
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000138-61.2017.4.03.6111
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ ANTONIO DE ALMEIDA ROCHA
Advogados do(a) APELADO: ELIANE CRISTINA TRENTINI - SP263386-A, MARINA GERDULLY AFONSO - SP255209-A
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000138-61.2017.4.03.6111
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ ANTONIO DE ALMEIDA ROCHA
Advogados do(a) APELADO: ELIANE CRISTINA TRENTINI - SP263386-A, MARINA GERDULLY AFONSO - SP255209-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de devolução de autos de apelação ao órgão julgador, após juízo de admissibilidade de recursos excepcionais, para reexame de acórdão que recebeu a seguinte ementa:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. TEMA 692/STJ. PARCELAS DE BENEFÍCIO PAGAS POR FORÇA DE DECISÃO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. AUSÊNCIA DE TÍTULO EXECUTIVO.
- O parágrafo único do artigo 302 do diploma processual civil autoriza a execução, nos próprios autos, dos valores vertidos em razão da efetivação da tutela de urgência, que foi posteriormente modificada.
- A Primeira Seção do E. Superior Tribunal de Justiça firmou o Tema 692 no julgamento do REsp 1.401.560/MT, cujo v. acórdão foi publicado no DJe de 13/10/2015, com a seguinte tese: “A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos”.
- Na mesma ocasião, o C. Supremo Tribunal Federal proferiu compreensão a respeito do assunto, manifestando-se pela desnecessidade de devolução de valores de benefício previdenciário recebidos de boa-fé pelo segurado, quando decorrentes de decisão judicial. Precedentes.
- Registre-se, noutro giro, que o E. Plenário do C. STF, ao deliberar sobre o Tema 799/STF, se pronunciou pela natureza infraconstitucional da controvérsia jurídica acerca da “possibilidade da devolução de valores recebidos em virtude de tutela antecipada posteriormente revogada”, no julgamento do ARE 722.421/MG, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, rejeitando a repercussão geral, (Tribunal Pleno, j. 19/03/2015, publ. 30/03/2015).
- Por essas razões, dada à proximidade dos julgamentos das Colendas Cortes Superiores, e com o intuito de espancar dissonâncias, o C. STJ selecionou a Pet 12.482/DF para novo exame do Tema 692/STJ, conforme o julgamento de Questão de Ordem nos Recursos Especiais ns. 1.734.627/SP, 1.734.641/SP, 1.734.647/SP, 1.734.656/SP, 1.734.685/SP e 1.734.698/SP, com acórdão publicado em 03/12/2018.
- A Primeira Seção do E. Superior Tribunal de Justiça, em 11/05/2022, procedeu ao julgamento da Questão de Ordem para reafirmar a tese jurídica contida no Tema Repetitivo 692/STJ, apenas com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação de regência, fixando-a nos seguintes termos: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago".
- No caso dos autos, a revogação da tutela ocorreu em sede recursal, nos termos do v. acórdão proferido em 14/04/2020, que nada dispôs acerca da necessidade de devolução de valores.
- A prolação do v. acórdão, que revogou a tutela antecipada, se deu à época em que havia reiterado desencontro jurisprudencial entre os C. Tribunais Superiores, ocasião na qual se verificou distanciamento da tese originariamente fixada no Tema 692/STJ em decorrência de sucessivos pronunciamentos pelo C. Supremo Tribunal Federal no sentido da não devolução dos valores dos benefícios.
- Não há como prosperar o cumprimento de sentença proposto pelo INSS em razão da ausência de título executivo a embasar a sua pretensão, não merecendo reforma a r. sentença recorrida.
- Recurso de apelação desprovido.
A Vice-Presidência deste Tribunal, em juízo de adequação, verificou possível incompatibilidade do acórdão com a tese fixada no Tema 692/STJ.
