
| D.E. Publicado em 05/07/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0033465-58.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação do INSS tirada de sentença, não submetida ao reexame necessário, que, em autos de concessão de aposentadoria por idade, com aproveitamento de tempos de trabalho rural e urbano, julgou procedente o pedido e condenou a autarquia previdenciária a conceder o benefício à parte autora, desde o requerimento administrativo (10/07/2012 - fl. 19), discriminados os consectários e fixados os honorários advocatícios em 10% sobre o valor da condenação (fls. 114/116).
Foram opostos embargos de declaração pela parte autora (fls. 119/120), aos quais foi dado provimento para explicitar os critérios de incidência de juros de mora e correção monetária (fl. 122).
Em seu recurso, alega o INSS a não comprovação do implemento da carência necessária à concessão do benefício. Subsidiariamente, sustenta a aplicabilidade da Lei n. 11.960/2009 quanto aos juros de mora e correção monetária (fls. 125/145).
Com as contrarrazões (fls. 149/173), subiram os autos ao Tribunal.
VOTO
Inicialmente, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o artigo 496, § 3º, inciso I, do NCPC, que entrou em vigor em 18 de março de 2016, dispõe que não está sujeita ao reexame necessário a sentença em ações movidas contra a União Federal e respectivas autarquias e fundações e cujo direito controvertido não exceda mil salários mínimos.
No caso dos autos, considerando as datas do termo inicial do benefício (10/07/2012) e da prolação da sentença (07/10/2016), bem como que o valor da benesse não poderá ultrapassar o teto do RGPS, verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de conhecer da remessa oficial, passo à análise do recurso interposto, uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade previstos no diploma processual.
A modalidade de jubilamento postulado pela autoria vem consagrado no § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.213/91, na dicção da Lei nº 11.718/2008, e é, tradicionalmente, denominado híbrido ou misto, haja vista a permissão legislativa quanto à contagem de tempo desempenhado em mister rural, em consórcio a outros interstícios contributivos atinentes a categorias de segurado diversas, de sorte a adimplir, com referido somatório, o lapso de carência, delimitado a partir da aplicação da tabela progressiva constante do artigo 142 da Lei nº 8.213/91. Quanto ao quesito etário, remanesce assinalado em 65 anos (homem) e 60 anos (mulher).
Ao prever tal espécie de aposentação, teve o legislador ordinário por fito salvaguardar os interesses dos exercentes de ofício rural que, em sua jornada profissional, de forma transitória ou permanente, vieram a galgar ocupações distintas, notadamente de natureza urbana, circunstância que, eventualmente, empecer-lhes-ia a outorga de aposentadoria por idade de trabalhador rural, relegando-os a verdadeiro limbo jurídico, à constatação de que desempenharam labor urbano por expressivo lapso temporal ou bem teriam abandonado a atividade campestre antes do atingimento etário ou da vindicação da benesse. É-lhes propiciada, nessa medida, a contabilização do tempo laboral desenvolvido no campo, ainda que de forma descontínua, conjugando-o ao afazer urbano, na busca do atendimento à carência legal. Desimporta, aqui, investigar-se do predomínio de atividades rurais no histórico laboral do requerente do benefício; tampouco, apurar-se se, quando da dedução do requerimento, o solicitante ainda estava a labutar no campo.
Vale ponderar, ainda, que, ao contrário do que sucede na aposentadoria por idade de trabalhador rural, na modalidade híbrida encontra aplicabilidade o artigo 3º, § 1º, da Lei nº 10.666/2003, mercê do qual a perda da qualidade de segurado, anteriormente ao atingimento da idade exigida, não é de molde a obstar a outorga do benefício, contanto que seja alcançada a carência exigida. Precedente deste Tribunal nesse diapasão: AC 00038436520164039999, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO, TRF3, SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 23/06/2016.
