
| D.E. Publicado em 14/05/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar suscitada e, em juízo rescindendo, julgar improcedente a presente ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0002658-55.2012.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta por JOÃO SAMUEL DA SILVA ALVES em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com fundamento no artigo 485, V, VII e IX, do CPC/1973, objetivando rescindir acórdão proferido pela 8ª Turma deste e. Tribunal, a fim de que lhe seja concedida aposentadoria por idade rural, desde a data de entrada do requerimento administrativo.
Aduziu que o julgado rescindendo violou disposição literal do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, eis que, no seu entender, o conjunto probatório formado nos autos da demanda subjacente seria suficiente à comprovação da atividade rural exercida pelo período de carência, independentemente de curto período de atividade considerada urbana. Ainda, juntou documentos novos a fim de reiterar e complementar o conjunto probatório da ação subjacente para comprovação de seu alegado direito ao benefício.
Sustentou, também, a ocorrência de erro de fato no julgado rescindendo, por não ter sido considerada a atividade rural indicada em certidão eleitoral supostamente extraviada dos autos durante o processamento do feito em 1ª Instância.
Em atenção à determinação de fl. 67, o autor complementou peças que instruíram a inicial (fls. 69-77).
À fl. 79, foram concedidos ao autor os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Citado (fls. 83-84), o réu apresentou contestação e documentos, às fls. 86-107, alegando, em preliminar, a ausência de interesse de agir e, no mérito, a inexistência de violação à lei, erro de fato ou documento novo.
O autor ofereceu réplica (fl. 111-112).
Oportunizada a apresentação de razões finais (fl. 114), as partes se manifestaram às fls. 116 e 118-136.
O Ministério Público Federal opinou pela improcedência da ação rescisória (fls. 138-142).
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, verifico que a presente demanda foi ajuizada em 02.02.2012, observado o prazo decadencial previsto no artigo 495 do CPC/1973, dada o trânsito em julgado no processo originário ocorrido em 27.07.2010 (fl. 36).
Rejeito a preliminar de ausência de interesse de agir, relativa à inadequação da via eleita para rediscussão do quadro fático da lide subjacente, por se confundir com o mérito da demanda rescisória.
O autor fundamenta a ação rescisória no artigo 485, V, VII e IX, do CPC/1973, alegando violação à disposição literal do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, eis que, no seu entender, o conjunto probatório formado nos autos da demanda subjacente seria suficiente à comprovação da atividade rural exercida pelo período de carência, independentemente de curto período de atividade considerada urbana. Ainda, juntou documentos novos a fim de reiterar e complementar o conjunto probatório da ação subjacente para comprovação de seu alegado direito ao benefício. Sustentou, também, a ocorrência de erro de fato no julgado rescindendo, por não ter sido considerada a atividade rural indicada em certidão eleitoral supostamente extraviada dos autos durante o processamento do feito em 1ª Instância.
Nascido em 28.07.1943 (fl. 24), o autor postulou na ação subjacente, ajuizada em 20.10.2006 (fl. 70v), a concessão de aposentadoria por idade rural desde a data da citação, mediante o reconhecimento de sua condição de trabalhador rural, na qualidade de diarista (fl. 71v).
Por ter completado a idade mínima necessária em 2003, deveria comprovar o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou ao requerimento do benefício, equivalente à carência, no caso, de 132 (cento e trinta e dois) meses, ou seja, entre 1992 e 2003.
Juntaram àqueles autos como prova material apenas a certidão de seu casamento, ocorrido em 20.04.1968, em que constou qualificado como "lavrador" (fl. 46), conforme mencionado naquela inicial, à fl. 71v.
Foram tomados depoimentos do autor e de suas testemunhas, em 24.01.2008 (fls. 41-45).
No termo de audiência (fls. 37-40), consta que foi deferida "a juntada do documento obtido junto ao Juízo da 27ª Zona Eleitoral exibido nessa audiência, independente de abertura de vista para que o INSS sobre ele se manifeste", tendo em vista que o representante legal da autarquia, embora ausente, fora intimado para comparecimento à audiência.
Ressalto que não consta cópia integral dos autos da demanda subjacente, não sendo possível averiguar o conteúdo da certidão mencionada. Não obstante, tal documento não é citado na sentença prolatada.
