D.E. Publicado em 31/10/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Nona Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer da apelação e lhe dar parcial provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Juiz Federal Convocado
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0023014-71.2017.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Trata-se de ação de conhecimento proposta em face do INSS, na qual se pleiteia o recálculo da renda mensal inicial de benefícios por incapacidade, mediante a aplicação do artigo 29, II e §5º, da Lei n. 8.213/91, com a redação conferida pela Lei n. 9.876/99.
Noticiado o óbito da parte autora, houve a habilitação do sucessor (f. 82).
A r. sentença julgou improcedentes os pedidos.
Nas razões de apelação, a parte autora requer seja reformada a sentença e determinada a revisão dos salários-de-benefício do auxílio-doença e da aposentadoria por invalidez nos termos do artigo 29, II, da LBP (média aritmética simples dos 80% maiores salários-de-contribuição), e a inclusão do salário-de-benefício do AD revisado, no período básico de cálculo da aposentadoria por invalidez, nos termos do art. 29, §5º, da Lei n. 8.213/91.
Contrarrazões não apresentadas.
Subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
O Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Rodrigo Zacharias: Conheço da apelação, porque preenchidos os requisitos de admissibilidade.
De início, constata-se presente o interesse processual da parte autora.
A noticiada revisão administrativa decorre da transação judicial firmada em ação civil pública com o mesmo objeto.
Consoante precedente do E. STJ, a circunstância de existir ação coletiva em que se objetiva a tutela de direitos individuais homogêneos não obsta a propositura de ação individual. Nessa esteira: RESP 201100679947, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ - Segunda Turma, DJe de 14/02/2012.
Com efeito, a vinculação da parte autora aos efeitos da ação civil pública é facultativa, conforme se depreende do disposto no artigo 104 da Lei n. 8.078/90 c.c. artigo 21 da Lei n. 7.347/85. Situação diversa, aliás, ensejaria exclusão da garantia constitucional de acesso ao Judiciário (art. 5º, XXXV, CF).
Nesse passo, o artigo 104 do Código do Consumidor prevê que, no caso do acolhimento do pedido deduzido na ação coletiva, os efeitos da coisa julgada serão estendidos para as ações individuais em curso, salvo se o legitimado individual tiver optado por prosseguir com a sua ação.
In casu, a ação individual foi ajuizada em 22/10/2010 - portanto, anteriormente ao trânsito em julgado da homologação do acordo na ação civil pública n. 0002320-59.2012.4.03.6183 (5/9/2012) - e prosseguiu independentemente do desfecho dessa ação coletiva.
Além disso, não há notícia nos autos de que a parte autora tenha efetivamente recebido os valores decorrentes da revisão ora pretendida.
Nesse sentido, AC 00196607720134039999, Des. Fed. SERGIO NASCIMENTO, TRF3 - Décima Turma, e-DJF3: 25/09/; APELREEX 00024234920114036103, Rel. Juíza Fed. Conv. RAQUEL PERRINI, TRF3 - Oitava Turma, e-DJF3: 28/06/2013.
No mérito, a r. sentença deve ser parcialmente reformada, pelas razões a seguir expostas.
A pretensão é de recálculo da renda mensal inicial dos benefícios de auxílio-doença (NB 300.033.243-1, DIB: 12/09/2001) e da aposentadoria por invalidez posteriormente concedida (NB 125.747.798-3, DIB: 04/10/2002), ao argumento de que a autarquia teria desatendido ao disposto no inciso II do artigo 29 da Lei n. 8.213/91, com a redação dada pela Lei n. 9.876/99.
O referido artigo dispõe que o salário-de-benefício para os benefícios por incapacidade consiste na média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo, nos termos das alterações introduzidas no artigo 29, II, da Lei n. 8.213/91.
A regulamentar a matéria, sobreveio o Decreto n. 3.265/99, que alterou a redação dos artigos 32, § 2º, e 188-A do Decreto n. 3.048/99. Posteriormente, novas disposições sobre o tema foram introduzidas pelo Decreto n. 5.545/05. Todavia, os dispositivos acima extrapolaram o poder regulamentar, na medida em que estabeleceram condições não previstas em lei.
Nessa esteira, o regulamento adotou a quantidade de contribuições realizadas pelo segurado como critério diferenciador para o cálculo do benefício por incapacidade, além de, em algumas hipóteses, não eliminar os 20% (vinte por cento) menores salários-de-contribuição na apuração do salário-de-benefício.
Frise-se: a lei, diferentemente do decreto, instituiu o cálculo do salário-de-benefício para os benefícios por incapacidade com base unicamente nos maiores salários-de-contribuição correspondentes a 80% (oitenta por cento) do período contributivo, independentemente da quantidade de contribuições realizadas pelo segurado.