Quanto à demonstração do labor rural, há de se operar à luz dos contornos arraigados na jurisprudência, tais os seguintes:
- é suficiente à demonstração do labor rural início de prova material (v.g., documentos expedidos por órgãos públicos que contemplem a qualificação rurícola da parte autora, não sendo taxativo o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei nº 8.213/91), corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica, sendo inservível a tal finalidade prova exclusivamente testemunhal (Súmula STJ 149), inclusive para os chamados "boias-frias" (REsp nº 1.321.493/PR, apreciado na sistemática do art. 543-C do CPC);
- são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores (v.g., STJ, AGARESP 201402280175, Relatora Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014);
- possível o reconhecimento de tempo de serviço rural antecedente ou ulterior ao princípio de prova documental apresentado, desde que ratificado por testemunhos idôneos (STJ, REsp nº 1.348.633/SP, Relator Min. Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
- indisputável a existência de início de prova material contemporâneo a, quando menos, quinhão do período rural por testificar-se (v. Súmula TNU 34; cf., também, RESP 201200891007, Relator Min. HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, DJE 19/12/2012, apreciado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, donde se colhe ser dispensável que o princípio de prova documental diga respeito a todo o interregno a comprovar, admitindo-se que aluda, apenas, à parcela deste);
- tratando-se de aposentadoria híbrida, despiciendo quer o recolhimento de contribuições previdenciárias relativamente ao tempo rural invocado pela autoria, à moda do que sucede em sede de aposentadoria por idade de trabalhador rural (RESP nº1497086/PR, 2ª T., Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 06/04/2015), quer a demonstração do exercício da labuta campesina ao tempo da oferta do requerimento administrativo do benefício (AgRg no RESP 1.497.086/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, STJ - Segunda Turma, DJe 06/04/2015; RESP 201300429921, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, STJ - Segunda Turma, DJe 10/09/2014).
Ao caso dos autos, pois.
A requerente nasceu em 03/02/1952 (fl. 14), tendo, de conseguinte, ultimado o pressuposto idade em 2012, incumbindo-lhe demonstrar o exercício de atividades rurícola e urbana por, no mínimo, 180 meses.
No intuito de denotar a labuta campesina, sem registro em carteira, desenvolvida, consoante aduz, entre 03/02/1964 e 30/03/1986, a demandante trouxe à baila carteira de filiação ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Paulo de Faria, datada de 01/07/1981 (fl. 15).
A testemunha Alcídio Lemes da Silva informou que conhece a autora desde meados de 1970 e que de vez em quando trabalhavam juntos na lavoura de algodão; que, em 1980, a demandante laborava para o pai do depoente, que era arrendatário de fazendas para o cultivo de algodão; não sabendo informar se ela exerceu ofícios de natureza urbana; que a autora trabalhou para a testemunha por, aproximadamente, dezesseis anos (fls. 102/107).
Sueli Fátima Macedo declarou que conhece a autora desde meados de 1975 e que esta trabalhava na lavoura de algodão, sem registro em CTPS; que ia junto com a requerente receber o pagamento do empreiteiro; que a demandante passou a exercer labor urbano como costureira e cabeleireira, por volta de 1986 (fls. 108/112).
Por aí se vê que os testigos são coesos e harmônicos quanto à prestação de trabalho rural pela requerente, permitem concluir pelo desempenho dessa atividade entre 1970 e 1986.
Ademais, há nos autos cópia do CNIS (fl. 16) e do Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição expedido pelo INSS, em nome da autora (fl. 58), com registro de recolhimentos como contribuinte autônomo (01/04/1986 a 30/04/1986 e 01/07/1986 a 31/07/1986), contribuinte individual (01/03/2005 a 30/04/2006) e empregado doméstico (01/01/2010 a 31/01/2011, 01/10/2011 a 31/10/2011 e 01/12/2011 a 31/01/2012).
Agregando-se o lapso de labor rural ora reconhecido ao interregno de serviço urbano que ecoa dos elementos carreados aos autos, ressai que a suplicante reúne tempo superior ao legalmente reclamado, sendo de rigor a acolhida do pleito inicial.
Passo à análise dos consectários.
Cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral sobre a incidência da Lei n. 11.960/2009: "1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere aos juros de mora e à correção monetária, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso incidirão juros e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO para fixar os juros de mora nos termos da fundamentação, explicitados os critérios de correção monetária.
É como voto.
ANA PEZARINI
Desembargadora Federal Relatora
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| Data e Hora: | 21/06/2018 15:28:47 |
