
4ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005791-94.2011.4.03.6126
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: CARMELITA BRITO CORDEIRO
Advogado do(a) APELANTE: JULIANO JOSE PIO - SP227900-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
4ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005791-94.2011.4.03.6126
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: CARMELITA BRITO CORDEIRO
Advogado do(a) APELANTE: JULIANO JOSE PIO - SP227900-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de Apelação (fls. 386 a 396) de Carmelita Brito Cordeiro contra sentença (fls. 374 e 375) que julgou improcedente o pedido de repetição de indébito, dada a adesão da autora a programa de parcelamento e consequente confissão dos valores devidos. Condenada a autora em honorários advocatícios arbitrados em 10% do valor da causa, observada a gratuidade judiciária.
A autora reitera os pedidos, especificamente de reconhecimento da inadmissibilidade de incidência de IRPF, pelo chamado regime de caixa, sobre verbas previdenciárias percebidas cumulativamente, repetição dos valores recolhidos a esse título, ressarcimento por danos materiais consubstanciados na contratação de patrono legal para sua representação na presente demanda e dano moral em virtude da incidência do tributo nos moldes mencionados.
Contrarrazões (fls. 398 a 410).
É o relatório.
4ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0005791-94.2011.4.03.6126
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: CARMELITA BRITO CORDEIRO
Advogado do(a) APELANTE: JULIANO JOSE PIO - SP227900-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A apelante opôs Agravo de Instrumento (fls. 99 a 110) contra decisão que indeferiu a antecipação da tutela (fls. 66 a 68), recurso convertido em Retido (fls. 127 e 128); foi requerida sua apreciação quando da apresentação do apelo, nos moldes do art. 523 do CPC/1973, a qual se realizará em conjunto com o mérito em virtude de seu teor.
A adesão a parcelamento implica confissão de dívida e é, em princípio, irretratável e irrevogável – porém, não obsta a discussão judicial da obrigação tributária no que toca aos seus aspectos jurídicos e, quanto aos fáticos, se houver vício que acarrete a nulidade do ato, havendo possibilidade de revisão.
Nesse sentido colaciono julgado do C. Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia, verbis:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA (ART. 543-C, § 1º, do CPC). AUTO DE INFRAÇÃO LAVRADO COM BASE EM DECLARAÇÃO EMITIDA COM ERRO DE FATO NOTICIADO AO FISCO E NÃO CORRIGIDO. VÍCIO QUE MACULA A POSTERIOR CONFISSÃO DE DÉBITOS PARA EFEITO DE PARCELAMENTO . POSSIBILIDADE DE REVISÃO JUDICIAL.
1. A Administração Tributária tem o poder/dever de revisar de ofício o lançamento quando se comprove erro de fato quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória (art. 145, III, c/c art. 149, IV, do CTN).
2. A este poder/dever corresponde o direito do contribuinte de retificar e ver retificada pelo Fisco a informação fornecida com erro de fato, quando dessa retificação resultar a redução do tributo devido.
3. Caso em que a Administração Tributária Municipal, ao invés de corrigir o erro de ofício, ou a pedido do administrado, como era o seu dever, optou pela lavratura de cinco autos de infração eivados de nulidade, o que forçou o contribuinte a confessar o débito e pedir parcelamento diante da necessidade premente de obtenção de certidão negativa.
4. Situação em que o vício contido nos autos de infração (erro de fato) foi transportado para a confissão de débitos feita por ocasião do pedido de parcelamento, ocasionando a invalidade da confissão.
5. A confissão da dívida não inibe o questionamento judicial da obrigação tributária, no que se refere aos seus aspectos jurídicos. Quanto aos aspectos fáticos sobre os quais incide a norma tributária, a regra é que não se pode rever judicialmente a confissão de dívida efetuada com o escopo de obter parcelamento de débitos tributários. No entanto, como na situação presente, a matéria de fato constante de confissão de dívida pode ser invalidada quando ocorre defeito causador de nulidade do ato jurídico (v.g. erro, dolo, simulação e fraude). Precedentes: REsp. n. 927.097/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 8.5.2007; REsp 948.094/PE, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 06/09/2007; REsp 947.233/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 23/06/2009; REsp 1.074.186/RS, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, julgado em 17/11/2009; REsp 1.065.940/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 18/09/2008.