É o relato do essencial.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000138-61.2017.4.03.6111
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LUIZ ANTONIO DE ALMEIDA ROCHA
Advogados do(a) APELADO: ELIANE CRISTINA TRENTINI - SP263386-A, MARINA GERDULLY AFONSO - SP255209-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.401.560/MT (Tema 692), pela sistemática dos recursos repetitivos, cujo v. acórdão foi publicado no DJe de 13/10/2015, firmou a seguinte tese jurídica: “A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos”.
Naquela época o Supremo Tribunal Federal possuía entendimento no sentido da desnecessidade de devolução de valores de benefício previdenciário recebidos de boa-fé pelo segurado, quando decorrentes de decisão judicial. Precedentes: MS 25.921 AgR/DF, Relator Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, j. 01/12/2015, publ. 04/04/2016; ARE 734.242 AgR/DF, Relator Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, j. 04/08/2015, publ. 08/09/2015; ARE 734199 AgR, Relatora Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, j. em 09/09/2014, publ. 23/09/2014.
Abarcado como paradigma representativo da controvérsia, o Plenário do C. STF no julgamento do ARE 722.421/MG (Tema 799), decidiu pela natureza infraconstitucional da controvérsia jurídica acerca da “possibilidade da devolução de valores recebidos em virtude de tutela antecipada posteriormente revogada”, rejeitando a repercussão geral (Tribunal Pleno, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, j. 19/03/2015, publ. 30/03/2015).
Com o intuito de por fim às dissonâncias interpretativas em julgamentos contemporâneos das Cortes Superiores, o Superior Tribunal de Justiça selecionou a Pet 12.482/DF para novo exame e revisão do entendimento do Tema 692/STJ, conforme o julgamento de Questão de Ordem nos Recursos Especiais nº 1.734.627/SP, 1.734.641/SP, 1.734.647/SP, 1.734.656/SP, 1.734.685/SP e 1.734.698/SP, com afetação ocorrida em 03/12/2018.
Em 11/05/2022 a C. Primeira Seção da Corte Superior procedeu ao julgamento da Questão de Ordem para reafirmar a tese jurídica contida no Tema Repetitivo 692/STJ, apenas com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação de regência, fixando-a nos seguintes termos: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago", cujo v. acórdão, publicado em 24/05/2022, recebeu a seguinte ementa:
PROCESSUAL CIVIL. PROPOSTA DE REVISÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO NO TEMA REPETITIVO 692/STJ (RESP N. 1.401.560/MT). ART. 927, § 4º, DO CPC/2015. ARTS. 256-S, 256-T, 256-U E 256-V DO RISTJ. DEVOLUÇÃO DE VALORES DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS RECEBIDOS POR FORÇA DE DECISÃO LIMINAR POSTERIORMENTE REVOGADA. ADVENTO DE NOVA LEGISLAÇÃO. ART. 115, INC. II, DA LEI N. 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 13.846/2019. TEMA N. 799/STF (ARE 722.421/MG): POSSIBILIDADE DA DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS EM VIRTUDE DE TUTELA ANTECIPADA POSTERIORMENTE REVOGADA. NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL. QUESTÃO DE ORDEM JULGADA NO SENTIDO DA REAFIRMAÇÃO, COM AJUSTES REDACIONAIS, DO PRECEDENTE FIRMADO NO TEMA REPETITIVO N. 692/STJ.
1. A presente questão de ordem foi proposta com a finalidade de definir se o entendimento firmado no Tema Repetitivo 692/STJ (REsp n. 1.401.560/MT) deve ser reafirmado, alterado ou cancelado, diante da variedade de situações que ensejam dúvidas quanto à persistência da orientação firmada pela tese repetitiva referida, bem como à jurisprudência do STF, estabelecida em sentido contrário, mesmo que não tendo sido com repercussão geral ou em controle concentrado de constitucionalidade.