A situação perdurou até 18 de agosto de 2009, quando passou a vigorar o Decreto n. 6.939, o qual revogou o § 20 do artigo 32 e deu nova redação ao § 4º do artigo 188-A do Decreto n. 3.048/99, em estrita conformidade com o disposto na Lei n. 8.213/91:
Evidencia-se, assim, que desde a edição do Decreto n. 3.265/99 até a vigência do Decreto n. 6.939/09 o critério utilizado pelo INSS para o cálculo do salário-de-benefício dos benefícios por incapacidade era contrário ao que dispunha a lei vigente.
Sobre essa questão, reporto-me aos seguintes julgados:
No mesmo sentido, confira-se o enunciado da Súmula n. 57 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, publicado em 24/5/2012:
Na hipótese, a autora falecida recebeu auxílio-doença, cuja apuração do salário-de-benefício demonstra não ter sido atendido ao disposto nos artigos 29, II, da Lei n. 8.213/91 c.c. artigo 3º, caput, da Lei n. 9.876/99.
Dessa forma, é devida a revisão da renda mensal inicial do benefício de auxílio-doença do qual derivou a aposentadoria por invalidez, para que o salário-de-benefício seja apurado mediante a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo período contributivo a ser considerado, nos termos da legislação supracitada, com o pagamento das diferenças apuradas, observada a prescrição das prestações vencidas antes do quinquênio que precede a propositura da ação, nos termos do parágrafo primeiro do art. 240, do NCPC e Súmula 85 do STJ.
Possíveis valores não cumulativos recebidos na esfera administrativa deverão ser compensados por ocasião da liquidação do julgado.
Evidentemente, o recálculo da RMI do auxílio-doença gera reflexos no valor da aposentadoria por invalidez, pois esta resultou de transformação de auxílio-doença gozado sem interposição de atividade laborativa ou de período de contribuição previdenciária.
Com efeito, o cálculo da aposentadoria por invalidez deve ser feito com base na aplicação do coeficiente de cem por cento sobre o salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal inicial do benefício originário (auxílio-doença), reajustado pelos mesmos índices de correção dos benefícios em geral (art. 36, §7º, Decreto n. 3.048/99).
Ou seja, se não houver período contributivo entre a concessão de um benefício e outro, a aposentadoria por invalidez deve ser calculada com base na aplicação do coeficiente de cem por cento sobre o salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo da renda mensal inicial do benefício originário (auxílio-doença), reajustado pelos mesmos índices de correção dos benefícios em geral.
Atualmente, a matéria sub judice é regida pelo Decreto n. 3.048/99, o qual, em seu artigo 36, § 7º, assim dispõe:
A controvérsia não mais comporta digressões ante os precedentes dos Tribunais Superiores que validam a conduta administrativa no tocante à aplicação do §7º do artigo 36 do Decreto n. 3.048/99.
Em sessão plenária realizada em 21/9/2011, em sede de repercussão geral reconhecida, o Colendo Supremo Tribunal Federal - STF deu provimento ao Recurso Extraordinário (RE) n. 583.834, de relatoria do E. Ministro Ayres Britto, para estabelecer que o "afastamento contínuo da atividade sem contribuição não pode ser considerado para calcular aposentadoria por invalidez precedida de auxílio-doença".
Enfatizou o eminente Relator que essa circunstância não autoriza a aplicação do § 5º do art. 29 da Lei 8.213/91, por tratar-se de "exceção razoável à regra proibitiva de tempo de contribuição ficta ou tempo ficto de contribuição". Isso porque esse dispositivo "equaciona a situação em que o afastamento que precede a aposentadoria por invalidez não é contínuo, mas intercalado com períodos de labor". Períodos em que, conforme ressalta o Relator, "é recolhida a contribuição previdenciária porque houve uma intercalação entre afastamento e trabalho".
Confira-se a ementa do julgado:
O Egrégio Superior Tribunal de Justiça - STJ, intérprete máximo da lei federal, também firmou o entendimento de não aplicação do disposto no § 5º do artigo 29 da Lei n. 8.213/91 nas hipóteses de aposentadoria por invalidez de segurado concedida por mera conversão de auxílio-doença, convalidando, em consequência, a incidência do art. 36, §7º, do Decreto n. 3.048/99 nessas hipóteses.
Nesse sentido (g. n.):
Confira-se, ainda: STJ, AgRg no REsp 1.017.522/SC, AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL, 2007/0302766-2, Relator(a) Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA,Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA, Data do Julgamento: 23/11/2010, Data da Publicação/Fonte DJe 17/12/2010; STJ, 6ªT, AgRg no REsp 1100488/RS, Rel. Des. Conv. do TJ/MG Jane Silva, julgado em 3/2/2009, publicado em DJe de 16/2/2009; STJ, 6ªT, AgRg no REsp 1062981/MG, Rel. Min. Paulo Gallotti, julgado em 11/11/2008, publicado em DJe de 9/12/2008; STJ, 5ªT, AgRg no REsp 1132233/RS, Rel. Min. GILSON DIPP, data de julgamento: 3/2/2011, data de publicação: DJe 21/2/2011; STJ, 5ªT, REsp 1091290/SC, Rel. Min. JORGE MUSSI, data de julgamento: 2/6/2009, data de publicação: DJe 3/8/2009.
