Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5277757-54.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal VANESSA VIEIRA DE MELLO
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
21/08/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 27/08/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. OFENSA À COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E TEMPORÁRIA.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
- As ações de concessão de benefíciopor incapacidade laboral caracterizam-se por terem como
objeto relações continuativas e, portanto, as sentenças nelas proferidas se vinculam aos
pressupostos do tempo em que foram formuladas, sem, contudo, extinguir a própria relação
jurídica, que continua sujeita à variação de seus elementos. Preliminar de ofensa à coisa julgada
e ao direito adquirido rejeitada.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- A ausência de incapacidade laboral total e definitiva do segurado para o exercício de quaisquer
atividades laborais, atestada por meio de perícia médica judicial, afasta a possibilidade de
concessão de aposentadoria por invalidez.
- Apelação não provida.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5277757-54.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: GILVANETE TELES DE LIMA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: LIGIA APARECIDA ROCHA - SP257688-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GILVANETE TELES DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: LIGIA APARECIDA ROCHA - SP257688-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5277757-54.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: GILVANETE TELES DE LIMA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: LIGIA APARECIDA ROCHA - SP257688-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GILVANETE TELES DE LIMA
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OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Cuida-se de apelação interposta em face da sentença que julgou procedente o pedido de auxílio-
doença, desde a cessação administrativa da aposentadoria por invalidez,discriminados os
consectários legais e antecipados os efeitos da tutela.
Decisão não submetida ao reexame necessário.
A parte autora alega que a cessação da aposentadoria por invalidez concedidajudicialmente
ofende a coisa julgada material e seu direito adquirido. Acrescenta estar total e permanentemente
incapacitada para o trabalho, sem possibilidade de reabilitação profissional, e requer a reforma do
julgado para fins de restabelecimento do benefício.
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5277757-54.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: GILVANETE TELES DE LIMA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: LIGIA APARECIDA ROCHA - SP257688-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GILVANETE TELES DE LIMA
Advogado do(a) APELADO: LIGIA APARECIDA ROCHA - SP257688-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Conheço da apelação, em razão da satisfação de seus requisitos.
Preliminarmente, não prospera a alegação de ofensa à coisa julgada material e ao direito
adquirido suscitada pela parte autora.
A coisa julgada constitui garantia fundamental do cidadão no nosso Estado Democrático de
Direito, consoante o disposto no artigo 5º, XXXVI, da Constituição Federal de 1988 (CF/1988),e
origina-se da necessidade de ser conferida segurança à reprodução das relações sociais.
Tal instituto tem a finalidade de conferir imutabilidade à sentença e, consequentemente, impedir
que a lide julgada definitivamente seja rediscutida em ação judicial posterior.
Todavia, as ações nas quais se postula os benefícios por incapacidade caracterizam-se por terem
como objeto relações continuativas e, portanto, as sentenças nelas proferidas se vinculam aos
pressupostos do tempo em que foram formuladas, sem, contudo, extinguir a própria relação
jurídica, que continua sujeita à variação de seus elementos.
Como dito, o benefício por incapacidade (aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença)é
fundado em contingência sujeita à alteração pelo simples transcurso de tempo, já que a
verificação da capacidade laboral do segurado depende de avaliação das suas atuais condições
de saúde.
Não se pode olvidar que a existência de enfermidades enseja situações de fato dinâmicas, tais
como agravamento do quadro clínico, recuperação, controle por meio de tratamento, necessidade
de cirurgia, consolidação etc.
Nesse passo, as sentençasde concessão de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-
doençacontêm implícita a cláusularebus sic stantibus, de forma que, modificadas as condições
fáticas ou jurídicas sobre as quais se formou a coisa julgada material, tem-se nova causa de pedir
próxima ou remota.
Com efeito, o próprio legislador estabeleceu a necessidade de perícias periódicas tendo em vista
que a incapacidade laborativa, por sua própria essência, pode ser suscetível de alteração com o
decurso do tempo, não havendo que se falar, portanto, em direito adquirido ou à coisa julgada.
No mérito, discute-se nos autos o preenchimento dos requisitos para a concessão de benefício
por incapacidade à parte autora.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Seguridade Social, especialmente no artigo 201, I, da Constituição Federal (CF/1988), com a
redação dada pela Emenda Constitucional n. 20/1998, que tem o seguinte teor:
“Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter
contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e
atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a: I - cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e
idade avançada (...)”.
Já a Lei n. 8.213/1991, aplicando o princípio da distributividade (artigo 194, parágrafo único, III, da
CF/1988), estabelece as condições para a concessão desse tipo de benefício.
A aposentadoria por invalidez, segundo a dicção do artigo 42 da Lei n. 8.213/1991, é devida ao
segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o
trabalho, de forma omniprofissional, e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade
que lhe garanta a subsistência.
O auxílio-doença é devido a quem ficar temporariamente incapacitado, à luz do disposto no artigo
59 da mesma lei, mas a incapacidade se refere "não para quaisquer atividades laborativas, mas
para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da Seguridade Social,
Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe, Porto Alegre, 2005,
p. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o
trabalho.
São requisitos para a concessão desses benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais, quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não estava previamente incapacitado ao filiar-se ao Regime
Geral da Previdência Social.
