
11ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009299-44.2002.4.03.6100
RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI
AUTOR: BRAVOX S A INDUSTRIA E COMERCIO ELETRONICO
Advogado do(a) AUTOR: JOSE PAULO DE CASTRO EMSENHUBER - SP72400-A
REU: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
11ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009299-44.2002.4.03.6100
RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI
AUTOR: BRAVOX S A INDUSTRIA E COMERCIO ELETRONICO
Advogado do(a) AUTOR: JOSE PAULO DE CASTRO EMSENHUBER - SP72400-A
REU: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de juízo positivo de retratação, nos termos do artigo 1.040, II do Código de Processo Civil.
Foi proposta ação ordinária, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, por BRAVOX S/A INDÚSTRIA E COMÉRCIO ELETRÔNICO, objetivando a declaração de inexigibilidade das contribuições previdenciárias sobre os valores pagos referentes a título de auxílio-doença, auxílio-acidente, auxílio-paternidade, complementação de auxilio previdenciário, indenização prevista no artigo 479 da CLT, indenização para o empregado demitido e que tenha mais de 45 anos, indenização por dispensa antes do dissidio coletivo, abonos/prêmios, adicional noturno, horas extras, periculosidade, insalubridade e salário-maternidade, bem como a compensação das quantias pretéritas indevidamente pagas, nos últimos dez anos.
O pedido de antecipação de tutela foi indeferido (ID 267356175 - fls. 142/143).
A r. sentença (ID 267356175, fls. 181/202), julgou improcedente o pedido. Fixando honorários advocatícios em 10% do valor da causa.
A parte autora interpôs recurso de apelação, pleiteando a concessão da ordem conforme seu pleito inicial. Apresentada contrarrazões.
Proferido o v. acórdão (ID267356665 – fls. 14/26), deu parcial provimento à apelação a parte autora, apenas para reconhecer a inexigibilidade da contribuição sobre os valores pagos ao empregado afastado por motivo de doença durante os quinze primeiros dias.
As partes opuseram embargos de declaração, alegando, em síntese, que o v. acórdão padece de obscuridade e omissão, apontando normas legais e constitucionais, rediscutindo a matéria.
Proferido o v. acórdão (ID267356665 – fls. 47/53), que conheceu e negou provimento aos embargos de declaração.
Da decisão supramencionada, as partes interpuseram Recursos Excepcionais. Apresentadas contrarrazões.
Em certidão (ID267356665 – fl. 234), o exame de admissibilidade dos recursos excepcionais interpostos foi sobrestado até o julgamento dos representativos das controvérsias RE nº 593.068, REsp nº 1.358.291 e REsp nº 1.230.957.
Em decisão monocrática (ID267356665 - fls. 236/238), a Vice-Presidente desta Corte, Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, considerando decisão do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 576.967/PR, alçado como representativo de controvérsia (tema nº 72) e submetido à sistemática de repercussão geral, fixando a tese de que "É inconstitucional a incidência da contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário maternidade", encaminhou os autos a esta Turma Julgadora, para verificação da pertinência de se proceder a um juízo positivo de retratação, nos termos do artigo 1.040, II do Código de Processo Civil.
Os autos retornaram conclusos a este Relator.
É o relatório.
11ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009299-44.2002.4.03.6100
RELATOR: Gab. 39 - DES. FED. JOSÉ LUNARDELLI
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V O T O
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL JOSÉ LUNARDELLI (RELATOR):
Inicialmente, com a entrada em vigor do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), em 18/03/2016, observo que no julgamento dos recursos interpostos contra decisões ou sentenças publicadas antes da entrada em vigor do presente código, continuam a ser aplicadas as disposições do antigo Código de Processo Civil, de 1973, em obediência ao princípio da não surpresa e ao princípio constitucional do isolamento dos atos processuais.
Com essa finalidade, editou o STJ o Enunciado Administrativo nº 2, que dispõe o seguinte: "Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/1973 (relativos a decisões publicadas até 17 de março de 2016) devem ser exigidos os requisitos de admissibilidade na forma nele prevista, com as interpretações dadas, até então, pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça."
