Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5044777-09.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
04/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 16/09/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO/PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO À APELAÇÃO.
PRELIMINAR REJEITADA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO COMPROVADA.
APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO. TUTELA
REVOGADA.
1. Em sede preliminar, não entendo que a imediata execução da sentença ora recorrida resulte,
necessariamente, em lesão grave ou de difícil reparação à Previdência Social, uma vez que se
deve observar que, no presente caso, colidem o bem jurídico vida e o bem jurídico pecuniário, daí
porque aquele primeiro é que deve predominar, mesmo porque, embora, talvez, não seja,
realmente, possível a restituição dos valores pagos a título de tutela antecipada, se não
confirmada a r. sentença em grau recursal, ainda será factível a revogação do benefício
concedido, impedindo, destarte, a manutenção da produção de seus efeitos. Além disso, ao
menos em sede de cognição primária, verifico não ter sido apresentada pela parte apelante
qualquer fundamentação relevante que ensejasse a atribuição de efeito suspensivo à apelação,
nos termos do artigo 1012, § 4º, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual deve ser o seu
pedido indeferido, rejeitando a preliminar arguida.
2. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
corroborado por prova testemunhal.
3. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
4. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
5. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
6. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
7. De início, destaco que o labor rural prestado na qualidade de diarista/boia-fria (hipótese dos
autos), iniciado a partir de 01/01/2011, deveria ter sido comprovado por prova material (e não
apenas por início de prova), e estaria sujeito a certa quantidade de contribuições vertidas pelo
demandante, ambas as situações inexistentes no caso vertente. Nesses termos, a partir de 2011,
o trabalho campesino eventualmente prestado pelo autor nessa condição não pode ser
reconhecido, restando comprovados, somente, os interregnos constantes de CTPS. Nada mais.
Quanto ao principal período controverso (02/05/1974 a 30/03/2007), entendo que o conjunto
probatório é frágil e insubsistente para comprovar as alegações trazidas pela exordial, pois o
documento inicial a atestar sua condição de “lavrador” é de natureza meramente declaratória e foi
emitido em 1975, não sendo capaz de comprovar sua permanência nas lides campesinas por
longos 32 anos, ou seja, até 2007, quando apresentou seu primeiro vínculo formal de trabalho.
8. Quanto à prova testemunhal, pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento de
que apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo a
existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". E nem esta se apresenta
efetivamente robusta, pois apesar de afirmar o trabalho rural do autor, é genérica e não
especificou, de forma minimamente razoável, quando isso ocorreu, por quanto tempo perdurou,
para quem trabalhou, sua carga horária, quanto recebia de remuneração e de que forma
percebiam tal pagamento. É o que se observa da transcrição constante da r. sentença, pois os
áudios correspondentes estão inaudíveis.
9. Dessa forma, não restando comprovada a realização de trabalho rural pelo período necessário
de carência, entendo que não restaram configurados os requisitos necessários à concessão da
benesse vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria medida imperativa.
10. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito (artigo 485, IV,
do CPC).
11. Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, determinando a
imediata cessação do benefício concedido pela r. sentença. Expeça-se ofício ao INSS, com os
documentos necessários, para as providências cabíveis, independentemente do trânsito em
julgado. A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela
parte autora deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução, após a eventual revisão do
entendimento firmado no Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de
Justiça.
12. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto. Tutela
revogada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5044777-09.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDO CHAGAS DE SOUSA
Advogados do(a) APELADO: MARCOS VINICIUS QUESSADA APOLINARIO - SP164723-N,
ALESSANDRO HENRIQUE QUESSADA APOLINARIO - SP175995-N, NATALINO APOLINARIO
- SP46122-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5044777-09.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDO CHAGAS DE SOUSA
Advogados do(a) APELADO: MARCOS VINICIUS QUESSADA APOLINARIO - SP164723-N,
ALESSANDRO HENRIQUE QUESSADA APOLINARIO - SP175995-N, NATALINO APOLINARIO
- SP46122-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que, extinguindo
o feito com resolução de mérito e fundamento no artigo 487, I, do CPC, condenou o INSS a
conceder à parte autora o benefício previdenciário de aposentadoria por idade rural, com DIB na
data do requerimento administrativo. Determinou, ainda, a imediata implantação do benefício em
prol da parte autora. No entanto, consignou que deixou de conceder tutela antecipada
considerando a irrepetibilidade dos alimentos. Definiu os consectários legais aplicáveis na
espécie e condenou a Autarquia Previdenciária ao pagamento de honorários advocatícios da
parte adversa, fixados em 10% (dez por cento) sobre o débito existente por ocasião da r.
sentença. Por fim, deixou de condenar o INSS ao pagamento das custas processuais.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Opostos embargos de declaração pela parte autora, foram acolhidos para retirar da r. sentença o
seguinte parágrafo, considerando a determinação para implantação do benefício: "Deixo de
conceder tutela antecipada considerando-se a irrepetibilidade dos alimentos, pois os benefícios
previdenciários possuem nítido caráter alimentar."
