D.E. Publicado em 12/07/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar, dar parcial provimento à apelação da parte autora e negar provimento ao recurso adesivo do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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Data e Hora: | 03/07/2018 18:10:15 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017968-72.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): De início, verifica-se que o pedido formulado na presente demanda envolve o reconhecimento de atividade desenvolvida em condições especiais, laborado em períodos em que o segurado encontrava-se filiado tanto ao Regime Geral de Previdência Social, quanto a Regime Próprio, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de serviço junto ao R.G.P.S.
Dessa maneira, não há que se falar em ilegitimidade passiva do INSS, considerando que a Constituição Federal em seu artigo 201, §9º, assegura a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, urbana e rural, mediante compensação dos regimes.
A alegação preliminar de impossibilidade jurídica do pedido de reconhecimento da atividade especial da atividade laborada como policial militar é questão que se confunde com o mérito da demanda e com ele será analisada.
É firme a jurisprudência no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização do denominado trabalho em regime especial é a vigente no período em que a atividade a ser considerada foi efetivamente exercida.
Ressalte-se que o artigo 58, § 1º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei 9.732, de 11/12/1998, dispõe que a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será efetuada nos termos da legislação trabalhista.
O art. 194 da CLT aduz que o fornecimento de Equipamento de Proteção Individual pelo empregador, aprovado pelo órgão competente do Poder Executivo, seu uso adequado e a consequente eliminação do agente insalubre são circunstâncias que tornam inexigível o pagamento do adicional correspondente. Portanto, retira o direito ao reconhecimento da atividade como especial para fins previdenciários.
Por sua vez, o art. 195 da CLT estabelece: A caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo do Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho, registrado no Ministério do Trabalho.
A respeito da matéria, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sessão de julgamento realizada em 14/05/2014, em sede de recurso representativo da controvérsia (Recurso Especial Repetitivo 1.398.260/PR, Rel. Min. Herman Benjamin), firmou orientação no sentido de que o nível de ruído que caracteriza a insalubridade para contagem de tempo de serviço especial deve ser superior a 80 (oitenta) decibéis até a edição do Decreto nº 2.171/1997, de 05/03/1997, superior a 90 (noventa) decibéis entre a vigência do Decreto nº 2.171/1997 e a edição do Decreto nº 4.882/2003, de 18/11/2003, e após a entrada em vigor do Decreto nº 4.882/2003, ou seja, a partir de 19/11/2003, incide o limite de 85 (oitenta e cinco) decibéis, considerando o princípio tempus regit actum.
Ainda com relação à matéria, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar o ARE 664.335/SC, em 04/12/2014, publicado no DJe de 12/02/2015, da relatoria do Ministro LUIZ FUX, reconheceu a repercussão geral da questão constitucional nele suscitada e, no mérito, fixou o entendimento de que a eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria, quando o segurado estiver exposto ao agente nocivo ruído.
No presente caso, a parte autora demonstrou haver laborado em atividade especial no período de 18/03/2011 a 10/10/2011. É o que comprova o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, elaborado nos termos dos arts. 176 a 178, da Instrução Normativa INSS/PRES nº 20, de 11 de outubro de 2007 (DOU - 11/10/2007) e art. 68, § 2º, do Decreto nº 3.048/99 (fl. 215), trazendo a conclusão de que a parte autora desenvolveu sua atividade profissional, com exposição a ruído e calor. Referidos agentes agressivos são classificados como especiais, conforme os códigos 1.1.1 e 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e códigos 1.1.1 e 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79, em razão da habitual e permanente exposição aos agentes ali descritos.
Entretanto, não é possível o enquadramento como especial da atividade exercida no período de 01/08/1979 a 18/12/1981, em razão da ausência de formulário ou laudo técnico que informe as condições ambientais e a sujeição da parte autora a agentes agressivos, uma vez que a atividade exercida ("aprendiz de ajustador mecânico"), por si só, não pode ser considerada de natureza especial, pois não se encontra listada no Decreto nº 53.831/64 e Decreto nº 83.080/79.