2. O CPC/1973 regulamentava a matéria de forma clara, prevendo, em resumo, que a efetivação da tutela provisória corre por conta do exequente, e a sua eventual reforma restituiria as partes ao estado anterior à concessão, o que obrigaria o exequente a ressarcir eventuais prejuízos sofridos pelo executado. A mesma lógica foi mantida pelo legislador do CPC/2015. Por conta disso que sempre se erigiu como pressuposto básico do instituto da tutela de urgência a reversibilidade dos efeitos da decisão judicial.
3. O debate surgiu especificamente no que tange à aplicação de tal regulamentação no âmbito previdenciário. Ou seja, discutia-se se as normas específicas de tal área do direito trariam solução diversa da previsão de caráter geral elencada na legislação processual.
4. A razão histórica para o surgimento dessa controvérsia na área previdenciária consiste na redação original do art. 130 da Lei n. 8.213/1991, o qual dispunha que: "Ocorrendo a reforma da decisão, será suspenso o benefício e exonerado o beneficiário de restituir os valores recebidos". Nos idos de 1997, a Lei n. 9.528 alterou completamente a redação anterior, passando a valer a regra geral do CPC, na ausência de norma especial em sentido contrário no âmbito previdenciário.
5. A partir de então, começou a amadurecer a posição no sentido da necessidade de devolução dos valores recebidos em caso de revogação da tutela antecipada, o que redundou, em 2014, no entendimento vinculante firmado pelo STJ no Tema Repetitivo 692 (REsp n. 1.401.560/MT): "A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos.".
6. Em 2018, esta Relatoria propôs a questão de ordem sob exame, diante da variedade de situações que ensejam dúvidas quanto à persistência da orientação firmada pela tese repetitiva referida, bem como à existência de alguns precedentes em sentido contrário no STF, mesmo não tendo sido com repercussão geral ou em controle concentrado de constitucionalidade.
7. À época, o art. 115, inc. II, da Lei n. 8.213/1991 que regulamenta a matéria no direito previdenciário trazia redação que não era clara e direta como a da legislação processual, uma vez que não referia expressamente a devolução de valores recebidos a título de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada. Tal fato, aliás, não passou despercebido pela Primeira Seção ao rejeitar os EDcl no REsp n. 1.401.560/MT fazendo menção a tal fato.
8. Foi essa redação pouco clara que gerou dúvidas e terminou ocasionando, em 2018, a propositura da questão de ordem ora sob julgamento.
9. A Medida Provisória n. 871/2019 e a Lei n. 13.846/2019, entretanto, trouxeram uma reformulação da legislação previdenciária, e o art. 115, inc. II, passou a não deixar mais qualquer dúvida: Na hipótese de cessação do benefício previdenciário ou assistencial pela revogação da decisão judicial que determinou a sua implantação, os valores recebidos devem ser devolvidos à parte adversa.
10. Se o STJ quando a legislação era pouco clara e deixava margem a dúvidas já tinha firmado o entendimento vinculante no Tema Repetitivo 692/STJ, não é agora que deve alterar sua jurisprudência, justamente quando a posição da Corte foi sufragada expressamente pelo legislador reformador ao regulamentar a matéria.
11. Trata-se, pois, de observância de norma editada regularmente pelo Congresso Nacional, no estrito uso da competência constitucional a ele atribuída, não cabendo ao Poder Judiciário, a meu sentir, reduzir a aplicabilidade do dispositivo legal em comento, decorrente de escolha legislativa explicitada com bastante clareza.
12. Ademais, a postura de afastar, a pretexto de interpretar, sem a devida declaração de inconstitucionalidade, a aplicação do art. 115, inc. II, da Lei n. 8.213/1991 pode ensejar questionamentos acerca de eventual inobservância do art. 97 da CF/1988 e, ainda, de afronta ao verbete vinculante n. 10 da Súmula do STF.
