Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5429530-83.2019.4.03.9999
Relator(a)
Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
05/11/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 11/11/2019
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. AUXÍLIO-
RECLUSÃO. RENDA SUPERIOR AO TETO LEGAL NA DATA DO PRIMEIRO
ENCARCERAMENTO. DESEMPREGO NA DATA DO SEGUNDO ENCARCERAMENTO.
BENEFÍCIO DEVIDO.
- No caso dos autos, considero as datas do termo inicial do benefício e da prolação da sentença.
Atenho-me ao teto para o salário-de-benefício como parâmetro de determinação do valor da
benesse. Verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários mínimos.
- No que concerne à primeira prisão, ocorrida no período de 20/01/2017 a 09/02/2017, verifica-se,
da cópia da CTPS que o recluso manteve vínculo empregatício com MXM Montagem Industrial e
Locação LTDA- EPP, no lapso de 16/05/2016 a 1º/03/2017. Abandono de emprego pelo próprio
trabalhador configura situação diversa do desemprego voluntário. Último salário de contribuição
superior ao teto legal. Benefício indevido.
- Quanto ao segundo encarceramento, em 12/04/2017, requisito da qualidade de segurado
atendido. Dependência econômica presumida. Desemprego. Requisito da baixa renda atendido.
Benefício devido.
- Juros de mora e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as
teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
- Apelação do INSS provida em parte, para limitar a concessão do benefício ao segundo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
encarceramento do segurado, explicitando os critérios de incidência de correção monetária e
juros de mora.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5429530-83.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: K. C. G. A., N. S. G. A.
REPRESENTANTE: FABIANA GONZAGA MONTEIRO
Advogados do(a) APELADO: MARIA AUGUSTA FORTUNATO MORAES - SP212795-N,
CAROLINA GALLOTTI - SP210870-N,
Advogados do(a) APELADO: MARIA AUGUSTA FORTUNATO MORAES - SP212795-N,
CAROLINA GALLOTTI - SP210870-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5429530-83.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: K. C. G. A., N. S. G. A.
REPRESENTANTE: FABIANA GONZAGA MONTEIRO
Advogados do(a) APELADO: MARIA AUGUSTA FORTUNATO MORAES - SP212795-N,
CAROLINA GALLOTTI - SP210870-N,
Advogados do(a) APELADO: MARIA AUGUSTA FORTUNATO MORAES - SP212795-N,
CAROLINA GALLOTTI - SP210870-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso de apelação do INSS, tirado de sentença, não submetida à remessa oficial,
que julgou procedente o pedido deduzido na inicial e determinou a concessão do benefício de
auxílio-reclusão às autoras. Discriminados os consectários e diferida a fixação da verba honorária
para a fase de liquidação.
Sustenta o INSS o descumprimento ao requisito da "baixa renda". Subsidiariamente, pleiteia a
aplicabilidade da Lei n. 11.960/2009 quanto à correção monetária e aos juros de mora.
Prequestiona a matéria para fins recursais.
Consta dos autos parecer do Ministério Público Federal. Opinoupelo desprovimento do recurso
autárquico e a fixação dos termos iniciais dos benefícios nas datas das prisões do segurado.
Em síntese, o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5429530-83.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: K. C. G. A., N. S. G. A.
REPRESENTANTE: FABIANA GONZAGA MONTEIRO
Advogados do(a) APELADO: MARIA AUGUSTA FORTUNATO MORAES - SP212795-N,
CAROLINA GALLOTTI - SP210870-N,
Advogados do(a) APELADO: MARIA AUGUSTA FORTUNATO MORAES - SP212795-N,
CAROLINA GALLOTTI - SP210870-N,
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o art. 496, § 3º, inciso I do Código de Processo Civil atual, que entrou em vigor em 18 de
março de 2016, dispõe que a sentença não será submetida ao reexame necessário quando a
condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000
(mil) salários mínimos, em desfavor da União ou das respectivas autarquias e fundações de
direito público.
