Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5004544-67.2018.4.03.6119
Relator(a)
Desembargador Federal HELIO EGYDIO DE MATOS NOGUEIRA
Órgão Julgador
1ª Turma
Data do Julgamento
01/09/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 08/09/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO VERIFICADA.
ACOLHIMENTO SEM EFEITOS INFRINGENTES.
1. Há omissão quanto à alegação de vício de competência. Em suas razões de apelação, o
contribuinte alegou que o Decreto nº 6.957/09 possui vício insanável de competência, pois o art.
22, §3º, da Lei nº 8.212/91 atribui ao Ministério do Trabalho e da Previdência Social a
competência para a alteração do enquadramento das empresas – e não ao Presidente da
República -, pois este é o órgão que tem condições de apurar as estatísticas de acidentes de
trabalho. Acrescente-se apenas que, por se tratar de órgão hierarquicamente superior ao
Ministério do Trabalho e da Previdência Social, a Presidência da República poderia ter
regulamentado a questão por meio de Decreto.
2. Com relação às características da contribuição ao SAT/RAT e à violação ao princípio da
referibilidade, ao desvio de finalidade da contribuição e aos princípios do equilíbrio financeiro-
atuarial, motivação e publicidade dos atos administrativos, acrescente-se trechos. Analisando a
contribuição ao SAT dentro do contexto do multiplicador FAP, verifica-se que não há ofensa a
princípios constitucionais. Em verdade, toda a metodologia criada buscou concretizar os
mandamentos constitucionais e viabilizar a aferição da situação de cada empresa em relação à
prevenção de acidentes.
3. A interposição dos embargos de declaração implica, tacitamente, no pré-questionamento da
matéria, sendo desnecessária a sua expressa menção (art. 1.025 do CPC).
4. Embargos de declaração acolhidos apenas para sanar a omissão apontada, sem conferir-lhes
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
efeitos infringentes.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004544-67.2018.4.03.6119
RELATOR:Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: RITZ IGUATEMI BAR E LANCHES LTDA
Advogados do(a) APELANTE: LUIZ COELHO PAMPLONA - SP147549-A, EMELY ALVES
PEREZ - SP315560-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004544-67.2018.4.03.6119
RELATOR:Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: RITZ IGUATEMI BAR E LANCHES LTDA
Advogados do(a) APELANTE: LUIZ COELHO PAMPLONA - SP147549-A, EMELY ALVES
PEREZ - SP315560-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR):
Trata-se de embargos de declaração opostos por RITZ IGUATEMI BAR E LANCHES LTDA. (Id.
133725729) contra o acórdão proferido por esta Turma, que, por unanimidade, assim deliberou
(Id. 107688884):
TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO AO SAT/GILRAT. DECRETO Nº 6.957/2009.
REENQUADRAMENTO DE ATIVIDADES ECONÔMICAS. DISCRICIONARIEDADE DA
ADMINISTRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO PELO PODER JUDICIÁRIO.
1. A Lei de Custeio da Seguridade Social (Lei nº 8.212/1991) prevê em seu art. 22, II, contribuição
previdenciária adicional a cargo das empresas para financiar os benefícios da aposentadoria
especial previstos nos arts. 57 a 58 da Lei nº 8.213/1991, bem como benefícios advindos de
incapacidade laboral por acidente de trabalho.
2. Foi estabelecida pela lei alíquotas de 1, 2 e 3%, consoante grau de risco (leve, médio, grave)
de acidente de trabalho da atividade desenvolvida, prevendo-se que o Ministério do Trabalho e da
Previdência Social poderia alterar, com base nas estatísticas de acidentes do trabalho, apuradas
em inspeção, o enquadramento de empresas para efeito da contribuição, a fim de estimular
investimentos em prevenção de acidentes (§3º).
3. Tal remissão a atos infralegais para efeito de determinação da alíquota aplicável foi
questionada pelos contribuintes sob o argumento de que feriria o princípio tributário da reserva
legal. Arguição esta que, todavia, foi afastada pelo Pretório Excelso, que assentou que a lei
definia satisfatoriamente a exação e que sua complementação por regulamento não ofendia a
Constituição.
4. Assim, o art. 22, §3º, da Lei nº 8.212/1991 atribuiu à Administração Pública o enquadramento
de empresas para efeito da contribuição ao SAT e essa delegação foi declarada constitucional
pelo STF.
