Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0017867-40.2012.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
06/10/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 08/10/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. EVENTUAL
IRREGULARIDADE. DÉBITO. DESCONTO. INSS. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ NÃO
AFASTADA. TEMA 979 STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Nos termos do art. 1.022, do CPC, cabem embargos de declaração contra qualquer decisão
judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; suprir omissão de ponto ou questão
sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; corrigir erro material.
- É entendimento consolidado da Egrégia 10ª. Turma desta Corte, que é defeso à Autarquia exigir
a devolução dos valores já pagos, pois, o C. STF decidiu que são irrepetíveis, quando percebidas
de boa-fé, as prestações previdenciárias, em função da sua natureza alimentar.
- O recebimento de boa-fé de valores a título de benefício previdenciário, pelo segurado ou
beneficiário, não são passíveis de devolução posto que se destinam à sua própria sobrevivência,
circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
- A Primeira Seção do E. STJ, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema979),
salvaguardou a boa-fé do segurado.
- Não demonstrada a ausência de boa-fé da segurada/agravante, não prosperam as alegações da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Autarquia quanto à cobrança do alegado débito a título de benefício assistencial.
-Honorários advocatíciosfixadosemR$ 2.000,00 (dois mil reais) considerando, especialmente, a
natureza da causa e do trabalho realizado pelo advogado, conforme critérios estabelecidos no
parágrafo 2º do artigo 85 do Código de Processo Civil.
- Embargos de declaração opostos pelo INSS rejeitados. Embargos de declaração opostos pela
parte autora acolhidos.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0017867-40.2012.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: TEREZINHA DE JESUS ALVES
Advogado do(a) APELANTE: THIAGO VICENTE - SP253491-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: LIZANDRA LEITE BARBOSA MARIANO - SP172115-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0017867-40.2012.4.03.9999
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de embargos de
declaração opostos pela parte autora e pelo INSS, com fulcro no art. 1022 do novo CPC, contra
acórdão (Id. 10928027, páginas 212/220), proferido à unanimidade pela 10ª Turma desta Corte
Regional.
Argumenta o INSS a existência de omissão, contradição e obscuridade no julgado, sob o
fundamento de quesão devidos os valores recebidos pela parte autora, independentemente de
má-fé, alegando que a simples constatação da boa-fé do segurado não o exime de restituir as
quantias indevidas que porventura receber.
A parte autora, por sua vez,alegaa existência de obscuridade no acordão quanto aos honorários
advocatícios.
Vista às partes, nos termos do art. 1.023, § 2º, do CPC, sem contraminuta
É o relatório.
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Advogado do(a) APELADO: LIZANDRA LEITE BARBOSA MARIANO - SP172115-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Conheço dos embargos de
declaração, haja vista que tempestivos.
Nos termos do art. 1022 do NCPC, os embargos de declaração são cabíveis quando o
provimento jurisdicional padece de omissão, contradição ou obscuridade, bem como para sanar
a ocorrência de erro material.
Omissão é a inércia do julgador em analisar ou pronunciar juízo de valor acerca de ponto
essencial ao desate da controvérsia.
A contradição ocorre quando na decisão se incluem proposições entre si inconciliáveis.
Conforme o magistério de Barbosa Moreira:
Pode haver contradição entre proposições contidas na motivação (exemplo: a mesma prova ora
é dita convincente, ora inconvincente), ou entre proposições da parte decisória, isto é,
incompatibilidade entre capítulos do acórdão: v.g. anula-se, por vício insanável, quando
logicamente se deveria determinar a restituição ao órgão inferior, para sentenciar de novo; ou
declara-se inexistente a relação jurídica prejudicial (deduzida em reconvenção ou em ação
declaratória incidental), mas condena-se o réu a cumprir a obrigação que dela necessariamente
dependia; e assim por diante. Também pode ocorrer contradição entre alguma proposição
enunciada nas razões de decidir e o dispositivo: por exemplo, se na motivação se reconhece
como fundada alguma defesa bastante para tolher a pretensão do autor, e no entanto se julga
procedente o pedido. (Comentários ao Código de Processo Civil. v. 5. Rio de Janeiro: Forense,
2008, p. 556-557).
