
| D.E. Publicado em 19/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo da parte autora para anular a r. sentença de 1º grau de jurisdição, e, nos termos dos arts. 515, §3º, do CPC/1973 e 1.013, §3º, do CPC/2015, adentrar no mérito da demanda, e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0041377-19.2011.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pela parte autora, em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão dos benefícios de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença de fls. 112/116, extinguiu o processo sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, V, do CPC/1973, em razão de litispendência/coisa julgada. Revogou os benefícios da assistência judiciária gratuita, condenando a parte autora no pagamento das custas e despesas processuais, bem como da verba honorária, arbitrada em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, além do pagamento de indenização ao ente autárquico, a título de litigância de má-fé, na ordem de 20% (vinte por cento), incidente, também, sobre o valor da causa.
Interposta apelação pela parte autora, às fls. 118/127, o recurso foi julgado deserto pelo MM. Juiz a quo, quando do exame de admissibilidade, à fl. 134, sendo que a requerente, contra esta última decisão, interpôs agravo de instrumento, às fls. 136/141, ao qual foi dado provimento para que fosse conhecido o apelo (fls. 150/153).
Na apelação, a parte autora pugna pela reforma da r. sentença, alegando a inocorrência de litispendência e de coisa julgada, uma vez que a demanda, ajuizada na Vara Cível da Justiça Federal de São João da Boa Vista/SP, visava o restabelecimento de benefício de auxílio-doença (NB: 560.534.036-7), enquanto pretende nestes autos a concessão de outro benefício indeferido administrativamente (NB: 537.157.991-1). Subsidiariamente, pugna para que seja afastada a condenação em litigância de má-fé e que sejam mantidos os benefícios decorrentes da assistência judiciária gratuita.
Contrarrazões às fls. 156/157.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A presente demanda foi proposta perante o Juízo Estadual, 2ª Vara Cível da Comarca de Mococa/SP, registrada em 29/09/2009 e autuada sob o número 360.01.2009.005503-2 (fl. 02).
Ocorre que a parte autora já havia ingressado anteriormente com ação, visando o restabelecimento de auxílio-doença ou concessão de aposentadoria por invalidez, cujo trâmite ocorreu na 1ª Vara Federal de São João da Boa Vista/SP, número 2007.61.27.005150-4, conforme o extrato de consulta processual de fls. 69/72.
Insta especificar que, nestes últimos autos mencionados, já foi proferida sentença de improcedência, a qual transitou em julgado em 23/05/2013 (consulta ao sítio eletrônico desta Corte Regional cuja tela encontra-se anexa a esta decisão).
Entretanto, no presente caso, depreende-se da petição inicial que a requerente pleiteia a concessão dos benefícios de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez desde 03/09/2009 (NB: 537.157.991-1 - fl. 19), ou seja, em período distinto daquele albergado pela coisa julgada material formada no processo que tramitou na 1ª Vara Federal de São João da Boa Vista/SP. Naqueles autos, de fato, a parte visava o restabelecimento de auxílio-doença cessado em 11/11/2007 (NB: 560.534.036-7 - fl. 75).
É relevante destacar que a coisa julgada constitui garantia fundamental do cidadão no nosso Estado Democrático de Direito, consoante o disposto no artigo 5º, XXXVI, da Carta da República, e origina-se da necessidade de ser conferida segurança às relações jurídicas.
Tal instituto tem a finalidade de conferir imutabilidade à sentença e, consequentemente, impedir que a lide julgada definitivamente seja rediscutida em ação judicial posterior.
Todavia, as ações nas quais se postula os benefícios por incapacidade caracterizam-se por terem como objeto relações continuativas e, portanto, as sentenças nelas proferidas se vinculam aos pressupostos do tempo em que foram formuladas, sem, contudo, extinguir a própria relação jurídica, que continua sujeita à variação de seus elementos.
Isso ocorre porque estas sentenças contêm implícita a cláusula rebus sic stantibus, de forma que, modificadas as condições fáticas ou jurídicas sobre as quais se formou a coisa julgada material, tem-se nova causa de pedir próxima ou remota.
