D.E. Publicado em 14/09/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do réu, ao recurso adesivo do autor e à remessa oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006215-97.2011.4.03.6139/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual busca a parte autora a declaração de períodos de trabalho especial, para fins de concessão de aposentadoria especial ou, na impossibilidade, a conversão do tempo em comum para fins de expedição de certidão de tempo de contribuição.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido apenas para averbar como tempo de serviço especial, sob o coeficiente de 1,40, os lapsos de 9/1/1978 a 18/2/1978, de 21/6/1980 a 31/1/1981, de 1/2/1981 a 4/1/1982, de 11/3/1985 a 31/5/1985, de 1/6/1985 a 30/11/1987, de 1/12/1987 a 13/2/1995 e de 24/1/2001 a 19/3/2009; fixou a sucumbência recíproca, porém, deixou de anotar o reexame necessário.
Inconformada, apela a Autarquia. Sustenta, fundamentalmente, a impossibilidade de conversão do tempo especial na condição de estatutário, exorando a extinção dessa pretensão; defende, ainda, a insuficiência do conjunto probatório à comprovação do labor insalubre reconhecido. Ao final, prequestionou a matéria para efeitos recursais.
A parte autora aviou recurso adesivo, requerendo (i) o reconhecimento do período afastado pelo julgado, de 21/7/1982 a 31/10/1982 e de 1/11/1982 a 6/10/1983; (ii) a extinção de todo período de labor em regime estatutário junto à Prefeitura de Buri/SP; (iii) a implantação da aposentadoria especial ou (iv) a expedição de CTS.
Com contrarrazões, os autos subiram a esta Egrégia Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço dos recursos manejados pelas partes, porque presentes os requisitos de admissibilidade.
Considerando que a r. sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não se aplicam as novas regras previstas no artigo 496 e §§ do Novo CPC.
Deste modo, apesar de ter sido proferida a sentença após a vigência da alteração do artigo 475, § 2º, do Código de Processo Civil pela Lei n. 10.352/2001, que afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação for inferior a 60 (sessenta) salários-mínimos, conheço da remessa oficial, por não haver valor certo a ser considerado, na forma da Súmula n. 490 do STJ.
Preambularmente, cumpre atender o pleito recursal de ambas as partes de extinção do pedido de enquadramento dos vínculos de trabalho insalutífero exercidos no regime estatutário junto à Municipalidade de Buri/SP: de 5/10/1995 a 23/1/2001, de 24/1/2001 a 19/3/2009 e de 20/3/2009 a 21/7/2010.
Passo, então, à análise das demais questões trazidas a julgamento.
Do enquadramento de período especial
Editado em 3 de setembro de 2003, o Decreto n. 4.827 alterou o artigo 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048, de 6 de maio de 1999, o qual passou a ter a seguinte redação:
Por conseguinte, o tempo de trabalho sob condições especiais poderá ser convertido em comum, observada a legislação aplicada à época na qual o trabalho foi prestado. Além disso, os trabalhadores assim enquadrados poderão fazer a conversão dos anos trabalhados a "qualquer tempo", independentemente do preenchimento dos requisitos necessários à concessão da aposentadoria.
Ademais, em razão do novo regramento, encontram-se superadas a limitação temporal, prevista no artigo 28 da Lei n. 9.711/98, e qualquer alegação quanto à impossibilidade de enquadramento e conversão dos lapsos anteriores à vigência da Lei n. 6.887/80.
Nesse sentido, reporto-me à jurisprudência firmada pelo Colendo STJ:
Cumpre observar que antes da entrada em vigor do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997, regulamentador da Lei n. 9.032/95, de 28 de abril de 1995, não se exigia (exceto em algumas hipóteses) a apresentação de laudo técnico para a comprovação do tempo de serviço especial, pois bastava o formulário preenchido pelo empregador (SB-40 ou DSS-8030), para atestar a existência das condições prejudiciais.
Contudo, tem-se que, para a demonstração do exercício de atividade especial cujo agente agressivo seja o ruído, sempre houve necessidade da apresentação de laudo pericial, independentemente da época de prestação do serviço.