No caso dos autos, considero as datas do termo inicial do benefício e da prolação da sentença.
Atenho-me ao teto para o salário-de-benefício como parâmetro de determinação do valor da
benesse. Verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise do recurso em seus exatos limites, uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade
previstos no Código de Processo Civil atual.
Discute-se o direito da parte autora à concessão de benefício de auxílio- reclusão.
Previsto no art. 201, IV, da Constituição Federal, a benesse vem disciplinada pelo art. 80 da Lei
nº 8.213/1991, bem assim pelos arts. 116 a 119 do Decreto nº 3.048/1999, atrelando-se sua
outorga, basicamente, à presença dos seguintes requisitos, a serem averiguados no momento do
recolhimento à prisão, nos moldes do princípio tempus regit actum:
- constatação do recolhimento do segurado a estabelecimento prisional, em virtude de pena
privativa de liberdade cumprida em regime fechado (penitenciária) ou semiaberto (colônia
agrícola, industrial e similares), comprovado mediante apresentação de certidão firmada pela
autoridade competente. Reclama-se, para efeito de continuidade do pagamento do benefício, seja
colacionada declaração de permanência na condição de presidiário;
- detecção da qualidade de segurado do recluso no momento da reclusão ou detenção,
inexigindo-se, contudo, cumprimento de carência mínima - art. 26, inciso I da Lei nº 8.213/1991;
- averiguação de dependência econômica relativamente à pessoa do enclausurado, atendido,
quanto a esse último aspecto, o elenco de dependentes inserto no art. 16 da Lei nº 8.213/1991,
legitimados, ativamente, à postulação do beneplácito;
- inocorrência de percepção, pelo confinado, de remuneração, auxílio-doença, aposentadoria ou
abono de permanência em serviço, ressalvada a hipótese de exercício de atividade remunerada
no cumprimento de pena em regime fechado ou semiaberto, caso em que não se tem perda do
direito ao benefício;
- comprovação de se tratar de segurado de "baixa renda", vale dizer, a remuneração bruta mensal
auferida pelo encarcerado não pode ultrapassar o limite vigente à época em que ocorreu a prisão,
cumprindo atentar, nesse particular, à importância constante em portaria do Ministério da
Previdência e Assistência Social, atualizada anualmente.
Tais limites acham-se assim disciplinados:
até 31/05/1999 - R$360,00 (EC nº 20/98);
de 1º/06/1999 a 31/05/2000 - R$ 376,60 (Portaria MPS nº 5.188/99);
de 1º/06/2000 a 31/05/2001 - R$ 398,48 (Portaria MPS nº 6.211/00);
de 1º/06/2001 a 31/05/2002 - R$ 429,00 (Portaria MPS nº 1.987/01);
de 1º/6/2003 a 31/04/2004 - R$560,81 (Portaria MPS nº 727/03);
de 1º/05/2004 a 30/04/2005 - R$586,19 (Portaria MPS nº479/04);
de 1º/05/2005 a 31/3/2006 - R$623,44 (Portaria MPS nº 822/05);
de 1º/04/2006 a 31/03/2007 - R$654,61 (Portaria MPS nº119/06);
de 1º/04/2007 a 29/02/2008 - R$676,27 (Portaria MPS nº142/07);
de 1º/03/2008 a 31/01/2009 - R$710,08 (Portaria MPS nº 77/08);
de 1º/02/2009 a 31/12/2009 - R$752,12 (Portaria MPS nº 48/09);
de 1º/01/2010 a 31/12/2010 - R$810,18 (Portaria MPS nº 333/2010);
de 1º/01/2011 a 14/7/2011 - R$862,11 (Portaria MPS nº568/2010);
de 15/7/2011 a 31/12/2011 - R$ 862,60 (Portaria MPS nº 407/2011);
de 01/01/2012 a 31/12/2012- R$ 915,05 (Portaria MPS 02/2012);
de 01/01/2013 e 31/12/2013- R$ 971,78 (Portaria MPS 15/2013);
de 01/01/2014 a 31/12/2014- R$ 1.025,81 (Portaria MPS/MF 19/2014);
de 01/01/2015 a 31/12/2015 - R$ 1.089,72 (Portaria MPS/MF 13/2015);
de 01/01/2016 a 31/12/2016 - R$ 1.212,64 (Portaria MTPS/MF 1/2016);
de 01/01/2017 a 31/12/2017 - R$ 1.292,43 (Portaria MF 8/2017);
a partir de 01 de janeiro de 2018 - R$ 1.319,18 (Portaria MF 15/2018).