6. Divirjo do relator para negar provimento ao recurso especial. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ n. 8/2008.
(STJ, REsp 1133027/SP, Rel. Min. Luiz Fux, Rel. p/ Acórdão Min. Mauro Campbell Marques, 1ª Seção, DJe 16.03.2011)
Cinge-se a presente controvérsia aos aspectos jurídicos do débito em questão, admitindo-se a análise do tema inclusive em virtude do estabelecimento do contraditório na instância de piso.
No caso em tela, trata-se da incidência de IRPF pelo regime de caixa sobre verba previdenciária a ser percebida cumulativamente por Domingos Cordeiro (fls. 130 a 370) que, vindo a falecer em 19.01.2009, sendo a apelante sua viúva e sucessora (fls. 117 e 118).
Como é cediço, o artigo 43 do Código Tributário Nacional determina a incidência do Imposto de Renda “sobre renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica”.
Por sua vez, o art. 46 da Lei nº 8.541/92, ao tratar do IRPF, assim determina:
Art. 46. O imposto sobre a renda incidente sobre os rendimentos pagos em cumprimento de decisão judicial será retido na fonte pela pessoa física ou jurídica obrigada ao pagamento, no momento em que, por qualquer forma, o rendimento se torne disponível para o beneficiário.
§ 1º (omissis).
§ 2° Quando se tratar de rendimento sujeito à aplicação da tabela progressiva, deverá ser utilizada a tabela vigente no mês de pagamento.
Os art. 12 da Lei nº 7.713/88 e 56 do Decreto nº 3.000/1999 determinavam que a incidência do Imposto de Renda ocorresse no mês do recebimento ou crédito, sobre o total dos rendimentos, quando recebidos acumuladamente por pessoa física. Porém, aos valores recebidos de forma acumulada, decorrentes de atrasados de benefício previdenciário de Aposentadoria, não poderia ser dispensado tratamento tributário distinto daquele que seria aplicado se os valores fossem recebidos à época correta, sob pena de se chancelar situação discriminatória ao sujeito já outrora lesado.
A jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça se pronunciou favoravelmente à aplicação do regime de competência, mesmo antes da inovação legislativa promovida pela Lei nº 12.350/10.
Deveras, a questão da tributação de valores pagos com atraso e recebidos acumuladamente restou pacificada no Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1.118.429 (submetido ao rito dos recursos repetitivos - art. 543-C do CPC). Entendeu aquela Corte que o pagamento, de uma só vez, de verbas referentes a períodos pretéritos não pode sujeitar o particular a tributação mais onerosa do que aquela que seria suportada caso os valores fossem pagos na época correta.
Por esse motivo, fixou-se a orientação de que a incidência do imposto de renda deve ter como parâmetro o valor mensal percebido e não o montante integral recebido de maneira acumulada – o chamado regime de competência. Para tanto, devem ser observadas as tabelas vigentes à época em que deveriam ter sido pagos, para fins de apuração das alíquotas e limites de isenção.
Por sua vez, o egrégio Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, decidiu que o Imposto de Renda incidente sobre os rendimentos recebidos acumuladamente deve ser recolhido pelo regime de competência (RE 614.406, relator p/acórdão Ministro Marco Aurélio, Plenário em 23/10/2014, DJE: 27/11/2014). Desse modo, a tributação referente à concessão de valores pagos de uma só vez não pode ocorrer sobre o montante total acumulado, sob pena de ferir os princípios constitucionalmente garantidos da isonomia tributária (Artigo 150, II, da CF/88) e da capacidade contributiva (§ 1º do Artigo 145 da CF/88).
O aresto foi assim ementado:
IMPOSTO DE RENDA - PERCEPÇÃO CUMULATIVA DE VALORES - ALÍQUOTA.
A percepção cumulativa de valores há de ser considerada, para efeito de fixação de alíquotas, presentes, individualmente, os exercícios envolvidos.