Em 1ª Instância, o pedido foi julgado procedente (fls. 37-40), sentença reformada em 2º grau de jurisdição, dando-se provimento à apelação autárquica para julgar improcedente o pedido, conforme decisão monocrática proferida pelo Desembargador Federal Newton De Lucca (fls. 58-63, da qual destaco o seguinte:
Ao agravo interposto pelo autor foi negado provimento, conforme acórdão unânime proferido pela 8ª Turma desta Corte (fls. 27-35) e, sem interposição de outros recursos pelas partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 27.07.2010 (fl. 36).
Para o reconhecimento de erro de fato, hábil à rescisão da coisa julgada na forma do artigo 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, exige-se que, sem que tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva para a conclusão do decidido.
Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo.
Nesse sentido, encontra-se sedimentada a jurisprudência dos Tribunais superiores e desta Corte:
Aduziu o autor a ocorrência de erro de fato no julgado rescindendo, decorrente de suposta inobservância de documento exibido em audiência, que, no seu entender, comprovaria o exercício da atividade rural durante o período em que reconhecido o exercício de atividade de natureza urbana.
Inicialmente, destaco que não foi apresentada cópia integral dos autos da demanda subjacente, de sorte que sequer restou viabilizada a cognição, nesta via rescisória, da alegada ocorrência de "extravio" do documento cuja juntada aos autos foi determinada em audiência.
Ressalto consistir ônus processual do autor a instrução do feito com todo o necessário para comprovação de suas alegações, sendo intransponível o óbice relativo ao transcurso do lapso decadencial bienal para ajuizamento da ação rescisória, com inicial apta à instauração da relação processual de forma plena e garantidora do necessário contraditório, sendo incabível o aditamento da inicial após a preclusão temporal (confira-se: STF, Pleno, AgR/AR 1967, relator Ministro Marco Aurélio, v.u., DJe 12.06.2014).
Não obstante, afigura-se-me que não houve mera desconsideração do documento, este apenas não foi expressamente citado.
Extrai-se da decisão monocrática, confirmada no acórdão rescindendo, que "os indícios de prova material, singularmente considerados, não são, por si sós, suficientes para formar a convicção do magistrado" (g.n.), isto é, além da certidão de casamento, expressamente mencionada na decisão monocrática, outros documentos teriam instruído o feito, ainda que insuficientes à comprovação do alegado.
Registro que a própria sentença de procedência, proferida na indigitada audiência, não faz menção ao tal "documento obtido junto ao Juízo da 27ª Zona Eleitoral" para o fim de fixar a existência da prova material indiciária do labor campesino, referindo-se tão somente à certidão de casamento, razão pela qual não há sequer como inferir que dele constaria qualquer indicação do exercício de atividade rural:
Destaco que, mesmo ao analisar a existência de vínculo de natureza urbana, o juízo de 1º grau também não faz menção à certidão eleitoral, a qual, segundo ora pugna o autor, faria prova do exercício de mourejo rural no período.
Ademais, ainda que constasse dos autos da demanda subjacente a informação registrada na certidão eleitoral juntada nesta via rescisória (fls. 49-50), de que em 18.09.1986 ter-se-ia declarado como "trabalhador rural", tal documento não descaracterizaria a conclusão do julgado rescindendo. É que a atividade de caseiro, embora possua natureza jurídica urbana por se tratar de vínculo de empregado doméstico, ao leigo seria facilmente capitulável como lida campesina, daí a declaração feita à justiça eleitoral não constituir sequer prova inequívoca do exercício de atividade tida como rural no período.
Não é demais lembrar, também, que a natureza da atividade de caseiro, se urbana ou rural, é matéria controversa até os dias atuais, não sendo desprovida de motivação ou razoabilidade, a conclusão que se formou no julgado rescindendo.
Há que se ponderar que a atividade de empregado doméstico perdurou até 1987, razão pela qual resta hígida a conclusão do julgado rescindendo, no sentido de que o conjunto probatório não se revelava suficientemente coeso para o fim da concessão do benefício, ressaltando-se, insluvive, a inexistência de início de prova material de atividade rural exercida no período de carência, entre 1992 e 2003, conforme acima mencionado.
Desse modo, não reconheço a alega existência de erro de fato.
A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta (confira-se: STJ, S1, AR 4264, relator Ministro Humberto Martins, DJe 02.05.2016).
Ressalto que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento, objeto do enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais".
Para que seja possível a rescisão do julgado por violação literal de lei decorrente de valoração da prova, esta deve ter sido de tal modo desconexa que resulte em pungente ofensa à norma vigente ou em absoluto descompasso com os princípios do contraditório ou da ampla defesa.
