Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000477-51.2017.4.03.6133
Relator(a)
Juiz Federal Convocado VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
06/02/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 11/02/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL.
RUÍDO. POSSIBILIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. BENEFÍCIO DEVIDO.
- A hipótese em exame não excede 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC.
- Demonstrada, pelo conjunto probatório dos autos, a exposição a ruídos de 90 dB(A), deve ser
reconhecida a especialidade do labor.
- Preenchidos os requisitos, é devido o benefício da aposentadoria especial a partir da data de
entrada do requerimento administrativo. Precedente do Superior Tribunal de Justiça.
- Apelação do INSS desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000477-51.2017.4.03.6133
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: RENATO FUJITA
Advogados do(a) APELADO: PATRICIA CHARRUA FERREIRA - SP339754-A, EDISON
VANDER PORCINO DE OLIVEIRA - SP200420-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000477-51.2017.4.03.6133
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RENATO FUJITA
Advogados do(a) APELADO: PATRICIA CHARRUA FERREIRA - SP339754-A, EDISON
VANDER PORCINO DE OLIVEIRA - SP200420-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação autárquica interposta em face de sentença, não submetida à remessa
oficial, que julgou procedentes os pedidos deduzidos na inicial para reconhecer a especialidade
do período laborado de 06/03/1997 a 17/11/2003 e conceder o benefício de aposentadoria
especial, desde a data de entrada do requerimento administrativo. Discriminados os consectários
e fixada a verba honorária em R$1.200,00. Foram antecipados os efeitos da tutela.
Requer o afastamento da especialidade dos períodos em razão da não submissão do autor a
níveis de ruído acima dos limites legais. Prequestiona a matéria para fins recursais.
Com as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000477-51.2017.4.03.6133
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA VANESSA MELLO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: RENATO FUJITA
Advogados do(a) APELADO: PATRICIA CHARRUA FERREIRA - SP339754-A, EDISON
VANDER PORCINO DE OLIVEIRA - SP200420-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
É importante salientar que, de acordo com o art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil
atual, não será aplicável o duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito
econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos.
Na hipótese dos autos, considerando-se a data de início do benefício- 14/07/2016-, bem como a
data da sentença, em que houve a antecipação dos efeitos da tutela- 22/03/2018-, e o valor da
benesse- R$ 5.024,09-, resta evidente que a condenação ou o proveito econômico obtido na
causa não ultrapassa o limite legal previsto, enquadrando-se perfeitamente à norma insculpida no
parágrafo 3º, I, art. 496 da atual lei processual, razão pela qual impõe-se o afastamento do
reexame necessário.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise do recurso, em seus exatos limites, uma vez cumpridos os requisitos de admissibilidade
previstos no Código de Processo Civil atual.
No mérito, discute-se o direito da parte autora ao reconhecimento de exercício de atividades em
condições especiais e, consequentemente, à percepção do benefício de aposentadoria especial.
A aposentadoria especial - modalidade de aposentadoria por tempo de contribuição com tempo
mínimo reduzido - é devida ao segurado que tiver trabalhado, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou
25 (vinte e cinco) anos, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física,
conforme disposição legal, a teor do preceituado no art. 57 da Lei nº 8.213/91 e no art. 201, § 1º,
da Constituição Federal.
O período de carência exigido, por sua vez, está disciplinado pelo art. 25, inciso II, da Lei de
Planos de Benefícios da Previdência Social, o qual prevê 180 (cento e oitenta) contribuições
mensais, bem como pela norma transitória contida em seu art. 142.
Registre-se, por oportuno, que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1310034/PR,
Primeira Seção, Rel.Min. Herman Benjamin, DJe 19/12/2012, submetido à sistemática do art.
543-C do CPC/1973, decidiu que a "lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao
direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime
jurídico à época da prestação do serviço", de modo que a conversão do tempo de atividade
comum em especial, para fins de aposentadoria especial, é possível apenas no caso de o
benefício haver sido requerido antes da entrada em vigor da Lei n.º 9.032/95, que deu nova
redação ao art. 57, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, exigindo que todo o tempo de serviço seja especial.
A caracterização e comprovação da atividade especial, de acordo com o art. 70, § 1º, do Decreto
n.º 3.048/1999, "obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do
serviço", como já preconizava a jurisprudência existente acerca da matéria e restou sedimentado
em sede de recurso repetitivo, no julgamento do REsp 1151363/MG, Terceira Seção, Rel. Min.
Jorge Mussi, DJe 05/04/2011, e do REsp 1310034/PR, citado acima.
Dessa forma, até o advento da Lei n.º 9.032, de 28 de abril de 1995, para a configuração da
atividade especial, bastava o seu enquadramento nos Anexos dos Decretos n.ºs. 53.831/64 e
83.080/79, os quais foram validados pelos Decretos n.ºs. 357/91 e 611/92, possuindo, assim,
vigência concomitante.
Consoante entendimento consolidado de nossos tribunais, a relação de atividades consideradas
insalubres, perigosas ou penosas constantes em regulamento é meramente exemplificativa, não
exaustiva, sendo possível o reconhecimento da especialidade do trabalho executado mediante
comprovação nos autos. Nesse sentido, a súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos:
"Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial se perícia judicial constata
que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em
Regulamento".
A partir de referida Lei n.º 9.032/95, que alterou o art. 57, §§ 3º e 4º, da Lei n.º 8.213/91, não mais
se permite a presunção de insalubridade, tornando-se necessária a comprovação da efetiva
exposição a agentes prejudiciais à saúde ou integridade física do segurado e, ainda, que o tempo
trabalhado em condições especiais seja permanente, não ocasional nem intermitente.
A propósito: STJ, AgRg no AREsp 547559/RS, Segunda Turma, Relator Ministro Humberto
Martins, j. 23/09/2014, DJe 06/10/2014.
A comprovação podia ser realizada por meio de formulário específico emitido pela empresa ou
seu preposto - SB-40, DISES BE 5235, DSS 8030 ou DIRBEN 8030, atualmente, Perfil
Profissiográfico Previdenciário-PPP -, ou outros elementos de prova, independentemente da
existência de laudo técnico, com exceção dos agentes agressivos ruído e calor, os quais sempre
exigiram medição técnica.
Posteriormente, a Medida Provisória n.º 1.523/96, com início de vigência na data de sua
publicação, em 14/10/1996, convertida na Lei n.º 9.528/97 e regulamentada pelo Decreto n.º
2.172, de 05/03/97, acrescentou o § 1º ao art. 58 da Lei n.º 8.213/91, determinando a
apresentação do aludido formulário "com base em laudo técnico de condições ambientais do
trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho". Portanto, a
partir da edição do Decreto n.º 2.172/97, que trouxe o rol dos agentes nocivos, passou-se a exigir,
além das informações constantes dos formulários, a apresentação do laudo técnico para fins de
demonstração da efetiva exposição aos referidos agentes.
Ademais, o INSS editou a Instrução Normativa INSS/PRES n.º 77, de 21/01/2015, estabelecendo,
em seu art. 260, que: "Consideram-se formulários legalmente previstos para reconhecimento de
períodos alegados como especiais para fins de aposentadoria, os antigos formulários em suas
diversas denominações, sendo que, a partir de 1º de janeiro de 2004, o formulário a que se refere
o § 1º do art. 58 da Lei nº 8.213, de 1991, passou a ser o PPP".
À luz da legislação de regência e nos termos da citada Instrução Normativa, o PPP deve
apresentar, primordialmente, dois requisitos: assinatura do representante legal da empresa e
identificação dos responsáveis técnicos habilitados para as medições ambientais e/ou biológicas.
Na atualidade, a jurisprudência tem admitido o PPP - perfil profissiográfico previdenciário como
substitutivo tanto do formulário como do laudo técnico, desde que devidamente preenchido.
A corroborar o entendimento esposado acima, colhe-se o seguinte precedente: STJ, AgRg no
REsp 1340380/CE, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 23/09/2014, DJe
06/10/2014.
Quanto ao uso de Equipamento de Proteção Individual - EPI, no julgamento do ARE n.º
664.335/SC, em que restou reconhecida a existência de repercussão geral do tema ventilado, o
Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o mérito, decidiu que, se o aparelho "for realmente capaz
de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial".
Destacou-se, ainda, que, havendo divergência ou dúvida sobre a sua real eficácia, "a premissa a
nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da
aposentadoria especial".
NÍVEIS DE RUÍDO - LIMITES LEGAIS
No tocante ao agente agressivo ruído, tem-se que os níveis legais de pressão sonora, tidos como
insalubres, são os seguintes: acima de 80 dB, até 05/03/1997, na vigência do Decreto n.º
53.831/64, superior a 90 dB, de 06/03/1997 a 18/11/2003,conforme Decreto n.º 2.172/97 e acima
de 85 dB, a contar de 19/11/2003, quando foi publicado o Decreto n.º 4.882/2003, o qual não se
aplica retroativamente, consoante assentado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, em
recurso submetido ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973, precisamente o
REsp 1398260/PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 05/12/2014.
