
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5058079-66.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - JUÍZA CONVOCADA DIANA BRUNSTEIN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDELSON RIBEIRO DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: LOURENCO MUNHOZ FILHO - SP153582-A, MICHELE APARECIDA PRADO MOREIRA - SP301706-N
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5058079-66.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - JUÍZA CONVOCADA DIANA BRUNSTEIN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EDELSON RIBEIRO DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: LOURENCO MUNHOZ FILHO - SP153582-A, MICHELE APARECIDA PRADO MOREIRA - SP301706-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de embargos de declaração opostos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra acórdão lavrado pela Décima Turma deste Tribunal, assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA CONDICIONAL. NULIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. LEI VIGENTE À ÉPOCA DO EXERCÍCIO LABORAL. RUÍDO. ELETRICIDADE. AUSÊNCIA DE EPI EFICAZ. BENEFÍCIO DEVIDO. COMPROVAÇÃO DO LABOR ESPECIAL EM JUÍZO. TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS DA APOSENTAÇÃO. TEMA 1124/STJ. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. FIXAÇÃO NOS TERMOS DA LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA.
- A declaração de nulidade da sentença é medida que se impõe, por ter, após análise de todas as questões postas em juízo, condicionado a concessão do benefício à análise por parte do ente autárquico acerca de eventual cumprimento do requisito temporal, e, ao deixar de analisá-la, incorreu na violação ao princípio da congruência, previsto no artigo 492, parágrafo único, do CPC.
- A Constituição da República (CR) previa na redação original do artigo 202, I e II, e § 1º, a aposentadoria por tempo de serviço, concedida com proventos integrais, após 35 (trinta e cinco) anos de trabalho, ao homem, e, após 30 (trinta), à mulher, ou na modalidade proporcional, após 30 (trinta) anos de trabalho, ao homem, e, após 25 (vinte e cinco), à mulher.
- O exercício de atividades nocivas, causadoras de algum prejuízo à saúde e à integridade física ou mental do trabalhador ao longo do tempo, independentemente de idade, garante ao trabalhador a conversão em tempo comum para fins de aposentação por tempo de contribuição.
- Conforme orientação do C. Superior Tribunal de Justiça, a natureza especial da atividade deve ser reconhecida em razão do tempo da prestação e da legislação então vigente, tornando-se direito adquirido do empregado.
- O agente nocivo deve, em regra, ser definido em legislação contemporânea ao labor, admitindo-se excepcionalmente que se reconheça como nociva a sujeição do segurado a agente não previsto em regulamento, desde que comprovada a sua efetiva prejudicialidade.
- O labor deve ser exercido de forma habitual e permanente, com exposição do segurado ao agente nocivo indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço.
- A discussão sobre o uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) como fator de descaracterização do tempo especial encontra-se balizada pelo C. STF no Tema 555 de repercussão geral. Na hipótese de o segurado apresentar PPP indicativo de sua exposição a determinado agente nocivo e inexistindo prova de que o EPI, embora possa atenuar os efeitos prejudiciais, seja capaz de neutralizar totalmente a nocividade do ambiente laborativo, é de rigor reconhecer a especialidade do labor. Além disso, ficou pacificado que inexiste EPI capaz de neutralizar ou minimizar os efeitos nocivos do agente ruído. Precedentes.
- Admite-se o enquadramento especial do labor em razão da exposição a níveis de ruído superiores aos limite de tolerância - 80 dB(A), até 05/03/1997, 90 dB(A), até 18/11/2003, e 85 dB(A), a partir de 19/11/2003 - item 1.1.6 do Anexo do Decreto n. 53.831/1964, item 1.1.5. do Anexo I, do Decreto n. 83.080/1979, item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n. 2.172/97 e item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto 3.048/1999.
- O anexo III do Decreto n. 53.381/1964, em seu item 1.1.8, elenca a eletricidade como agente nocivo, in verbis: “Eletricidade - operações em locais com eletricidade em condições de perigo de vida - Trabalhos permanentes em instalações ou equipamentos elétricos com risco de acidentes. Eletricistas, cabistas, montadores e outros.” e, nos termos do REsp 1.306.113/SC, o agente eletricidade pode ser admitido para caracterização da especialidade do labor em razão do caráter exemplificativo do rol de atividades especiais da legislação de regência, não afastando o direito à aposentadoria, pois não se trata de admissão de critério diferenciado ao estabelecido, não ferindo o caráter contributivo e de filiação obrigatória, nem a preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, estipulados no artigo 201, § 1º, da Constituição Federal ou princípio da separação dos poderes e prerrogativas reservadas aos Poderes Executivo e Legislativo (nos termos dos artigos 84, IV, e 194, III, da Constituição Federal).
- Reconhecimento da atividade especial, exercida sob condições nocivas à saúde ou à integridade física do segurado, nos períodos de 01/07/1991 a 28/02/2007, 02/04/2008 a 04/12/2008, 01/07/2009 a 09/04/2011, 01/09/2011 a 11/04/2012 e 24/04/2012 a 06/02/2018.