Ademais, não é devido o enquadramento como especial da atividade exercida no período compreendido entre 09/02/2012 e a data do ajuizamento da demanda, em razão da ausência de qualquer formulário ou laudo técnico que informe as condições ambientais e a sujeição da parte autora a agentes agressivos, a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10/12/1997.
Com relação ao período laborado como policial militar (20/03/1984 a 18/07/2007), apesar de ser atividade nitidamente de natureza especial, conforme demonstrado pela Certidão de Tempo de Serviço (fls. 66/67) e demonstrativos de pagamento, comprovando o recebimento de adicional de periculosidade (fls. 59/82), trazendo a conclusão de que o autor desenvolveu, de modo habitual e permanente, ocupação perigosa, verifico que o autor esteve submetido a regime próprio de previdência (estatutário) e não ao RGPS.
Esta Relatora vinha decidindo no sentido da possibilidade da conversão do tempo de serviço como policial militar em tempo de serviço comum, em respeito ao princípio da isonomia, uma vez que o segurado pretende aposentar-se pelo RGPS e, portanto, reconhecia a periculosidade da atividade desenvolvida tal com o era para o vigia e o guarda, categorias para as quais a jurisprudência já havia pacificado quanto à possibilidade da conversão em tempo comum, porquanto seu trabalho correspondia e corresponde ao exercício de atividade de guarda, classificado no código 2.5.7 do Decreto 53.831/64.
Todavia, em relação ao período como policial militar (20/03/1984 a 18/07/2007), em que o autor esteve no cargo de Policial Militar, junto à Policia Militar do Estado de São Paulo, não pode haver a conversão em tempo de serviço comum, uma vez que é firme a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça no sentido de que não se admite, por expressa proibição legal (artigo 96, I, da Lei 8.213/1991), a conversão de tempo especial em comum, para fins contagem recíproca. Nesse sentido:
No caso dos autos, constata-se da Certidão de Tempo de Contribuição (fls. 66/67), emitida pela Polícia Militar do Estado de São Paulo, que o autor efetuou os recolhimentos previdenciários correspondentes ao período em questão para o Regime Próprio de Previdência Social - RPPS.
Conclui-se, assim, pela impossibilidade de conversão de tempo especial em comum no período de 20/03/1984 a 18/07/2007, por expressa proibição legal (artigo 96, I, da Lei 8.213/1991) e de acordo com o entendimento do E. STJ.
Observo, todavia, que o período referido deve ser computado como tempo de serviço e de contribuição para fins do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.
Desta forma, na data do requerimento administrativo, o somatório do tempo de serviço especial da parte autora é inferior a 25 (vinte e cinco) anos, sendo, portanto, indevida a aposentadoria especial, conforme o artigo 57 da Lei nº 8.213/91.
De outra parte, no tocante à conversão do tempo de serviço especial em comum para a concessão da aposentadoria por tempo de serviço, o artigo 201, § 1º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, passou a exigir a definição das atividades exercidas sob condições especiais mediante lei complementar, com a ressalva contida no art. 15 da referida EC nº 20/98, no sentido de que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 mantêm a sua vigência até que seja publicada a lei complementar exigida. Assim, dúvidas não há quanto à plena vigência, do artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, no tocante à possibilidade da conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de serviço comum.
