
| D.E. Publicado em 05/07/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, na parte em que conhecida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0004580-34.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de apelação do INSS, interposta em face da r. sentença, não submetida ao reexame necessário, que em autos de concessão de aposentadoria por idade, com aproveitamento de tempos de trabalho rural e urbano, julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária a conceder o benefício à parte autora, a partir da data do requerimento administrativo, discriminando os consectários e antecipando os efeitos da tutela. Outrossim, condenou o réu em honorários advocatícios fixados no percentual de 10% sobre o valor da condenação (fls. 144/155).
Pugna o INSS, em preambular, pela submissão do feito ao reexame necessário. No mérito, visa à reforma da sentença, sob a alegação de ausência de prova material do exercício de atividade rural. Subsidiariamente, pleiteia a redução da verba honorária para o percentual de 10% sobre o valor da condenação e questiona os critérios de fixação da correção monetária. Prequestiona a matéria para fins recursais (fls. 159/180).
Com contrarrazões (fls. 184/189), subiram os autos a este Tribunal.
VOTO
Inicialmente, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o artigo 496, § 3º, inciso I, do Novo Código de Processo Civil, que entrou em vigor em 18 de março de 2016, dispõe que não está sujeita ao reexame necessário a sentença em ações movidas contra a União Federal e respectivas autarquias e fundações e cujo direito controvertido não exceda mil salários mínimos.
No caso dos autos, considerando as datas do termo inicial do benefício (31/08/2015- fl. 88) e da prolação da sentença (12/09/2016), bem como o valor da benesse, verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à análise do recurso autárquico em seus exatos limites, uma vez que cumpridos os requisitos de admissibilidade, conforme o artigo nº 1.011 do NCPC.
Outrossim, não conheço do apelo no que tange aos honorários advocatícios, uma vez que já fixados pela sentença no patamar vindicado.
A modalidade de jubilamento postulado pela autoria vem consagrado no § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.213/91, na dicção da Lei nº 11.718/2008, e é, tradicionalmente, denominado híbrido ou misto, haja vista a permissão legislativa quanto à contagem de tempo desempenhado em mister rural, em consórcio a outros interstícios contributivos atinentes a categorias de segurado diversas, de sorte a adimplir, com referido somatório, o lapso de carência, delimitado a partir da aplicação da tabela progressiva constante do artigo 142 da Lei nº 8.213/91. Quanto ao quesito etário, remanesce assinalado em 65 anos (homem) e 60 anos (mulher).
Ao prever tal espécie de aposentação, teve o legislador ordinário por fito salvaguardar os interesses dos exercentes de ofício rural que, em sua jornada profissional, de forma transitória ou permanente, vieram a galgar ocupações distintas, notadamente de natureza urbana, circunstância que, eventualmente, empecer-lhes-ia a outorga de aposentadoria por idade de trabalhador rural, relegando-os a verdadeiro limbo jurídico, à constatação de que desempenharam labor urbano por expressivo lapso temporal ou bem teriam abandonado a atividade campestre antes do atingimento etário ou da vindicação da benesse. É-lhes propiciada, nessa medida, a contabilização do tempo laboral desenvolvido no campo, ainda que de forma descontínua, conjugando-o ao afazer urbano, na busca do atendimento à carência legal. Desimporta, aqui, investigar-se do predomínio de atividades rurais no histórico laboral do requerente do benefício; tampouco, apurar-se se, quando da dedução do requerimento, o solicitante ainda estava a labutar no campo.
Vale ponderar, ainda, que, ao contrário do que sucede na aposentadoria por idade de trabalhador rural, na modalidade híbrida encontra aplicabilidade o artigo 3º, § 1º, da Lei nº 10.666/2003, mercê do qual a perda da qualidade de segurado, anteriormente ao atingimento da idade exigida, não é de molde a obstar a outorga do benefício, contanto que seja alcançada a carência exigida. Precedente deste Tribunal nesse diapasão: AC 00038436520164039999, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, TRF3, SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 23/06/2016.
Quanto à demonstração do labor rural, há de se operar à luz dos contornos arraigados na jurisprudência, tais os seguintes:
- é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
- são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014);
- possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
- indisputável a existência de início de prova material contemporâneo a, quando menos, quinhão do período rural por testificar-se (v. Súmula TNU 34; cf., também, RESP 201200891007, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, DJE 19/12/2012, apreciado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, donde se colhe ser dispensável que o princípio de prova documental diga respeito a todo o interregno a comprovar, admitindo-se que aluda, apenas, à parcela deste);
- tratando-se de aposentadoria híbrida, despiciendo quer o recolhimento de contribuições previdenciárias relativamente ao tempo rural invocado pela autoria, à moda do que sucede em sede de aposentadoria por idade de trabalhador rural (RESP nº1497086/PR, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 06/04/2015), quer a demonstração do exercício da labuta campesina ao tempo da oferta do requerimento administrativo do benefício (AgRg no RESP 1.497.086/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, STJ - Segunda Turma, DJe 06/04/2015; RESP 201300429921, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, STJ - Segunda Turma, DJe 10/09/2014).