Por fim, também é clássico o conceito de obscuridade que, segundo Cândido Rangel
Dinamarco, é "a falta de clareza em um raciocínio, em um fundamento ou em uma conclusão
constante da sentença".
No tocante às alegações do INSS, diferentemente do alegado, a questão sobre a
obrigatoriedade de devolução de valores recebidos de boa-féfoi devidamente abordada no
acórdão embargado, ainda que com solução diversa da pretendida pelo embargante.
A revisão do ato administrativo consiste no exercício do poder-dever de autotutela da
Administração sobre seus próprios atos, motivo pelo qual, apurada irregularidade no pagamento
do benefício, a devolução das parcelas recebidas indevidamente, através de descontos nos
proventos mensais recebidos pela parte autora, é imperativo lógico e jurídico, conforme
previsão do art. 115, II e parágrafo único, da Lei nº 8.213/91.
Entretanto, diante do caráter social das normas previdenciárias, que primam pela proteção de
todos aqueles sujeitos à Previdência Social, os pleitos respectivos devem ser julgados no
sentido de amparar a parte hipossuficiente, garantida a flexibilização dos rígidos institutos
processuais, bem como em face da boa-fé do segurado.
Com efeito, o C. Supremo Tribunal Federal decidiu no sentido de ser desnecessária a
restituição dos valores recebidos de boa-fé, devido ao seu caráter alimentar, em razão do
princípio da irrepetibilidade dos alimentos, conforme julgados abaixo transcritos:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO
COM AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR. RECEBIMENTO
DE BOA - FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA
REVOGADA. DEVOLUÇÃO. (g.n.)
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário
recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à
repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes.
2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente
recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº
8.213/1991. Precedentes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, ARE 734242 AgR, Relator Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em
04/08/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015);
AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TCU QUE
DETERMINOU A IMEDIATA INTERRUPÇÃO DO PAGAMENTO DA URP DE FEVEREIRO DE
1989 (26,05%). EXCLUSÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA RECONHECIDA POR DECISÃO
JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE
BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA
LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido do descabimento da restituição
de valores percebidos indevidamente em circunstâncias, tais como a dos autos, em que o
servidor público está de boa-fé. (Precedentes: MS 26.085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal
Pleno, DJe 13/6/2008; AI 490.551-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 3/9/2010).
2. A boa-fé na percepção de valores indevidos bem como a natureza alimentar dos mesmos
afastam o dever de sua restituição.
3. Agravo regimental a que se nega provimento.
(STF, MS 25921 AgR, Relator Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 01/12/2015,
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-060 DIVULG 01-04-2016 PUBLIC 04-04-2016)".
O Pleno do STF, ao julgar o RE 638.115, novamente decidiu pela irrepetibilidade dos valores
recebidos de boa-fé até a data do julgamento, conforme a ata de julgamento de 23/03/2015,
abaixo transcrita:
“Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, apreciando o tema 395 da repercussão
geral, conheceu do recurso extraordinário, vencidos os Ministros Rosa Weber, Luiz Fux,
Cármen Lúcia e Celso de Mello. Em seguida, o Tribunal, por maioria, deu provimento ao
recurso extraordinário, vencidos os Ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Celso de Mello. O
Tribunal, por maioria, modulou os efeitos da decisão para desobrigar a devolução dos valores
recebidos de boa - fé pelos servidores até esta data, nos termos do voto do relator, cessada a
ultra-atividade das incorporações concedidas indevidamente, vencido o Ministro Marco Aurélio,
que não modulava os efeitos da decisão. Impedido o Ministro Roberto Barroso . Presidiu o
julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 19.03.2015.