No caso vertente, colhe-se dos documentos carreados aos autos que a aposentadoria por invalidez derivou de auxílio-doença, sem períodos intercalados de contribuição entre a concessão de um benefício e outro.
Assim, consoante entendimento jurisprudencial sufragado pelas Cortes Superiores, nas hipóteses de interrupção dos benefícios por incapacidade temporária, sem contribuições posteriores, e de concessão de benefícios de aposentadoria por invalidez precedidos de auxílio-doença, sem solução de continuidade, a apuração do valor da renda mensal inicial deve ser realizada mediante a convolação do benefício originário, calculado à razão de 100% do salário-de-benefício que serviu de base para o cálculo do auxílio-doença, reajustado pelos mesmos índices de correção dos benefícios em geral, em cumprimento ao estabelecido pelo § 7º do artigo 36 do Decreto n. 3.048/99.
Nesse diapasão, não há como ser acolhida a tese da incidência do §5º do artigo 29 da Lei n. 8.213/91, em virtude de disposição legal em contrário.
Em consequência, não cabe cogitar da aplicação do artigo 29, II, da Lei n. 8.213/91 ao benefício de aposentadoria por invalidez que resultou de mera transformação de auxílio-doença gozado sem interposição de atividade laborativa ou de período de contribuição previdenciária.
Passo à análise dos consectários.
Quanto à correção monetária, esta deve ser aplicada nos termos da Lei n. 6.899/81 e da legislação superveniente, bem como do Manual de Orientação de Procedimentos para os cálculos na Justiça Federal, aplicando-se o IPCA-E (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
Com relação aos juros moratórios, estes são fixados em 0,5% (meio por cento) ao mês, contados da citação, por força dos artigos 1.062 do CC/1916 e 240 do CPC/2015, até a vigência do CC/2002 (11/1/2003), quando esse percentual foi elevado a 1% (um por cento) ao mês, nos termos dos artigos 406 do CC/2002 e 161, § 1º, do CTN, devendo, a partir de julho de 2009, ser utilizada a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança, consoante alterações introduzidas no art. 1º-F da Lei n. 9.494/97 pelo art. 5º da Lei n. 11.960/09 (Repercussão Geral no RE n. 870.947, em 20/9/2017, Rel. Min. Luiz Fux).
Em relação às parcelas vencidas antes da citação, os juros são devidos desde então de forma global e, para as vencidas depois da citação, a partir dos respectivos vencimentos, de forma decrescente, observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE n. 579.431, em 19/4/2017, Rel. Min. Marco Aurélio.
Tendo em vista a ocorrência de sucumbência recíproca, condeno ambas as partes a pagar honorários ao advogado da parte contrária, arbitrados em 3% (três por cento) sobre o valor da condenação, conforme critérios do artigo 85, caput e § 14, do Novo CPC.
Todavia, em relação à parte autora, fica suspensa a exigibilidade, segundo a regra do artigo 98, § 3º, do mesmo código, por ser a parte autora beneficiária da justiça gratuita.
Referentemente às custas processuais, no Estado de São Paulo, delas está isenta a Autarquia Previdenciária, a teor do disposto nas Leis Federais n. 6.032/74, 8.620/93 e 9.289/96, bem como nas Leis Estaduais n. 4.952/85 e 11.608/03. Contudo, tal isenção não exime a Autarquia Previdenciária do pagamento das custas e despesas processuais em restituição à parte autora, por força da sucumbência, na hipótese de pagamento prévio. Na hipótese, entretanto, deve-se observar o disposto no artigo 86 do CPC/2015 e a gratuidade da justiça deferida à parte autora.
Diante do exposto, conheço da apelação e lhe dou parcial provimento, para condenar o réu a efetuar a revisão da renda mensal inicial do benefício de auxílio-doença (NB 300.033.243-1) do qual derivou a aposentadoria por invalidez, para que o salário-de-benefício seja apurado mediante a média aritmética simples dos maiores salários-de-contribuição, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo período contributivo a ser considerado, com reflexos no valor da aposentadoria por invalidez e o pagamento das diferenças apuradas, observada a prescrição das prestações vencidas antes do quinquênio que precede a propositura da ação, nos termos do parágrafo primeiro do art. 240, do NCPC e Súmula 85 do STJ e discriminar os consectários na forma acima estabelecida.
É o voto.
Rodrigo Zacharias
Juiz Federal Convocado
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | RODRIGO ZACHARIAS:10173 |
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Data e Hora: | 17/10/2017 17:57:50 |