Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5004484-96.2018.4.03.6183
Relator(a)
Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
29/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 04/09/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EX-FERROVIÁRIO. COMPLEMENTAÇÃO DE
APOSENTADORIA. LEI N.º 8.186/91. LEI N.º 10.478/02. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E
DO INSS. VÍNCULO ESTATUTÁRIO. DESNECESSIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Preliminares de ilegitimidade passiva afastada, tendo em vista que tanto a União quanto o
INSS são partes legítimas para figurar no polo passivo da demanda, sendo a primeira na
condição de órgão pagador e o segundo como mantenedor dos aludidos pagamentos.
II - Tanto os ferroviários que se aposentaram até a edição do Decreto-lei n.º 956/69, quanto
aqueles que foram admitidos até outubro de 1969, em face da superveniência da Lei n.º 8.186/91,
sob qualquer regime, possuem direito à complementação da aposentadoria prevista no Decreto-
Lei n.º 956/69.
III - Com o advento da Lei nº 10.478/2002, foi estendida a complementação da aposentadoria aos
ferroviários admitidos Rede Ferroviária Federal até 21.05.1991, consoante se verifica da redação
de seu artigo 1º.
IV – Possuem direito à complementação da aposentadoria os ferroviários que, à época da
jubilação, mantinham com a RFFSA tanto vínculo estatutário como celetista, visto que o Decreto-
Lei nº 956/69 não restringiu o direito à complementação aos estatutários, referindo-se aos
servidores públicos e autárquicos federais ou em regime especial.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
V - Levando-se em consideração o disposto no art. 493 do CPC e tendo em vista que a
demandante ingressou na Rede Ferroviária Federal anteriormente a maio de 1991, faz ela jus à
complementação de sua aposentadoria.
VI - O deferimento da complementação da aposentadoria com base na Lei nº 10.478/2002 não
implica julgamento ultra ou extra petita, face ao princípio naha mihi factum, dabo tibi jus, pelo qual
o magistrado não está adstrito às regras indicadas pelas partes.
VII - Em razão dessas diversas leis que regem a matéria, a complementação em epígrafe não é
sempre necessariamente devida a partir da concessão da aposentadoria, impondo-se, assim, que
sejam observadas as seguintes situações: (a) para os trabalhadores aposentados na RFFSA até
01.11.1969, a complementação é devida desde a concessão da respectiva aposentadoria,
observada a prescrição quinquenal, tendo em vista que o Decreto-Lei 965/69 reconheceu esse
direito adquirido; (b) para os trabalhadores admitidos na RFFSA até 31.10.1969 e que se
aposentaram entre 02.11.1969 e 21.05.1991, a complementação é devida somente a partir da
publicação da Lei nº 8.168, de 21.05.1991; (c) para os trabalhadores admitidos na RFFSA entre
01.11.1969 e 21.05.1991 a complementação é devida somente a partir de 01.04.2002, nos termos
do art. 1º da Lei nº 10.478/2002, caso a respectiva aposentadoria seja anterior a tal data.
VIII – No caso em tela, a demandante ingressou junto à RFFSA em 01.12.1968 e se aposentou
em 12.05.1994, de modo que a complementação da pensão é devida a partir de 01.04.2002.
Ajuizada a presente ação em junho de 2016, restam prescritas as diferenças vencidas
anteriormente a junho de 2011.
IX - A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de
regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947. Quanto
aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de
30.06.2009.
X – Mantida a verba honorária na forma estabelecida na sentença.