(RE 614.406, relatora Ministra Rosa Weber, relator p/acórdão: Ministro Marco Aurélio, Tribunal Pleno, julgado em 23/10/2014, Acórdão eletrônico repercussão geral - mérito DJE-233 divulgado em 26/11/2014, publicado em 27/11/2014)
Dessa forma, o pagamento a destempo, conforme ocorreu no caso concreto, deve sofrer a tributação em consonância com a tabela e alíquota vigentes à época própria, de modo a evitar a consumação de evidente prejuízo ao contribuinte.
Observo ainda que o exato valor do tributo a ser recolhido ou de valores por repetir serão apurados em sede de execução de sentença, mormente em vista da não realização de perícia contábil nesta relação processual.
Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE SENTENÇA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IRPF INCIDENTE SOBRE VERBAS TRABALHISTAS RECEBIDAS ACUMULADAMENTE. APRESENTAÇÃO DOS DOCUMENTOS NECESSÁRIOS AO CÁLCULO DO QUANTUM DEBEATUR. ÔNUS DA PARTE EXEQUENTE. LIQUIDAÇÃO POR ARBITRAMENTO. IMPOSSIBILIDADE.
1. O título exequendo reconheceu o direito dos autores à tributação do IR de acordo com as alíquotas estabelecidas nas tabelas progressivas vigentes nas épocas próprias em que os créditos trabalhistas deveriam ter sido pagos.
(...)
3. Compete aos exequentes trazer aos autos as informações necessárias para que se possa determinar o exato valor a ser pago. É o que se dessume do quanto disposto no art. 524, do CPC, ao prever que o requerimento do exequente “será instruído com demonstrativo discriminado e atualizado do crédito”. Vale dizer, não basta apresentar sua memória de cálculos, é necessário que sejam carreados aos autos os documentos/informações que serviram de base para tais contas.
4. A ausência de dados e informações essenciais aos cálculos de liquidação impossibilitam a apuração do quantum debeatur, mesmo por estimativa.
5. Apelação desprovida.
(TRF 3ª Região, ApCiv 5005059-50.2018.4.03.6104, Rel. Des. Fed. Marli Marques Ferreira, 4ª Turma, DJ 22.04.2020)
Não merece prosperar o pedido de indenização por dano material em virtude contratação de patrono legal para representação da ora apelante na presente demanda.
Um dos aspectos da assistência judiciária gratuita, assegurada pela própria Constituição Federal, art. 5º, LXXIV, diz respeito à prestação de serviços advocatícios ao que comprovar insuficiência de recursos, valendo-se o indivíduo da defesa e assessoria jurídica da defensoria pública da União e dos Estados.
Considerando a jurisdição federal, para os casos em que na Subseção competente para a apreciação da demanda não houver Defensoria Pública instalada, o Conselho da Justiça Federal firmou convênio com a OAB (Resolução n.º 558/2007), para atender, entre outras necessidades, a que se faz presente no caso concreto: permitir que os indivíduos que comprovarem insuficiência de recursos não fiquem desassistidos pelo Estado, por inexistir ali Defensor Público. Segundo o próprio magistrado, a parte apelante tinha como opção dirigir-se à OAB local justamente para que um advogado defendesse integralmente seus direitos. Oportuno mencionar que a parte demandante goza dos benefícios da assistência judiciária gratuita.
Logo, ao se valer dos serviços particulares prestados por seu patrono, a ora apelante assumiu os riscos e custos decorrentes de sua escolha, inclusive os relativos à contratação. Injustificável, portanto, transferir a responsabilidade da despesa relativa à verba advocatícia à parte apelada, terceiro não integrante da relação contratual firmada entre advogado e cliente.
Nesse sentido:
CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA JURÍDICA INTEGRAL E GRATUITA. CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO PARTICULAR. RESSARCIMENTO.
1. A Constituição Federal, em seu art. 5º, LXXIV, versa sobre prestação de serviços advocatícios pelo Estado ao que comprovar insuficiência de recursos, sendo possível ao jurisdicionado a defesa e assessoria jurídica da defensoria pública da União e dos Estados.
2. A inexistência de Defensoria Pública na Subseção competente não constitui óbice ao direito, devendo tão somente dirigir-se à OAB local para a designação de advogado, conforme convênio firmado entre o CJF e a OAB.
