
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000266-25.2021.4.03.6339
RELATOR: Gab. 36 - JUÍZA CONVOCADA DIANA BRUNSTEIN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIS CARLOS BORGES
Advogado do(a) APELADO: MARCELO VICTORIA IAMPIETRO - SP169230-N
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000266-25.2021.4.03.6339
RELATOR: Gab. 36 - JUÍZA CONVOCADA DIANA BRUNSTEIN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIS CARLOS BORGES
Advogado do(a) APELADO: MARCELO VICTORIA IAMPIETRO - SP169230-N
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSS contra o v. acórdão, assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO EXERCÍCIO LABORAL. CONTRIBUINTE AUTÔNOMO. DENTISTA. AGENTES BIOLÓGICOS. AUSÊNCIA DE EPI EFICAZ. BENEFÍCIO DEVIDO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Ainda que aparentemente ilíquida a sentença, o proveito econômico pretendido pela parte autora não excede o novo valor de alçada do CPC, consistente em 1.000 (mil) salários mínimos, e, além disso, a condenação de natureza previdenciária é mensurável, visto que pode ser aferível por simples cálculos aritméticos, razão pela qual a remessa oficial não deve ser conhecida.
- A Constituição da República (CR) previa na redação original do artigo 202, I e II, e § 1º, a aposentadoria por tempo de serviço, concedida com proventos integrais, após 35 (trinta e cinco) anos de trabalho, ao homem, e, após 30 (trinta), à mulher, ou na modalidade proporcional, após 30 (trinta) anos de trabalho, ao homem, e, após 25 (vinte e cinco), à mulher.
- O exercício de atividades nocivas, causadoras de algum prejuízo à saúde e à integridade física ou mental do trabalhador ao longo do tempo, independentemente de idade, garante ao trabalhador a conversão em tempo comum para fins de aposentação por tempo de contribuição.
- Conforme orientação do C. Superior Tribunal de Justiça, a natureza especial da atividade deve ser reconhecida em razão do tempo da prestação e da legislação então vigente, tornando-se direito adquirido do empregado.
- O agente nocivo deve, em regra, ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva prejudicialidade.
- O labor deve ser exercido de forma habitual e permanente, com exposição do segurado ao agente nocivo indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.
- A discussão sobre o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) como fator de descaracterização do tempo especial encontra-se balizada pelo C. STF no Tema 555 de repercussão geral. Na hipótese de o segurado apresentar PPP indicativo de sua exposição a determinado agente nocivo e inexistindo prova de que o EPI, embora possa atenuar os efeitos prejudiciais, seja capaz de neutralizar totalmente a nocividade do ambiente laborativo, é de rigor reconhecer a especialidade do labor. Além disso, ficou pacificado que inexiste EPI capaz de neutralizar ou minimizar os efeitos nocivos do agente ruído. Precedentes.
- O enquadramento da especialidade em razão da atividade profissional é possível até 28/04/1995.
- A exposição do trabalhador a agentes biológicos tem sua intensidade medida por análise qualitativa, bastando apenas o contato físico para caracterização da especialidade do trabalho, uma vez que não estabelece limites de tolerância ou quaisquer especificações no que tange à concentração dos agentes.
- Para enquadramento especial da atividade basta apenas que se comprove a exposição a radiações.
- Aos segurados que tenham recolhido à Previdência Social como contribuintes individuais, autônomos, como é o caso da autora, não constitui óbice a ausência de contribuições previdenciárias para fins de averbação de trabalho especial, porquanto a Constituição Federal, em seu artigo 201, §1º, e a Lei n. 8.213/91, em seus artigos 18, I, 'd', e 57, não fazem quaisquer diferenciações entre os segurados para concessão do benefício de aposentadoria especial.
- No caso concreto, considerando o conjunto probatório dos autos, é de rigor o reconhecimento da atividade especial, exercida sob condições nocivas à saúde ou à integridade física do segurado, nos períodos de 01/11/1993 a 28/02/1997, 01/04/1997 a 31/10/1997, 01/12/1997 a 28/02/2008, 01/02/2009 a 31/12/2010 e 01/03/2011 a 08/06/2019.