Nesse contexto, a exposição superior a 80 decibéis era considerada atividade insalubre até a edição do Decreto n. 2.172/97, que majorou o nível para 90 decibéis. Isso porque os Decretos n. 83.080/79 e n. 53.831/64 vigoraram concomitantemente até o advento do Decreto n. 2.172/97.
Com a edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003, o limite mínimo de ruído para reconhecimento da atividade especial foi reduzido para 85 decibéis (art. 2º do Decreto n. 4.882/2003, que deu nova redação aos itens 2.0.1, 3.0.1 e 4.0.0 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto n. 3.048/99).
Quanto a esse ponto, à míngua de expressa previsão legal, não há como conferir efeito retroativo à norma regulamentadora que reduziu o limite de exposição para 85 dB(A) a partir de novembro de 2003.
Nesse sentido, o C. STJ, ao julgar o Recurso Especial o n. 1.398.260, sob o regime do artigo 543-C do CPC, consolidou entendimento acerca da inviabilidade da aplicação retroativa do decreto que reduziu o limite de ruído no ambiente de trabalho (de 90 para 85 dB) para configuração do tempo de serviço especial (julgamento realizado em 14/5/2014).
A propósito, ainda, da comprovação do tempo de serviço prestado em condições especiais, sob a égide dos Decretos n. 53.831, de 25 de março de 1964, e 83.080, de 24 de janeiro de 1979, o enquadramento das atividades ocorria dava-se por grupos profissionais e pelo rol dos agentes nocivos. Assim, se a categoria profissional à qual pertencesse o segurado se encontrasse entre aquelas descritas nos anexos dos decretos, a concessão de aposentadoria especial, caso houvesse satisfação de todos os requisitos legais, independeria de comprovação da efetiva exposição aos agentes nocivos, exceto para a exposição a ruídos e calor, que sempre exigiu prova pericial. Nessa diretriz, para comprovação das atividades exercidas pelo segurado, foi criado o formulário "SB 40", no qual constavam as atividades especiais exercidas, bem como suas especificações.
Em relação ao EPI, cumpre tecer algumas considerações.
Com a edição da Medida Provisória n. 1.729/98 (convertida na Lei n. 9.732/98), foi inserida na legislação previdenciária a exigência de informação, no laudo técnico de condições ambientais do trabalho, quanto à utilização do Equipamento de Proteção Individual (EPI).
Desde então, com base na informação sobre a eficácia do EPI, a autarquia deixou de promover o enquadramento especial das atividades desenvolvidas posteriormente a 3/12/1998.
Sobre a questão, entretanto, o C. Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o ARE n. 664.335, em regime de repercussão geral, decidiu que: (i) se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo ao enquadramento especial; (ii) havendo, no caso concreto, divergência ou dúvida sobre a real eficácia do EPI para descaracterizar completamente a nocividade, deve-se optar pelo reconhecimento da especialidade; (iii) na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites de tolerância, a utilização do EPI não afasta a nocividade do agente.
Quanto a esses aspectos, sublinhe-se o fato de que o campo "EPI Eficaz (S/N)" constante no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) é preenchido pelo empregador considerando-se, tão somente, se houve ou não atenuação dos fatores de risco, consoante determinam as respectivas instruções de preenchimento previstas nas normas regulamentares. Vale dizer: essa informação não se refere à real eficácia do EPI para descaracterizar a nocividade do agente.
In casu, quanto aos lapsos vindicados como celetista, de 9/1/1978 a 18/2/1978, de 21/6/1980 a 31/1/1981, de 1/2/1981 a 4/1/1982, de 11/3/1985 a 31/5/1985, de 1/6/1985 a 30/11/1987 e de 1/12/1987 a 13/2/1995, constam formulários padrão e laudos, que apontam exposição da parte autora - de forma habitual e permanente - a níveis de ruído de 90 dB, superiores aos limites de tolerância para a época de prestação do serviço, cujo fato permite o enquadramento no código 1.1.6 do anexo ao Decreto n. 53.831/64.
