
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003506-97.2020.4.03.6103
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OSEAS PEREIRA
Advogados do(a) APELADO: GISELI BARROS DOS SANTOS - SP425676-A, MARIANA DIAS SOLLITTO BELON - SP308409-A
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003506-97.2020.4.03.6103
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OSEAS PEREIRA
Advogados do(a) APELADO: GISELI BARROS DOS SANTOS - SP425676-A, MARIANA DIAS SOLLITTO BELON - SP308409-A
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CONSOLIM (Relator):
Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face do acórdão (Id 286737256), mediante o qual restou provida parcialmente a apelação do INSS e à remessa oficial tida por ocorrida, para, somando a parte autora, OSEAS PEREIRA, o tempo de 25 anos e 11 dias, excluir a especialidade do período de 1º.3.1992 a 31.8.1992 e corrigir erro material na sentença quanto ao período de 18.8.2004 a 25.9.2018.
A autarquia embargante sustenta, em síntese, que o acórdão embargado incorreu em omissão, uma vez que não observada a determinação de suspensão dos processos, em qualquer fase e em todo o território nacional, que versem sobre o Tema 1.209 do excelso Supremo Tribunal Federal, atinente ao RE 1.368.225, que pode ser aplicado para toda e qualquer atividade considerada ordinariamente como de risco, não apenas à de vigilante. Destaca a circunstância de que desde 6.3.1997 (Decreto n. 2.172/1997) a periculosidade deixou de ser caracterizada como agente nocivo. Ao final, aventa o fato da exigência de fonte de custeio à concessão da benesse especial. Prequestiona a matéria.
Intimada, a parte contrária apresentou manifestação sobre os embargos de declaração.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003506-97.2020.4.03.6103
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OSEAS PEREIRA
Advogados do(a) APELADO: GISELI BARROS DOS SANTOS - SP425676-A, MARIANA DIAS SOLLITTO BELON - SP308409-A
V O T O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CONSOLIM (Relator):
Nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são o instrumento processual adequado para a integração do julgado nas hipóteses de omissão, obscuridade ou contradição, podendo também ser utilizados para a correção de vício ou erro material.
Ausentes as hipóteses previstas no aludido dispositivo legal, compete à parte inconformada com o teor da decisão, lançar mão dos recursos cabíveis com o fim de obter a reforma do ato judicial, já que os embargos de declaração não se prestam à manifestação de inconformismo ou à rediscussão do julgado. Nesse sentido: STJ, ED no MS n. 17963/DF, Primeira Seção, Relator Ministro PAULO SERGIO DOMINGUES, DJe 14.3.2023.
Ainda que se pretenda a análise da matéria para fins de prequestionamento, para o conhecimento dos embargos de declaração, é necessária a demonstração de um dos vícios enumerados na norma processual citada. Nesse sentido:
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO E OBSCURIDADE. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO DE REJULGAMENTO DO RECURSO. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS REJEITADOS.
1. Os embargos de declaração poderão ser opostos com a finalidade de eliminar da decisão qualquer erro material, obscuridade, contradição ou suprir omissão sobre ponto acerca do qual se impunha pronunciamento, o que não é o caso dos autos.
2. Na esteira da uníssona jurisprudência desta Corte de Justiça, os embargos de declaração não constituem instrumento adequado ao prequestionamento, com vistas à futura interposição de recurso extraordinário, razão pela qual, para tal escopo, também não merecem prosperar.
3. Embargos de declaração rejeitados”.
(STJ - EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp 1929948 SC 2021/0224604-0, Terceira Turma, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 7.4.2022)
Confira-se, por oportuno, o teor da ementa do acórdão embargado:
“PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. PRELIMINARES. ATIVIDADE PREJUDICIAL. AGENTES NOCIVOS. FATORES QUÍMICOS. GLP. COMPROVAÇÃO. EPI INEFICAZ. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. EFEITOS FINANCEIROS. TEMA 709/STF.
I - Rejeitada a preliminar arguida pelo INSS, quanto à concessão de efeito suspensivo à apelação, tendo em vista a realização de seu julgamento no presente momento, com a entrega do provimento jurisdicional definitivo.
II - O entendimento de que não é possível a antecipação de tutela em face da Fazenda Pública, equiparada no presente feito ao órgão previdenciário, está ultrapassado, porquanto a antecipação do provimento não importa em pagamento de parcelas vencidas, o que estaria sujeito ao regime de precatórios. A implantação provisória ou definitiva do benefício, tanto previdenciário como assistencial, não está sujeita à disciplina do artigo 100 da Constituição da República, não havendo, portanto, falar-se em impossibilidade de implantação do benefício perseguido sem o trânsito em julgado da sentença.