Com efeito, o próprio legislador estabeleceu a necessidade de perícias periódicas tendo em vista que a incapacidade laborativa, por sua própria essência, pode ser suscetível de alteração com o decurso do tempo.
In casu, a parte autora juntou relatório médico posterior à sentença proferida na Vara Federal de São João da Boa Vista/SP (fl. 24), o qual descreve os males da qual é portadora, identificando suposta incapacidade laborativa.
Tais circunstâncias justificam, ao menos em tese, seu interesse de provocar a via judicial para a satisfação da pretensão deduzida.
Destarte, como as provas que acompanham a petição inicial indicam suposto quadro incapacitante da demandante, após 03/09/2009, não há falar em ocorrência de coisa julgada material.
Nesse sentido, reporto-me aos seguintes julgados:
É certo, ademais, que, em situações como a presente, na qual há plena condição de ser julgada a demanda e, por se tratar inclusive de demanda na qual já foi realizada toda a dilação probatória necessária (perícia médica), demonstra-se cabível a aplicação da teoria da causa madura, nos termos do artigo 515, §3º, do CPC/1973 (1.013, §3º, I, do CPC/2015). O Novo Código de Processo Civil, ressalta-se, expressamente permite o julgamento do mérito em segunda instância quando a decisão de extinção recorrida estiver fundada nas hipóteses do artigo 485 do novel diploma, entre as quais, o reconhecimento de litispendência ou de coisa julgada. É o caso dos autos.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
No caso dos autos, a autora não comprovou a qualidade de segurada junto à Previdência Social, nem o cumprimento da carência legal, seja na data do ajuizamento da demanda, em 29/09/2009 (fl. 02), seja na data do requerimento administrativo, apresentado em 03/09/2009 (NB: 537.157.991-1 - fl. 19).
Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, as quais seguem em anexo, dão conta que a autora se manteve como segurada da Previdência Social até 15/01/2009, haja vista que percebeu benefício de auxílio-doença até 11/11/2007, o qual foi precedido de diversos recolhimentos na condição de "empregada doméstica", vertidos até 28/02/2007.
Com efeito, nos termos do art. 13, II, do Decreto 3.048/99, mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuição, até 12 (doze) meses após a cessação de benefício por incapacidade, o segurado que deixar de exercer atividade abrangida pela Previdência Social, no caso, a lide doméstica. Por sua vez, chega-se à data de 15/01/2009, como termo final da filiação ao RGPS, observando-se o disposto no artigo 30, II, da Lei 8.212/91 c/c artigo 14 do Decreto 3.048/99.
Além da não comprovação da qualidade de segurada e do cumprimento da carência legal, a requerente também não demonstra estar incapacitada para o trabalho.
O profissional médico indicado pelo Juízo, com base em exame pericial de fls. 142/148, diagnosticou a parte autora como portadora de "diabetes mellitus" e "depressão".
Atesta que as moléstias estão controladas, além do que o estado pós-operatório de hérnia discal na região lombar evoluiu satisfatoriamente.
Acresce que "o transtorno depressivo geralmente não leva à incapacidade laborativa, a não ser em caso de situações críticas. A eventual incapacidade laborativa está condicionada à adesão e a eficácia do tratamento, a atividade exercida (riscos para si e para terceiros) e à melhora dos sintomas.
O uso continuado de medicamentos não é, por si só, motivo para manutenção de afastamento laborativo.
A maioria dos casos de depressão leve e moderada são controlados em até 60 dias com tratamento adequado.
A diabetes mellitus sem complicação e o estado pós-operatório de hérnia discal na região lombar não geram incapacidade.
Não apresentou, ao exame clínico, sinais que denotem incapacidade laborativa".
Não reconhecida a incapacidade absoluta para o labor, requisito indispensável à concessão de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença, como exigem os já citados artigos 42 e 59 da Lei 8.213/91, de rigor o indeferimento do pedido.
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
Ante o exposto, dou provimento ao apelo da autora para anular a r. sentença de 1º grau de jurisdição, e, nos termos dos arts. 515, §3º, do CPC/1973 e 1.013, §3º, do CPC/2015, adentro no mérito da demanda, e julgo improcedente o pedido deduzido na inicial.
Por conseguinte, condeno a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 05/09/2017 16:39:34 |