3. A parte autora, ao se valer dos serviços particulares prestados por seu patrono, assumiu os riscos e custos decorrentes de sua escolha, inclusive os relativos à contratação. Injustificável, portanto, transferir a responsabilidade da despesa, relativa à verba advocatícia, à parte apelada, terceiro não integrante da relação contratual firmada entre advogado e cliente.
4. Apelo improvido.
(TRF3, ApCiv 0000581-88.2013.4.03.6127/SP, Rel. Des. Fed. Marcelo Saraiva, 4ª Turma, DJ 19.04.2017)
Quanto ao pedido de indenização por dano moral, rememore-se serem elementos da responsabilidade civil a ação ou omissão do agente, a culpa, o nexo causal e o dano, do qual surge o dever de indenizar.
Nossa Constituição Federal, em seu art. 37, §6º, consagra a responsabilidade do Estado de indenizar os danos causados por atos, omissivos ou comissivos, praticados pelos seus agentes a terceiros, independentemente de dolo ou culpa, in verbis:
"Art. 37. (...)
(...)
§ 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável no caso de dolo ou culpa.
Trata-se do postulado de Responsabilidade Civil Objetiva do Estado, que prescinde da prova de dolo ou culpa do agente público, a qual fica restrita à hipótese de direito de regresso contra o responsável (responsabilidade civil subjetiva dos agentes), não abordada nestes autos.
O aspecto característico da responsabilidade objetiva reside na desnecessidade de comprovação, por quem se apresente como lesado, da existência da culpa do agente ou do serviço.
Assim, para que o ente público responda objetivamente, suficiente que se comprovem a conduta da Administração, o resultado danoso e o nexo causal entre ambos, porém com possibilidade de exclusão da responsabilidade na hipótese de caso fortuito/força maior ou culpa exclusiva da vítima. Trata-se da adoção, pelo ordenamento jurídico brasileiro, da teoria do risco administrativo.
Por sua vez não basta, para a configuração dos danos morais, o aborrecimento ordinário, diuturnamente suportado por todas as pessoas. Impõe-se que o sofrimento infligido à vítima seja de tal forma grave, invulgar, justifique a obrigação de indenizar do causador do dano e lhe fira, intensamente, qualquer direito da personalidade. Nesse sentido, veja-se o magistério de Sérgio Cavalieri Filho: "Nessa linha de princípio, só deve ser reputado dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre os amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo". (Programa de Responsabilidade Civil, Malheiros Editores, 4ª edição, 2003, p. 99).
Entendo não haver que se falar em dano moral no caso em tela. Embora a incidência do IRPF tenha acarretado compreensíveis dissabores à apelante, não se demonstra nos autos que sua subsistência tenha se mostrado ameaçada, para tanto não bastando alegações nesse sentido; do mesmo modo, não se fez prova de que viu-se ameaçada de perder sua residência em virtude do tributo a pagar, conforme entender da Fazenda Pública até então. Em suma, não comprovado o alegado dano moral.
Ante o até aqui mencionado se constata que ambas as partes se mostraram vencedoras e vencidas, nos termos do art. 21 do CPC/1973, cabendo o afastamento da condenação da apelante em honorários advocatícios.
Por fim, mostra-se prejudicado o Agravo de Instrumento, uma vez que a decisão de mérito superou a controvérsia relativa à possibilidade de depósito em conta judicial das parcelas vincendas do parcelamento.
Face ao exposto, julgo prejudicado o Agravo de Instrumento e dou parcial provimento à Apelação, reformando a sentença para determinar, sobre a verba previdenciária percebida acumuladamente, incidência de IRPF nos moldes do chamado regime de competência, apurando-se o montante recolhido indevidamente em sede de execução de sentença, bem como afastar a condenação da apelante em honorários advocatícios, conforme fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ADESÃO A PARCELAMENTO. INTERESSE DE AGIR. TRIBUTÁRIO. IRPF. VERBAS ATRASADAS. PERCEPÇÃO ACUMULADA. REGIME DE COMPETÊNCIA. ART. 12 DA LEI 7.713/88. INCIDÊNCIA DE IR. APURAÇÃO DO MONTANTE A RECOLHER OU RESTITUIR. SEDE DE EXECUÇÃO DE SENTENÇA. ASSISTÊNCIA JURÍDICA INTEGRAL E GRATUITA. CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO PARTICULAR. DANO MATERIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. INOCORRÊNCIA.