5. Ressalte-se que o dispositivo legal em tela determina que a alteração do enquadramento da
empresa, em atenção às estatísticas de acidente de trabalho que reflitam investimentos
realizados na prevenção de sinistros, constitui ato atribuído pelo legislador exclusivamente ao
Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
6. Dessa forma, não cabe ao Poder Judiciário imiscuir-se no âmbito da discricionariedade da
Administração e determinar o enquadramento em grau de risco mais vantajoso. Não pode o
Poder Judiciário adentrar o mérito do ato administrativo e julgar se é adequado o grau de risco
atribuído pela Administração à atividade econômica da autora e às demais atividades que a
autora julga similares a sua. É evidente que a interpretação defendida pela parte interessada
extrapola o comando inserto no art. 22, § 3º, da Lei nº 8.212/91.
7. Apelação não provida. Honorários majorados.
Sustenta a embargante, em síntese, que o v. acórdão foi omisso quanto às seguintes
alegações:(i) Decreto nº 6.957/09 e seu insanável vício de competência; (ii) características da
contribuição ao SAT/RAT e a violação ao princípio da referibilidade; (iii) desvio de finalidade da
contribuição ora discutida; (iv) violação dos princípios do equilíbrio financeiro-atuarial, motivação e
publicidade dos atos administrativos.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5004544-67.2018.4.03.6119
RELATOR:Gab. 03 - DES. FED. HELIO NOGUEIRA
APELANTE: RITZ IGUATEMI BAR E LANCHES LTDA
Advogados do(a) APELANTE: LUIZ COELHO PAMPLONA - SP147549-A, EMELY ALVES
PEREZ - SP315560-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA (RELATOR):
São cabíveis embargos de declaração somente se a decisão judicial contiver pelo menos um dos
vícios trazidos pelo art. 1.022 do Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015) - antigo art.
535 do CPC de 1.973 - (EDcl no AgRg na Rcl 4855/MG, Rel. Min. PAULO DE TARSO
SANSEVERINO, DJE 25/04/2011; EDcl no AgRg no REsp 1080227/RS, Rel. Min. SIDNEI
BENETI, DJE 30/03/2011; EDcl no AgRg no REsp 1212665/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, DJe
de 28/03/2011; STF: Rcl 3811 MCAgRED, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJE
25/03/2011; AIAgRED 697928, Rel. Min. AYRES BRITTO, DJE 18/03/2011), não se apresentando
como via adequada para:
1) compelir o Juiz ou Tribunal a se debruçar novamente sobre a matéria já decidida, julgando de
modo diverso a causa, diante de argumentos "novos" (EDcl no REsp 976021/MG, Rel. Ministra
NANCY ANDRIGHI, DJE 02/05/2011; EDcl no AgRg no Ag 807.606/GO, Rel. Min. LUIS FELIPE
SALOMÃO, DJE 15/04/2011), ainda mais quando resta claro que as partes apenas pretendem "o
rejulgamento da causa, por não se conformarem com a tese adotada no acórdão" (EDcl no REsp
1219225/MG, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJE 15/04/2011; EDcl no AgRg no
REsp 845184/SP, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJE 21/03/2011; EDcl no MS 14124/DF,
Rel. Min. JORGE MUSSI, DJE 11/02/2011), sendo certo que a "insatisfação" do litigante com o
resultado do julgamento não abre ensejo a declaratórios (EDcl no AgRg nos EREsp 884621/RS,
Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJE 04/05/2011);
2) compelir o órgão julgador a responder a 'questionários' postos pela parte sucumbente, que não
aponta de concreto nenhuma obscuridade, omissão ou contradição no acórdão (EDcl no REsp
1098992/RS, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, DJE 05/05/2011; EDcl no AgRg na Rcl
2644/MT, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJE 03/03/2011);
3) fins meramente infringentes (AI 719801 ED, Rel. Ministra ELLEN GRACIE, DJe de 04/05/2011;
AgRg no REsp 1080227/RS, Rel. Min. SIDNEI BENETI, DJE 07/02/2011). A propósito, já decidiu
o STJ que "(...) a obtenção de efeitos infringentes nos aclaratórios somente é possível,
excepcionalmente, nos casos em que, reconhecida a existência de um dos defeitos elencados
nos incisos do mencionado art. 535, a alteração do julgado seja conseqüência inarredável da
correção do referido vício, bem como nas hipóteses de erro material ou equívoco manifesto, que,
por si sós, sejam suficientes para a inversão do julgado" (EDcl no AgRg no REsp 453718/MS,
Rel. Min. PAULO DE TARSO SANSEVERINO, DJE 15/10/2010);
4) resolver "contradição" que não seja "interna" (EDcl no AgRg no REsp 920.437/RS, Rel. Min.
