Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5364243-76.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
07/04/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 09/04/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INCAPACIDADE
TEMPORÁRIA. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. IMPOSSIBLIDADE.
- Constatada a incapacidade temporária da parte autora, não há que se falar em reabilitação
profissional, nos termos do art. 62 da Lei nº 8.213/91, pois esta é aplicável às hipóteses de em
que é insuscetível a recuperação do segurado para o exercício de sua atividade habitual.
-O benefício de auxílio-doença poderá ser cessado no momento em que for constatada a
recuperação do segurado, sendo imprescindível a realização de nova perícia administrativa
posteriormente à decisão, cabendo ao INSS notificar a parte autora para realizar a reavaliação
médica periódica. Precedentes.
- A "alta programada", inserida pela Lei 13.457/17, conflita com o disposto no artigo 62 da Lei nº
8.213/91, com a redação dada pelas Leis 13.457/17 e13.846/19.
- Embargos de declaração acolhidos em parte.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5364243-76.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELANTE: FATIMA TOURO PADILHA DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA LUIZA BATISTA DE SOUZA - SP219869-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5364243-76.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: FATIMA TOURO PADILHA DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA LUIZA BATISTA DE SOUZA - SP219869-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora):Trata-se de embargos de
declaração opostos pelo INSS em face de acórdão de minha relatoria, julgado à unanimidade
pela Egrégia 10ª Turma deste Tribunal (id 144001107).
Alega a embargante que o v. acórdão embargado é omisso, uma vez que determinou a
reabilitação profissional da segurada, a despeito de ter sido constatada sua incapacidade
temporária para o trabalho. Alega que o art. 60, §§ 8º e 9º, da Lei nº 8.213/91 prevê que
passados 120 dias da implantação do benefício o segurado deve manifestar interesse para a
reavaliação médica para a comprovação da continuidade de sua incapacidade, sendo que a alta
programada está prevista legalmente, não necessitando de autorização do judiciário para cessar
o benefício. Aduz a necessidade de prequestionar pontos do processo para fins de interposição
futura de recursos para as instâncias superiores.
Vista à parte contrária,sem manifestação.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5364243-76.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: FATIMA TOURO PADILHA DE SOUZA
Advogado do(a) APELANTE: MARIA LUIZA BATISTA DE SOUZA - SP219869-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Conheço dos embargos de
declaração, haja vista que tempestivos.
Nos termos do art. 1022 do NCPC, os embargos de declaração são cabíveis quando o
provimento jurisdicional padece de omissão, contradição ou obscuridade, bem como para sanar a
ocorrência de erro material.
Omissão é a inércia do julgador em analisar ou pronunciar juízo de valor acerca de ponto
essencial ao desate da controvérsia.
A contradição ocorre quando na decisão se incluem proposições entre si inconciliáveis. Conforme
o magistério de Barbosa Moreira:
Pode haver contradição entre proposições contidas na motivação (exemplo: a mesma prova ora é
dita convincente, ora inconvincente), ou entre proposições da parte decisória, isto é,
incompatibilidade entre capítulos do acórdão: v.g. anula-se, por vício insanável, quando
logicamente se deveria determinar a restituição ao órgão inferior, para sentenciar de novo; ou
declara-se inexistente a relação jurídica prejudicial (deduzida em reconvenção ou em ação
declaratória incidental), mas condena-se o réu a cumprir a obrigação que dela necessariamente
dependia; e assim por diante. Também pode ocorrer contradição entre alguma proposição
enunciada nas razões de decidir e o dispositivo: por exemplo, se na motivação se reconhece
como fundada alguma defesa bastante para tolher a pretensão do autor, e no entanto se julga
procedente o pedido. (Comentários ao Código de Processo Civil. v. 5. Rio de Janeiro: Forense,
2008, p. 556-557).
Por fim, também é clássico o conceito de obscuridade que, segundo Cândido Rangel Dinamarco,
é "a falta de clareza em um raciocínio, em um fundamento ou em uma conclusão constante da
sentença".
Por fim, cabe ressaltar que erro material é aquele que se evidencia à primeira vista e que
demonstra não traduzir o pensamento ou a vontade de quem o cometeu. Reconhecido, portanto,
de forma objetiva.
De fato, razão assiste à autarquia.
Com efeito, a perícia médica realizada em juízo constatou que a incapacidade da parte autora é
temporária, de maneira que não há que se falar em reabilitação profissional, nos termos do art. 62
da Lei nº 8.213/91, pois esta é aplicável às hipóteses de em que é insuscetível a recuperação do
segurado para o exercício de sua atividade habitual, o que não se verifica no caso.
Observo que, nos termos dos artigos 101 da Lei n. 8.213/1991 e 71 da Lei 8.212/91, a autarquia
previdenciária não está impedida de reavaliar em exame médico as condições laborais do
segurado.