III - Aplica-se ao caso o Enunciado da Súmula 490 do E. STJ. IV - No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida.
V - As funções do autor consistiam na distribuição do GLP (Gás Inflamável de Petróleo), substância química composta de hidrocarboneto e outros derivados de carbono, cuja tarefa, portanto, é realizada com risco à integridade física, nos termos do Decreto n.º 53.831/64 (código 1.2.11); do Decreto n.º 83.080/79 (código 1.2.10) e do Decreto n.º 3.048/99 (código 1.0.17), bem como do artigo 58 da Lei 8.213/1991, razão que justifica a manutenção do reconhecimento da especialidade no interregno controverso.
VI - A exposição a gás GLP, garante a contagem diferenciada para fins previdenciários por trazer risco à saúde/integridade física do segurado, em razão do potencial inflamável e de explosão dos botijões de gás. VII - Nos termos do art.68, §4º, do Decreto 3.048/99, com a redação dada pelo Decreto 8.123/2013, vigente à época da prestação do serviço, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração. No caso dos autos, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
VIII – O termo inicial da concessão do benefício, para fins de cálculo da respectiva RMI, deve ser fixado na data do requerimento administrativo.
IX - Todavia, em relação ao termo inicial dos efeitos financeiros, ante à afetação do tema repetitivo n. 1.124/STJ, a sua solução dar-se-á por ocasião da liquidação do julgado, observando-se o que for decidido no aludido paradigma.
X - O vínculo empregatício mantido junto ao estabelecimento em que exercia atividade especial, encontra-se encerrado. Dessa forma, não há, em tese, impedimento para imediata implantação do benefício de aposentadoria especial (Tema 709/STF), já que não consta que exerça atividade tida por especial.
XI - Após a implantação do benefício de aposentadoria especial, a parte autora não poderá mais exercer qualquer atividade tida por especial, sob pena de cessação imediata do pagamento de tal benefício, conforme já decidido pelo E. STF no Tema 709.
XII - Preliminar de cassação da antecipação da tutela rejeitada. Preliminar de remessa oficial acolhida. Apelo do réu e remessa oficial tida por interposta parcialmente providos. (...)”
Com efeito, improcede a afirmação autárquica de que, ao se considerar o tempo trabalho especial da parte autora, não foi levada em conta a impossibilidade de se reconhecer a especialidade de atividades perigosas.
Isso porque no acórdão restou, de forma fundamentada, reconhecido o risco inerente à atividade desempenhada, uma vez que sob o manejo e a presença de agente inflamável e explosivo de alta periculosidade dos botijões de gás. O mesmo julgado tratou também da exposição autoral aos hidrocarbonetos aromáticos, os quais têm em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo n. 13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho, fator, outrossim, levado em consideração à contagem especial, em decorrência do tempo de trabalho sob tal exposição.
Relevante a transcrição de trechos de interesse do acórdão embargado:
“No caso dos autos, consoante laudo pericial o autor laborou de 06.01.1992 a 28.02.1992 e de 01.09.1992 a 15.02.2002, na Supergasbras Energia Ltda; de 07.05.2002 a 01.09.2003, para Liquigas Distribuidora Brasil S.A.; e de 18.08.2004 a 25.09.2018 para Copagaz Distribuidora de Gás S.A., em atividades que envolviam operações com GLP (gás liquefeito do petróleo), como transferência, carregamento, descarregamento, e transporte de gás.
(...) Destarte, verifica-se que as funções do autor consistiam na distribuição do GLP (Gás Inflamável de Petróleo), substância química composta de hidrocarboneto e outros derivados de carbono, cuja tarefa, portanto, é realizada com risco à integridade física, nos termos do Decreto n.º 53.831/64 (código 1.2.11); do Decreto n.º 83.080/79 (código 1.2.10) e do Decreto n.º 3.048/99 (código 1.0.17), bem como do artigo 58 da Lei 8.213/1991, razão que justifica a manutenção do reconhecimento da especialidade dos períodos mencionados.
Com efeito, a exposição a gás GLP, garante a contagem diferenciada para fins previdenciários por trazer risco à saúde/integridade física do segurado, em razão do potencial inflamável e de explosão dos botijões de gás, de forma habitual e permanente, fazendo jus ao adicional de periculosidade.
(...) Com efeito, a exposição a gás GLP, garante a contagem diferenciada para fins previdenciários por trazer risco à saúde/integridade física do segurado, em razão do potencial inflamável e de explosão dos botijões de gás, de forma habitual e permanente, fazendo jus ao adicional de periculosidade.