XI - Preliminares rejeitadas. Apelações do INSS e da União e remessa oficial improvidas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004484-96.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: UNIAO FEDERAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELISABETH SZABO
Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS DE ASSIS PINTO - SP96958-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004484-96.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: UNIAO FEDERAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELISABETH SZABO
Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS DE ASSIS PINTO - SP96958-A
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: COMPANHIA PAULISTA DE TRENS METROPOLITANOS
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: CAMILA GALDINO DE ANDRADE
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: MARIA EDUARDA FERREIRA RIBEIRO DO VALLE
GARCIA
R E L A T Ó R I O
Exmo. Senhor Desembargador Federal Sergio Nascimento (Relator): Trata-se de apelações
interpostas em face de sentença que julgou procedente pedido formulado em ação ordinária, para
declarar o direito da autora ao recebimento da complementação de sua aposentadoria, nos
termos das Leis nº 8.186/91 e 10.478/02. As parcelas vencidas, observada a prescrição daquelas
antecedentes ao quinquênio anterior à propositura da ação, serão corrigidas monetariamente e
acrescidas juros de mora na forma do Manual de Orientações de Procedimentos para os Cálculos
na Justiça Federal. Os réus foram condenados, ainda, ao pagamento de honorários advocatícios,
os quais terão os percentuais definidos na liquidação da sentença, com observância do disposto
na Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Em suas razões recursais, defende o INSS, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, visto que
não comanda nenhuma espécie de reajuste referente ao benefício almejado pela autora. No
mérito, argumenta que o adicional vindicado é devido apenas aos Aposentados da RFFSA que
com ela mantinham vínculo estatutário e que, no caso dos autos, a autora manteve com a Rede
Ferroviária Federal, a Companhia Brasileira de Trens Urbanos e a Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos vínculo de natureza trabalhista, regulado pela Consolidação das Leis do Trabalho
– CLT, estando sempre submetida, portanto, ao Regime Geral de Previdência Social. Aduz,
outrossim, que Daí a demandante não tem qualquer direito a receber sua complementação de
aposentadoria com base na tabela salarial da CPTM, pois tal empresa não é subsidiária da
RFFSA, como exige expressamente o artigo 2º, caput, da Lei 8.186/91. Subsidiariamente, requer
sejam a correção monetária e os juros de mora calculados na forma da Lei nº 11.960/2009.
A União, a seu turno, apela igualmente arguindo, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva, uma
vez que cabe apenas à CPTM e/ou ao Estado de São Paulo arcar com a complementação em
tela, na forma de legislação estadual sobre a matéria. Aduz, ademais, que a possibilidade jurídica
da complementação de aposentadoria que ensejaria o interesse da autora já deixou de existir, na
medida em que a Lei nº 8.186/91, suplementada pela Lei nº 10.478/02, só permite a concessão
do benefício em exame àqueles “segurados” que se encontravam nos quadros da RFFSA no
preciso momento de sua aposentadoria, o que não ocorre no caso em tela, uma vez que a
demandante não se aposentou quando ainda trabalhava para a RFFSA e sim quando já
trabalhava para a CPTM. No mérito, sustenta que inexiste qualquer respaldo legal para que a
complementação pleiteada tenha como parâmetro a tabela salarial da Companhia Paulista de
Trens Metropolitanos (CPTM) e não a tabela da Rede Ferroviária Federal S/A (RFFSA).
Subsidiariamente, roga seja a correção monetária calculada nos termos do artigo 1º-F da Lei nº
9.494/97.
Com contrarrazões oferecidas pela requerente, os autos subiram a esta E. Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004484-96.2018.4.03.6183
RELATOR: Gab. 35 - DES. FED. SÉRGIO NASCIMENTO
APELANTE: UNIAO FEDERAL, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELISABETH SZABO
Advogado do(a) APELADO: JOSE CARLOS DE ASSIS PINTO - SP96958-A
OUTROS PARTICIPANTES:
INTERESSADO: COMPANHIA PAULISTA DE TRENS METROPOLITANOS
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: CAMILA GALDINO DE ANDRADE
ADVOGADO do(a) INTERESSADO: MARIA EDUARDA FERREIRA RIBEIRO DO VALLE
GARCIA
V O T O
Recebo as apelações da União e do INSS, na forma do artigo 1.011 do CPC.
Da remessa oficial tida por interposta.
Tenho por interposto o reexame necessário, na forma da Súmula 490 do STJ.
Das preliminares de ilegitimidade passiva.
Afasto as preliminares suscitadas, tendo em vista que tanto a União quanto o INSS são partes
legítimas para figurar no polo passivo da demanda, sendo a primeira na condição de órgão
pagador e o segundo como mantenedor dos aludidos pagamentos. Nesse sentido, colaciono o
seguinte precedente do STJ:
DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. PENSIONISTA DE EX-FERROVIÁRIO DA
RFFSA. COMPLEMENTAÇÃO DE PENSÃO. LEI 8.186 /91 E DECRETO 956/69. LEGITIMIDADE
PASSIVA DA UNIÃO. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. NÃO-OCORRÊNCIA. SÚMULA
85/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÍNDICE. INPC. MULTA PREVISTA NO ART. 538,
PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. CARÁTER NÃOPROTELATÓRIO DOS EMBARGOS
DECLARATÓRIOS. RECURSO INTERPOSTO PELO INSS CONHECIDO E IMPROVIDO.
RECURSO INTERPOSTO PELA UNIÃO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
(...)
3. A União é parte legítima, juntamente com o INSS, para figurar no polo passivo de demanda na
qual se postula o pagamento da complementação de pensão de que tratam a Lei 8.186 /91 e o
Decreto 956/69.
(...)
(RESP 200802236536, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJU de 15.06..2009)
Do mérito.
A complementação da aposentadoria do ex-ferroviário, constituída pela diferença entre o valor da
aposentadoria paga pelo INSS e a remuneração do cargo correspondente ao do pessoal em
atividade na RFFSA, tem sua origem relacionada à criação, por meio do Decreto-Lei nº 4.682/23,
em cada uma das estradas de ferro do País, das Caixas de Aposentadoria e Pensões da qual os
ferroviários eram contribuintes obrigatórios.
Na época, havia empresas ferroviárias privadas e empresas ferroviárias públicas, sendo que os
funcionários aposentados pelas Caixas de Aposentadoria e Pensões recebiam proventos em
valor menor ao daqueles percebidos pelos funcionários públicos pagos pelo Tesouro Nacional.
Essa distorção foi solucionada pelo Decreto nº 3.769/41 que no art. 1º assim dispôs:
Art. 1º - Os funcionários públicos civis da União associados de Caixas de Aposentadoria e
Pensões, quando aposentados, terão direito ao provento assegurado aos demais funcionários, de
acordo com a legislação que vigorar.
Parágrafo único - A diferença entre o provento pago pela Caixa respectiva e aquele a que tiver
direito o funcionário, na forma deste Decreto-Lei correrá à conta da União.
Com a edição da Lei nº 2.622/55, o mesmo direito foi reconhecido aos ferroviários que eram
servidores das entidades autárquicas ou paraestatais.
Em 1957, pela Lei nº 3.115, foram unificadas todas as estradas de ferro, extintas as autarquias e
criada a RFFSA, cabendo à União o pagamento de todas as vantagens dos ferroviários, até que o
Decreto-Lei nº 57.629/66 determinou que o pagamento das referidas verbas passaria a ser feito
pelo INPS, competindo à RFFSA a responsabilidade de informar ao órgão previdenciário os
valores referentes a cada servidor.
Novas disposições sobre a matéria foram dadas pelo Decreto-Lei nº 956/69 cujo art. 1º é
reproduzido a seguir:
Artigo 1º - As diferenças ou complementações de proventos, gratificações adicionais ou
quinquênios e outras vantagens, excetuado o salário-família, de responsabilidade da União,
presentemente auferidos pelos ferroviários servidores públicos e autárquicos federais e em
regime especial aposentados pela Previdência Social, serão mantidas e pagas pelo Instituto
Nacional de Previdência Social, por conta do Tesouro Nacional, como parcela complementar da
aposentadoria, a qual será com esta reajustada na forma da Lei Orgânica da Previdência Social.