Todavia, no tocante à fixação do período de pagamento, em que pesem as recentes alterações
legislativas no art. 60, §§ 8º e 9º, da Lei nº 8.213/91, incluídas pela Lei nº 13.457, de 2017, que
possibilitam ao Poder Judiciário, sempre que possível, estabelecer o limite temporal para o gozo
do benefício de auxílio-doença, somente poderá ser cessado no momento em que for constatada
a recuperação do segurado, sendo imprescindível a realização de nova perícia administrativa
posteriormente à decisão, cabendo ao INSS notificar a parte autora para realizar a reavaliação
médica periódica.
Outrossim, entendo que a "alta programada", inserida pela Lei 13.457/17, conflita com o disposto
no artigo 62 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pelas Leisns. 13.457/17 e 13.846/19, que
dispõe:
"Art. 62. O segurado em gozo de auxílio-doença, insusceptível de recuperação para sua atividade
habitual, deverá submeter-se a processo de reabilitação profissional para o exercício de outra
atividade.
§ 1º. O benefício a que se refere o caput deste artigo será mantido até que o segurado seja
considerado reabilitado para o desempenho de atividade que lhe garanta a subsistência ou,
quando considerado não recuperável, seja aposentado por invalidez."
O dispositivo legal supramencionado determina que o benefício somente poderá ser cessado no
momento em que for constatada a recuperação do segurado, assim, o benefício somente poderá
ser cessado com a realização de nova perícia que constate a recuperação da capacidade
laborativa do segurado.
Nesse sentido, a jurisprudência do E. STJ:
"PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. ALTERAÇÃO DO REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL PELO DECRETO 5.844/2006. CRIAÇÃO DA DENOMINADA "ALTA PROGRAMADA".
ILEGALIDADE. CONTRARIEDADE AO ART. 62 DA LEI 8.213/1991. 1. O acórdão recorrido está
no mesmo sentido da compreensão do STJ de que a inserção da chamada "alta programada"
para auxílio-doença concedido pelo INSS pelo art. 78, §§ 1º a 3º, do Decreto 3.048/1999
(mediante modificação operada pelo Decreto 5.844/2006) é ilegal, pois contraria o art. 62 da Lei
8.213/1991. A propósito: REsp 1.717.405/PB, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma,
DJe 17.12.2018; AgInt no AREsp 968.191/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda
Turma, DJe 20.10.2017; AgInt no REsp 1.546.769/MT, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira
Turma, DJe 3.10.2017; AgInt no AREsp 1.049.440/MT, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma, DJe 30.6.2017. 2. Recurso Especial não provido" (RESP - 1597725. Relator Ministro
HERMAN BENJAMIN. J. 25/06/2019. DJE DATA:01/07/2019.) Destaquei.
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. CESSAÇÃO DO PAGAMENTO
DO BENEFÍCIO. AUSÊNCIA DE PERÍCIA MÉDICA. IMPOSSIBILIDADE. 1. A jurisprudência do
STJ tem-se firmado no sentido de que é incompatível com a lei previdenciária a adoção, em
casos desse jaez, do procedimento da "alta programada", uma vez que fere o direito subjetivo do
segurado de ver sua capacidade laborativa aferida através do meio idôneo a tal fim, que é a
perícia médica. 2. De fato, revela-se incabível que o Instituto preveja, por mero prognóstico, em
que data o segurado está apto para retornar ao trabalho, sem avaliar efetivamente o estado de
saúde em que se encontra, tendo em vista que tal prognóstico pode não corresponder à evolução
da doença, o que não é difícil de acontecer em casos mais complexos, como é o versado nos
autos. Precedentes: REsp 1.291.075/CE, Relatora Ministra Regina Helena Costa, DJe 18/2/2014;
REsp 1.544.417/MT, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, DJe 19/8/2015; REsp 1.563.601-
MG, Relator Ministro Humberto Martins, DJe 30/6/2016. 3. Recurso Especial não provido (RESP -
1737688. Relator Ministro HERMAN BENJAMIN. J. 23/11/2018. DJE DATA:23/11/2018.)
Destaquei.
Diante do exposto, ACOLHO EM PARTE OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS PELO
INSS para excluir da condenação o dever de o INSS incluir a autora em processo de reabilitação
profissional e acrescentar novos fundamentos ao acórdão embargado, na forma da
fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. INCAPACIDADE
TEMPORÁRIA. REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. IMPOSSIBLIDADE.
- Constatada a incapacidade temporária da parte autora, não há que se falar em reabilitação
profissional, nos termos do art. 62 da Lei nº 8.213/91, pois esta é aplicável às hipóteses de em
que é insuscetível a recuperação do segurado para o exercício de sua atividade habitual.
-O benefício de auxílio-doença poderá ser cessado no momento em que for constatada a
recuperação do segurado, sendo imprescindível a realização de nova perícia administrativa
posteriormente à decisão, cabendo ao INSS notificar a parte autora para realizar a reavaliação
médica periódica. Precedentes.
- A "alta programada", inserida pela Lei 13.457/17, conflita com o disposto no artigo 62 da Lei nº
8.213/91, com a redação dada pelas Leis 13.457/17 e13.846/19.
- Embargos de declaração acolhidos em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por
unanimidade, decidiu acolher em parte os embargos de declaração, nos termos do relatório e
voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
