Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5046840-07.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
02/12/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 09/12/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ARTIGO
1.021 E §§ DO CPC DE 2015. AVERBAÇÃO DE LABOR RURÍCOLA. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL AMPLIADO PELA OITIVA DE TESTEMUNHAS. POSSIBILIDADE.
1. O agravo interno tem por fim impugnar os fundamentos da decisão agravada, para que seja
assegurado o direito à ampla defesa, submetendo as alegações recursais ao órgão colegiado,
não se prestando à rediscussão de matéria já decidida.
2. Trata-se de agravo interno interposto pelo autor em face de decisão que monocraticamente
negou provimento à sua apelação.
3. A possibilidade de aplicação daeficácia prospectiva e retrospectiva dos documentospermite o
reconhecimento de tempo de serviço rural além do período relativo ao início de prova material,
quando for corroborado por prova testemunhal. Esse entendimento foi consolidado e reiterado
pelo Colendo STJ, conferindo segurança jurídica à aplicação dessa ratio decidendi aos casos
concretos, de natureza obrigatória às instâncias inferiores, na forma das normas do artigo 927 do
CPC.
4. Ao cristalizar oTema 554/STJ, o C. STJ estabeleceu diretrizes para observância da Súmula
149/STJ, que poderá ter a sua aplicação abrandada quando a prova material for corroborada pela
prova testemunhal idônea. Atese firmada assentou que: “Aplica-se a Súmula 149/STJ (‘A prova
exclusivamente testemunhal (...)' aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo
imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado,considerando a inerente
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material
somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja
aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova
testemunhal”. (REsp Repetitivo nº 1.321.493, Relator Ministro Herman Benjamin, j. 10/10/2012,
DJe 19/12/2012).
5. Por outro lado, não há qualquer disposição na legislação de que a averbação do trabalho
rurícola deve ser realizada de acordo com a data inicial e final dos documentos, uma vez
pacificado na Jurisprudência de que é possível ampliar o lapso, desde que corroborado por
testemunhos idôneos.
6. Dessa forma, as provas documentais (que englobam os anos de 1970 a 1971) e orais,
analisadas em conjunto, permitem a comprovação do labor rural desenvolvido pela parte autora
no período de 26/01/1972 a 30/12/1980, independentemente do recolhimento de contribuições
previdenciárias, não podendo tal período ser computado para efeito de carência, nos termos do
art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.
7. Somado o período rural ora reconhecido ao tempo de contribuição, perfaz o autor na data do
requerimento administrativo mais de 35 anos de contribuição, fazendo jus ao benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição.
8. Comprovados os requisitos para concessão do benefício na data do requerimento
administrativo, este deve ser considerado como seu termo inicial, acrescidas as parcelas devidas
de correção monetária e juros.
9. Condenado ao pagamento de honorários advocatícios, no patamar de 10% sobre o valor da
condenação, nos termos do artigo 85, §§ 3º e 5º, c.c. artigo 86, parágrafo único, do CPC,
incidentes, conforme a Súmula 111 do C. STJ, sobre as parcelas vencidas até a sentença de
procedência, porém, tendo em vista que a pretensão da parte autora, ora agravante, foi provida
somente em fase recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as parcelas vencidas
até a data do presente acórdão, conforme o disposto no § 11 do artigo 85, do CPC
10. Agravo interno provido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5046840-07.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: MANOEL FERREIRA DE LIMA
Advogado do(a) APELANTE: PAULO ROBERTO DA SILVA DE SOUZA - SP322871-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5046840-07.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: MANOEL FERREIRA DE LIMA
Advogado do(a) APELANTE: PAULO ROBERTO DA SILVA DE SOUZA - SP322871-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
R E L A T Ó R I O
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):
Cuida-se deagravo internointerposto pela parte autora em face de decisão que
monocraticamente, nos termos do art. 932 V do CPC, negou provimento à sua apelação.