(...) Nos termos do art.68, §4º, do Decreto 3.048/99, com a redação dada pelo Decreto 8.123/2013, vigente à época da prestação do serviço, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
No caso dos autos, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho. (...)”
Nessa esteira, anote-se que a jurisprudência desta Corte é firme no sentido de reconhecer a especialidade da atividade danosa à saúde, face à exposição a hidrocarbonetos aromáticos e em decorrência da periculosidade.
Nesse sentido, mutatis mutandis, relevante o julgado deste Tribunal, de relatoria Desembargadora Federal Leila Paiva Morrison, nos autos da Apelação Cível n. 5000301-53.2022.4.03.6115 (DJe 17.10.2023):
“(...) - A especialidade das atividades desenvolvidas durante o abastecimento de aeronaves configura-se tanto pela exposição a agentes químicos hidrocarbonetos aromáticos, como óleo, querosene, gasolina e outros derivados de petróleo, nos termos dos itens 1.2.9 e 1.2.11 do Anexo do Decreto n. 53.831, de 1964; 1.2.10 e 1.2.11 do Anexo I do Decreto n. 83.080, de 1979; e 1.0.17 e 1.0.19 dos Anexos IV dos Decretos ns. 2.172/1997 e 3.048/1999, como nos termos do que estabelece a alínea 'c' do item 1 do Anexo 2 da NR 16, aprovada pela Portaria MTB n. 3.214, de 08/06/1978. - A periculosidade inerente ao risco constante de explosões permite enquadrar essas atividades como especiais, também com respaldo no assentado pela C. Suprema Corte na Súmula 212/STF, que prevê o pagamento de adicional de periculosidade ao trabalhador em postos de combustíveis, como é a hipótese a que se submetem os frentistas e lavadores de automóveis, em postos de combustíveis.”
Por fim, no tocante ao argumento autárquico da necessidade de prévia existência de fonte de custeio de qualquer benefício previdenciário, importa destacar que o excelso Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo n. 664.335 SC, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, em sede de repercussão geral, assim se pronunciou acerca do modelo de financiamento de benefícios de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição decorrente da conversão de tempo especial em comum: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88). Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".
Deveras, no acórdão embargado foram apreciadas todas as questões suscitadas nestes embargos de declaração.
Ao que se infere, a parte embargante não aponta, propriamente, omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido. Na verdade, pretende que o mérito seja julgado novamente, o que é descabido em sede de embargos de declaração.
Impõe-se, destarte, reconhecer que no acórdão embargado não há qualquer vício a ensejar a oposição deste recurso.
Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração, consoante a fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. OBSCURIDADE. ERRO MATERIAL. ARTIGO 1.022 DO CPC. AUSÊNCIA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE NOCIVO. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS E PERICULOSIDADE. PREVISÃO. EQUILÍBRIO FINANCEIRO ATUARIAL. AUSÊNCIA DE OFENSA. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.
1. Nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são o instrumento processual adequado para a integração do julgado nas hipóteses de omissão, obscuridade ou contradição, podendo também ser utilizados para a correção de vício ou erro material.
2. Ausentes as hipóteses previstas no aludido dispositivo legal, compete à parte inconformada com o teor da decisão lançar mão dos recursos cabíveis com o fim de obter a reforma do ato judicial, já que não se prestam os embargos de declaração à manifestação de inconformismo ou à rediscussão do julgado.
3. A embargante não aponta, propriamente, omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido, pretendendo que o mérito seja julgado novamente, o que é descabido em sede de embargos de declaração.
4. Ainda que se pretenda a análise da matéria para fins de prequestionamento, para o conhecimento dos embargos de declaração, é necessária a demonstração de um dos vícios enumerados na norma processual citada. Nesse sentido: STJ - EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp 1929948 SC 2021/0224604-0, Terceira Turma, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 7.4.2022.
5. Reconhecido no acórdão o risco inerente à atividade desempenhada, uma vez o manejo e a presença de agente inflamável e explosivo de alta periculosidade dos botijões de gás. O mesmo julgado tratou também da exposição autoral aos hidrocarbonetos aromáticos, os quais têm em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo n. 13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho, fator, outrossim, levado em consideração à contagem especial, em decorrência do tempo de trabalho sob tal exposição.
6. O excelso Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo n. 664.335 SC, de Relatoria do Ministro Luiz Fux, em sede de repercussão geral, assim se pronunciou acerca do modelo de financiamento de benefícios de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição decorrente da conversão de tempo especial em comum: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88).” Corroboração pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, considerando que o art. 195, § 5º, da CR de 1988, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição.
7. No acórdão embargado não há qualquer vício a ensejar a oposição deste recurso.
8. Embargos de declaração rejeitados.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