- Diante dos períodos especiais ora reconhecidos, convertidos para tempo comum pelo fator de conversão 1,40, somados aos demais interregnos de labor comum apontados no relatório CNIS, perfaz a parte autora, na data do requerimento administrativo (DER), em 08/06/2019, o total de 41 anos, 8 meses e 10 dias de tempo de contribuição e 56 anos, 3 meses e 11 dias de idade, tempo suficiente para lhe garantir a concessão, naquela data, do benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, garantido o direito a não incidência do fator previdenciário, caso mais vantajoso, uma vez que a pontuação totalizada é superior a 96 pontos e o tempo mínimo de contribuição foi observado (Lei 8.213/91, art. 29-C, inc. I, incluído pela Lei 13.183/2015).
- A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que refere a aplicação da EC n. 113/2001, observados o Tema 96/STF e a Súmula Vinculante 17/STF.
- Honorários advocatícios majorados em 2%.
- Preliminar rejeitada. Recurso do INSS desprovido.
Sustenta o embargante, em suma, que “o acórdão é omisso por não ter se pronunciado expressamente sobre a impossibilidade de cômputo do tempo de serviço especial, na condição de contribuinte individual, após a edição da Lei nº 9.032/95.”
Requer o acolhimento dos embargos inclusive para fins de prequestionamento.
Houve contrarrazões.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0000266-25.2021.4.03.6339
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os embargos de declaração, conforme dispõe o artigo 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado.
O caráter infringente dos embargos somente é admitido a título excepcional, quando da eliminação da contradição ou da omissão decorrer logicamente a modificação do julgamento embargado.
No caso concreto, não houve no acórdão omissão de ponto sobre o qual deveria haver pronunciamento judicial, nem contradição ou obscuridade.
Tenha-se em vista que o juiz não está adstrito a examinar todas as normas legais trazidas pelas partes, bastando que, in casu, decline os fundamentos suficientes para lastrear sua decisão.
Depreende-se dos embargos que não se busca suprir vícios no julgado, mas verifica-se, na verdade, inconformismo com a solução adotada, desfavorável à parte embargante, e pretende-se a reforma da decisão. Não é essa, contudo, a finalidade dos embargos de declaração.
Segundo a autarquia embargante há omissão no que tange à “impossibilidade de enquadramento da atividade exercida por contribuinte individual após a Lei nº 9.032/95 como especial”.
Ocorre que o decisum se pronunciou sobre a questão, conforme se exemplifica no seguinte excerto:
[...] O reconhecimento do trabalho especial será possível, considerada a evolução legislativa exposta, nos seguintes termos:
1) até 28/04/1995: com fulcro na Lei n. 3.807, de 26/08/1960 (LOPS), e suas alterações; e, posteriormente, a Lei n. 8.213, de 24/07/1991, em sua redação original, pela presunção da especialidade do trabalho, mediante o enquadramento da atividade, considerada a ocupação profissional ou a exposição a agentes nocivos, segundo as normas de regência da época, especialmente os Decretos n. 53.831, de 25/03/1964 e n. 83.080, de 24/01/1979. Admitida qualquer meio probatório, inclusive, mediante os antigos formulários, que vigoraram até 31/12/2003, independentemente de laudo técnico, à exceção dos agentes calor, frio e ruído.
2) a partir de 29/04/1995: entrou em vigor a Lei n. 9.032, de 28/04/1995, que alterou o artigo 57 da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, e extinguiu a presunção da especialidade das atividades por categoria profissional, passando a ser imprescindível a demonstração por qualquer meio de prova da submissão aos agentes insalubres, considerando-se suficiente a apresentação de formulários padrão (IS SSS-501.19/71, ISS-132, SB-40, DISES-BE 5235, DSS-8030, DIRBEN-8030) preenchidos pela empresa (artigo 272 da IN INSS n. 128, de 28/03/2022), independentemente de laudo técnico, à exceção dos agentes calor, frio e ruído.
[...]
Aos segurados que tenham recolhido à Previdência Social como contribuintes individuais, autônomos, como é o caso da autora, não constitui óbice a ausência de contribuições previdenciárias para fins de averbação de trabalho especial, porquanto a Constituição Federal, em seu artigo 201, §1º, e a Lei n. 8.213/91, em seus artigos 18, I, 'd', e 57, não fazem quaisquer diferenciações entre os segurados para concessão do benefício de aposentadoria especial.
Além disso, a inexistência de previsão legal para o custeio da atividade especial para os contribuintes individuais não os exclui da cobertura previdenciária.
A matéria já foi pacificada pelo Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, por Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário com Agravo n. 664.335/SC, sessão plenária de 04/12/2014, com Relatoria do E. Ministro Luiz Fux, quando foi afastada a alegação de ausência de prévia fonte de custeio para o direito à aposentadoria especial, suscitada pelo INSS.