O agravante sustenta, em síntese, que carreou aos autos início de prova material suficiente
para que, aliado aos depoimentos testemunhais, seja reconhecida a atividade rurícola no
período de 26/01/1972 a 30/12/1980, sendo pacífica a Jurisprudência no sentido de que a prova
material não precisa abranger todo o intervalo requerido.
Sem manifestação do agravado, os autos vieram conclusos.
É o relatório.
epv
, Tribunal Regional Federal da 3ª Região9ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5046840-07.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 32 - JUÍZA CONVOCADA LEILA PAIVA
APELANTE: MANOEL FERREIRA DE LIMA
Advogado do(a) APELANTE: PAULO ROBERTO DA SILVA DE SOUZA - SP322871-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
VOTO
A Excelentíssima Senhora Juíza Federal convocada Leila Paiva (Relatora):
Presentes os requisitos de admissibilidade, nos termos do artigo 1.021, §§, do CPC/2015,
conheço do presente recurso.
Cuida-se deagravo internointerposto pela parte autora em face de decisão que
monocraticamente, nos termos do art. 932 V do CPC, negou provimento à sua apelação.
O agravante sustenta, em síntese, que carreou aos autos início de prova material suficiente
para que, aliado aos depoimentos testemunhais, seja reconhecida a atividade rurícola no
período de 26/01/1972 a 30/12/1980, sendo pacífica a Jurisprudência no sentido de que a prova
material não precisa abranger todo o intervalo requerido.
O agravo interno tem por fim impugnar os fundamentos da decisão agravada que, seja
assegurado o direito à ampla defesa, submetendo as alegações recursais ao órgão colegiado,
não se prestando à rediscussão de matéria já decidida.
O acesso à Previdência Social foi erigido pela Constituição da República a direito fundamental
de segunda geração, razão por que as Colendas Cortes Superiores flexibilizaram a rigidez da
metodologia processual probatória, dada à natureza das lides previdenciárias, que
instrumentalizam a discussão de direitos emanados de contexto social adverso, considerando-
se as especiais condições do trabalho campesino.
Nessa esteira, acomprovação da atividade ruralpode ser realizada medianteinício de prova
materialcorroborada por prova testemunhal, conforme o § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213, de
24/07/1991,in verbis:
Art. 55. (...)§ 3º A comprovação do tempo de serviço para os fins desta Lei, inclusive mediante
justificativa administrativa ou judicial, observado o disposto no art. 108 desta Lei, só produzirá
efeito quando for baseadaem início de prova material contemporânea dos fatos, não admitida a
prova exclusivamente testemunhal, exceto na ocorrência de motivo de força maior ou caso
fortuito, na forma prevista no regulamento. (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)
O comando legal transcrito veda expressamente a exclusividade da prova testemunhal,
impondo que conjunto probatório deve ser norteado pela harmonia das provas material e
testemunhal idônea, vedado o reconhecimento de tempo de trabalho rurícola mediante somente
a apresentação de testemunhos. Essa interpretação foi cristalizada pelo C. STJ no verbete
daSúmula 149 do C. STJ: “A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”. (STJ, Terceira Seção, j.
07/12/1995, DJ 18/12/1995).
Acrescente-se que o comando do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, e o
precedente inserto na Súmula 149/STJ aplicam-se também aos trabalhadores rurais que
laboram na informalidade, como os denominados “boias-frias”, por força do que foi consignado
peloTema 554 pelo C. STJ(REsp Repetitivo nº 1.321.493, Relator Ministro Herman Benjamin, j.
10/10/2012, DJe 19/12/2012).
No que diz respeito àsprovas materiaisconsideradas aptas à demonstração do trabalho rural,
elas foram enumeradas peloartigo 106 da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, cujo rol tem natureza
meramente exemplificativa, conforme jurisprudência pacificada do C. STJ e deste C. Tribunal,
(Precedentes:AgInt no AREsp 1372590/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda
Turma, j. 21/03/2019; DJe 28/03/2019; RESP nº 1.081.919/PB, Relator Ministro Jorge Mussi,
Quinta Turma, DJe 03/08/2009; TRF3, Nona Turma,Apelação/Remessa Necessária
AC6080974-09.2019.4.03.9999, Relator Desembargador Federal Gilberto Jordan, publ.
25/11/2020)
A comprovação da atividade rural será realizada, ainda, mediante verificação dos registros de
segurados especiais no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), na forma dos artigos
38-A e 38-B da Lei nº 8.213, de 24/07/1991.
Quanto à declaração de sindicato de trabalhadores rurais, o documento foi submetido a três
disciplinas distintas. Inicialmente, por força do disposto pelo artigo 106 do PBPS, exigia-se a
homologação do Ministério Público. A partir da edição da Lei nº 9.063, em14/06/1995, passou a
ser necessária a homologação do INSS. No entanto, desde18/01/2019, com a edição da
Medida Provisória nº 871/2019, convertida na Lei nº 13.846, de 2019, não pode ser aceita a
referida declaração para fins de comprovação da atividade rural.
A possibilidade de aplicação daeficácia prospectiva e retrospectiva dos documentospermite o
reconhecimento de tempo de serviço rural além do período relativo ao início de prova material,
quando for corroborado por prova testemunhal. Esse entendimento foi consolidado e reiterado
pelo Colendo STJ, conferindo segurança jurídica à aplicação dessa ratio decidendi aos casos
concretos, de natureza obrigatória às instâncias inferiores, na forma das normas do artigo 927
do CPC.
Ao cristalizar oTema 554/STJ, já referido acima, o C. STJ estabeleceu diretrizes para
observância da Súmula 149/STJ, que poderá ter a sua aplicação abrandada quando a prova
material for corroborada pela prova testemunhal idônea. Atese firmada assentou que: “Aplica-se
a Súmula 149/STJ (‘A prova exclusivamente testemunhal (...)’) aos trabalhadores rurais
denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por
outro lado,considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador
campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal
pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida
prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal”. (REsp Repetitivo nº
1.321.493, Relator Ministro Herman Benjamin, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012).
Segundo esse mesmo juízo, foi admitido pela Colenda Corte de Justiça a possibilidade de a
prova testemunhal conceder suporte ao período laborado anteriormente à data do primeiro
documento apresentado. Assim foi consolidado oTema 638/STJ: “Mostra-se possível o
reconhecimento detempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que
amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório" (RESP nº
1.348.633/SP, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, j. 28/08/2013, DJE 05/12/2014).
Nessa senda, sedimentou-se a jurisprudência do C. STJ no sentido de admitir o
reconhecimento de tempo rural anterior ao documento mais antigo, contanto que seja
corroborado pela prova testemunhal. Esse é o teor do verbete daSúmula 577/STJ: “É possível
reconhecer otempo de serviço rural anterior ao documento mais antigoapresentado, desde que
amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório” (Primeira Seção, j.
22/06/2016, DJe 27/06/2016).
Como é sabido,após a data de início da vigência da Lei nº 8.213, de 24/07/1991, que se deu a
partir de 25/07/1991, énecessário orecolhimento das contribuições sociaispara fins de
averbação de tempo de serviço rural sem registro, objetivando a percepção de aposentadoria
por tempo de contribuição.
Cabe anotar que a pretérita fixação do mês de outubro de 1991, como termo final da não
exigência de contribuições, decorre de alteração, revogada, do § 2º do artigo 55 da Lei nº
8.213, de 24/07/1991, pela Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, reeditada até a MP
1523-13, de 23/10/1997, e depois pela MP nº 1596-14, de 10/11/1997. Durante a vigência fugaz
das referidas MPs, (de 11/10/1996 a 09/10/1997), a redação ao § 2º do artigo 55 passou a
referir expressamente disciplina quanto ao “tempo de atividade rural anterior a novembro de
1991”. Todavia, o texto não prevaleceu quando da conversão da MP 1596-14/97 na Lei nº
9.528, de 10/12/1997, impondo-se o retorno à versão original, a saber: “§ 2ºO tempo de serviço
do segurado trabalhador rural,anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado
independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para
efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento”.