PAULO DE TARSO SANSEVERINO, DJE 23/02/2011);
5) permitir que a parte "repise" seus próprios argumentos (RE 568749 AgR-ED, Rel. Ministra
ELLEN GRACIE, DJE 10/05/2011);
No caso, há omissão quanto à alegação de vício de competência.
Em suas razões de apelação, o contribuinte alegou que o Decreto nº 6.957/09 possui vício
insanável de competência, pois o art. 22, §3º, da Lei nº 8.212/91 atribui ao Ministério do Trabalho
e da Previdência Social a competência para a alteração do enquadramento das empresas – e não
ao Presidente da República -, pois este é o órgão que tem condições de apurar as estatísticas de
acidentes de trabalho.
A questões foi enfrentada da seguinte forma:
“Foi estabelecida pela lei alíquotas de 1, 2 e 3%, consoante grau de risco (leve, médio, grave) de
acidente de trabalho da atividade desenvolvida, prevendo-se que o Ministério do Trabalho e da
Previdência Social poderia alterar, com base nas estatísticas de acidentes do trabalho, apuradas
em inspeção, o enquadramento de empresas para efeito da contribuição, a fim de estimular
investimentos em prevenção de acidentes (§3º).
(...)
Assim, o art. 22, §3º, da Lei nº 8.212/1991 atribuiu à Administração Pública o enquadramento de
empresas para efeito da contribuição ao SAT e essa delegação foi declarada constitucional pelo
STF. In verbis:
"§ 3º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social poderá alterar, com base nas estatísticas
de acidentes do trabalho, apuradas em inspeção, o enquadramento de empresas para efeito da
contribuição a que se refere o inciso II deste artigo, a fim de estimular investimentos em
prevenção de acidentes"
Ressalte-se que o dispositivo legal em tela determina que a alteração do enquadramento da
empresa, em atenção às estatísticas de acidente de trabalho que reflitam investimentos
realizados na prevenção de sinistros, constitui ato atribuído pelo legislador ao Ministério do
Trabalho e da Previdência Social.”
Acrescente-se apenas que, por se tratar de órgão hierarquicamente superior ao Ministério do
Trabalho e da Previdência Social, a Presidência da República poderia ter regulamentado a
questão por meio de Decreto.
Com relação às características da contribuição ao SAT/RAT e à violação ao princípio da
referibilidade, ao desvio de finalidade da contribuição e aos princípios do equilíbrio financeiro-
atuarial, motivação e publicidade dos atos administrativos, acrescente-se que:
“A Lei de Custeio da Seguridade Social (Lei nº 8.212/1991) prevê em seu art. 22, II, contribuição
previdenciária adicional a cargo das empresas para financiar os benefícios da aposentadoria
especial previstos nos arts. 57 a 58 da Lei nº 8.213/1991, bem como benefícios advindos de
incapacidade laboral por acidente de trabalho.
Comumente era conhecida por contribuição ao Seguro Acidente de Trabalho (SAT); atualmente,
contribuição em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos
ambientais do trabalho - GILRAT.
Foi estabelecida pela lei alíquotas de 1, 2 e 3%, consoante grau de risco (leve, médio, grave) de
acidente de trabalho da atividade desenvolvida, prevendo-se que o Ministério do Trabalho e da
Previdência Social poderia alterar, com base nas estatísticas de acidentes do trabalho, apuradas
em inspeção, o enquadramento de empresas para efeito da contribuição, a fim de estimular
investimentos em prevenção de acidentes (§3º).
Tal remissão a atos infralegais para efeito de determinação da alíquota aplicável foi questionada
pelos contribuintes sob o argumento de que feriria o princípio tributário da reserva legal. Arguição
esta que, todavia, foi afastada pelo Pretório Excelso, que assentou que a lei definia
satisfatoriamente a exação e que sua complementação por regulamento não ofendia a
Constituição:
“CONSTITUCIONAL - TRIBUTÁRIO - CONTRIBUIÇÃO: SEGURO ACIDENTE DE TRABALHO -
SAT - LEI 7787/89, ARTS. 3º E 4º; LEI 8212/91, ART. 22, II, REDAÇÃO DA LEI 9732/98 -
DECRETOS 612/92, 2173/97 E 3048/99 - CF, ARTIGO 195, § 4º; ART. 154, II; ART. 5º, II; ART.
150, I.
1. Contribuição para o custeio do Seguro Acidente de Trabalho - SAT : Lei 7787/89, art. 3º, II; Lei
8212/91, art. 22, II: alegação no sentido de que são ofensivos ao art. 195, § 4º, c.c. art. 154, I, da
Constituição Federal: improcedência. Desnecessidade de observância da técnica da competência
residual da União, CF, art. 154, I. Desnecessidade de lei complementar para a instituição da
contribuição ao SAT .
2. O art. 3º, II, da Lei 7787/89 não é ofensivo ao princípio da igualdade, por isso que o art. 4º da
mencionada Lei 7787/89 cuidou de tratar desigualmente aos desiguais.
3. As Leis 7787/89, art. 3º, II, e 8212/91, art. 22, II, definem, satisfatoriamente, todos os
elementos capazes de fazer nascer a obrigação tributária válida. O fato de a lei deixar para o
regulamento a complementação dos conceitos de "atividade preponderante" e "grau de risco leve,
médio e grave" não implica ofensa ao princípio da legalidade genérica, CF, art. 5º, II, e da
legalidade tributária, CF, art. 150, I.
4. Se o regulamento vai além do conteúdo da lei, a questão não é de inconstitucionalidade, mas
de ilegalidade, matéria que não integra o contencioso constitucional.
(RE nº 343446, Tribunal Pleno, Relator Ministro Carlos Velloso, DJ 04/04/2003, pág. 01388)”
Outrossim, sua legalidade já foi afirmada pelo Superior Tribunal de Justiça, consoante se
dessume do enunciado da Súmula nº 351/STJ.
Ato contínuo, a Lei nº 10.666/2003 previu, em seu art. 10, a possibilidade de redução de até 50%
e majoração de até 100% dessas alíquotas, conforme dispusesse o regulamento, em razão do
desempenho da empresa em relação à respectiva atividade econômica, apurado em
conformidade com os resultados obtidos a partir dos índices de frequência, gravidade e custo,
calculados segundo metodologia aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social
(CNPS).
Tal previsão foi regulamentada pelo Decreto nº 6.042/2007, incluindo o art. 202-A no
Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/1999) que previu elemento denominado
Fator Acidentário de Prevenção (FAP).
O mesmo raciocínio do RE nº 343446 há de ser empregado com relação à aplicação do FAP.
Não há que se falar em inconstitucionalidade ou ilegalidade em razão da majoração da alíquota
se dar por critérios definidos em decreto. Todos os elementos essenciais à cobrança da
contribuição em tela encontram-se previstos em lei, não tendo o Decreto nº 6.957/09, extrapolado
os limites delineados no art. 22, inciso II, da Lei nº 8.212/91 e no art. 10 da Lei nº 10.666/03.
Ou seja, da mesma forma que o STF concluiu pela constitucionalidade e legalidade da definição
das alíquotas diferenciadas de 1%, 2% e 3% em função do grau de risco (leve, médio e grave),
através de critérios definidos em decreto regulamentar, é de se concluir também pela
constitucionalidade e legalidade da redução e majoração da alíquota, de 50% a 100%, em função
do desempenho da empresa, conforme critérios definidos no regulamento e metodologia apurada
pelo CNPS.
Deveras, dado seu caráter extremamente abstrato, não é possível ou desejável à lei adentrar em
caracteres técnicos particulares, ficando a cargo dos atos infralegais, observadas as diretrizes
legais, fixar os parâmetros relativos à análise de situações concretas.
Atento que, posteriormente, foi verificado que os parâmetros utilizados eram deficientes,
porquanto o quantum arrecadado para fins dos benefícios arrecadados era consideravelmente
inferior aos gastos acidentários da Previdência, sendo necessária novel metodologia que
efetivamente implementasse a equidade na forma de custeio e o equilíbrio atuarial do sistema, o
que ocorreu com o advento do Decreto nº 6.957/2009, que definiu o FAP como multiplicador
variável num intervalo contínuo de cinco décimos (0,5000) a dois inteiros (2,0000) - art. 202-A,
§1º, do RPS.
E nem se alegue o aumento da quantidade de acidentes de trabalho a partir da implementação da
nova sistemática. Tal se deve ao fato de que a regulamentação anterior era prementemente
baseada na Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), documento pelo qual o empregador
notifica acidente de trabalho ou de trajeto e doença ocupacional.
Muito embora as sociedades empresárias tivessem obrigação de comunicar tais sinistros até o
primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, sob pena de multa
(arts. 286 e 336 do RPS), mesmo assim, para evitar a majoração de suas alíquotas, observava-se
uma subnotificação dos empregadores quanto a tais acontecimentos.
Aperfeiçoando tal modelo, a novel sistemática (Resolução CNPS n. 1.308, de 27.5.2009, alterada
em seu Anexo I pela Resolução MPS/CNPS n. 1.316, de 31.5.2010) tem como base, além da
CAT, registros de concessão de benefícios acidentários que constam nos sistemas
informatizados do INSS, concedidos a partir de abril de 2007, sob a nova abordagem dos nexos
técnicos aplicáveis pela perícia médica da autarquia, destacando-se aí o Nexo Técnico
Epidemiológico Previdenciário NTEP.
Este está previsto no art. 21-A da Lei nº 8.213/1991, que prevê que a perícia médica do INSS
considerará caracterizada a natureza acidentária da incapacidade quando constatar ocorrência de
nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade
da empresa ou do empregado doméstico e a entidade mórbida motivadora da incapacidade
elencada na Classificação Internacional de Doenças (CID), em conformidade com o que dispuser
o regulamento.
Ressalte-se que os empregadores podem insurgir-se contra o estabelecimento do Nexo, dentro
dos prazos dispostos na Instrução Normativa INSS/PRES nº 31, de 10 de setembro de 2008.
Adicionalmente, a metodologia utiliza dados populacionais empregatícios registrados no Cadastro
Nacional de Informações Social - CNIS, e a expectativa de sobrevida do segurado a partir da
tábua completa de mortalidade construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística - IBGE.
Assim, a insurgência apresentada pela parte impetrante que, como parte considerável dos
contribuintes, teve sua alíquota incrementada, é, na verdade, contra o fato de que a nova
sistemática tem um campo de dados muito mais abrangente, que lhe permite verificar a situação
real de cada empresa, diferentemente do que ocorria no passado, em que era muito mais fácil
mascarar os números reais de acidentes.
O cálculo para aferimento do FAP utiliza-se dos percentis de frequência, gravidade e custo, por
Subclasse da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE 2.0), de maneira a
compor uma classificação do índice composto desses três fatores.
Por fim, após esse processo, é averiguado se a Taxa de Mortalidade no setor está acima da
média nacional ou se a Taxa de Rotatividade é superior a 75% (dobro da média nacional), caso
em que é majorada de 1 a 2% a alíquota do CNAE.
Como se observa, o cálculo foi objetivo e embasado em uma ampla rede de dados públicos,
afastando-se a pecha de qualquer arbitrariedade.
Advirto que o princípio da igualdade na sua concepção material - ínsita aos direitos fundamentais
denominados de segunda geração -, adotada pela Constituição, não significa impossibilidade de
tratamento díspar na ótica individualista liberal, mas sim o conceito aristotélico de tratar
diferentemente os desiguais. O que o art. 5º da Constituição veda são perseguições e
discriminações odiosas, i.e., sem que não haja pertinência lógica entre o fator de discrímen
escolhido pela norma e a finalidade para qual se propõe (Cf. Celso Antônio Bandeira de Mello, O
Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade).
A igualdade de todos em relação a todas as posições jurídicas não produziria apenas normas
incompatíveis com sua finalidade, sem sentido e injustas; ela também eliminaria as condições
para o próprio exercício da competência legislativa.
A sistemática adotada consubstancia o princípio da equidade na forma de participação do custeio
da Seguridade Social, conforme estabelece o inciso V do parágrafo único do artigo 194 da
Constituição Federal, bem como a consolidação dos princípios da proporcionalidade e do
equilíbrio atuarial.
Tem, além do mais, escopo extrafiscal de fortalecer a prevenção dos acidentes e doenças do
trabalho, robustecendo as políticas públicas a fim de se alcançar avanços maiores rumo às
melhorias ambientais no trabalho e à maior qualidade de vida para todos os trabalhadores do
país.