Quanto a esse último pressuposto, diga-se que, após celeumas iniciais havidas na doutrina e
jurisprudência, hodiernamente bem assentada está a tese de que a renda por considerar é a do
segurado preso, não a de seus dependentes. Nesse diapasão, já deliberou o C. STF, inclusive
em sede de repercussão geral:
"PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-
RECLUSÃO. ART. 201, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO
DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO- RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS
SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998.
SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO
EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. I - Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do
segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não
a de seus dependentes. II - Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo
pela EC 20/1998, que restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio- reclusão , a qual
adotou o critério da seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários. III - Diante
disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade. IV -
Recurso extraordinário conhecido e provido."
(RE nº 587365/SC, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, Repercussão Geral, j.
25/03/2009, DJe 08/05/2009).
Na mesma vereda:
"DIREITO CONSTITUCIONAL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE
INSTRUMENTO. AUXÍLIO- RECLUSÃO. PARÂMETRO PARA CONCESSÃO. RENDA DO
SEGURADO PRESO. 1. O Supremo Tribunal Federal assentou que, nos termos do art. 201, IV,
da Constituição Federal, a renda do segurado preso é a que deve ser utilizada como parâmetro
para a concessão do benefício e não a de seus dependentes. 2. Ausência de razões aptas a
desconstituir a decisão agravada. 3. Agravo regimental a que se nega provimento".
(AI nº 767352, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª T., j. 14/02/2010, DJE 08/02/2011).
No que concerne, outrossim, à derradeira condicionante, cumpre anotar a existência de dissenso
jurisprudencial acerca da possibilidade de eventual flexibilização quando se verifica trespasse ao
limite legal por montante ínfimo. A despeito de conhecer paradigmas do C. STJ em abono a esse
modo de pensar, v.g., AgRg - RESP nº 1.523.797, 1ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia
Filho, j. 1º/10/2015, certo é que esta egrégia Nona Turma vem recusando a adoção desse
posicionamento, à compreensão de que eventual elasticidade na exegese desse critério induziria
insegurança jurídica, à míngua de fatores objetivos na definição de eventual irrisoriedade,
conceito que, certamente, daria azo a múltiplas interpretações, ao exclusivo sabor do operador do
Direito frente ao caso concreto.
Esse o entendimento desta Nona Turma, cujo precedente transcrito:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DO ART. 557, § 1º, CPC/1973 (ART. 1.021 DO
CPC/2015). AUXÍLIO RECLUSÃO . LIMITE ESTABELECIDO PARA A CONCESSÃO. ÚLTIMA
CONTRIBUIÇÃO INTEGRAL QUE ULTRAPASSA O VALOR ESTABELECIDO EM PORTARIA.
VALOR ÍNFIMO. IMPOSSIBILIDADE DE ELASTICIZAÇÃO DE CRITÉRIO LEGALMENTE
IMPOSTO. DECISÃO REFORMADA.
I - No agravo do art. 557, § 1º, do CPC/1973, a controvérsia limita-se ao exame da ocorrência, ou
não, de flagrante ilegalidade ou abuso de poder, a gerar dano irreparável ou de difícil reparação
para a parte, vícios inexistentes na decisão agravada.
II - Razões recursais que não contrapõem tal fundamento a ponto de demonstrar o desacerto da
decisão, limitando-se a reproduzir argumento visando rediscutir a matéria nele decidida.