A propósito, quanto à plena validade das regras de conversão de tempo de serviço especial em comum, de acordo com o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, traz-se à colação trecho de ementa de aresto: "Mantida a redação do § 5º do art. 57 da Lei 8.213/91, em face da superveniência da Lei 9.711 de novembro de 1998 que converteu a MP 1.663/15ª sem acolher abolição da possibilidade de soma de tempo de serviço especial com o comum que a medida provisória pretendia instituir, e ainda persistindo a redação do caput desse mesmo art. 57 tal como veiculada na Lei 9.032/95 (manutenção essa ordenada pelo expressamente no art. 15 da Emenda Constitucional nº 20 de 15.12.98) de modo que o regramento da aposentadoria especial continuou reservado a"lei", não existe respiradouro que dê sobrevida às Ordens de Serviço ns. 600, 612 e 623, bem como a aspectos dos D. 2.782/98 e 3.048/99 (que restringiam âmbito de apreciação de aposentadoria especial), já que se destinavam justamente a disciplinar administrativamente o que acabou rejeitado pelo Poder Legislativo. Art. 28 da Lei 9.711/98 - regra de transição - inválido, posto que rejeitada pelo Congresso Nacional a revogação do § 5º do art. 57 do PBPS." (TRF - 3ª Região; AMS nº 219781/SP, 01/04/2003, Relator Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO, j. 01/04/2003, DJU 24/06/2003, p. 178).
Além disso, conforme se extrai do texto do § 1º do art. 201 da Constituição Federal, o trabalhador que se sujeitou a trabalho em atividades consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física tem direito a obter a inatividade de forma diferenciada.
A presunção da norma é de que o trabalhador que exerceu atividades em condições especiais teve um maior desgaste físico ou teve sua saúde ou integridade submetidas a riscos mais elevados, sendo merecedor da aposentação em tempo inferior àquele que exerceu atividades comuns, com o que se estará dando tratamento equânime aos trabalhadores. Assim, se em algum período de sua vida laboral o trabalhador exerceu alguma atividade classificada como insalubre ou perigosa, porém não durante tempo suficiente para obter aposentadoria especial, esse tempo deverá ser somado ao tempo de serviço comum, com a devida conversão, ou seja, efetuando-se a correspondência com o que equivaleria ao tempo de serviço comum, sob pena de não se fazer prevalecer o ditame constitucional que garante ao trabalhador que exerceu atividades em condições especiais atingir a inatividade em menor tempo de trabalho.
É indubitável que o trabalhador que exerceu atividades perigosas, insalubres ou penosas teve ceifada com maior severidade a sua higidez física do que aquele trabalhador que nunca exerceu atividade em condições especiais, de sorte que suprimir o direito à conversão prevista no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 significa restringir o alcance da vontade das normas constitucionais que pretenderam dar tratamento mais favorável àquele que labutou em condições especiais.
Assim, o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 tem por escopo garantir àquele que exerceu atividade laborativa em condições especiais a conversão do respectivo período, o qual, depois de somado ao período de atividade comum, deverá garantir ao segurado direito à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.
Desta forma, o período contributivo do autor (fls. 66/67 e 89/91) é suficiente para garantir-lhe o cumprimento do período de carência de 180 (cento e oitenta) meses de contribuição, na data do requerimento administrativo (04/04/2012), de acordo com a tabela do artigo 142 da Lei nº 8.213/91.
Entretanto, o somatório do tempo de serviço da autora, considerando o tempo de atividade especial ora reconhecido, na data da publicação da EC 20/98, é inferior a 30 (trinta) anos, totalizando 17 (dezessete) anos, 01 (um) mês e 14 (quatorze) dias, de maneira que é aplicável ao caso dos autos a regra de transição prevista no artigo 9º da referida Emenda Constitucional, pois a parte autora não possuía direito adquirido ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço na data da sua publicação, em 16/12/1998.
Entretanto, computando-se o tempo de serviço posterior a 15/12/1998, devidamente registrado em CTPS, o somatório do tempo de serviço totaliza 32 (trinta e dois) anos, 06 (seis) meses e 28 (vinte e oito) dias, na data do ajuizamento da demanda, não restando comprovado o cumprimento do acréscimo do tempo de serviço (pedágio) exigido pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, que no presente caso perfaz 35 (trinta e cinco) anos.
Portanto, a parte autora não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço postulado.
Diante do exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR, DOU PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA para reconhecer a atividade especial no período de 18/03/2011 a 10/10/2011 e NEGO PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DO INSS, nos termos da fundamentação.
É o voto.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
Data e Hora: | 03/07/2018 18:10:11 |