Ao caso dos autos, pois.
A parte autora, nascida em 06/05/1954 (fl. 11), adimpliu o requisito etário em 06/05/2014, incumbindo-lhe demonstrar o exercício de atividades rurícola e urbana por, no mínimo, 180 meses.
No intuito de denotar a labuta campesina, sem registro em carteira, alegadamente desenvolvida desde os oito anos de idade, a demandante apresentou:
Considere-se, de início, a impossibilidade de reconhecimento do labor rural desde os oito anos de idade, tendo em vista que esta Corte de Justiça tem se manifestado no sentido da possibilidade do cômputo, para fins previdenciários, do período laborado no campo a partir de doze anos de idade: AC 0019697-07.2013.4.03.9999, Décima Turma, Rel. Desembargador Federal Sergio Nascimento, julgado em 08/10/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/10/2013.
No que concerne aos documentos em nome dos genitores, é cediço que o C. Superior Tribunal de Justiça assentou o entendimento no sentido de que os documentos em nome de terceiros, como pais, cônjuge e filhos, são hábeis a comprovar a atividade rural em regime de economia familiar, onde dificilmente todos os membros da família terão documentos em seu nome, posto que concentrados, na maioria das vezes, na figura do chefe da família. Confira-se, a propósito: EREsp 1171565/SP, Terceira Seção, Relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05/3/2015; REsp 501.009, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 11/12/2006; REsp 447655, Quinta Turma, Relatora Ministra Laurita Vaz, DJ 29/11/2004).
Ainda, ressalto compreender extensível à esposa a qualificação de lavrador do marido, pelas especificidades da vida campesina, em que, usualmente, a mulher também se dedica ao ofício rural, quando este é desempenhado pelo cônjuge.
Evidenciada a presença, in casu, de princípios de prova documental do labor rural desde 06/05/1966 (data em que a autora completou doze anos de idade), passo à análise da prova testemunhal, colhida em audiência realizada em 06/07/2016 (mídia digital de fl. 191).
As testemunhas, que declararam conhecer a autora há mais de quarenta e cinquenta anos, respectivamente, afirmaram que ela sempre trabalhou na lavoura, com seus pais e, posteriormente, com seu esposo, no sítio São Pedro e na Usina Zanin, dentre outros, sendo que parou de trabalhar em 2011.
Por aí vai-se vendo que os testigos ouvidos, coesos e harmônicos quanto à prestação de trabalho rural pela requerente, permitem concluir pelo desempenho dessa atividade no período pleiteado.
Entretanto, há, nos autos, cópia do CNIS da autora (fl. 114), no qual se verifica o recolhimento de contribuições previdenciárias, vertidas na qualidade de contribuinte facultativo, no interregno de 01/07/2015 a 30/09/2015, ou seja, em data próxima da propositura da ação judicial (18/12/2015), evidenciando o claro propósito de produção de prova de recolhimentos de caráter urbano, a fim de consubstanciar exercício de atividade híbrida e, assim, propiciar a fruição da aposentação respectiva.
Contudo, ainda quando se pudesse considerar a nuança urbana desses derradeiros recolhimentos - circunstância a respeito da qual qualquer comprovação subsiste, sequer havendo notícia no CNIS a respeito - certo é que não se revelariam hábeis a descaracterizar a condição rurícola da parte autora, dado o diminuto período envolvido - cuida-se, apenas, de 03 contribuições.
A contexto, traga-se entendimento do c. Superior Tribunal de Justiça, verbis:
Destarte, a demandante não integra o rol de possíveis beneficiários da denominada aposentadoria por idade híbrida - presentes, aqui, as considerações introdutórias lançadas neste provimento jurisdicional, no sentido de que tal benesse tem por escopo apaziguar situações peculiares, a obstar prejuízo ao trabalhador rural que, em seu histórico profissional, passou a oficiar no meio urbano, transitória ou permanentemente, de sorte a lhes inibir a fruição da aposentação por idade destinada aos rurícolas.
E, em tese, seria justamente a aposentadoria por idade rural o beneplácito adequado ao contexto insinuado pela suplicante, cuja outorga, no entanto, resta inibida pela noticiada cessação dessa espécie de labor em 2011, antes do implemento do requisito etário, em 2014, desatendida, pois, a exigência da imediatidade (STJ: AgRg no RESP 1.497.086/PR; RESP 201300429921).
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não haver qualquer infringência à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Ante o exposto, DOU PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, na parte em que conhecida, para julgar improcedente o pedido.
Diante da sucumbência recursal e da regra prevista no § 11 do art. 85 do NCPC, fixo a verba honorária em 12% sobre o valor da causa, observado o disposto no artigo 98, § 3º, do mesmo codex, que manteve a sistemática da Lei n. 1060/50, por ser beneficiária da justiça gratuita.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
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