Diante dos períodos especiais ora reconhecidos, afere-se que a parte autora possuía na data de entrada do requerimento administrativo (DER), em 01/11/2017, o total de 24 anos, 3 meses e 1 dia de tempo de contribuição especial, tempo insuficiente para lhe garantir a concessão, desde a referida data, do benefício de aposentadoria especial.
- Considerados os períodos especiais, convertidos para tempo comum pelo fator de conversão 1,40, somados aos demais interregnos de labor comum apontados no relatório CNIS, perfaz a parte autora, na data do requerimento administrativo (DER), em 01/11/2017, o total de 42 anos e 28 dias de tempo de contribuição, tempo suficiente para lhe garantir a concessão, naquela data, do benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, com a incidência do fator previdenciário.
- No caso em comento, parte dos períodos de labor especial foi comprovada no curso do processo, a respaldar a necessidade de sobrestamento do feito na fase de execução, para que sejam observados os exatos parâmetros do que for assentado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, na definição do Tema 1124/STJ.
- A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que refere a aplicação da EC n. 113/2001, observados o Tema 96/STF e a Súmula Vinculante 17/STF.
- Sentença anulada de ofício, pedido inicial julgado parcialmente procedente e apelação do INSS prejudicada.
Sustenta a autarquia embargante que há omissão no acórdão, uma vez que a matéria em discussão está relacionada a um tema submetido ao Tema 1.209 do STF, sob o regime de repercussão geral, que trata do reconhecimento da especialidade de atividades de risco (perigosas). Outrossim, alega que, a partir de 06/03/1997, não é mais possível caracterizar a especialidade de determinada atividade profissional por ser perigosa, conforme os Decretos n.º 2.172/97 e n.º 83.080/79. Nesse sentido, portanto, requer o acolhimento dos aclaratórios para suspender o processo até o pronunciamento final do STF, bem como a impossibilidade de reconhecimento da atividade como especial.
Requer o acolhimento dos embargos, inclusive para fins de prequestionamento.
Intimada, a embargada não apresentou contrarrazões.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5058079-66.2022.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - JUÍZA CONVOCADA DIANA BRUNSTEIN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Os embargos de declaração, conforme dispõe o artigo 1.022 do CPC, destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material existente no julgado.
O caráter infringente dos embargos somente é admitido a título excepcional, quando da eliminação da contradição ou da omissão decorrer logicamente a modificação do julgamento embargado.
No caso concreto, não houve no acórdão omissão de ponto sobre o qual deveria haver pronunciamento judicial, nem contradição ou obscuridade.
Tenha-se em vista que o juiz não está adstrito a examinar todas as normas legais trazidas pelas partes, bastando que, in casu, decline os fundamentos suficientes para lastrear sua decisão.
Depreende-se dos embargos que não se busca suprir vícios no julgado, mas verifica-se, na verdade, inconformismo com a solução adotada, desfavorável à parte embargante, e pretende-se a reforma da decisão. Não é essa, contudo, a finalidade dos embargos de declaração.
Quanto à questão levantada pelo recorrente como objeto de omissão, o acórdão embargado assim decidiu:
[...]
As atividades especiais em função da categoria profissional, à exceção daquelas submetidas aos agentes calor, frio e ruído, para as quais é imprescindível a apresentação de laudo técnico, têm como parâmetro as tabelas dos Decretos n. 53.831, de 25/03/1964, Anexos I e II, e do n. 83.080, de 24/01/1979, Anexo, que vigeram simultaneamente, não tendo ocorrido revogação daquele diploma por este. Portanto, havendo divergência entre as referidas normas, prevalecerá a que for mais favorável ao segurado.
O rol de atividades inserto nos decretos tem caráter exemplificativo. Assim, é possível o enquadramento de outras atividades mediante perícia, consoante a Súmula 198/TFR do extinto E. Tribunal Federal de Recursos: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento”.
Consolidando esse entendimento, o C. STJ definiu, no julgamento do REsp 1.306.113, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, o Tema 534/STJ: "as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991)", (PRIMEIRA SEÇÃO, j. 14/11/2012, DJe 07/03/2013, t. j. 26/06/2013).
[...]
[...] a partir de 11/12/1997: tem efetividade o Decreto n. 2.172, de 05/03/1997, que regulamenta a Lei n. 9.528, de 10/12/1997, o qual convalidou a MP n. 1.523, de 11/10/1996, diversas vezes reeditada, e republicada pela MP n. 1.596-14, de 10/11/1997, exigindo para o reconhecimento de tempo de serviço especial a prova qualificada da efetiva sujeição do segurado a quaisquer agentes agressivos mediante apresentação de formulário padrão elaborado com supedâneo em Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho (LTCAT) ou perícia técnica.
[...]
Ademais, a controvérsia sobre a incidência do agente ruído diz respeito a períodos antes e após a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003.