III - Agravo legal improvido."
(AGRAVO LEGAL EM APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002915-53.2015.4.03.6183/SP, RELATORA:
Desembargadora Federal MARISA SANTOS, j. 15 de agosto de 2016).
Ainda no que diz com a mensuração do quesito baixa renda, cabe ponderar a prevalência, após
intensos debates jurisprudenciais, do entendimento segundo o qual, uma vez demonstrada
situação de desemprego do recluso ao instante do recolhimento ao estabelecimento prisional,
sem constatação de perda da condição de segurado, resulta salvaguardada a percepção da
benesse.
Confira-se o seguinte precedente do C. STJ:
"PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. SEGURADO DESEMPREGADO OU SEM RENDA.
CRITÉRIO ECONÔMICO. MOMENTO DA RECLUSÃO. ÚLTIMO SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO.
IMPOSSIBILIDADE.
1. A questão jurídica controvertida consiste em definir o critério de rendimentos ao segurado
recluso em situação de desemprego ou sem renda no momento do recolhimento à prisão. O
acórdão recorrido e o INSS defendem que deve ser considerado o último salário de contribuição,
enquanto os recorrentes apontam que a ausência de renda indica o atendimento ao critério
econômico.
(...)
3. O Estado, através do Regime Geral de Previdência Social, no caso, entendeu por bem amparar
os que dependem do segurado preso e definiu como critério para a concessão do benefício a
"baixa renda".
4. Indubitavelmente que o critério econômico da renda deve ser constatado no momento da
reclusão, pois nele é que os dependentes sofrem o baque da perda do seu provedor.
5. O art. 80 da Lei 8.213/1991 expressa que o auxílio- reclusão será devido quando o segurado
recolhido à prisão "não receber remuneração da empresa".
6. Da mesma forma o § 1º do art. 116 do Decreto 3.048/1999 estipula que "é devido auxílio-
reclusão aos dependentes do segurado quando não houver salário-de-contribuição na data do
seu efetivo recolhimento à prisão, desde que mantida a qualidade de segurado", o que regula a
situação fática ora deduzida, de forma que a ausência de renda deve ser considerada para o
segurado que está em período de graça pela falta do exercício de atividade remunerada
abrangida pela Previdência Social." (art. 15, II, da Lei 8.213/1991).
7. Aliada a esses argumentos por si sós suficientes ao provimento dos Recursos Especiais, a
jurisprudência do STJ assentou posição de que os requisitos para a concessão do benefício
devem ser verificados no momento do recolhimento à prisão, em observância ao princípio tempus
regit actum. Nesse sentido: AgRg no REsp 831.251/RS, Rel. Ministro Celso Limongi
(Desembargador convocado do TJ/SP), Sexta Turma, DJe 23.5.2011; REsp 760.767/SC, Rel.
Ministro Gilson Dipp, Quinta Turma, DJ 24.10.2005, p. 377; e REsp 395.816/SP, Rel. Ministro
Fernando Gonçalves, Sexta Turma, DJ 2.9.2002, p. 260.
8. Recursos Especiais providos."
(REsp n. 1.480.461/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 10/10/2014).
Dessa postura, não discrepa a egrégia Terceira Seção deste Regional:
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES EM AGRAVO LEGAL. AUXÍLIO-
RECLUSÃO. SEGURADO DESEMPREGADO NA DATA DA PRISÃO. NÃO HÁ RENDA A SER
CONSIDERADA.
1. O auxílio- reclusão é benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado nos termos
do artigo 80 da Lei n° 8.213/1991.
2. A renda a ser aferida é a do detento e não a de seus dependentes. (RE 587365, Rel. Ministro
Ricardo Lewandowski, DJe 08/05/2009).
3. Mantida a qualidade de segurado do recluso, que não exercia atividade laboral na data do
recolhimento à prisão e, desse modo, não possuía renda, fazem jus seus dependentes ao
benefício em questão.