13. O STF adota o posicionamento referido em algumas ações originárias propostas (na maioria, mandados de segurança) em seu âmbito. Porém, não o faz com caráter de guardião da Constituição Federal, mas sim na análise concreta das ações originárias. A maioria dos precedentes do STF não diz respeito a lides previdenciárias e, além disso, são todos anteriores às alterações inseridas no art. 115, inc. II, da Lei n. 8.213/1991. Na verdade, atualmente o STF vem entendendo pela inexistência de repercussão geral nessa questão, por se tratar de matéria infraconstitucional, como se verá adiante.
14. O que se discute no caso em tela é a interpretação de artigo de lei federal, mais especificamente, o art. 115, inc. II, da Lei n. 8.213/1991 e vários dispositivos do CPC/2015. Assim, vale o entendimento do STJ sobre a matéria, pois, segundo o art. 105 da Carta Magna, é esta Corte a responsável pela uniformização da interpretação da legislação infraconstitucional no país.
15. A propósito, o STF, ao julgar o Tema 799 da Repercussão Geral (ARE 722.421/MG, j. em 19/3/2015), já firmou expressamente que a questão não é constitucional e deve, portanto, ser deslindada nos limites da legislação infraconstitucional, o que foi feito com bastante clareza pelo legislador ao trazer a nova redação do art. 115, inc. II, da Lei n. 8.213/1991. No mesmo sentido, vide o RE 1.202.649 AgR (relator Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, j. em 20/12/2019), e o RE 1.152.302 AgR (relator Ministro Marco Aurélio, Primeira Turma, j. em 28/5/2019).
16. Ao propor a questão de ordem, esta Relatoria citou as seguintes particularidades processuais que supostamente seriam aptas a ensejar uma consideração específica quanto à possibilidade de revisão do entendimento firmado no Tema 692/STJ: a) tutela de urgência concedida de ofício e não recorrida; b) tutela de urgência concedida a pedido e não recorrida; c) tutela de urgência concedida na sentença e não recorrida, seja por agravo de instrumento, na sistemática processual anterior do CPC/1973, seja por pedido de suspensão, conforme o CPC/2015; d) tutela de urgência concedida initio litis e não recorrida; e) tutela de urgência concedida initio litis, cujo recurso não foi provido pela segunda instância; f) tutela de urgência concedida em agravo de instrumento pela segunda instância; g) tutela de urgência concedida em primeiro e segundo graus, cuja revogação se dá em razão de mudança superveniente da jurisprudência então existente.
17. Quanto a elas, note-se que se trata basicamente do momento em que foi concedida e/ou revogada a tutela de urgência, se logo no início do feito, se na sentença, se na segunda instância, ou se apenas no STF ou no STJ. A ideia subjacente é que, em algumas hipóteses, a tutela de urgência já estaria, de certa forma, incorporada ao patrimônio jurídico da parte autora, e sua revogação poderia resultar em injustiça no caso concreto.
18. Tais situações, entretanto, são tratadas pela lei da mesma forma, não merecendo distinção do ponto de vista normativo. Ou seja, em qualquer desses casos, a tutela de urgência não deixa de ser precária e passível de modificação ou revogação a qualquer tempo, o que implicará o retorno ao estado anterior à sua concessão.
19. Situação diversa é a da tutela de urgência cuja revogação se dá em razão de mudança superveniente da jurisprudência então dominante. Nesses casos, a superação do precedente deverá ser acompanhada da indispensável modulação dos efeitos, a juízo do Tribunal que está promovendo a alteração jurisprudencial, como determina o art. 927, § 3º, do CPC. Assim, como diz a norma, o próprio juízo de superação "de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos" deve ser acompanhado da modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica. Dessa forma, uma eventual guinada jurisprudencial não resultará, em princípio, na devolução de valores recebidos por longo prazo devido à cassação de tutela de urgência concedida com base em jurisprudência dominante à época em que deferida, bastando que o tribunal, ao realizar a superação, determine a modulação dos efeitos.