Requer a Autarquia apelante, preliminarmente, a atribuição de efeito suspensivo ao recurso, em
razão da possibilidade de lesão ao erário. No mérito, em suas razões recursais e em apertada
síntese, alega que a parte autora não preencheu os requisitos necessários à concessão da
benesse pretendida, pois não teria restado comprovado os autos o trabalho campesino da parte
autora pelo período de carência e no momento imediatamente anterior ao implemento do requisito
etário/requerimento administrativo. Requer, nesses termos, a reforma da r. sentença para julgar
improcedente o pleito inaugural. Subsidiariamente, pleiteia a alteração da DIB e dos consectários
legais fixados.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Observado, em grau recursal, que os depoimentos prestados pela autora se encontravam
inaudíveis, foi determinado à Origem o encaminhamento de arquivos digitais com depoimentos
audíveis ou transcrição integral dos referidos depoimentos, a fim de viabilizar a apreciação
recursal. Sobreveio resposta da Origem, esclarecendo que os referidos depoimentos estão,
efetivamente, inaudíveis, mas que se encontram transcritos no termo de audiência de fls. 103.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5044777-09.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: APARECIDO CHAGAS DE SOUSA
Advogados do(a) APELADO: MARCOS VINICIUS QUESSADA APOLINARIO - SP164723-N,
ALESSANDRO HENRIQUE QUESSADA APOLINARIO - SP175995-N, NATALINO APOLINARIO
- SP46122-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Em sede preliminar, não entendo que a imediata execução da sentença ora recorrida resulte,
necessariamente, em lesão grave ou de difícil reparação à Previdência Social, uma vez que se
deve observar que, no presente caso, colidem o bem jurídico vida e o bem jurídico pecuniário, daí
porque aquele primeiro é que deve predominar, mesmo porque, embora, talvez, não seja,
realmente, possível a restituição dos valores pagos a título de tutela antecipada, se não
confirmada a r. sentença em grau recursal, ainda será factível a revogação do benefício
concedido, impedindo, destarte, a manutenção da produção de seus efeitos.
Além disso, ao menos em sede de cognição primária, verifico não ter sido apresentada pela parte
apelante qualquer fundamentação relevante que ensejasse a atribuição de efeito suspensivo à
apelação, nos termos do artigo 1012, § 4º, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual deve
ser o seu pedido indeferido, rejeitando a preliminar arguida.
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o no efeito devolutivo (considerando a tutela
concedida no processado), devendo ser apreciado nos termos do artigo 1.011 do Código de
Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), bem como a demonstração do exercício de
atividade rural, além do cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei (art.
201, § 7º, II, da CF/88 e arts. 48, 49, 142 e 143, da Lei nº 8.213/91).
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais para os filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar destes qualquer possibilidade de
auferir o benefício conferido em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com redação determinada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995,
dispõe que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 1956, comprovou o cumprimento do requisito
etário no ano de 2016. Assim, considerando que o implemento desse requisito se deu quando já
havia encerrada a prorrogação prevista no art. 143 da Lei de Benefícios, é necessária, após
31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os empregados rurais,
trabalhadores avulsos e diaristas, além da comprovação do cumprimento da carência de 180
meses, a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, com vistas à concessão do
benefício.
Antes de analisar os requisitos relativos à qualidade de segurado e ao cumprimento da carência,
cumpre salientar que o esgotamento do prazo acima referido não constitui óbice à percepção de
benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo, nos termo do disposto no art. 39, I, da
Lei nº 8.213/91.
No entanto, o exercício de atividades rurais relativo ao período encerrado em 31/12/2010 há de
ser comprovado de igual modo, ou seja, bastando a apresentação de início de prova material
corroborada por testemunhos. E, quanto ao período posterior, iniciado em 01/01/2011 até
31/12/2015, o labor rural deve ser comprovado por prova material, não bastando o início de
prova, correspondendo cada mês comprovado a três meses de carência, limitados a 12 meses
dentro do ano civil. E a partir de 01/01/2016 até 31/12/2020, o labor rural deve ser comprovado da
forma anteriormente consignada, correspondendo cada mês comprovado, agora, a dois meses de
carência, limitados a 12 meses dentro do ano civil, conforme as regras introduzidas pela Lei
11.718/08, em seu art. 2º, parágrafo único e art. 3º, incisos I, II e III
Em suma, considera-se que a simples limitação temporal das regras prescritas pelo art. 143 da
Lei de Benefícios, por si só, não obsta a comprovação do exercício de atividades rurais nem a
percepção do benefício, desde que comprovado os recolhimentos obrigatórios, que passaram a
ser exigidos após o advento das novas regras introduzidas pela Lei nº 11.718/08.