4. Embargos infringentes providos. Concedido o pedido de tutela antecipada formulado pelo
advogado da tribuna, em sustentação oral."
(TRF3, Terceira Seção, EI 00412389620134039999, Relator Desembargador Federal Souza
Ribeiro, e-DJF3 13/08/2015, p. 956).
No particular abordado, acredito remanescer oportunidade ao debate, sob ângulo, a meu ver,
pouco abordado, tal seja, a necessidade, e mesmo viabilidade fático-jurídica, de comprovação do
estado de desemprego e da decorrente ausência de renda.
Força é reconhecer certa preponderância, na jurisprudência, do entendimento acerca da
suficiência da falta de recolhimentos ou mesmo de recebimento de remuneração ao instante do
confinamento, para o aludido efeito probatório. Seguindo essa trilha de raciocínio, a mera
detecção de ausência de registro de contrato de trabalho, quando do encarceramento, bastaria à
demonstração do avivado desemprego.
Roborando o acerto desse modo de pensar, os adeptos dessa linha interpretativa objetam que a
exigência da efetiva evidenciação de desemprego importaria em 'probatio diabolica', dado que de
tormentosa confecção, por envolver fato, a todas as luzes, negativo.
Finalizando as considerações introdutórias quanto ao benefício em referência, remanesce
abordar a temática da fixação de seu marco inicial, o qual será estatuído na data do efetivo
recolhimento do segurado à prisão, se requerido até trinta dias depois desta, ou na data do
requerimento, se posterior, observadas demais disposições regulamentares. Vide art. 116, § 4º,
do Decreto nº 3.048/1999, com redação dada pelo Decreto nº 4.729/2003. Tratando-se de
absolutamente incapazes, contudo, tem-se que o estabelecimento do termo a quo ao tempo do
encarceramento não se vincula à data de oferecimento do requerimento, uma vez que não seria
concebível que eventual inação dos representantes legais, relativamente à solicitação do
beneplácito, fosse de molde a lhes gerar gravame.
No caso vertente, o Certificado de Recolhimento Prisional demonstra o encarceramento de
Ednilson Luciano Alcará de 20/01/2017 a 09/02/2017 e, novamente, em 12/04/2017. Ainda, as
certidões de nascimento acostadas aos autos comprovam que as demandantes, nascidas em
07/11/2001 e 20/07/2006, são suas filhas, cuja dependência econômica é presumida, nos termos
do art. 16 da Lei n. 8.213/1991.
No que concerne à primeira prisão, ocorrida no período de 20/01/2017 a 09/02/2017, verifica-se,
da cópia da CTPS que o recluso manteve vínculo empregatício com MXM Montagem Industrial e
Locação LTDA- EPP, no lapso de 16/05/2016 a 1º/03/2017. Todavia, analisando-se o extrato do
CNIS, constata-se que o segurado percebeu remuneração de 05/2016 a 10/2016 e,
posteriormente, somente em 02/2017.
Instado o empregador a esclarecer a ausência de pagamentos entre 11/2016 e 01/2017, esse
informou que o recluso foi funcionário da empresa e “laborava suas atividades em cidades onde a
empresa presta serviços, recebia o mesmo pela quantia de R$1.361,80 por mês, na função de
auxiliar de montagem. Vindo o mesmo a se ausentar da empresa em outubro de 2016, sendo por
várias vezes procurado pela empresa por vários meios de contato, contando assim falta até a
data de desligamento. Sendo o mesmo desligado da empresa na data de 1º/03/2017 por
abandono de emprego”.
Desse modo, conclui-se que o segurado não se encontrava desempregado, mas possuía vínculo
empregatício vigente. O abandono de emprego pelo próprio trabalhador configura situação
diversa do desemprego involuntário, não se podendo dar a tais situações o mesmo tratamento
legal. Assim, resta comprovada a qualidade de segurado, uma vez que seu derradeiro contrato
trabalho estava vigente.