Passo à análise da matéria tratada nos autos.
Cumpre destacar que a devolução dos autos pela Vice-Presidência ocorre para verificar a pertinência de se proceder a um juízo de retratação, nos termos e para fins estabelecidos pelo artigo 1.040, II do Código de Processo Civil.
O v. acórdão recorrido, assim consignou em sua ementa:
“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. INDEVIDA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE OS QUINZE PRIMEIROS DIAS DE AUXÍLIO-DOENÇA. AUXÍLIO-ACIDENTE. LICENÇA PATERNIDADE. SALÁRIO MATERNIDADE. COMPLEMENTAÇÃO SOBRE O AUXÍLIO-DOENÇA. INDENIZAÇÃO PARA O EMPREGADO DEMITIDO COM MAIS DE 45 ANOS. INDENIZAÇÃO POR DISPENSA ANTES DO DISSÍDIO COLETIVO. INDENIZAÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 479 DA CLT. ABONOS E PRÊMIOS. ADICIONAL DE HORAS-EXTRAS. NOTURNO. INSALUBRIDADE. PERICULOSIDADE. COMPENSAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PROVA DO RECOLHIMENTO. ÔNUS DA AUTORA.
1. O empregado afastado por motivo de doença não presta serviço e, por isso, não recebe salário durante os primeiros 15 (quinze) dias de afastamento. A descaracterização da natureza salarial afasta a incidência da contribuição à Seguridade Social.
2. O auxílio-acidente É BENEFÍCIO previsto no artigo 86 da lei n.º 8.213 e não tem qualquer semelhança com o auxílio-doença, mesmo na hipótese de concessão em razão de acidente propriamente dito ou de doença ocupacional, pois ele pressupõe não o afastamento, mas o retorno do segurado às atividades laborais, embora com redução da produtividade em razão das seqüelas. Inclusive, o valor do auxílio-acidente não integra o salário de contribuição, para os fins da Lei n° 8.212/91, como previsto no seu art. 28, §9°; a: § 9º "Não integram o salário-de-contribuição para os fins desta Lei, exclusivamente: a) os benefícios da previdência social, nos termos e limites legais, salvo o salário-maternidade";
3. O salário maternidade tem natureza salarial e integra a base de cálculo da contribuição previdenciária, consoante o artigo 7º, XVIII da CF/88 e do artigo 28, §2º, da Lei nº 8.212/91. (Precendentes do STJ).
4. Sobre os valores pagos a título da licença-paternidade ou auxílio-paternidade como a chama a autora, prevista no artigo Art. 7º, XIX, da CF/88 e art. 10, § 1º, do ADCT, incide contribuição previdenciária, pois é licença remunerada prevista constitucionalmente, tem natureza salarial, não se incluindo no rol dos benefícios previdenciários (TRF3 - AC 2003.61.00.004699-3).
5. A complementação sobre o auxílio-doença, entre o 16° dia e o 120º dia, a indenização para o empregado demitido com mais de 45 anos e a indenização por dispensa antes do dissídio coletivo têm regramento de concessão previsto em Convenção Coletiva de Trabalho, constituindo uma condição mais benéfica do que a prevista em lei.
6. As Convenções Coletivas de Trabalho operam efeito entre as partes (art. 611, CLT) e não se sobrepõem à Lei, não vinculando a Fazenda Pública, bem como que a natureza remuneratória, indenizatória ou de mera liberalidade do empregador são aferidas pelas condições em que o pagamento é realizado e não segundo a denominação dada.
7. A Primeira Seção do E. STJ, por ocasião do julgamento dos REsp's 1.112.745/SP e 1.102.575/MG, submetidos ao regime do art. 543-C do CPC, consolidou o entendimento de que sobre as verbas pagas espontaneamente ou por liberalidade do ex-empregador não há imposição de nenhuma fonte normativa prévia ao ato de dispensa e que as mesmas não possuem caráter indenizatório.