Caso reconhecida a incapacidade apenas parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as
condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez ou de
auxílio-doença. Pode, ainda, conceder auxílio-acidente, na forma do artigo 86 da Lei n.
8.213/1991, se a parcial incapacidade decorre de acidente de trabalho, ou de qualquer natureza,
ou ainda de doença profissional ou do trabalho (artigo 20, I e II, da mesma lei).
O reconhecimento da incapacidade, total ou parcial, depende da realização de perícia médica,
por perito nomeado pelo Juízo, nos termos do Código de Processo Civil (CPC). Contudo, o juiz
não está adstrito unicamente às suas conclusões, podendo valer-se de outros elementos
pessoais, profissionais ou sociais para a formação de sua convicção, desde que constantes dos
autos.
Alguns enunciados da Turma Nacional de Uniformização (TNU) são pertinentes a esse tema:
Súmula 33 da TNU: Quando o segurado houver preenchido os requisitos legais para a concessão
da aposentadoria por tempo de serviço na data do requerimento administrativo, esta data será o
termo inicial da concessão do benefício.
Súmula 47 da TNU: Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve
analisar as condições pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por
invalidez.
Súmula 53 da TNU: Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a
incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de
Previdência Social.
Súmula 77 da TNU: O julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando
não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual.
No caso dos autos, a perícia médica realizada em 8/7/2019, constatou a incapacidade laboral
total e temporária da autora (nascida em 1968), por ser portadora de epilepsia, com crises
esporádicas relacionadas a situações de stress.
Segundo a médica perita, a autora também é portadora de hipertensão arterial sistêmica
compensada, porém sem repercussão na capacidade laboral.
Ela esclareceu que a epilepsia "é alteração temporária e reversível do funcionamento do cérebro"
e que o"tratamento das epilepsias é feito através de medicamentos que evitam as descargas
elétricas cerebrais anormais, que são a origem das crises epilépticas".
A peritaafirmoua possibilidade de recuperação total da capacidade laboral da autora com o
controle das crises convulsivas esporádicas, mas não soube estimar oprazo necessário
aotratamento adequado.
Lembro, por oportuno, que o magistrado não está adstrito ao laudo pericial. Contudo, os demais
elementos de prova não autorizam convicção em sentido diverso.
Ou seja, ao menos por ora, afigura-se possível a reversão do quadro clínico da parte autora.
Assim, não patenteada a incapacidade total e definitiva para quaisquer serviços, não é possível a
concessão de aposentadoria por invalidez.
Em decorrência, impõe-se a manutenção da sentença, na esteira dos precedentes que cito:
"RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL
PARA O TRABALHO HABITUAL. 1. É devido o auxílio-doença ao segurado considerado
parcialmente incapaz para o trabalho, mas suscetível de reabilitação profissional para o exercício
de outras atividades laborais. 2. Recurso improvido". (REsp 501267 / SP RECURSO ESPECIAL
2003/0018983-4 Relator(a) Ministro HAMILTON CARVALHIDO (1112) Órgão Julgador T6 -
SEXTA TURMA Data do Julgamento 27/04/2004 Data da Publicação/Fonte DJ 28/06/2004 p. 427)
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. CARÊNCIA E
QUALIDADE DE SEGURADO. COMPROVAÇÃO. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E
TEMPORÁRIA. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO A
CONTAR DO LAUDO PERICIAL. I - A consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais -
CNIS comprova o preenchimento da carência exigida por Lei e a manutenção da qualidade de
segurado da autora quando do ajuizamento da ação. II - As conclusões obtidas pelo laudo pericial
comprovam a incapacidade total e temporária da autora para o exercício de atividade laborativa,
devendo ser concedido o auxílio-doença. III - Não houve fixação do início da incapacidade, razão
pela qual a data de início do benefício deve corresponder à data do laudo pericial. IV - Remessa
oficial e apelação do INSS parcialmente providas. Tutela antecipada". (APELREE -
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO - 1497185 Processo: 2010.03.99.010150-5 UF: SP Órgão
Julgador: NONA TURMA Data do Julgamento:13/09/2010 Fonte: DJF3 CJ1 DATA:17/09/2010
PÁGINA: 836 Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS)
Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito,nego provimento à apelação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. OFENSA À COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E TEMPORÁRIA.
REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. SUCUMBÊNCIA RECURSAL.
- As ações de concessão de benefíciopor incapacidade laboral caracterizam-se por terem como
objeto relações continuativas e, portanto, as sentenças nelas proferidas se vinculam aos
pressupostos do tempo em que foram formuladas, sem, contudo, extinguir a própria relação
jurídica, que continua sujeita à variação de seus elementos. Preliminar de ofensa à coisa julgada
e ao direito adquirido rejeitada.
- São exigidos à concessão dos benefícios: a qualidade de segurado, a carência de doze
contribuições mensais - quando exigida, a incapacidade para o trabalho de forma permanente e
insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra atividade que garanta a subsistência (
aposentadoria por invalidez) e a incapacidade temporária (auxílio-doença), bem como a
demonstração de que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao
Regime Geral da Previdência Social.
- A ausência de incapacidade laboral total e definitiva do segurado para o exercício de quaisquer
atividades laborais, atestada por meio de perícia médica judicial, afasta a possibilidade de
concessão de aposentadoria por invalidez.
- Apelação não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