Em outras palavras, há um suporte empírico para a diferenciação, que é um elemento pertinente
com a finalidade normativa, e o elemento indicativo da medida de comparação possui uma
relação causal estatisticamente fundada com a medida de comparação (cf. Humberto Ávila,
Teoria da Igualdade Tributária, 3ª ed., pg.47-48).
Quanto à publicidade dos dados estatísticos constantes do Anexo V, do Decreto nº 3.048/99, com
as alterações do Decreto nº 6.042/07, e posteriormente do Decreto nº 6.958/09, observo que a
metodologia de cálculo do FAP foi aprovada pelo Conselho Nacional de Previdência Social
(CNPS), órgão paritário, através das Resoluções nºs 1.308/09 e 1.309/09, sendo os "percentis"
de cada um dos elementos gravidade, frequência e custo, por Subclasse, divulgado
originariamente pela Portaria Interministerial MF/MPS nº 254, de 24 de setembro de 2009.
Desde então, Portaria anual respectiva torna públicos os índices que serão utilizados no ano
seguinte (a atual é a Portaria nº 390 do MF, de 28 de setembro de 2016).
Ainda, publica-se anualmente no Diário Oficial da União os róis dos percentis, além de divulgar-se
na rede mundial de computadores a discriminação dos elementos que compõem o FAP de cada
contribuinte, o que permite aos mesmos a verificação de correção da alíquota aplicada, bem
como sua performance relativamente à sua Subclasse (art. 202-A, §5º, do Decreto nº 3.048/99).
Adicionalmente, permite-se impugnação administrativa do Fator atribuído (art. 202-B), por meio
de petição eletrônica, disponibilizada nos sítios da Previdência Social e da Receita Federal do
Brasil, durante prazo estabelecido na Portaria do ano, cabendo, outrossim, recurso da decisão
respectiva.
Por conseguinte, há um amplo acesso dos empregadores aos dados utilizados e possibilidade de
correção por defesa, mostrando-se, assim, desarrazoada afirmação genérica de aumento
arbitrário, sem sequer trazer aos autos a ampla gama de dados disponibilizados.
Não há que se falar, ainda, na necessidade de divulgação dos dados individuais para todos os
outros contribuintes, uma vez que tal exigência encontra óbice no art. 198 do CTN que veda a
divulgação de informações sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de
terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades.
A insatisfação manifestada pelos contribuintes, em confronto com os elementos indicativos
apresentados órgãos governamentais, tornam indispensáveis o oferecimento de elementos
probatórios - o que restou desatendido -, ressaltando-se que a inclusão de acidentes in itinere no
cálculo do FAP encontra respaldo no art. 21, IV, "d" da Lei nº 8.213/91 (Ac
00022601520104036100, Desembargadora Federal Ramza Tartuce, Quinta Turma, E-DJF3
Judicial 1 Data: 25/09/2012; Ac: 1058 Sp 0001058-32.2012.4.03.6100, Relator: Juiz Convocado
Paulo Domingues, Data de Julgamento: 27/08/2013, Primeira Turma).
Advirta-se, nesse viés, que o STJ já decidiu que as insurreições dos contribuintes contra a
metodologia de cálculo não encontram no mandado de segurança o instrumento indicado ante a
necessidade de dilação probatória:
“3. Os procedimentos em torno do cálculo do Fator Acidentário de Prevenção e os critérios
professados pela impetrante demandam dilação probatória, inclusive com prova pericial,
impossível de realização na estreita via do mandado de segurança. Precedentes da 1ª Seção.
(MS 13.448/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
22/05/2013, DJe 31/05/2013)”
Ressalto que, embora o CNPS, em 17.11.2016, tenha aprovado alterações no cálculo do FAP -
inclusive para excluir do cômputo os acidentes de trajeto -, tal, por disposição expressa, apenas
tem aplicabilidade para as contribuições a partir de 2018. Princípio da irretroatividade tributária,
devendo as exações serem auferidas consoante a legislação (art. 96, CTN) vigente quando do
fato gerador.
Observe-se que no sentido da constitucionalidade e legalidade da aplicação do fator acidentário
de prevenção (FAP) já se fixou o entendimento desta Corte: AI 2010.03.00.002250-3, Rel. Des.
Fed. Henrique Herkenhoff, Segunda Turma, j. 06/04/2010, DJF3 15/04/2010; AG nº 0002472-
03.2010.4.03.0000 / SP, 5ª Turma, Relatora Desembargadora Federal Ramza Tartuce, j.