20. Por fim, não há que se falar em modulação dos efeitos do julgado no caso em tela, uma vez que não se encontra presente o requisito do art. 927, § 3º, do CPC. Isso porque, no caso sob exame, não houve alteração, mas sim reafirmação da jurisprudência dominante do STJ.
21. Questão de ordem julgada no sentido da reafirmação da tese jurídica, com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação de regência, nos termos a seguir: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.". (Pet n. 12.482/DF, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 11/5/2022, DJe de 24/5/2022.)
Sobreleva notar, contudo, que muito embora se reconheça o teor da decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, inclusive com reafirmação da tese, com acréscimo de fundamento - PET 12.482/DF - j. 11/05/22 - fixada no Tema 692 do STJ, até o momento a reafirmação não transitou em julgado, havendo embargos de declaração opostos, inclusive para eventual modulação de efeitos.
Indo adiante, é de especial atenção que o Supremo Tribunal Federal, ao debruçar-se sobre o tema em oportunidades posteriores ao não reconhecimento da repercussão geral do tema 799 e também da reafirmação da tese do tema 692 do STJ, manifesta o caráter alimentar das verbas previdenciárias recebidas a título precário, concluindo pela sua irrepetibilidade, observada a boa-fé do segurado. Nesse sentido, precedentes:
“[...] verifica-se que o acórdão do Tribunal de origem não destoa da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que em processos de sua competência originária, se orienta no sentido da irrepetibilidade de verbas de natureza alimentar recebidas em decorrência de decisão liminar posteriormente revogada, tendo em vista a existência de boa-fé do beneficiado, cujo direito se encontrava amparado em decisão judicial válida e eficaz até o momento da revogação. Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes:
'Direito Constitucional e Administrativo. Embargos de Declaração em Mandado de Segurança. Decisão do TCU que recusou registro ao ato concessivo de aposentadoria em razão de indevida incorporação aos proventos do percentual de 84,32%. Devolução de valores recebidos por ordem judicial revogada. 1. A jurisprudência do STF afirma a desnecessidade de restituição de parcelas recebidas por decisão judicial posteriormente revogada em razão de mudança da jurisprudência. A orientação ampara-se: (i) na confiança legítima que tinham os beneficiários de a pretensão ser acolhida; e (ii) no lapso temporal transcorrido entre o deferimento da liminar e a sua revogação. Precedentes. 2. No caso em análise, a liminar foi deferida em 09.07.2013, com fundamento em antiga jurisprudência que reconhecia a oponibilidade da coisa julgada ao TCU de decisão judicial que reconhecia o direito a incorporação de parcelas remuneratórias. A revogação da liminar ocorreu em 15.08.2017, em razão de mudança dessa jurisprudência desta Corte. Assim, os princípios da boa-fé e da segurança jurídica afastam o dever de restituição de parcelas recebidas por ordem liminar revogada. 3. Embargos de declaração providos para sanar omissão, sem efeitos modificativos' (MS 32185 ED, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 05.08.2019)
'AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ACÓRDÃO DO TCU QUE DETERMINOU A IMEDIATA INTERRUPÇÃO DO PAGAMENTO DA URP DE FEVEREIRO DE 1989 (26,05%). EXCLUSÃO DE VANTAGEM ECONÔMICA RECONHECIDA POR DECISÃO JUDICIAL COM TRÂNSITO EM JULGADO. NATUREZA ALIMENTAR E A PERCEPÇÃO DE BOA-FÉ AFASTAM A RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS ATÉ A REVOGAÇÃO DA LIMINAR. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido do descabimento da restituição de valores percebidos indevidamente em circunstâncias, tais como a dos autos, em que o servidor público está de boa-fé. (Precedentes: MS 26.085, Rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 13/6/2008; AI 490.551-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, DJe 3/9/2010) 2. A boa-fé na percepção de valores indevidos bem como a natureza alimentar dos mesmos afastam o dever de sua restituição. 3. Agravo regimental a que se nega provimento' (MS 25921 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 04.04.2016)".
(ARE 1.484.756/SC, Rel. Ministro Gilmar Mendes, julgado em 16.04.2024)
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. NATUREZA ALIMENTAR. RECEBIMENTO DE BOA-FÉ EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. DEVOLUÇÃO.
1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes.
2. Decisão judicial que reconhece a impossibilidade de descontos dos valores indevidamente recebidos pelo segurado não implica declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei nº 8.213/1991. Precedentes.
3. Agravo regimental a que se nega provimento". (STF, ARE 734242 AgR, Relator Ministro ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 04.08.2015, PJ-e, DJe-175 DIVULG 04-09-2015 PUBLIC 08-09-2015)
Da mesma forma, caminha a jurisprudência desta Décima Turma:
PROCESSUAL CIVIL. ART. 1.040, INC. II, DO CPC. JUÍZO DE RETRATAÇÃO NEGATIVO. RESP 1.401.560/MT. PET N. 12.482/DF. PREVIDENCIÁRIO. TUTELA ANTECIPADA. REVOGAÇÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR. BOA-FÉ DO SEGURADO. POSICIONAMENTO DO STF. ACÓRDÃO MANTIDO.
1. Reexame da matéria conforme previsto no artigo 1.040, inc. II, do CPC.
2. O Superior Tribunal de Justiça, em sede de Recurso Repetitivo de Controvérsia, entendeu que a reforma de decisão que antecipa a tutela obriga o autor a devolver os benefícios previdenciários recebidos por força dela.
3. Aplicação do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no sentido de que o benefício previdenciário recebido pelo segurado de boa-fé, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes jurisprudenciais.
4. Juízo de retratação negativo. Acórdão mantido.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5065417-57.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 11/09/2024, DJEN DATA: 16/09/2024)
PROCESSO CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. benefício previdenciário. TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. TEMA 692/STJ. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. INABLICABILIDADE. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELA SUPREMA CORTE. SEGURANÇA JURÍDICA E PROTEÇÃO DA CONFIANÇA LEGÍTIMA.
1. Ao apreciar a questão de ordem na Pet nº 12.482/DF, o c. Superior Tribunal de Justiça decidiu reafirmar a tese jurídica firmada no Tema Repetitivo nº 692/STJ (REsp nº 1.401.560/MT), com acréscimo redacional, nos seguintes termos: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago". Não obstante, verifica-se que o acórdão objeto de recurso especial está assentado em entendimento firmado pelo e. STF, no sentido da desnecessidade de restituição dos valores recebidos, com fundamento no princípio da boa-fé e no caráter alimentar do benefício.
2. Em que pese a Suprema Corte tenha decidido, em julgamento pelo Plenário Virtual, na data de 20/03/2015, que "a questão acerca da devolução de valores recebidos em virtude de concessão de antecipação de tutela posteriormente revogada tem natureza infraconstitucional e a ela atribuem-se os efeitos da ausência de repercussão geral" (Tema 799/STF), mantém-se hígida a interpretação jurisprudencial segundo a qual os valores recebidos de boa-fé, por força de decisão judicial, são irrepetíveis, diante de sua natureza alimentar.
3. A decisão que a revogou a tutela, assegurando a irrepetibilidade dos valores, foi proferida em 18/01/2016, antes da entrada em vigor da Lei 13.846/19 que, ao dar nova redação ao Art. 115, II, da Lei 8.213/91, passou a prever que pode ser descontado do benefício "pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento", não havendo, até aquele momento, previsão legal no âmbito previdenciário que determinasse a restituição dos valores na hipótese de revogação da tutela judicial.
4. A controvérsia sobre se o entendimento adotado no Tema nº 692/STJ deveria ser reafirmado, alterado ou cancelado, diante da variedade de situações que ensejaram dúvidas sobre sua aplicação, somente foi dirimida no julgamento da questão de ordem na Pet nº 12.482/DF, ocorrido em 24/05/2022, quando foram definidos os contornos de incidência da tese firmada, com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação de regência.
