Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5066434-07.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
20/10/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 27/10/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. INÉPCIA DO APELO AUTÁRQUICO. NÃO CONFIGURAÇÃO.
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
ACIDENTE. INCAPACIDADE CONFIGURADA. SÚMULA 149 DO STJ. SEGURADO ESPECIAL.
PEQUENO PRODUTOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO CARACTERIZADO.
AUTOR PROPRIETÁRIO DE 3 (TRÊS) CAMINHÕES E OUTROS VEÍCULOS DE ALTO
PADRÃO. INCOMPATIBILIDADE COM LABOR CAMPESINO DE SUBSISTÊNCIA.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA INDEVIDOS. PRELIMINAR
REJEITADA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA
TUTELA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA
IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO
SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. APELO DA PARTE AUTORA PREJUDICADO.
1 - Rejeitada a preliminar de admissibilidade suscitada pelo autor em face do apelo do INSS, na
medida em que o recurso autárquico é atinente à matéria discutida na causa, assim como
impugna os fundamentos da sentença. Desta forma, ventila a matéria debatida na demanda,
devolvendo-a regularmente para apreciação deste colegiado.
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame efetuado em 28 de agosto de 2017, quando o demandante possuía 28 (vinte e oito) anos,
consignou o seguinte: “O autor relata que em 13/01/2016 sofreu um acidente de trânsito
(motociclístico) e apresentou fraturas no antebraço esquerdo, na mão esquerda e amputação
parcial no membro inferior esquerdo, ao nível do terço proximal da coxa (...) Com base nas
observações acima registradas, conclui-se que, no momento deste exame pericial, do ponto de
vista ortopédico, a situação médica do periciando configura incapacidade, parcial e permanente,
para o desempenho de sua atividade laboral habitual. Observa-se sequelas consolidadas que
implicam em redução permanente da capacidade para o trabalho que o autor habitualmente
exercia”.
10 - Embora configurado o impedimento, verifica-se que o requerente não conseguiu demonstrar
a qualidade de segurado especial junto à Previdência Social, na data do infortúnio, por meio da
comprovação de trabalho efetuado na condição de rurícola, em regime de economia familiar.
11 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova
exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
12 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que
se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da
7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser
contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido
produzidos de forma espontânea, no passado.
13 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de
que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele
retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que
tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
14 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, e §1º.
15 - Para fazer prova da qualidade de segurado especial, o autor colacionou aos autos os
seguintes documentos: a) notas fiscais de venda e compra de produtos agrícolas, em seu nome,
de novembro de 2015 a agosto de 2016; b) registro de contribuinte do ICMS, ativo desde
12.09.2012, junto à Secretária da Fazenda do Estado de São Paulo, na qual encontra-se
qualificado como “produtor rural (pessoa física)”.
16 - Realizada audiência de instrução e julgamento, em 17 de abril de 2018, foram colhidos os
depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pelo requerente.
17 - In casu, nota-se que o demandante até trouxe aos autos substrato material mínimo,
consentâneo como os testemunhos supra, de que desenvolve a atividade de agricultor, contudo,
tal desempenho não se dá em regime de economia familiar.
18 - Isso porque documentação obtida via SINESP INFOSEG, acostada pelo INSS aos autos, a
despeito de confirmar que é agricultor no “cultivo de plantas oleaginosas de lavoura temporária”,
denota que possui cerca de 3 (três) caminhões (M. BENZ/L 1133, ano 1985; VW/17.220, ano
2002; e VW/8.160 DRC 4x2, ano 2015) e mais 2 (dois) veículos de alto padrão (Jeep Compass,
ano 2017; e Fiat Toro, ano 2016/2017).
19 - Dessa forma, malgrado o requerente tenha dedicado sua vida profissional ao meio rural, não
se pode dizer que a atividade tenha sido praticado em regime de economia familiar, cuja
característica primeira é a união dos membros da família para o cultivo e colheita de produtos
agrícolas para subsistência, com a comercialização apenas do excedente, hipótese que, nem de
longe, resvala nos autos.
20 - Assim, não faz jus aos benefícios pleiteados.
21 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
22 - Inversão do ônus sucumbencial, com condenação da parte autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento
dos honorários advocatícios, arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente atualizado (CPC,
art. 85, §2º), observando-se o previsto no §3º do artigo 98 do CPC.
23 - Preliminar rejeitada. Apelação do INSS provida. Sentença reformada. Revogação da tutela.
Devolução de valores. Juízo da execução. Ação julgada improcedente. Inversão das verbas de
sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça. Apelo da parte autora
prejudicado.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5066434-07.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ERICK CARDOSO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: VINICIUS CAMARGO LEAL - SP319409-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5066434-07.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ERICK CARDOSO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: VINICIUS CAMARGO LEAL - SP319409-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e
por ERICK CARDOSO DOS SANTOS, em ação ajuizada pelo último, objetivando a concessão
de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez ou, ainda, auxílio-acidente.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento
dos atrasados de auxílio-doença, desde a data do requerimento administrativo, que se deu em
13.09.2016 (ID 7726698). Fixou correção monetária nos termos do Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Condenou o INSS, ainda, no pagamento
de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas em
atraso, contabilizadas até a data da sua prolação. Por fim, determinou a imediata implantação
do benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada (ID 7726730).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que o autor
não preenche os requisitos para a concessão de auxílio-doença. Em sede subsidiária, requer a
fixação da DIB na data da juntada do laudo pericial aos autos (ID 7726738).
O demandante também interpôs recurso de apelação, na forma adesiva, no qual pugna pelo
deferimento de auxílio-acidente, quando da cessação do auxílio-doença já concedido (ID
7726742). Ainda apresentou contrarrazões (ID 7726741), nas quais sustenta a inépcia do
recurso autárquico, devendo o mesmo não ser conhecido.
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional
Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5066434-07.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ERICK CARDOSO DOS SANTOS
Advogado do(a) APELADO: VINICIUS CAMARGO LEAL - SP319409-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
De início, rejeito a preliminar de admissibilidade suscitada pelo autor em face do apelo do INSS,
na medida em que o recurso autárquico é atinente à matéria discutida na causa, assim como
impugna os fundamentos da sentença. Desta forma, ventila a matéria debatida na demanda,
devolvendo-a regularmente para apreciação deste colegiado.
Passo à análise do mérito.
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença,
for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame efetuado em 28 de agosto de 2017 (ID 7726717), quando o demandante possuía 28
(vinte e oito) anos, consignou o seguinte:
“O autor relata que em 13/01/2016 sofreu um acidente de transito (motociclístico) e apresentou
fraturas no antebraço esquerdo, na mão esquerda e amputação parcial no membro inferior
esquerdo, ao nível do terço proximal da coxa
(...)
Com base nas observações acima registradas, conclui-se que, no momento deste exame
pericial, do ponto de vista ortopédico, a situação médica do periciando configura incapacidade,
parcial e permanente, para o desempenho de sua atividade laboral habitual. Observa-se
sequelas consolidadas que implicam em redução permanente da capacidade para o trabalho
que o autor habitualmente exercia”.
Embora configurado o impedimento, verifico que o requerente não conseguiu demonstrar a
qualidade de segurado especial junto à Previdência Social, na data do infortúnio, por meio da
comprovação de trabalho efetuado na condição de rurícola, em regime de economia familiar.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal.
Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor para todos os anos do período que se
pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o
raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS
NÃO DEMONSTRADOS. 1. (...). 3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o
período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em
que foi constituído o documento.(...)" (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº
0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1
DATA:07/12/2015 - grifos nossos).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO
DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...)
2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência
estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua
eficácia probatória. (...)" (AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver
comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil,
assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural
exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos
como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal
idônea.
Nessa senda, quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia
familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos
seguintes termos:
"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(omissis)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado
urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda
que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro
outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do
caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal
meio de vida;
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal
meio de vida; e
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este
equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente,
trabalhem com o grupo familiar respectivo.
§1º - Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos
membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento
socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e
colaboração, sem a utilização de empregados permanentes" (grifos nossos).