O regime jurídico ao qual estava submetido o ferroviário à época da aposentadoria tanto poderá
ser estatutário como celetista, isto porque o Decreto-Lei nº 956/69 não restringiu o direito à
complementação aos estatutários, referindo-se aos servidores públicos e autárquicos federais ou
em regime especial.
Cumpre consignar que, anteriormente ao atual Regime Jurídico Único, era utilizada a expressão
servidor público para designar o gênero, do qual eram espécie o funcionário público, o funcionário
autárquico, os celetistas, os extranumerários, etc., donde decorre a dificuldade de identificação
das diversas categorias de servidores.
O retrospecto acima tem o objetivo de demonstrar a evolução da legislação aplicável à
complementação de aposentadoria de ferroviário, a qual culminou com a edição da Lei nº
8.186/91, cujos artigos 1º, 2º, 3º e 5º dispõem, respectivamente:
Art. 1º É garantida a complementação da aposentadoria paga na forma da Lei Orgânica da
Previdência Social (LOPS) aos ferroviários admitidos até 31 de outubro de 1969, na Rede
Ferroviária Federal S.A. (RFFSA), constituída ex-vi da Lei nº 3.115, de 16 de março de 1957,
suas estradas de ferro, unidades operacionais e subsidiárias.
Art. 2° Observadas as normas de concessão de benefícios da Lei Previdenciária, a
complementação da aposentadoria devida pela União é constituída pela diferença entre o valor
da aposentadoria paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e o da remuneração do
cargo correspondente ao do pessoal em atividade na RFFSA e suas subsidiárias, com a
respectiva gratificação adicional por tempo de serviço.
Parágrafo único. O reajustamento do valor da aposentadoria complementada obedecerá aos
mesmos prazos e condições em que for reajustada a remuneração do ferroviário em atividade, de
forma a assegurar a permanente igualdade entre eles.
Art. 3º Os efeitos desta Lei alcançam também os ferroviários ex-servidores públicos ou
autárquicos que, com base na Lei nº 6.184, de 11 de dezembro de 1974, e no Decreto-Lei nº 5,
de 4 de abril de 1966, optaram pela integração nos quadros da RFFSA sob o regime da
Consolidação das Leis do Trabalho, inclusive os tornados inativos no período de 17 de março de
1975 a 19 de maio de 1980.
Art. 5° A complementação da pensão de beneficiário do ferroviário abrangido por esta lei é
igualmente devida pela União e continuará a ser paga pelo INSS, observadas as normas de
concessão de benefícios da Lei Previdenciária e as disposições do parágrafo único do art. 2°
desta lei.
Verifica-se dos dispositivos legais acima transcritos que tanto os ferroviários que se aposentaram
até a edição do Decreto-lei n.º 956/69, quanto aqueles que foram admitidos até outubro de 1969,
em face da superveniência da Lei n.º 8.186/91, sob qualquer regime, possuem direito à
complementação da aposentadoria prevista no Decreto-Lei n.º 956/69.
Ocorre que, com o advento da Lei nº 10.478/2002, foi estendida a complementação da
aposentadoria aos ferroviários admitidos Rede Ferroviária Federal até 21.05.1991, consoante se
verifica da redação de seu artigo 1º, in verbis:
Art. 1º Fica estendido, a partir do 1º de abril de 2002, aos ferroviários admitidos até 21 de maio de
1991 pela Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA, em liquidação, constituída ex vi da Lei no
3.115, de 16 de março de 1957, suas estradas de ferro, unidades operacionais e subsidiárias, o
direito à complementação de aposentadoria na forma do disposto na Lei no 8.186, de 21 de maio
de 1991.