[...]
A atividade do dentista é considerada insalubre por enquadramento, apenas em razão da profissão exercida, até 28/04/1995, nos itens 2.1.3 dos Decretos n. 53.831/1964 e 83.080/1979, uma vez que o contato com doentes e materiais infecto-contagiantes é inerente às atividades desenvolvidas pelos referidos profissionais.
Após 28/04/1995, para o enquadramento do labor especial, o segurado passou a ter que provar, por meio de formulário específico e/ou laudo técnico, a exposição a agentes nocivos, no caso biológicos, previstos no item 3.0.1 do Anexo IV dos Decretos n. 2.172/97 e 3.048/99.
[...]
Quanto aos períodos em discussão, acerca dos quais se litiga a respeito do reconhecimento da atividade como especial, estão assim detalhados:
Períodos: 01/11/1993 a 28/02/1997, 01/04/1997 a 31/10/1997, 01/12/1997 a 28/02/2008, 01/02/2009 a 31/12/2010 e 01/03/2011 a 08/06/2019
Contribuinte autônomo
Função: Dentista
Prova: CNIS (ID 272620490, p. 25),carteira do Conselho Regional de Odontologia (ID 272620486, p.6), LTCAT (ID 272620486, p. 49, ID 272620497, p. 28), Diploma em Odontologia (ID 272620490, p. 22), alvará do consultório cirurgião dentista (ID 272620490, p. 68, ID .272620497, p. 48), licença de funcionamento vigilância sanitária (ID 272620493, p. 1, ID 272620497, p.49), termo de responsabilidade técnica de raio x dentário (ID 272620493, p. 47 e 69), alvará para funcionamento de raio x (ID 272620493, p. 48 e 70), laudo de levantamento radiométrico e de teste de radiação de fuga (ID 272620493, p. 53/65), laudo de controle de qualidade em radiologia odontológica (ID 272620494), programa de controle de qualidade periapical (ID 272620497, p. 15),
Enquadramento/Norma: Especial - Exposição habitual e permanente a agentes biológicos (bactérias, fungos, vírus, parasitas e bacilos) ? item 1.3.4 do Decreto n. 83.080/1979, itens 3.0.1 dos Decretos 2.172/1997, 3.048/1999 e 4.882/2003 e Exposição a radiações capazes de causarem mal à saúde - itens 1.1.3 do Anexo I do Decreto n. 83.080/79 e 2.0.3 dos Anexos IV dos Decretos n. 2.172/97 e 3.048/99.
Considerando tratar-se de contribuinte individual, somente as competências efetivamente recolhidas podem ser computadas para o fim da concessão de benefício previdenciário, de modo que reconheço como especiais os períodos de 01/11/1993 a 28/02/1997, 01/04/1997 a 31/10/1997, 01/12/1997 a 28/02/2008, 01/02/2009 a 31/12/2010 e 01/03/2011 a 08/06/2019, conforme CNIS (ID 272620486, p. 32/45).
A decisão, enfim, é clara, tendo-se nela apreciado e decidido todas as matérias em relação às quais estava o julgador obrigado a pronunciar-se segundo seu convencimento. O inconformismo com a solução adotada deve ser manifestado nas vias recursais à disposição do interessado.
O escopo de prequestionar a matéria para efeito de interposição de recurso especial ou extraordinário perde a relevância, em sede de embargos de declaração, se não demonstrada a ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no artigo 1.022 do Código de Processo Civil.
Veja-se que o artigo 1.025 do Código de Processo Civil bem esclarece que os elementos suscitados pelo embargante serão considerados incluídos no acórdão “para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”.
Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIARIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. INOCORRÊNCIA DE VÍCIOS NO JULGADO. PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS REJEITADOS.
1. Os embargos de declaração, conforme dispõe o artigo 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado.
2. O caráter infringente dos embargos somente é admitido a título excepcional, quando da eliminação do vício decorrer logicamente a modificação do julgamento embargado.
3. A decisão é clara, tendo-se nela apreciado e decidido todas as matérias em relação às quais estava o julgador obrigado a pronunciar-se segundo seu convencimento. O inconformismo com a solução adotada deve ser manifestado nas vias recursais à disposição do interessado.
4. O escopo de prequestionar a matéria para efeito de interposição de recurso especial ou extraordinário perde a relevância, em sede de embargos de declaração, se não demonstrada a ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no artigo 1.022 do Código de Processo Civil.
5. Embargos de declaração rejeitados.