De outro lado, o último salário percebido pelo genitor dos demandantes é superior tanto ao limite
estabelecido na Portaria MTPS/MF nº 1/2016, quanto na Portaria MF nº 8/2017, desatendido,
assim, o requisito da baixa renda, sendo de rigor, portanto, a denegação da benesse vindicada.
Colocado em liberdade em 09/02/2017, manteve sua qualidade de segurado por mais 12 meses,
conforme o disposto pelo art. 15, IV, da Lei nº 8.213/91. Assim, quando do segundo
encarceramento, em 12/04/2017, mantinha o recluso qualidade de segurado.
Por conseguinte, nesse contexto, concluo que a ausência de anotações de vínculos
empregatícios entre a data final do último vínculo e a data do encarceramento comprova a
situação de desemprego.
Portanto, de rigor a concessão apenas da benesse relativa à segunda prisão do segurado. O
termo inicial do benefício deve ser fixado na data do encarceramento, isto é, 12/04/2017.
No que concerne aos consectários, cumpre esclarecer que, em 20 de setembro de 2017, o STF
concluiu o julgamento do RE 870.947, definindo as seguintes teses de repercussão geral: "1) O
art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, na parte em que
disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao
incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os
mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em
respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações
oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de
remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão,
o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e 2) O art.
1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a
atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração
oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao
direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada
a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se
destina."
Assim, a questão relativa à aplicação da Lei n. 11.960/2009, no que se refere à correção
monetária e aos juros de mora, não comporta mais discussão, cabendo apenas o cumprimento da
decisão exarada pelo STF em sede de repercussão geral.
Nesse cenário, sobre os valores em atraso, incidirão correção monetária e juros de mora em
conformidade com os critérios legais compendiados no Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as teses fixadas no julgamento final do RE
870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
Quanto à modulação dos efeitos da decisão do citado RE, destaca-se a pendência de apreciação,
pelo STF, de Embargos de Declaração, ficando remarcada, desta forma, a sujeição da questão
da incidência da correção monetária ao desfecho do referido "leading case".
Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, para limitar a concessão
do benefício ao segundo encarceramento do segurado, explicitando os critérios de incidência de
correção monetária e juros de mora.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. AUXÍLIO-
RECLUSÃO. RENDA SUPERIOR AO TETO LEGAL NA DATA DO PRIMEIRO
ENCARCERAMENTO. DESEMPREGO NA DATA DO SEGUNDO ENCARCERAMENTO.
BENEFÍCIO DEVIDO.
- No caso dos autos, considero as datas do termo inicial do benefício e da prolação da sentença.
Atenho-me ao teto para o salário-de-benefício como parâmetro de determinação do valor da
benesse. Verifico que a hipótese em exame não excede os mil salários mínimos.
- No que concerne à primeira prisão, ocorrida no período de 20/01/2017 a 09/02/2017, verifica-se,
da cópia da CTPS que o recluso manteve vínculo empregatício com MXM Montagem Industrial e
Locação LTDA- EPP, no lapso de 16/05/2016 a 1º/03/2017. Abandono de emprego pelo próprio
trabalhador configura situação diversa do desemprego voluntário. Último salário de contribuição
superior ao teto legal. Benefício indevido.
- Quanto ao segundo encarceramento, em 12/04/2017, requisito da qualidade de segurado
atendido. Dependência econômica presumida. Desemprego. Requisito da baixa renda atendido.
Benefício devido.
- Juros de mora e correção monetária em conformidade com os critérios legais compendiados no
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observadas as
teses fixadas no julgamento final do RE 870.947, de relatoria do Ministro Luiz Fux.
- Apelação do INSS provida em parte, para limitar a concessão do benefício ao segundo
encarceramento do segurado, explicitando os critérios de incidência de correção monetária e
juros de mora. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS, para limitar a concessão do
benefício ao segundo encarceramento do segurado, explicitando os critérios de incidência de
correção monetária e juros de mora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA