
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000152-63.2022.4.03.6113
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: MARIA RUTH DE LIMA SOUZA
Advogados do(a) APELANTE: ADONIS AUGUSTO OLIVEIRA CALEIRO - SP338515-A, JOSE CARLOS THEO MAIA CORDEIRO - SP74491-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000152-63.2022.4.03.6113
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: MARIA RUTH DE LIMA SOUZA
Advogados do(a) APELANTE: ADONIS AUGUSTO OLIVEIRA CALEIRO - SP338515-A, JOSE CARLOS THEO MAIA CORDEIRO - SP74491-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CONSOLIM (Relator):
Trata-se de embargos de declaração opostos pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face do acórdão (Id 286735938), mediante o qual restou provida parcialmente a apelação da parte autora, MARIA RUTH DE LIMA SOUZA, para julgar parcialmente procedente o pedido inicial, a fim de reconhecer os períodos de atividade especial de 1º.1.1977 a 21.1.1977, 15.3.1977 a 9.10.1978, 1º.11.1978 a 24.1.1980, 1º.6.1981 a 6.7.1981, 4.8.1981 a 1º.2.1982, 1º.6.1984 a 25.4.1985, 25.7.1985 a 24.5.1986, 11.06.1986 a 1º.7.1986, 14.7.1986 a 16.9.1986, 6.6.1989 a 2.8.1990, 3.8.1990 a 7.2.1992 e 15.9.1997 a 10.12.1997, totalizando a autora 30 anos, 3 meses e 10 dias de tempo de serviço até a data do requerimento administrativo, em 2.11.2019, e, em consequência, condenar o réu a conceder-lhe o benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição, sem a aplicação do fator previdenciário, a partir da data do requerimento administrativo (2.11.2019).
A autarquia embargante sustenta, em síntese, que o acórdão embargado incorreu em de omissão, uma vez que reconheceu a especialidade das condições de trabalho no período em que a parte autora praticou a atividade laborativa de sapateira, com base apenas nas anotações em Carteira de Trabalho e Previdência Social – CTPS, sem a comprovação da efetiva exposição a agentes nocivos à saúde. Prequestiona a matéria.
Intimada, a parte contrária apresentou manifestação sobre os embargos de declaração.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000152-63.2022.4.03.6113
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. JOÃO CONSOLIM
APELANTE: MARIA RUTH DE LIMA SOUZA
Advogados do(a) APELANTE: ADONIS AUGUSTO OLIVEIRA CALEIRO - SP338515-A, JOSE CARLOS THEO MAIA CORDEIRO - SP74491-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO CONSOLIM (Relator):
Nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são o instrumento processual adequado para a integração do julgado nas hipóteses de omissão, obscuridade ou contradição, podendo também ser utilizados para a correção de vício ou erro material.
Ausentes as hipóteses previstas no aludido dispositivo legal, compete à parte inconformada com o teor da decisão, lançar mão dos recursos cabíveis com o fim de obter a reforma do ato judicial, já que os embargos de declaração não se prestam à manifestação de inconformismo ou à rediscussão do julgado. Nesse sentido: STJ, ED no MS n. 17963/DF, Primeira Seção, Relator Ministro PAULO SERGIO DOMINGUES, DJe 14.3.2023.
Ainda que se pretenda a análise da matéria para fins de prequestionamento, para o conhecimento dos embargos de declaração, é necessária a demonstração de um dos vícios enumerados na norma processual citada. Nesse sentido:
“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO E OBSCURIDADE. INEXISTÊNCIA. PRETENSÃO DE REJULGAMENTO DO RECURSO. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS REJEITADOS.
1. Os embargos de declaração poderão ser opostos com a finalidade de eliminar da decisão qualquer erro material, obscuridade, contradição ou suprir omissão sobre ponto acerca do qual se impunha pronunciamento, o que não é o caso dos autos.
2. Na esteira da uníssona jurisprudência desta Corte de Justiça, os embargos de declaração não constituem instrumento adequado ao prequestionamento, com vistas à futura interposição de recurso extraordinário, razão pela qual, para tal escopo, também não merecem prosperar.
3. Embargos de declaração rejeitados”.
(STJ - EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp 1929948 SC 2021/0224604-0, Terceira Turma, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 7.4.2022)
Confira-se, por oportuno, o teor da ementa do acórdão embargado:
PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PRELIMINAR AFASTADA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS. FATOR PREVIDENCIÁRIO. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Não merece ser acolhida a preliminar de cerceamento de defesa arguida pela autora, uma vez que ao magistrado cabe a condução da instrução probatória, tendo o poder de dispensar a produção de provas que entender desnecessárias para a resolução da causa. No caso concreto, as provas coligidas aos autos suficientes para formar o livre convencimento deste Juízo.
II - No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida.
III – Em se tratando de matéria reservada à lei, o Decreto 2.172/1997 somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
IV - Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS.
V - No caso concreto, os contratos de trabalho anotados em Carteira Profissional - CTPS, cujas atividades eram de sapateiro ou funções correlatas até 10.12.1997, são suficientes à comprovação da exposição a agentes nocivos insalubres, uma vez que a utilização de hidrocarboneto tóxico - derivado do carbono "cola de sapateiro" é inerente a tal atividade, utilizada no processo produtivo em empresas - fábrica de sapatos, localizada na cidade de Franca, conhecido polo industrial de calçados. VI - Nos termos do §2º do art. 68 do Decreto 3.048/99, vigente à época da prestação da atividade, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
VII - No presente caso, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR-15 do Ministério do Trabalho.
VIII - No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF afirmou que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do PPP, no sentido da eficácia do EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
IX - Ademais, relativamente a outros agentes (químicos, biológicos, calor, etc.), pode-se dizer que a multiplicidade de tarefas desenvolvidas pela parte autora demonstra a impossibilidade de atestar a utilização do EPI durante toda a jornada diária; normalmente todas as profissões, como a do autor, há multiplicidade de tarefas, que afastam a afirmativa de utilização do EPI em toda a jornada diária, ou seja, geralmente a utilização é intermitente.
X - Ademais, os artigos 57 e 58 da Lei 8.213/91, que regem a matéria relativa ao reconhecimento de atividade especial, garantem a contagem diferenciada para fins previdenciários ao trabalhador que exerce atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física e não vinculam o ato concessório do benefício previdenciário à eventual pagamento de encargo tributário.
XI - Cumpre observar que a Medida Provisória n. 676, de 17.06.2015 (D.O.U. de 18.06.2015), convertida na Lei n. 13.183, de 04.11.2015 (D.O.U. de 05.11.2015), inseriu o artigo 29-C na Lei n. 8.213/91 e criou hipótese de opção pela não incidência do fator previdenciário, denominada "regra 85/95", quando, preenchidos os requisitos para a aposentadoria por tempo de contribuição, a soma da idade do segurado e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações, for: a) igual ou superior a 95 (noventa e cinco pontos), se homem, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta e cinco anos; b) igual ou superior a 85 (oitenta e cinco pontos), se mulher, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta anos.
XII - Ademais, as somas referidas no caput e incisos do artigo 29-C do Plano de Benefícios computarão "as frações em meses completos de tempo de contribuição e idade" (§ 1º), e serão acrescidas de um ponto ao término dos anos de 2018, 2020, 2022, 2024 e 2026, até atingir os citados 90/100 pontos.
XIII - Dessa forma, a autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço, calculado nos termos do art. 29-C, I, da Lei 8.213/91, incluído pela Lei 13.183/2015.
XIV - Tendo em vista que a parte apresentou documentos suficientes à comprovação da prejudicialidade de seu labor na seara administrativa, o termo inicial do benefício e os efeitos financeiros da concessão devem ser fixados a partir da data do requerimento administrativo, conforme entendimento jurisprudencial sedimentado nesse sentido.
XV - Os juros de mora e a correção monetária serão calculados de acordo com as disposições do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, observando-se o preceituado no artigo 3º da Emenda Constitucional n. 113/2021, já acrescentado no referido Manual, conforme alteração promovida pela Resolução n. 784/2022 - CJF, de 08/08/22.
XVI - Os honorários advocatícios devem ser apurados em liquidação de sentença, tendo por base as disposições contidas nos §§ 2º, 3º e 4º, incisos II, do art. 85 do CPC, incidentes sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgamento, nos termos da Súmula n. 111 do E. STJ.
XVII - Preliminar rejeitada. Apelação da autora parcialmente provida.
Com efeito, não procede a afirmação autárquica de que o acórdão embargado incorreu no vício de omissão, sob a alegação de que pelo aresto tenha sido reconhecida, somente com base nas anotações em CTPS, por enquadramento, a especialidade das condições de trabalho no período em que a parte autora trabalhava na atividade de sapateira, sem a comprovação da efetiva exposição à agentes nocivos à saúde.
Isso porque no julgamento colegiado restou consignada a especialidade dos interregnos contidos nos intervalos que se iniciam em 1º.1.1977 e terminam em 10.12.1997, laborados como sapateira, exposição a agentes nocivos insalubres, uma vez que a utilização de hidrocarboneto tóxico - derivado do carbono "cola de sapateiro" - é inerente a tal atividade, utilizada no processo produtivo em empresas, fábrica de sapatos, localizada na cidade de Franca, conhecido polo industrial de calçados.