03/05/2010; AMS 00162247520104036100, DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM
GUIMARÃES, SEGUNDA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/05/2013; AMS
00195799320104036100, DESEMBARGADOR FEDERAL PEIXOTO JUNIOR, SEGUNDA
TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/12/2014; AC 00027760520104036110, DESEMBARGADOR
FEDERAL MARCELO SARAIVA, PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/12/2014; AC
00034507120064036126, DESEMBARGADORA FEDERAL CECILIA MELLO, DÉCIMA
PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:30/09/2014.”
Como se vê, analisando a contribuição ao SAT dentro do contexto do multiplicador FAP, verifica-
se que não há ofensa a princípios constitucionais. Em verdade, toda a metodologia criada buscou
concretizar os mandamentos constitucionais e viabilizar a aferição da situação de cada empresa
em relação à prevenção de acidentes.
Assim, é manifesto o intuito do embargante de promover nova discussão sobre a matéria, o que
deve ocorrer por meio da via recursal adequada, e não pela via dos embargos de declaração.
Não passa de mera manifestação de inconformismo, sendo clara a intenção, em via transversa,
de modificar o julgado, o que é inviável em sede de embargos de declaração.
Não se conformar com a exegese dos dispositivos que orientaram a conclusão judicial não a
torna omissa ou contraditória, pois, tendo apreciado as questões controvertidas, conferindo-lhes o
enquadramento adequado, o julgado cumpriu seu escopo.
Os demais argumentos aduzidos no recurso do qual foi tirado os presentes embargos de
declaração não têm o condão de modificar, nem mesmo em tese, o acórdão combatido, de vez
que aqueles de maior relevância à elucidação do julgado foram devidamente apreciados (artigo
1022, parágrafo único, inciso II, do CPC/2015).
Saliento que não há de se confundir fundamentação concisa com a ausência dela, não se
exigindo do juiz a análise pormenorizada de cada uma das argumentações lançadas pelas partes,
podendo ele limitar-se àquelas de relevância ao deslinde da causa, atendendo, assim, ao
princípio basilar insculpido no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal. Nesse sentido a Corte
Suprema já pacificou o tema, ao apreciar o AI nº 791.292, em sede de repercussão geral, de
relatoria do Ministro Gilmar Mendes, em julgamento do Plenário em 23.06.2010.
Por fim, assente-se que, nos termos do artigo 1025 do Novo Código de Processo Civil, a
interposição dos embargos de declaração implica, tacitamente, no pré-questionamento da
matéria, sendo desnecessária a sua expressa menção.
Ante o exposto, acolho os embargos de declaração apenas para sanar a omissão apontada, sem
conferir-lhes efeitos infringentes.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO VERIFICADA.
ACOLHIMENTO SEM EFEITOS INFRINGENTES.
1. Há omissão quanto à alegação de vício de competência. Em suas razões de apelação, o
contribuinte alegou que o Decreto nº 6.957/09 possui vício insanável de competência, pois o art.
22, §3º, da Lei nº 8.212/91 atribui ao Ministério do Trabalho e da Previdência Social a
competência para a alteração do enquadramento das empresas – e não ao Presidente da
República -, pois este é o órgão que tem condições de apurar as estatísticas de acidentes de
trabalho. Acrescente-se apenas que, por se tratar de órgão hierarquicamente superior ao
Ministério do Trabalho e da Previdência Social, a Presidência da República poderia ter
regulamentado a questão por meio de Decreto.
2. Com relação às características da contribuição ao SAT/RAT e à violação ao princípio da
referibilidade, ao desvio de finalidade da contribuição e aos princípios do equilíbrio financeiro-
atuarial, motivação e publicidade dos atos administrativos, acrescente-se trechos. Analisando a
contribuição ao SAT dentro do contexto do multiplicador FAP, verifica-se que não há ofensa a
princípios constitucionais. Em verdade, toda a metodologia criada buscou concretizar os
mandamentos constitucionais e viabilizar a aferição da situação de cada empresa em relação à
prevenção de acidentes.
3. A interposição dos embargos de declaração implica, tacitamente, no pré-questionamento da
matéria, sendo desnecessária a sua expressa menção (art. 1.025 do CPC).
4. Embargos de declaração acolhidos apenas para sanar a omissão apontada, sem conferir-lhes
efeitos infringentes. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, por unanimidade, acolheu
os embargos de declaração apenas para sanar a omissão apontada, sem conferir-lhes efeitos
infringentes, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