Entrementes, a parte autora não logrou haurir elementos elucidativos à prova da atividade especial, como "braçal" e "resineiro", nos intervalos de 21/7/1982 a 31/10/1982 e de 1/11/1982 a 6/10/1983, respectivamente.
Nesse diapasão, a simples sujeição às intempéries da natureza, contato com animais peçonhentos e manipulação com defensivos agrícolas não é suficiente a caracterizar a lida como insalubre ou perigosa.
Lembrando que não basta a mera alusão de exposição ao agente nocivo, mas sim que haja a demonstração da efetiva potencialidade lesiva a prejudicar a saúde do trabalhador e lhe proporcionar uma redução do tempo de serviço, diante das condições peculiares sobre as quais o labor é prestado.
Assim, a parte autora deixou de carrear elementos elucidativos suficientes a patentear o labor especial, com habitualidade e permanência, de modo que deve ser considerado como tempo comum.
Apenas os interstícios de 9/1/1978 a 18/2/1978, de 21/6/1980 a 31/1/1981, de 1/2/1981 a 4/1/1982, de 11/3/1985 a 31/5/1985, de 1/6/1985 a 30/11/1987 e de 1/12/1987 a 13/2/1995 devem ser confirmados como especiais, convertidos em comum sob o fator de 1,40, e somados aos demais incontroversos para efeito de expedição de CTC, haja vista que a parte autora não atinge tempo de serviço suficiente à concessão da aposentadoria especial.
Passo à análise da questão referente aos honorários de advogado à luz do direito processual intertemporal.
"Em caso de sucumbência recíproca, deverá ser considerada proveito econômico do réu, para fins do art. 85, § 2º, do CPC/2015, a diferença entre o que foi pleiteado pelo autor e o que foi concedido, inclusive no que se refere às condenações por danos morais." (Enunciado n° 14 aprovado pela ENFAM), sendo vedada a compensação na forma do § 14 do mesmo artigo.
Contudo, a despeito da sucumbência recíproca verificada in casu, deixo de condenar ambas as partes a pagar honorários ao advogado, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC, isso para evitar surpresa à parte prejudicada, aplicando-se o mesmo entendimento da jurisprudência concernente à não aplicação da sucumbência recursal.
De fato, considerando que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, não incide ao presente caso a regra de seu artigo 85, §§ 1º a 11º, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal.
Nesse diapasão, o Enunciado Administrativo nº 7 do STJ, in verbis: "Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC."
De todo modo, como a questão dos honorários de advogado envolve direito substancial, deve ser observada a legislação vigente na data da publicação da sentença, porquanto pertinente ao caso a regra do artigo 6º, caput, da LINDB.
Em relação à parte autora, é suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser beneficiária da justiça gratuita.
Referentemente às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio.
Quanto ao prequestionamento suscitado, assinalo não ter havido desrespeito algum à legislação federal ou a dispositivos constitucionais.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do réu, ao recurso adesivo do autor e à remessa oficial, tida por interposta, para, nos termos da fundamentação desta decisão: (i) julgar extinto o processo sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, IV, do NCPC/2015, em relação ao pleito de conversão em comum dos lapsos insalubres exercidos no regime estatutário, de 5/10/1995 a 23/1/2001, de 24/1/2001 a 19/3/2009 e de 20/3/2009 a 21/7/2010; (ii) restringir o enquadramento, como tempo especial, aos períodos de 9/1/1978 a 18/2/1978, de 21/6/1980 a 31/1/1981, de 1/2/1981 a 4/1/1982, de 11/3/1985 a 31/5/1985, de 1/6/1985 a 30/11/1987 e de 1/12/1987 a 13/2/1995; (iii) determinar ao réu a expedição de certidão de tempo de contribuição (CTC), já incluído o acréscimo decorrente do enquadramento citado; (iv) fixar a sucumbência recíproca.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
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Data e Hora: | 30/08/2016 19:06:39 |