1. A adesão a parcelamento implica confissão de dívida e é, em princípio, irretratável e irrevogável - porém, não obsta a discussão judicial da obrigação tributária no que toca aos seus aspectos jurídicos e, quanto aos fáticos, se houver vício que acarrete a nulidade do ato, havendo possibilidade de revisão.
2. Os art. 12 da Lei nº 7.713/88 e 56 do Decreto nº 3.000/1999 determinavam que a incidência do Imposto de Renda ocorresse no mês do recebimento ou crédito, sobre o total dos rendimentos, quando recebidos acumuladamente por pessoa física. Porém, aos valores recebidos de forma acumulada, decorrentes de atrasados de benefício previdenciário de Aposentadoria, não poderia ser dispensado tratamento tributário distinto daquele que seria aplicado se os valores fossem recebidos à época correta, sob pena de se chancelar situação discriminatória ao sujeito já outrora lesado.
3. A jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça se pronunciou favoravelmente à aplicação do regime de competência, mesmo antes da inovação legislativa promovida pela Lei nº 12.350/10.
4. Deveras, a questão da tributação de valores pagos com atraso e recebidos acumuladamente restou pacificada no Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 1.118.429 (submetido ao rito dos recursos repetitivos - art. 543-C do CPC). Entendeu aquela Corte que o pagamento, de uma só vez, de verbas referentes a períodos pretéritos não pode sujeitar o particular a tributação mais onerosa do que aquela que seria suportada caso os valores fossem pagos na época correta.
5. Por esse motivo, fixou-se a orientação de que a incidência do imposto de renda deve ter como parâmetro o valor mensal percebido e não o montante integral recebido de maneira acumulada – o chamado regime de competência. Para tanto, devem ser observadas as tabelas vigentes à época em que deveriam ter sido pagos, para fins de apuração das alíquotas e limites de isenção.
6. O egrégio Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, decidiu que o Imposto de Renda incidente sobre os rendimentos recebidos acumuladamente deve ser recolhido pelo regime de competência (RE 614.406, relator p/acórdão Ministro Marco Aurélio, Plenário em 23/10/2014, DJE: 27/11/2014). Desse modo, a tributação referente à concessão de valores pagos de uma só vez não pode ocorrer sobre o montante total acumulado, sob pena de ferir os princípios constitucionalmente garantidos da isonomia tributária (Artigo 150, II, da CF/88) e da capacidade contributiva (§ 1º do Artigo 145 da CF/88).
7. O exato valor do tributo a ser recolhido ou de valores por repetir serão apurados em sede de execução de sentença, mormente em vista da não realização de perícia contábil nesta relação processual.
8. Não merece prosperar o pedido de indenização por dano material em virtude contratação de patrono legal para representação da ora apelante na presente demanda. Ao se valer dos serviços particulares prestados por seu patrono, a ora apelante assumiu os riscos e custos decorrentes de sua escolha, inclusive os relativos à contratação. Injustificável, portanto, transferir a responsabilidade da despesa relativa à verba advocatícia à parte apelada, terceiro não integrante da relação contratual firmada entre advogado e cliente.
9. O art. 37, §6º, da Constituição Federal consagra a responsabilidade do Estado de indenizar os danos causados por atos, omissivos ou comissivos, praticados pelos seus agentes a terceiros, independentemente de dolo ou culpa.
10. Para que o ente público responda objetivamente, suficiente que se comprovem a conduta da Administração, o resultado danoso e o nexo causal entre ambos, porém com possibilidade de exclusão da responsabilidade na hipótese de caso fortuito/força maior ou culpa exclusiva da vítima.
11. Entendo não haver que se falar em dano moral no caso em tela. Embora a incidência do IRPF tenha acarretado compreensíveis dissabores à apelante, não se demonstra nos autos que sua subsistência tenha se mostrado ameaçada, para tanto não bastando alegações nesse sentido; do mesmo modo, não se fez prova de que viu-se meaçada de perder sua residência em virtude do tributo a pagar, conforme entender da Fazenda Pública até então. Em suma, não comprovado o alegado dano moral.
12. Agravo de Instrumento prejudicado.
13. Apelo parcialmente provido.