8. A autora pretende, na verdade, que a inexigibilidade da contribuição previdenciária sobre os valores previstos no artigo 479 da CLT, prevista no § 9º do artigo 28 da Lei n° 8.212/91, retroaja para o lapso temporal anterior a ela. Tal pleito é impossível, à mingua de previsão legal para o período pretendido.
9. Quanto às gratificações e prêmios, em análise, a incidência da contribuição à Seguridade Social sobre a referida gratificação depende da habitualidade com que esta é paga. Se é habitual, integra a remuneração e sobre ela recai a contribuição. Em caso contrário, quando não há habitualidade, não integra a remuneração e, em conseqüência, não é devida a contribuição. (TST - RR-761.168/2001, rel. Min. Rider de Brito, DJ-10.10.2003.).
10. Cabe à autora, nos termos do artigo 333 do Código de Processo Civil, I, o ônus da prova quanto ao fato constitutivo do seu direito e, no presente caso, não restou demonstrado nos autos se havia ou não a habitualidade propalada pela demandante, pelo que, em momento próprio para a produção de provas, isso deveria ter sido demonstrado pela via material, pericial ou testemunhal.
11. É pacífico no Superior Tribunal de Justiça que incide contribuição previdenciária sobre os adicionais de horas-extras, noturno, insalubridade e periculosidade, em razão do seu caráter salarial.
12. Não é possível a pretensão de compensação quanto ao auxílio-doença, pois a autora não comprovou ter recolhido as verbas sobre as quais ora reconheço não incidir a contribuição, não demonstrando, portanto, o seu direito à compensação.
13. Era ônus da autora provar o alegado, nos termos do artigo 333 do CPC
14. A simples juntada de guias de recolhimento à Previdência Social, sem qualquer outra prova demonstra o pagamento de contribuição previdenciária, mas não das verbas.
15. Não há prova do pagamento de contribuição social previdenciária sobre os primeiros quinze dias anteriores aos benefícios de auxílio-doença. Não há provas de empregados afastados do trabalho, períodos em que tal se deu, CAT - Comunicação de Acidente do Trabalho, para as hipóteses de acidente de trabalho ou de doença profissional ou qualquer outro documento nesse sentido, como a GFIP, preenchida conforme orientação contida no manual do SEFIP 8, que pode ser obtido no site www.cef.gov.br. A partir do relatório da GFIP/SEFIP é possível aferir, por exemplo, se ocorreram, no período em que se pretende compensar, ocorrências relativas a auxílio-doença previdenciário (B31) ou auxílio-doença decorrente de acidente de trabalho (B91). Na GFIP, o auxílio-doença previdenciário é declarado no mês em que se deu o início do afastamento e, também, no mês de retorno, com código de afastamento P1 ou P2. Já no auxílio-doença decorrente de acidente de trabalho, deve ser declarada mensalmente a ocorrência, sob o código de afastamento O1 e O2. Tais distinções se fazem necessárias, naquele documento, para efeito de incidência de FGTS, o que não vem ao caso em análise. O que importa nestes autos, é definir o conceito de prova, ou seja, a comprovação do recolhimento, com a juntadas das guias, bem como a demonstração do fato, por meio dos relatórios da GFIP/SEFIP ou, alternativamente, pela CAT, para o auxílio-doença decorrente de acidente do trabalho ou outros documentos que permitam aferir o direito alegado.
16. Não prospera a pretensão recursal da autora quanto à compensação do aludido benefício.
17. Sucumbência mantida, pois a autora foi vencedora em parte mínima do pedido.
18. Apelação da autora a que se dá parcial provimento, apenas para reconhecer a inexigibilidade da contribuição sobre os valores pagos ao empregado afastado por motivo de afastamento por doença durante os primeiros 15 (quinze) dias.”
Assiste parcial razão à impetrante, no tocante a não incidência de contribuição previdenciária sobre os valores despendidos a título de salário-maternidade.
O Supremo Tribunal Federal, analisando o RE nº 576.967/PR, assentou entendimento de que "É inconstitucional a incidência da contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário maternidade", sendo decidido pelo Tribunal Pleno, em 05.08.2020, com julgamento publicado em 21.10.2020, a ementa que segue:
"Direito constitucional. Direito tributário. Recurso Extraordinário com repercussão geral. Contribuição previdenciária do empregador. Incidência sobre o salário-maternidade. Inconstitucionalidade formal e material.