A par disso, esta Turma Julgadora tem se posicionado no sentido da admissão da especialidade
quando detectada a presença desse agente nocivo em patamares exatos, isto é, 80, 90 e 85
decibéis:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. EXPOSIÇÃO A
RUÍDO DE 85 DECIBÉIS. DECRETO 4.882/2003. MANTIDO RECONHECIMENTO DA
ATIVIDADE ESPECIAL. ENTENDIMENTO DA NONA TURMA. ILEGALIDADE OU ABUSO DE
PODER INEXISTENTES.
(...) Omissis
IV. A exposição a exatos 85 dB de 19.11.2003 a 18.04.2012 não configuraria condição especial
de trabalho. Ressalvado o posicionamento pessoal da Relatora, acompanha-se o entendimento
desta Turma no sentido de reconhecer como especiais as atividades exercidas sob níveis de
ruído de 80 dB, 85 dB ou 90 dB (no limite).
V. Agravo legal improvido."
(TRF 3ª Região, Apelação Cível 0005050-55.2013.4.03.6103, Nona Turma, Rel. Desembargadora
Federal Marisa Santos, julgado em 15/08/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/08/2016, destaquei)
Ainda neste sentido: TRF 3ª Região, ApReeNec n.º 0013503-95.2010.4.03.6183, Relatora
Desembargadora Federal Ana Pezarini, Nona Turma, julgado em 07/03/2018, v.u., e-DJF3
Judicial 1 DATA:21/03/2018.
Postas as balizas, passa-se ao exame do caso concreto.
Reconheceu, a r. decisão recorrida, a especialidade do labor desenvolvido no interregno de
06/03/1997 a 17/11/2003, junto a PETROBRÁS S.A., em virtude da exposição do autor a níveis
de ruído acima dos limites legais.
O PPP de ID 7500737- fls. 10/15 aponta a exposição do autor, de forma habitual e permanente, a
ruído com intensidade de 90 dB(A). Portanto, cabível o enquadramento, em razão da
comprovação da sujeição do autor a agente considerado prejudicial à saúde, como acima
exposto.
Assim, escorreita a r. sentença recorrida quanto ao reconhecimento da especialidade do labor
exercido no aludido interregno.
Somados os períodos reconhecidos neste feito àqueles incontroversos, após a exclusão dos
lapsos concomitantes, verifica-se a seguinte contagem de tempo de serviço/contribuição:
CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
TEMPO DE SERVIÇO COMUM
-Data de nascimento: 16/04/1967
-Sexo: Masculino
-DER: 14/07/2016
- Período 1 -14/05/1986a14/03/1990- 3 anos, 10 meses e 1 dias - 47 carências
- Período 2 -11/05/1995a05/03/1997- 1 anos, 9 meses e 25 dias - 23 carências
- Período 3 -06/03/1997a17/11/2003- 6 anos, 8 meses e 12 dias - 80 carências
- Período 4 -18/11/2003a14/07/2016- 12 anos, 7 meses e 27 dias - 152 carências
* Não há períodos concomitantes.
-Soma até 16/12/1998 (EC 20/98): 7 anos, 5 meses e 7 dias, 91 carências
-Soma até 28/11/1999 (Lei 9.876/99): 8 anos, 4 meses e 19 dias, 102 carências
-Soma até 14/07/2016 (DER): 25 anos, 0 meses, 5 dias, 302 carências e 74.2583 pontos
* Para visualizar esta planilha acesse
https://planilha.tramitacaointeligente.com.br/planilhas/3EYYE-WNYKD-ZM
Portanto, correta a concessão de aposentadoria especial, a partir da data do requerimento
administrativo, isto é, dia 14/07/2016 (DER).
Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496,
§ 3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL.
RUÍDO. POSSIBILIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. BENEFÍCIO DEVIDO.
- A hipótese em exame não excede 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC.
- Demonstrada, pelo conjunto probatório dos autos, a exposição a ruídos de 90 dB(A), deve ser
reconhecida a especialidade do labor.
- Preenchidos os requisitos, é devido o benefício da aposentadoria especial a partir da data de
entrada do requerimento administrativo. Precedente do Superior Tribunal de Justiça.
- Apelação do INSS desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