Destarte, ao segurado especial ou trabalhador rural, que pretenda o cômputo do tempo de
serviço campesino para aposentação por tempo de contribuição, é desnecessária a
comprovação de recolhimentos de contribuições previdenciárias no período anterior à data do
início da vigência da Lei de Benefícios, em 25/07/1991.
Esse é o entendimento do C. STJ:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO
ESPECIAL. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO
RURAL SEM NECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES
PREVIDENCIÁRIAS. POSSIBILIDADE. SEGURADO ESPECIAL FILIADO AO REGIME GERAL
DE PREVIDÊNCIA SOCIAL ANTES DA LEI 8.213/1991. AGRAVO REGIMENTAL NÃO
PROVIDO.
1. A decisão agravada deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos, pois aplicou a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, firme no sentido de quea necessidade de
recolhimento de contribuições previdenciárias só é evidenciada para os casos em que se
pleiteia o benefício aposentadoria por tempo de contribuição, tendo em vista que em caso de
aposentadoria por idade rural, aplica-se o disposto no art. 39, I, da Lei 8.213/1991. (...) 2.
Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1537424/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/08/2015, DJe 03/09/2015)
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. SÚMULA 343/STF.
INAPLICABILIDADE. CONTAGEM DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL PARA
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. RGPS. RECOLHIMENTO DE
CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE. 1. É inaplicável a Súmula 343/STF quando a questão
controvertida possui enfoque constitucional.2. Dispensa-se o recolhimento de contribuição para
averbação do tempo de serviço rural em regime de economia familiar, relativo a período anterior
à Lei n. 8.213/1991, para fins de aposentadoria por tempo de contribuição pelo Regime Geral
da Previdência Social (RGPS).3. Ação rescisória procedente. (AR 3.902/RS, Rel. Ministro
SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 24/04/2013, DJe 07/05/2013)
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. ERRO DE FATO. OCORRÊNCIA. TEMPO DE
SERVIÇO RURAL. APOSENTADORIA. CONTRIBUIÇÕES. DESNECESSIDADE.
PRECEDENTES. I - O autor não pleiteou aposentadoria no regime estatuário, pois sempre foi
vinculado ao Regime Geral de Previdência Social -RGPS. II - Ao julgar a causa como sendo
matéria referente à contagem recíproca, o r. decisum rescindendo apreciou os fatos
equivocadamente, o que influenciou de modo decisivo no julgamento da quaestio.III - Não é
exigível o recolhimento das contribuições previdenciárias, relativas ao tempo de serviço
prestado pelo segurado como trabalhador rural, anteriormente à vigência da Lei n° 8.213/91,
para fins de aposentadoria urbana pelo Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
Precedentes da Terceira Seção. Ação rescisória procedente.(AR 3.272/PR, Rel. Ministro FELIX
FISCHER, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/03/2007, DJ 25/06/2007, p. 215)
A Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, por
sua vez, editou o verbete da súmula nº 10 nos seguintes termos: “O tempo de serviço rural
anterior à vigência da Lei nº 8.213/91 pode ser utilizado para fins de contagem recíproca, assim
entendida aquela que soma tempo de atividade privada, rural ou urbana, ao de serviço público
estatutário, desde que sejam recolhidas as respectivas contribuições previdenciárias”.
Trata-se de ação previdenciária em vistas do reconhecimento de atividade rural sem registro na
CTPS, com posterior concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Apelou e agravou a parte autora da r. sentença e decisão monocrática que julgou improcedente
o pedido inicial porinsuficiência probatória.
Apresentado panorama legal e com base na análise do acervo fático-probatório produzido nos
autos, vejamos a controvérsia.
Em análise detida às provas dos autos, observo que a parte autora trouxe aos autos (ID
5913165):
a) Certidão de seu nascimento, no ano 1960, com a qualificação profissional do seu pai como
lavrador (p. 01);
b) Cédula do Banco do Brasil, para crédito de pequeno produtor rural, emitida em 1961, em
nome do pai do autor, para custeio de produção de algodão (p. 02/03);
c) Matrícula do pai do autor no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Penápolis, emitida em
22/12/1970 (p. 04);
d) Matrícula escolar da irmã do autor no ano de 1971, com a qualificação do seu genitor como
agricultor (p. 05);
e) CNIS com vínculo empregatício do autor na qualidade de trabalhador rural no período de
02/01/1981 a 26/01/1981, na Augustus Agropecuária e Reflorestamento (p. 14).
Dos documentos trazidos aos autos, destaco ser remansosa a Jurisprudência no sentido de
aceitar como início de prova do trabalho rural certidões e documentos nos quais constem
menção da atividade pela parte autora ou por seus familiares.
Em princípio, consigno que os documentos descritos nos itens 'a' e 'b', por se referirem a
período remoto, embora não possam servir de início de prova material, permitem assegurar que
o pai do autor era agricultor e como descrito nos itens 'c' e 'd', continuava nas lides rurais nos
anos de 1970 a 1971.
Foram ouvidas duas testemunhas.
Conforme asseverado na r. sentença, Liogi Hirata informou que a família do autor veio do
Nordeste para o interior do Estado de São Paulo e foram morar e trabalhar na propriedade rural
do Sr. Osvaldo Marim. Eram em vários irmãos e todos sobreviviam dessa atividade que eles
desenvolviam nessa propriedade. Lá trabalhavam como porcenteiros, em plantação de
amendoim, algodão, feijão, milho. O autor ainda era menino quando passou a morar lá, saindo
quando passou a trabalhar na cidade, já moço, aproximadamente em 1981/1982. Informou que
praticamente foram vizinhos de propriedade na época em que a família mudou-se do Nordeste
para a cidade em que residia.
Dessa forma, as provas documentais (que englobam os anos de 1970 a 1971) e orais,
analisadas em conjunto, permitem a comprovação do labor rural desenvolvido pela parte autora
no período de 26/01/1972 a 30/12/1980.
Ressalto que não há provas de que o autor tenha exercido outra atividade no referido período,
bem como seu primeiro vínculo empregatício no ano de 1981 se deu na qualidade de
trabalhador rural.
O autor, filho de agricultor, foi criado e trabalhou na zona rural, havendo forte presunção de que
desempenhou atividade campesina desde muito jovem, como é comum acontecer nesse
ambiente, em que toda a família, inclusive filhos ainda em tenra idade, vão para o campo, em
prol de suas subsistências.
O marco inicial do cômputo do trabalho do autor é a partir dos seus doze anos de idade.
Nesse ponto, oportuno salientar que é possível o cômputo do trabalho rural realizado pelo
menor de idade, pois a norma constitucional que não permite o seu trabalho não pode ser
estabelecida em seu desfavor, ou seja, privá-lo de ver seu direito de averbação da atividade
agrária para fins previdenciárias, especialmente quando se considera a dura realidade daqueles
que se veem obrigados a trabalhar desde a tenra idade. Nesse sentido é o ARE 1.045.867, de
relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, Dje: 03.08.2017.
Por fim, não há qualquer disposição na legislação de que a averbação do trabalho rurícola deve
ser realizada de acordo com a data inicial e final dos documentos, uma vez pacificado na
Jurisprudência de que é possível ampliar o lapso, desde que corroborado por testemunhos
idôneos.
Dessa forma, em resumo, reconheço a atividade rural, sem registro, desenvolvida pelo autor, no
período de 26/01/1972 a 30/12/1980, independentemente do recolhimento de contribuições
previdenciárias, não podendo tal período ser computado para efeito de carência, nos termos do
art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.
Somado o período rural reconhecido ao tempo de contribuição reconhecido pelo ente
autárquico, quando do requerimento administrativo, 17/09/2015 (28 anos, 9 meses e 18 dias -
ID 5913165, p. 15/17), perfaz a parte autora 37 anos, 8 meses e 23 dias de tempo de
contribuição, fazendo jus à aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos da planilha
constante do site: https://planilha.tramitacaointeligente.com.br/planilhas/72TMD-4FRT7-MC
Consigno que o termo inicial do pagamento do benefício deve ser fixado na data do
requerimento administrativo (DER), em 17/09/2015, data em que o autor já preenchia os
requisitos e tinha direito adquirido ao benefício.