Desse modo, levando-se em consideração o disposto no art. 493 do CPC e tendo em vista que a
demandante ingressou na Rede Ferroviária Federal anteriormente a maio de 1991, faz ela jus à
complementação de sua aposentadoria. Observe-se, por oportuno, o seguinte precedente do
STJ:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. TESE DE VIOLAÇÃO AOS ARTS. 1.º, 5.º E 6.º, DA
LEI N.º 8.186/91. NÃO-OCORRÊNCIA. RFFSA. FERROVIÁRIOS. LEI N.º 8.186/91. DIREITO À
COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA. LEI N.º 10.478/02. FATO SUPERVENIENTE.
ART. 462 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APLICAÇÃO. CUSTAS PROCESSUAIS E
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA N.º 284 DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. JUROS DE MORA. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DE
TODOS OS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO HOSTILIZADO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 283
DO EXCELSO PRETÓRIO.
1. O fato constitutivo, modificativo ou extintivo de direito, superveniente à propositura da ação
deve ser levado em consideração, de ofício ou a requerimento das partes, pelo julgador, uma vez
que a lide deve ser composta como ela se apresenta no momento da entrega da prestação
jurisdicional. Precedentes.
2. O advento da Lei n.º 10.478, de 28 de junho de 2002, que dispôs sobre a complementação de
aposentadorias de ferroviários da Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA, configura fato
superveniente relevante para o julgamento da presente lide.
3. Nos termos do Decreto-Lei n.° 956/69, os ferroviários que se aposentaram antes de sua
vigência têm direito à complementação de proventos.
4. A Lei n.º 8.168, de 21/05/91, garantiu, expressamente, o direito à complementação de
aposentadoria aos ferroviários admitidos até 31/10/69 na Rede Ferroviária Federal, inclusive para
os optantes pelo regime celetista.
5. O benefício em questão foi estendido pela Lei n.º 10.478/02 a todos os ferroviários admitidos
até 21/05/91 pela Rede Ferroviária Federal S.A.
(...)
(RESP 540.839/PR, Rel. Min. Laurita Vaz, DJ de 14.05.2007)
Saliento que o deferimento da complementação da aposentadoria com base na Lei nº
10.478/2002 não implica julgamento ultra ou extra petita, face ao princípio naha mihi factum, dabo
tibi jus, pelo qual o magistrado não está adstrito às regras indicadas pelas partes.
Por outro lado, em razão dessas diversas leis que regem a matéria, a complementação em
epígrafe não é sempre necessariamente devida a partir da concessão da aposentadoria,
impondo-se, assim, que sejam observadas as seguintes situações:
- para os trabalhadores aposentados na RFFSA até 01.11.1969, a complementação é devida
desde a concessão da respectiva aposentadoria, observada a prescrição quinquenal, tendo em
vista que o Decreto-Lei 965/69 reconheceu esse direito adquirido;
- para os trabalhadores admitidos na RFFSA até 31.10.1969 e que se aposentaram entre
02.11.1969 e 21.05.1991, a complementação é devida somente a partir da publicação da Lei nº
8.168, de 21.05.1991;
- para os trabalhadores admitidos na RFFSA entre 01.11.1969 e 21.05.1991 a complementação é
devida somente a partir de 01.04.2002, nos termos do art. 1º da Lei nº 10.478/2002, caso a
respectiva aposentadoria seja anterior a tal data.
No caso em tela, a demandante ingressou junto à RFFSA em 01.12.1968 e se aposentou em
12.05.1994, de modo que a complementação da pensão é devida a partir de 01.04.2002. Ajuizada
a presente ação em junho de 2016, restam prescritas as diferenças vencidas anteriormente a
junho de 2011.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência,
observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947. Quanto aos juros de
mora será observado o índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de 30.06.2009.
Mantida a verba honorária na forma estabelecida na sentença.
A autarquia previdenciária está isenta de custas e emolumentos, nos termos do art. 4º, I, da Lei
9.289/96, do art. 24-A da MP 2.180-35/01, e do art. 8º, § 1º da Lei 8.620/92.