Na mesma esteira, no acórdão embargado houve o efetivo pronunciamento de que a especialidade da atividade da parte autora possa ser comprovada até 10.12.1997 sem a apresentação de laudo técnico, sendo suficiente à caracterização da denominada atividade especial, a apresentação dos informativos SB-40, Dss-830 ou CTPS.
Vejamos o que se disse no voto constante do acórdão, relativamente a tais questões:
“No que tange à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida.
Em se tratando de matéria reservada à lei, o Decreto 2.172/1997 somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual apenas para atividades exercidas a partir de então é exigível a apresentação de laudo técnico. Neste sentido: STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482.
Pode, então, em tese, ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40, DSS-8030 ou CTPS. (...)
No caso em apreço, os contratos de trabalho anotados em Carteira Profissional – CTPS da autora, cujas atividades eram de sapateira ou funções correlatas até 10.12.1997, são suficientes à comprovação da exposição a agentes nocivos insalubres, uma vez que a utilização de hidrocarboneto tóxico - derivado do carbono "cola de sapateiro" é inerente a tal atividade, utilizada no processo produtivo em empresas - fábrica de sapatos, localizada na cidade de Franca, conhecido polo industrial de calçados.
Assim, deve ser reconhecido o caráter prejudicial dos períodos de 01.01.1977 a 21.01.1977, 15.03.1977 a 09.10.1978, 01.11.1978 a 24.01.1980, 01.06.1981 a 06.07.1981, 04.08.1981 a 01.02.1982, 01.06.1984 a 25.04.1985, 25.07.1985 a 24.05.1986, 11.06.1986 a 01.07.1986, 14.07.1986 a 16.09.1986, 06.06.1989 a 02.08.1990, 03.08.1990 a 07.02.1992 e 15.09.1997 a 10.12.1997, em que a autora laborou como sapateira, pespontadeira e atividades afins, em indústrias de calçados da cidade de Franca/SP, conforme CTPS acostada aos autos.
Nos termos do §2º do art. 68 do Decreto 3.048/99, vigente à época da prestação da atividade, a exposição, habitual e permanente, às substâncias químicas com potencial cancerígeno justifica a contagem especial, independentemente de sua concentração.
No presente caso, os hidrocarbonetos aromáticos possuem em sua composição o benzeno, substância relacionada como cancerígena no anexo nº13-A da NR- 15 do Ministério do Trabalho.”
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Deveras, no acórdão embargado foram apreciadas todas as questões suscitadas nestes embargos de declaração.
Ao que se infere, a autarquia embargante não aponta, propriamente, omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido. Na verdade, pretende que o mérito seja julgado novamente, o que é descabido em sede de embargos de declaração.
Impõe-se, destarte, reconhecer que no acórdão embargado não há qualquer vício a ensejar a oposição deste recurso.
Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração, consoante a fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. OBSCURIDADE. ERRO MATERIAL. ARTIGO 1.022 DO CPC. AUSÊNCIA. ATIVIDADE PREJUDICIAL. AGENTES NOCIVOS. COMPROVAÇÃO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS.
1. Nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração são o instrumento processual adequado para a integração do julgado nas hipóteses de omissão, obscuridade ou contradição, podendo também ser utilizados para a correção de vício ou erro material.
2. Ausentes as hipóteses previstas no aludido dispositivo legal, compete à parte inconformada com o teor da decisão lançar mão dos recursos cabíveis com o fim de obter a reforma do ato judicial, já que não se prestam os embargos de declaração à manifestação de inconformismo ou à rediscussão do julgado.
3. A embargante não aponta, propriamente, omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido, pretendendo que o mérito seja julgado novamente, o que é descabido em sede de embargos de declaração.
4. Ainda que se pretenda a análise da matéria para fins de prequestionamento, para o conhecimento dos embargos de declaração, é necessária a demonstração de um dos vícios enumerados na norma processual citada. Nesse sentido: STJ - EDcl no AgInt nos EDcl no AREsp 1929948 SC 2021/0224604-0, Terceira Turma, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, DJe 7.4.2022.
5. No acórdão restou consignada a especialidade dos interregnos contidos nos intervalos laborados como sapateira, sob exposição a agentes nocivos insalubres, uma vez que a utilização de hidrocarboneto tóxico - derivado do carbono "cola de sapateiro" - é inerente a tal atividade, utilizada no processo produtivo em fábrica de sapatos.
6. No acórdão embargado não há qualquer vício a ensejar a oposição deste recurso.
7. Embargos de declaração rejeitados.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