As prestações vencidas, referentes ao período retroativo a partir da DER, deverão ser corrigidas
monetariamente e acrescidas de juros de mora.
Aplica-se aos débitos previdenciários a súmula 148 do C.STJ:"Os débitos relativos a benefício
previdenciário, vencidos e cobrados em juízo após a vigência da Lei nº 6.899/81, devem ser
corrigidos monetariamente na forma prevista nesse diploma legal”. (Terceira Seção, j.
07/12/1995)
Da mesma forma, incide a súmula 8 deste E. Tribunal: “Em se tratando de matéria
previdenciária, incide a correção monetária a partir do vencimento de cada prestação do
benefício, procedendo-se à atualização em consonância com os índices legalmente
estabelecidos, tendo em vista o período compreendido entre o mês em que deveria ter sido
pago, e o mês do referido pagamento".
A incidência de juros de mora deve observar a norma do artigo 240 do CPC de 2015,
correspondente ao artigo 219 do CPC de 1973, de modo que são devidos a partir da citação, à
ordem de 6% (seis por cento) ao ano, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/02; após, à razão
de 1% ao mês, por força do art. 406 do Código Civil e, a partir da vigência da Lei nº
11.960/2009 (art. 1º-F da Lei 9.494/1997), de acordo com a remuneração das cadernetas de
poupança, conforme determinado na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947
(Tema 810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
Há incidência de correção monetária na forma da Lei n. 6.899, de 08/04/1981 e da legislação
superveniente, conforme preconizado pelo Manual de Cálculos da Justiça Federal, consoante
os precedentes do C. STF no julgamento do RE n. 870.947 (Tema 810), bem como do C. STJ
no julgamento do Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
c) Honorários advocatícios
Sucumbente, mantenho a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios
fixados em 10% sobre o valor da condenação, consoante o disposto no artigo 85, §§ 2º a 3º, do
CPC.
Os honorários advocatícios, conforme a Súmula 111 do C. STJ, incidem sobre as parcelas
vencidas até a sentença de procedência, porém, tendo em vista que a pretensão da parte
autora, ora agravante, foi provida somente em fase recursal, a condenação da verba honorária
incidirá sobre as parcelas vencidas até a data do presente acórdão, conforme o disposto no §
11 do artigo 85, do CPC.
Nesse sentido é o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TERMO FINAL PARA APURAÇÃO DA
BASE DE CÁLCULO. OBSERVÂNCIA DA SÚMULA 111/STJ.
1. Conforme teor da Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça, o marco final da verba
honorária deve ser a decisão em que o direito do segurado foi reconhecido: "Os honorários
advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a
sentença".
2. Na hipótese, o acórdão recorrido, que concedeu o direito à aposentadoria especial, deve ser
considerado como termo final. Nesse sentido: AgRg no AREsp 271.963/AL, Rel. p/a. Acórdão,
Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 19/5/2014; EDcl no AgRg no REsp 1.271.734/RS,
Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora Convocada do TJ/PE), DJe de
18/4/2013; AgRg nos EDcl no AREsp 155.028/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques,
Segunda Turma, DJe 24/10/2012. (g. m.)
3. Recurso Especial provido.
(REsp 1831207/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
12/11/2019, DJe 19/12/2019)
PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 7 DO STJ. TERMO FINAL.
SÚMULA 111 DO STJ. OBSERVÂNCIA.
1. A jurisprudência desta Corte Superior admite a revisão do juízo de equidade referente à
fixação de honorários advocatícios (art. 20, § 4º, do CPC/1973) quando o valor arbitrado é
irrisório ou exorbitante, pois, nesses casos, a violação à aludida norma processual exsurge de
maneira flagrante a justificar a intervenção deste Sodalício como meio de preservar a aplicação
da lei federal de regência.
2. Caso em que não se mostra desarrazoada a fixação dos honorários advocatícios em 10%
sobre o valor da condenação, cuja revisão esbarra no óbice da Súmula 7 do STJ.