Diante o exposto, rejeito as preliminares arguidas e, no mérito, nego provimento às apelações do
INSS e da União Federal e à remessa oficial, tida por interposta. Verbas acessórias na forma
acima explicitada. Os valores em atraso serão resolvidos em sede liquidação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. EX-FERROVIÁRIO. COMPLEMENTAÇÃO DE
APOSENTADORIA. LEI N.º 8.186/91. LEI N.º 10.478/02. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E
DO INSS. VÍNCULO ESTATUTÁRIO. DESNECESSIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - Preliminares de ilegitimidade passiva afastada, tendo em vista que tanto a União quanto o
INSS são partes legítimas para figurar no polo passivo da demanda, sendo a primeira na
condição de órgão pagador e o segundo como mantenedor dos aludidos pagamentos.
II - Tanto os ferroviários que se aposentaram até a edição do Decreto-lei n.º 956/69, quanto
aqueles que foram admitidos até outubro de 1969, em face da superveniência da Lei n.º 8.186/91,
sob qualquer regime, possuem direito à complementação da aposentadoria prevista no Decreto-
Lei n.º 956/69.
III - Com o advento da Lei nº 10.478/2002, foi estendida a complementação da aposentadoria aos
ferroviários admitidos Rede Ferroviária Federal até 21.05.1991, consoante se verifica da redação
de seu artigo 1º.
IV – Possuem direito à complementação da aposentadoria os ferroviários que, à época da
jubilação, mantinham com a RFFSA tanto vínculo estatutário como celetista, visto que o Decreto-
Lei nº 956/69 não restringiu o direito à complementação aos estatutários, referindo-se aos
servidores públicos e autárquicos federais ou em regime especial.
V - Levando-se em consideração o disposto no art. 493 do CPC e tendo em vista que a
demandante ingressou na Rede Ferroviária Federal anteriormente a maio de 1991, faz ela jus à
complementação de sua aposentadoria.
VI - O deferimento da complementação da aposentadoria com base na Lei nº 10.478/2002 não
implica julgamento ultra ou extra petita, face ao princípio naha mihi factum, dabo tibi jus, pelo qual
o magistrado não está adstrito às regras indicadas pelas partes.
VII - Em razão dessas diversas leis que regem a matéria, a complementação em epígrafe não é
sempre necessariamente devida a partir da concessão da aposentadoria, impondo-se, assim, que
sejam observadas as seguintes situações: (a) para os trabalhadores aposentados na RFFSA até
01.11.1969, a complementação é devida desde a concessão da respectiva aposentadoria,
observada a prescrição quinquenal, tendo em vista que o Decreto-Lei 965/69 reconheceu esse
direito adquirido; (b) para os trabalhadores admitidos na RFFSA até 31.10.1969 e que se
aposentaram entre 02.11.1969 e 21.05.1991, a complementação é devida somente a partir da
publicação da Lei nº 8.168, de 21.05.1991; (c) para os trabalhadores admitidos na RFFSA entre
01.11.1969 e 21.05.1991 a complementação é devida somente a partir de 01.04.2002, nos termos
do art. 1º da Lei nº 10.478/2002, caso a respectiva aposentadoria seja anterior a tal data.
VIII – No caso em tela, a demandante ingressou junto à RFFSA em 01.12.1968 e se aposentou
em 12.05.1994, de modo que a complementação da pensão é devida a partir de 01.04.2002.
Ajuizada a presente ação em junho de 2016, restam prescritas as diferenças vencidas
anteriormente a junho de 2011.
IX - A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de
regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947. Quanto
aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de
30.06.2009.
X – Mantida a verba honorária na forma estabelecida na sentença.
XI - Preliminares rejeitadas. Apelações do INSS e da União e remessa oficial improvidas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egregia Decima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3 Regiao, por unanimidade, rejeitar as preliminares
arguidas e, no merito, negar provimento as apelacoes do INSS e da Uniao Federal e a remessa
oficial, tida por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