5. As situações jurídicas consolidadas anteriormente ao novo panorama legislativo e jurisprudencial devem ser preservadas, em homenagem à segurança jurídica e à confiança legítima que o cidadão deposita no Estado, notadamente quando se trata de prestação de caráter alimentar, recebida de boa-fé, por força de decisão judicial.
6. Acórdão impugnado mantido, com determinação de retorno dos autos à e. Vice-Presidência.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0026023-41.2017.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA, julgado em 28/08/2024, DJEN DATA: 03/09/2024)
No caso em tela, a parte autora recebeu valores de benefício previdenciário por força de antecipação de tutela posteriormente revogada em acórdão datado de 14/04/2020.
Pela análise cronológica, a decisão que revogou a liminar foi proferida à época em que ainda não havia sido julgada/reafirmada a tese do Tema 692/STJ, estando embasada em precedentes da Corte Superior e deste Tribunal Regional Federal, além de influenciada por sucessivos pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal no sentido da não devolução dos valores dos benefícios.
Torna-se pertinente, neste caso, a aplicação da técnica da distinção (distinguishing) com o objetivo de preservar o entendimento consentâneo ao momento jurisprudencial no qual foi prolatada a decisão, em homenagem à certeza do direito.
Não se está aqui a proclamar decisão contrária à tese jurídica firmada no Tema 692/STJ, cujo caráter vinculante para as instâncias ordinárias é inquestionável, mas sim para preservar o direito da parte autora cuja pretensão deduzida nos autos foi decidida segundo a diretriz jurisprudencial que se apresentava na época.
Trata-se de medida excepcional tendo em vista que o valor segurança jurídica, contido no pretérito pronunciamento judicial que antecipou os efeitos da tutela, havia oferecido a firme confiança, especialmente àqueles que de boa-fé buscaram o Poder Judiciário. O conjunto de direitos defendidos fora reconhecido, ainda que por decisão provisória, antes da sedimentação da jurisprudência.
Ante o exposto, com a devida vênia, nego o juízo de retratação, mantendo o acórdão proferido.
Oportunamente, retornem os autos à Vice-Presidência.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PARCELAS PAGAS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA REVOGADA. TEMA 692/STJ. APLICAÇÃO. TÉCNICA DA DISTINÇÃO. ACÓRDÃO MANTIDO. RETRATAÇÃO NEGATIVA.
1. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.401.560/MT (Tema 692), pela sistemática dos recursos repetitivos, cujo v. acórdão foi publicado no DJe de 13/10/2015, firmou a seguinte tese jurídica: “A reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos”, a reafirmando, com acréscimo de fundamentação, em 11/05/2022, por decisão ainda não transitada em julgado.
2. O Supremo Tribunal Federal, ao debruçar-se sobre o tema em oportunidades posteriores ao não reconhecimento da repercussão geral do tema 799 e também da reafirmação da tese do tema 692 do STJ, manifesta o caráter alimentar das verbas previdenciárias recebidas a título precário, concluindo pela sua irrepetibilidade, observada a boa-fé do segurado. Precedentes.
3. Pela análise cronológica, a decisão que revogou a liminar foi proferida à época em que ainda não havia sido julgada/reafirmada a tese do Tema 692/STJ, estando embasada em precedentes da Corte Superior e deste Tribunal Regional Federal, além de influenciada por sucessivos pronunciamentos do Supremo Tribunal Federal no sentido da não devolução dos valores recebidos.
4. Torna-se pertinente, neste caso, a aplicação da técnica da distinção (distinguishing) com o objetivo de preservar o entendimento consentâneo ao momento jurisprudencial no qual foi prolatada a decisão, em homenagem à certeza do direito.
5. Juízo de retratação negativo.