3. A respeito do termo final da verba honorária, a orientação jurisprudencial do Superior Tribunal
de Justiça é a de que deve ser fixado na data do julgamento favorável à concessão do benefício
pleiteado, excluindo-se as parcelas vincendas, conforme determina a Súmula 111 desta Corte.
(g. m.)
4. Agravo interno não provido.
(AgInt no AREsp 824.577/SP, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado
em 22/08/2017, DJe 04/10/2017)
Ante o exposto, dou provimento ao agravo interno, restando provida a apelação da parte autora,
nos termos da fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. INTERNO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ARTIGO
1.021 E §§ DO CPC DE 2015. AVERBAÇÃO DE LABOR RURÍCOLA. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL AMPLIADO PELA OITIVA DE TESTEMUNHAS. POSSIBILIDADE.
1. O agravo interno tem por fim impugnar os fundamentos da decisão agravada, para que seja
assegurado o direito à ampla defesa, submetendo as alegações recursais ao órgão colegiado,
não se prestando à rediscussão de matéria já decidida.
2. Trata-se de agravo interno interposto pelo autor em face de decisão que monocraticamente
negou provimento à sua apelação.
3. A possibilidade de aplicação daeficácia prospectiva e retrospectiva dos documentospermite o
reconhecimento de tempo de serviço rural além do período relativo ao início de prova material,
quando for corroborado por prova testemunhal. Esse entendimento foi consolidado e reiterado
pelo Colendo STJ, conferindo segurança jurídica à aplicação dessa ratio decidendi aos casos
concretos, de natureza obrigatória às instâncias inferiores, na forma das normas do artigo 927
do CPC.
4. Ao cristalizar oTema 554/STJ, o C. STJ estabeleceu diretrizes para observância da Súmula
149/STJ, que poderá ter a sua aplicação abrandada quando a prova material for corroborada
pela prova testemunhal idônea. Atese firmada assentou que: “Aplica-se a Súmula 149/STJ (‘A
prova exclusivamente testemunhal (...)' aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias',
sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado,considerando a
inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova
material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula
149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea
e robusta prova testemunhal”. (REsp Repetitivo nº 1.321.493, Relator Ministro Herman
Benjamin, j. 10/10/2012, DJe 19/12/2012).
5. Por outro lado, não há qualquer disposição na legislação de que a averbação do trabalho
rurícola deve ser realizada de acordo com a data inicial e final dos documentos, uma vez
pacificado na Jurisprudência de que é possível ampliar o lapso, desde que corroborado por
testemunhos idôneos.
6. Dessa forma, as provas documentais (que englobam os anos de 1970 a 1971) e orais,
analisadas em conjunto, permitem a comprovação do labor rural desenvolvido pela parte autora
no período de 26/01/1972 a 30/12/1980, independentemente do recolhimento de contribuições
previdenciárias, não podendo tal período ser computado para efeito de carência, nos termos do
art. 55, §2º, da Lei 8.213/1991.
7. Somado o período rural ora reconhecido ao tempo de contribuição, perfaz o autor na data do
requerimento administrativo mais de 35 anos de contribuição, fazendo jus ao benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição.
8. Comprovados os requisitos para concessão do benefício na data do requerimento
administrativo, este deve ser considerado como seu termo inicial, acrescidas as parcelas
devidas de correção monetária e juros.
9. Condenado ao pagamento de honorários advocatícios, no patamar de 10% sobre o valor da
condenação, nos termos do artigo 85, §§ 3º e 5º, c.c. artigo 86, parágrafo único, do CPC,
incidentes, conforme a Súmula 111 do C. STJ, sobre as parcelas vencidas até a sentença de
procedência, porém, tendo em vista que a pretensão da parte autora, ora agravante, foi provida
somente em fase recursal, a condenação da verba honorária incidirá sobre as parcelas
vencidas até a data do presente acórdão, conforme o disposto no § 11 do artigo 85, do CPC
10. Agravo interno provido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu dar provimento ao agravo interno, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