Para fazer prova da qualidade de segurado especial, o autor colacionou aos autos os seguintes
documentos:
a) notas fiscais de venda e compra de produtos agrícolas, em seu nome, de novembro de 2015
a agosto de 2016 (ID 7726703);
b) registro de contribuinte do ICMS, ativo desde 12.09.2012, junto à Secretária da Fazenda do
Estado de São Paulo, na qual encontra-se qualificado como “produtor rural (pessoa física)” (ID
7726704).
Realizada audiência de instrução e julgamento, em 17 de abril de 2018 (ID 7726730), foram
colhidos os depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pelo requerente.
ROBERTO HAN JÚNIOR asseverou: "que conhece o(a) autor desde criança. Não são parentes.
São vizinhos. Que o autor começou a trabalhar desde novo na roça da família e também como
diarista. Que tem esposa e filhos e continuou trabalhando após formar a família mas no
momento não o vê trabalhando tanto por conta do acidente que teve. Atualmente planta alho,
alface em roça própria, acredita ser de 20 tarefas e não têm empregados, só a família trabalha.
Sempre trabalhou na roça e nunca trabalhou na cidade. Que o autor sofreu acidente em janeiro
de 2016 ou 2017, não tem certeza" (sic) (ID 7726731).
ROBSON TOMAZ CAMARGO disse o seguinte: "que conhece o(a) autor desde criança. Não
são parentes. São vizinhos de bairro. Que o autor começou a trabalhar aos dez anos na roça da
família. Que tem esposa e filhos e continua trabalhando mas não como antes por conta da
perna dele. Atualmente planta verdura, alface em roça própria, de 10 tarefas e não têm
empregados, só a família trabalha. Sempre trabalhou na roça e nunca trabalhou na cidade" (sic)
(ID 7726732).
In casu, noto que o demandante até trouxe aos autos substrato material mínimo, consentâneo
como os testemunhos supra, de que desenvolve a atividade de agricultor, contudo, tal
desempenho não se dá em regime de economia familiar.
Isso porque documentação obtida via SINESP INFOSEG, acostada pelo INSS aos autos (ID
7726739), a despeito de confirmar que é agricultor no “cultivo de plantas oleaginosas de lavoura
temporária”, denota que possui cerca de 3 (três) caminhões (M. BENZ/L 1133, ano 1985;
VW/17.220, ano 2002; e VW/8.160 DRC 4x2, ano 2015) e mais 2 (dois) veículos de alto padrão
(Jeep Compass, ano 2017; e Fiat Toro, ano 2016/2017).
Dessa forma, malgrado o requerente tenha dedicado sua vida profissional ao meio rural, não se
pode dizer que a atividade tenha sido praticado em regime de economia familiar, cuja
característica primeira é a união dos membros da família para o cultivo e colheita de produtos
agrícolas para subsistência, com a comercialização apenas do excedente, hipótese que, nem
de longe, resvala nos autos.
Assim, não faz jus aos benefícios pleiteados.
Observo, por fim, que a sentença concedeu a tutela antecipada.
Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória
deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado,
conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) que é tema
cuja análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo
(STJ, Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia
constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o
derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo
ao andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo
juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar, e, no mérito, dou provimento à apelação do INSS
para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, com a
revogação da tutela anteriormente concedida, restando prejudicado o apelo da parte autora.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando-a no ressarcimento das despesas
processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento dos
honorários advocatícios, os quais arbitro no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente atualizado (art. 85,
§2º, do CPC).
Havendo a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no §3º
do artigo 98 do CPC, ficará a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a
situação de insuficiência de recursos que a fundamentou.
Oficie-se ao INSS.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. INÉPCIA DO APELO AUTÁRQUICO. NÃO CONFIGURAÇÃO.
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-
ACIDENTE. INCAPACIDADE CONFIGURADA. SÚMULA 149 DO STJ. SEGURADO
ESPECIAL. PEQUENO PRODUTOR RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO
CARACTERIZADO. AUTOR PROPRIETÁRIO DE 3 (TRÊS) CAMINHÕES E OUTROS
VEÍCULOS DE ALTO PADRÃO. INCOMPATIBILIDADE COM LABOR CAMPESINO DE
SUBSISTÊNCIA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA INDEVIDOS.
PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA.
REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. AÇÃO
JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE
PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. APELO DA PARTE AUTORA
PREJUDICADO.
1 - Rejeitada a preliminar de admissibilidade suscitada pelo autor em face do apelo do INSS, na
medida em que o recurso autárquico é atinente à matéria discutida na causa, assim como
impugna os fundamentos da sentença. Desta forma, ventila a matéria debatida na demanda,
devolvendo-a regularmente para apreciação deste colegiado.
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º
estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12
(doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame efetuado em 28 de agosto de 2017, quando o demandante possuía 28 (vinte e oito)
anos, consignou o seguinte: “O autor relata que em 13/01/2016 sofreu um acidente de trânsito
(motociclístico) e apresentou fraturas no antebraço esquerdo, na mão esquerda e amputação
parcial no membro inferior esquerdo, ao nível do terço proximal da coxa (...) Com base nas
observações acima registradas, conclui-se que, no momento deste exame pericial, do ponto de
vista ortopédico, a situação médica do periciando configura incapacidade, parcial e permanente,
para o desempenho de sua atividade laboral habitual. Observa-se sequelas consolidadas que
implicam em redução permanente da capacidade para o trabalho que o autor habitualmente
exercia”.
10 - Embora configurado o impedimento, verifica-se que o requerente não conseguiu
demonstrar a qualidade de segurado especial junto à Previdência Social, na data do infortúnio,
por meio da comprovação de trabalho efetuado na condição de rurícola, em regime de
economia familiar.
11 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
12 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
13 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
14 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, e §1º.
15 - Para fazer prova da qualidade de segurado especial, o autor colacionou aos autos os
seguintes documentos: a) notas fiscais de venda e compra de produtos agrícolas, em seu
nome, de novembro de 2015 a agosto de 2016; b) registro de contribuinte do ICMS, ativo desde
12.09.2012, junto à Secretária da Fazenda do Estado de São Paulo, na qual encontra-se
qualificado como “produtor rural (pessoa física)”.
16 - Realizada audiência de instrução e julgamento, em 17 de abril de 2018, foram colhidos os
depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pelo requerente.
17 - In casu, nota-se que o demandante até trouxe aos autos substrato material mínimo,
consentâneo como os testemunhos supra, de que desenvolve a atividade de agricultor,
contudo, tal desempenho não se dá em regime de economia familiar.
18 - Isso porque documentação obtida via SINESP INFOSEG, acostada pelo INSS aos autos, a
despeito de confirmar que é agricultor no “cultivo de plantas oleaginosas de lavoura temporária”,
denota que possui cerca de 3 (três) caminhões (M. BENZ/L 1133, ano 1985; VW/17.220, ano
2002; e VW/8.160 DRC 4x2, ano 2015) e mais 2 (dois) veículos de alto padrão (Jeep Compass,
ano 2017; e Fiat Toro, ano 2016/2017).
19 - Dessa forma, malgrado o requerente tenha dedicado sua vida profissional ao meio rural,
não se pode dizer que a atividade tenha sido praticado em regime de economia familiar, cuja
característica primeira é a união dos membros da família para o cultivo e colheita de produtos
agrícolas para subsistência, com a comercialização apenas do excedente, hipótese que, nem
de longe, resvala nos autos.
20 - Assim, não faz jus aos benefícios pleiteados.
21 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
22 - Inversão do ônus sucumbencial, com condenação da parte autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento
dos honorários advocatícios, arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente atualizado (CPC,
art. 85, §2º), observando-se o previsto no §3º do artigo 98 do CPC.
23 - Preliminar rejeitada. Apelação do INSS provida. Sentença reformada. Revogação da tutela.
Devolução de valores. Juízo da execução. Ação julgada improcedente. Inversão das verbas de
sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça. Apelo da parte autora
prejudicado. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar, e, no mérito, dar provimento à apelação do
INSS para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, com a
revogação da tutela anteriormente concedida, restando prejudicado o apelo da parte autora, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