(RE 638115, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 19/03/2015, processo
eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-151 divulg 31-07-2015 public 03-08-2015)".
Neste passo, é entendimento consolidado da Egrégia 10ª. Turma desta Corte, que é defeso à
Autarquia exigir a devolução dos valores já pagos, pois, conforme acima exposto, o C. STF
decidiu que são irrepetíveis, quando percebidas de boa-fé, as prestações previdenciárias, em
função da sua natureza alimentar.
É dizer, o recebimento de boa-fé de valores a título de benefício previdenciário, pelo segurado
ou beneficiário, não é passível de devolução posto que os valores se destinam à sua própria
sobrevivência, circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
Acresce relevar, ainda, que a Primeira Seção do E. STJ, em julgamento sob o rito dos recursos
repetitivos (Tema 979), salvaguardou a boa-fé do segurado, conforme tese fixada:
“Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo
(material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela
Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por
cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o
segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com
demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.”
O colegiado acompanhou o voto do relator, Ministro Benedito Gonçalves, para quem, na análise
dos casos de erro material ou operacional, deve-se averiguar a presença da boa-fé do
segurado, concernente à sua aptidão para compreender, de forma inequívoca, a irregularidade
do pagamento. Houve modulação dos efeitos da decisão, que será aplicada aos processos
distribuídos na primeira instância a partir da publicação do acórdão (23/04/2021).
Assim, ante a natureza alimentar do benefício concedido, pressupõe-se que os valores
correspondentes foram por ele utilizados para a manutenção da própria subsistência e de sua
família, além do que, não consta dos autos elementos capazes de afastar a presunção de que
os valores não foram recebidos de boa-fé pela parte autora, haja vista que recebidos por força
de ato administrativo do INSS.
Por outro lado, razão assiste à parte autora, pois os honorários advocatícios devem ser
fixadosemR$ 2.000,00 (dois mil reais) considerando, especialmente, a natureza da causa e do
trabalho realizado pelo advogado, conforme critérios estabelecidos no parágrafo 2º do artigo 85
do Código de Processo Civil.
Diante do exposto, REJEITO OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS PELO INSS E
ACOLHO OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA PARTE AUTORA para fixar a verba
honorária, nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. BENEFÍCIO
ASSISTENCIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. EVENTUAL
IRREGULARIDADE. DÉBITO. DESCONTO. INSS. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ NÃO
AFASTADA. TEMA 979 STJ. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Nos termos do art. 1.022, do CPC, cabem embargos de declaração contra qualquer decisão
judicial para esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; suprir omissão de ponto ou
questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento; corrigir erro
material.
- É entendimento consolidado da Egrégia 10ª. Turma desta Corte, que é defeso à Autarquia
exigir a devolução dos valores já pagos, pois, o C. STF decidiu que são irrepetíveis, quando
percebidas de boa-fé, as prestações previdenciárias, em função da sua natureza alimentar.
- O recebimento de boa-fé de valores a título de benefício previdenciário, pelo segurado ou
beneficiário, não são passíveis de devolução posto que se destinam à sua própria
sobrevivência, circunstância que o reveste de nítido caráter alimentar.
- A Primeira Seção do E. STJ, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema979),
salvaguardou a boa-fé do segurado.
- Não demonstrada a ausência de boa-fé da segurada/agravante, não prosperam as alegações
da Autarquia quanto à cobrança do alegado débito a título de benefício assistencial.
-Honorários advocatíciosfixadosemR$ 2.000,00 (dois mil reais) considerando, especialmente, a
natureza da causa e do trabalho realizado pelo advogado, conforme critérios estabelecidos no
parágrafo 2º do artigo 85 do Código de Processo Civil.
- Embargos de declaração opostos pelo INSS rejeitados. Embargos de declaração opostos pela
parte autora acolhidos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar os embargos de declaração do INSS e acolher os embargos de
declaração da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante
do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