1. Recurso extraordinário interposto em face de acórdão do TRF da 4ª Região, que entendeu pela constitucionalidade da incidência da contribuição previdenciária "patronal" sobre o salário-maternidade.
2. O salário-maternidade é prestação previdenciária paga pela Previdência Social à segurada durante os cento e vinte dias em que permanece afastada do trabalho em decorrência da licença-maternidade. Configura, portanto, verdadeiro benefício previdenciário.
3. Por não se tratar de contraprestação pelo trabalho ou de retribuição em razão do contrato de trabalho, o salário-maternidade não se amolda ao conceito de folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício. Como consequência, não pode compor a base de cálculo da contribuição previdenciária a cargo do empregador, não encontrando fundamento no art. 195, I, a, da Constituição. Qualquer incidência não prevista no referido dispositivo constitucional configura fonte de custeio alternativa, devendo estar prevista em lei complementar (art. 195, §4º). Inconstitucionalidade formal do art. 28, §2º, e da parte final da alínea a, do §9º, da Lei nº 8.212/91.
4. Esta Corte já definiu que as disposições constitucionais são legitimadoras de um tratamento diferenciado às mulheres desde que a norma instituidora amplie direitos fundamentais e atenda ao princípio da proporcionalidade na compensação das diferenças. No entanto, no presente caso, as normas impugnadas, ao imporem tributação que incide somente quando a trabalhadora é mulher e mãe cria obstáculo geral à contratação de mulheres, por questões exclusivamente biológicas, uma vez que torna a maternidade um ônus. Tal discriminação não encontra amparo na Constituição, que, ao contrário, estabelece isonomia entre homens e mulheres, bem como a proteção à maternidade, à família e à inclusão da mulher no mercado de trabalho. Inconstitucionalidade material dos referidos dispositivos.
5. Diante do exposto, dou provimento ao recurso extraordinário para declarar, incidentalmente, a inconstitucionalidade da incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade, prevista no art. art. 28, §2º, e da parte final da alínea a, do §9º, da Lei nº 8.212/91, e proponho a fixação da seguinte tese: "É inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário- maternidade".
(RE 576.967, Relator Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 05/08/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-254 DIVULG 20-10-2020 PUBLIC 21-10-2020) Grifei
Verifico, portanto, que o v. acórdão se encontra em dissonância ao julgado pelo Supremo Tribunal Federal, no RE nº 576.967/PR, em sistemática de repercussão geral.
Desta forma, reconsidero a decisão anteriormente proferida, em divergência com a orientação atual do Supremo Tribunal Federal, reexaminando a causa, para adequá-la à jurisprudência consolidada, reconhecendo a não incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário-maternidade.
Diante do exposto, nos termos do artigo 1.040, II do Código de Processo Civil, cabível o juízo positivo de retratação, para reconsiderar o acórdão anterior e dar parcial provimento ao recurso de apelação da impetrante, incluindo a inexigibilidade de contribuição previdenciária sobre os valores recolhidos a título de salário-maternidade, nos termos da fundamentação supra.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA PATRONAL. SALÁRIO MATERNIDADE. REPERCUSSÃO GERAL. PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - RE 576.967/PR.
1. Retornam os autos da Vice-Presidência para juízo de retratação, nos termos e para os fins estabelecidos pelo artigo 1.040, II do Código de Processo Civil.
2. Reconsiderada a decisão anteriormente proferida, em divergência com a orientação atual do Supremo Tribunal Federal, reexaminando a causa, para adequá-la à jurisprudência consolidada, reconhecendo a não incidência de contribuição previdenciária a cargo do empregador sobre o salário-maternidade.
3. Adoção do entendimento da corte superior exarado no Recurso Extraordinário nº 576.967/PR.
4. Cabível juízo positivo de retratação, nos termos do artigo 1.040, II, do Código de Processo Civil.