Verifica-se que a metodologia de aferição dos níveis de ruído, em período anterior a 18/11/2003, observou a redação original do § 11 do artigo 68 do Decreto n. 3.048/1999, cuja norma admite a medição do ruído segundo a NR-15/MTE, denominado critério do nível máximo de ruído, "pico de ruído", a média aritmética simples ou o Nível de Exposição Normalizado (NEN). Quanto aos interregnos posteriores a 19/11/2003, data da publicação do Decreto n. 4.882/2003, os elementos probatórios apontaram o exercício da atividade sob condições especiais em decorrência da exposição a ruído acima dos limites de tolerância, mensurado segundo a metodologia da NR-15/MTE, cuja aferição não pode desqualificar o tempo especial, porquanto foi adotado o critério técnico do nível máximo do ruído (ruído de pico), também admitido pela ratio decidendi do Tema 1083/STJ.
Ainda, quanto ao período a partir de 19/11/2003, ressalte-se que não existe lei fixando determinada metodologia, tampouco assinalando a exclusividade do Nível de Exposição Normalizado (NEN), tanto que o Enunciado 13 do CRPS até 21/03/2021, (Resolução 33/CRPS), permitia que o PPP não indicasse a norma aplicável nem a técnica utilizada, cabendo às empresas cumprir as obrigações contidas nos §§ 1º a 4º do artigo 58 da LBPS.
No que concerne às anotações sobre a utilização de Equipamento de Proteção Individual (EPI) eficaz, as informações do PPP não são idôneas para descaracterizar a natureza especial do labor, porquanto não há dados sobre a real eficácia do EPI, nem tampouco provas de que o tipo de equipamento utilizado foi realmente suficiente para eliminar ou mitigar a nocividade dos agentes nocivos descritos. Ademais, como assentado pelo C. STF no Tema 555/STF, na hipótese de dúvida ou divergência é de rigor o reconhecimento da especialidade do trabalho.
Acrescente-se que a C. Corte Suprema também rechaçou a declaração do empregador quanto à eficácia do EPI, consoante o Tema 555/STF, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância.
Dessa forma, considerando o conjunto probatório dos autos, é de rigor o reconhecimento da atividade especial, exercida sob condições nocivas à saúde ou à integridade física do segurado, nos períodos de 01/07/1991 a 28/02/2007, 02/04/2008 a 04/12/2008, 01/07/2009 a 09/04/2011, 01/09/2011 a 11/04/2012 e 24/04/2012 a 06/02/2018.
A decisão é clara e aborda todas as matérias que o julgador deveria se pronunciar, de acordo com seu convencimento. Qualquer insatisfação com a solução adotada deve ser manifestada através das vias recursais adequadas.
A recorrente não especifica quais questões ainda precisam ser apreciadas ou esclarecidas pelo acórdão contestado. Também não indica quais argumentos poderiam, em tese, alterar o resultado do julgamento e que não foram abordados na decisão. Em vez disso, argumenta sobre as normas aplicáveis à aposentadoria especial em relação ao agente nocivo em questão.
Quanto ao pedido de sobrestamento relacionado ao Tema 1.209/STF, a questão discutida refere-se especificamente à atividade de vigilante. Embora esta se enquadre na categoria de atividade perigosa, não pode ser considerada idêntica à questão tratada na decisão embargada, que lida com a exposição a agentes nocivos de ruído e eletricidade, acima daqueles tolerados.
Por fim, o objetivo de prequestionar a matéria para fins de interposição de recurso especial ou extraordinário perde relevância em sede de embargos de declaração se não demonstrada a ocorrência de qualquer das hipóteses previstas no artigo 1.022 do Código de Processo Civil.
O artigo 1.025 do Código de Processo Civil esclarece que os elementos suscitados pelo embargante serão considerados incluídos no acórdão “para fins de prequestionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”.
Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 1.022 DO CPC. OMISSÃO, OBSCURIDADE, CONTRADIÇÃO, ERRO MATERIAL. NÃO CONFIGURAÇÃO. REDISCUSSÃO DO MÉRITO. PREQUESTIONAMENTO. EMBARGOS REJEITADOS.
1. Os embargos de declaração, conforme artigo 1.022 do Código de Processo Civil (CPC), visam suprir omissão, afastar obscuridade, eliminar contradição ou corrigir erro material no julgado.
2. O caráter infringente dos embargos de declaração é excepcional, sendo admitido apenas quando a eliminação de contradição ou omissão resultar, logicamente, na modificação do julgamento embargado.
3. Os embargos de declaração não se prestam à reforma do julgado, mas sim a dissipar contradições e obscuridades, sendo os efeitos infringentes admitidos apenas em situações excepcionais.
4. Não configurada omissão, contradição, obscuridade ou erro material no acórdão embargado, o recurso não pode ser acolhido, uma vez que se denota o intuito de rediscutir o mérito, o que é inadmissível.
5. O propósito de prequestionamento da matéria não autoriza o acolhimento dos embargos se ausentes os vícios previstos no artigo 1.022 do CPC.
6. Embargos de declaração rejeitados.