Embora reconhecida a existência de início de prova material do labor campesino, representada pela certidão de casamento realizado em 20.04.1968, não foi considerado comprovado o exercício da atividade rural pelo período de carência (entre 1992 e 2003) em razão do exercício de atividade de natureza urbana entre 1985 e 1987, inviabilizando, assim, a extensão da eficácia probatória daquele documento para período posterior ao vínculo de empregado doméstico
A atividade de empregado doméstico, inclusive como caseiro, tem natureza urbana, independentemente da eventual prestação do serviço em imóvel localizado na zona rural. Nesse sentido:
Ainda que se reconheça a existência de posicionamento divergente quanto à natureza jurídica da atividade de caseiro em imóvel rural, seria incabível a rescisão do julgado, atraindo-se o enunciado de Súmula STF n.º 343.
Destaco, também, que, embora a perda da qualidade de segurado não seja óbice à aposentação por idade, tal como expresso no artigo 3º, § 1º, da Lei n.º 10.666/03, bem como no artigo 102 da Lei n.º 8.213/91, desde sua redação original e de acordo com a atual redação dada pela Lei n.º 9.528/97, no caso dos trabalhadores rurais, cujo tempo de serviço é contado independentemente de efetiva contribuição, sempre se exigiu o exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, ou implementação do requisito etário, e pelo tempo equivalente à carência (artigo 48 da Lei n.º 8.213/91, desde sua redação original até sua atual redação dada pela Lei n.º 11.718/08).
Dessa forma, não reconheço violação à literal disposição de lei no julgado, uma vez que houve apreciação do conjunto probatório, o qual foi valorado pelo Juízo originário segundo seu livre convencimento, de forma motivada e razoável, tendo sido adotado uma solução jurídica, dentre outras, admissível.
Assim, o julgado rescindendo não se afastou dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época.
A excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas. Nesse sentido, confira-se precedentes desta 3ª Seção:
Em relação à possibilidade de rescisão da coisa julgada em decorrência de documento novo, tem-se que a prova material nova deve ser, por si só, suficiente para modificar o julgado rescindendo, ainda que de forma parcial.
Não se objetiva reabrir a dilação probatória para, simplesmente, suprir deficiência do conjunto probatório produzido na ação originária, decorrente da não observância pela parte, por desídia ou negligência, de seu ônus processual probatório, mas, sim, viabilizar a apresentação de prova material nova, cuja existência a parte ignorava ou de que não podia fazer uso, bem como, em casos excepcionais, documento cujo valor probatório era desconhecido pela parte em razão de circunstâncias vulnerabilizantes, como aquelas vivenciadas por trabalhadores rurais.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:
Como documentos novos, o autor juntou:
1) certidões de nascimento de seus filhos, ocorridos em 23.09.1971, 12.11.1976, 27.12.1981, em que constou qualificado como "lavrador" (fls. 52-54);
2) certidões eleitorais, emitidas em 23.08.2011, em que consta ter se declarado "trabalhador rural" por ocasião do cadastro eleitoral em 18.09.1986 (fls. 49-50).
No que tange às certidões indicadas no item 2, conforme assentado anteriormente quanto à alegada ocorrência de erro de fato, já constavam dos autos da demanda subjacente e, ainda que assim não fosse, não descaracterizaria a existência de vínculo de natureza jurídica urbana no período.
Ainda que observados os parâmetros de razoabilidade que norteiam a solução pro misero e aceita a tese da sua novidade, os documentos elencados no item 1 também não seriam suficientes à inversão do resultado do julgamento.
Tem-se como fundamento determinante no julgado rescindendo, que levou à improcedência do pedido na ação subjacente, o exercício de atividade de natureza urbana entre 1985 a 1987, de sorte que não restou comprovada a lida campesina no período de carência (entre 1992 e 2003), situação esta que não sofre alteração alguma com a juntada de documentos indicativos do mourejo rural no período anterior a 1985.
Desse modo, também não reconheço a existência de documento novo para fins de rescisão da coisa julgada.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar suscitada e, em iudicium rescindens, julgo improcedente a presente ação rescisória, nos termos dos artigos 269, I, do CPC/1973 e 487, I, do CPC/2015.
Custas na forma da lei.
Condeno o autor no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade das verbas honorárias devidas ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
É como voto.
Desembargador Federal
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