No processado, a parte autora postulou o reconhecimento de labor rural supostamente exercido
entre 02/05/1974 a 30/03/2007 (como boia-fria) e em períodos onde teria trabalhado, de forma
intercalada, como boia-fria e empregado registrado, ocorridos a partir de 02/04/2007. A autarquia
previdenciária reconheceu, administrativamente, o trabalho rural do autor como boia-fria nos
períodos de 05/10/2007 a 17/05/2008, 03/11/2008 a 21/03/2009, 01/06/2009 a 06/06/2009 e de
23/08/2009 a 02/01/2010, deixando de homologar demais interregnos vindicados.
No que tange ao exercício de atividade rural, foram apresentados os seguintes documentos:
- Certidão de Casamento dos genitores do autor, cujo enlace matrimonial ocorreu em 1947, onde
consta que seu pai seria “lavrador”;
- Certidão de nascimento do autor, onde não consta a atividade laborativa de seus pais;
- CTPS do autor, onde constam alguns vínculos formais de trabalho rural, ocorridos nos seguintes
períodos: 02/04/2007 a 03/10/2007; 19/05/2008 a 01/11/2008; 23/03/2009 a 29/05/2009;
08/06/2009 a 21/08/2009; 04/01/2010 a 23/04/2011; 09/05/2011 a 29/09/2011; 02/05/2012 a
21/05/2012; 18/06/2012 a 23/07/2012 e de 15/03/2013 a 02/09/2016.
- Declaração de Exercício de Atividade Rural fornecida pelo Sindicato de Trabalhadores Rurais de
Divinolândia, emitida em 18/01/2017, não homologada;
- Título Eleitoral do autor, emitido em 23/04/1975, onde consta sua profissão como “lavrador”.
Pois bem.
De início, destaco que o labor rural prestado na qualidade de diarista/boia-fria (hipótese dos
autos), iniciado a partir de 01/01/2011, deveria ter sido comprovado por prova material (e não
apenas por início de prova), e estaria sujeito a certa quantidade de contribuições vertidas pelo
demandante, ambas as situações inexistentes no caso vertente. Nesses termos, a partir de 2011,
o trabalho campesino eventualmente prestado pelo autor nessa condição não pode ser
reconhecido, restando comprovados, somente, os interregnos constantes de CTPS. Nada mais.
Quanto ao principal período controverso (02/05/1974 a 30/03/2007), entendo que o conjunto
probatório é frágil e insubsistente para comprovar as alegações trazidas pela exordial, pois o
documento inicial a atestar sua condição de “lavrador” é de natureza meramente declaratória e foi
emitido em 1975, não sendo capaz de comprovar sua permanência nas lides campesinas por
longos 32 anos, ou seja, até 2007, quando apresentou seu primeiro vínculo formal de trabalho.
Quanto à prova testemunhal, pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que
apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo a
existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". E nem esta se apresenta
efetivamente robusta, pois apesar de afirmar o trabalho rural do autor, é genérica e não
especificou, de forma minimamente razoável, quando isso ocorreu, por quanto tempo perdurou,
para quem trabalhou, sua carga horária, quanto recebia de remuneração e de que forma
percebiam tal pagamento. É o que se observa da transcrição constante da r. sentença, pois os
áudios correspondentes estão inaudíveis.
Dessa forma, não restando comprovada a realização de trabalho rural pelo período necessário de
carência, entendo que não restaram configurados os requisitos necessários à concessão da
benesse vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria medida imperativa.
Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP).
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora,
a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja
exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de
Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, determinando a
imediata cessação do benefício concedido pela r. sentença. Expeça-se ofício ao INSS, com os
documentos necessários, para as providências cabíveis, independentemente do trânsito em
julgado.
A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora
deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução, após a eventual revisão do entendimento firmado no
Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
Por esses fundamentos, rejeito a preliminar e dou parcial provimento à apelação do INSS,
extinguindo o processo nos termos do artigo 485, IV, do CPC, revogando a tutela concedida,
conforme ora consignado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO/PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO À APELAÇÃO.
PRELIMINAR REJEITADA. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
PREENCHIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO COMPROVADA.
APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. PROCESSO EXTINTO. TUTELA
REVOGADA.
1. Em sede preliminar, não entendo que a imediata execução da sentença ora recorrida resulte,
necessariamente, em lesão grave ou de difícil reparação à Previdência Social, uma vez que se
deve observar que, no presente caso, colidem o bem jurídico vida e o bem jurídico pecuniário, daí
porque aquele primeiro é que deve predominar, mesmo porque, embora, talvez, não seja,
realmente, possível a restituição dos valores pagos a título de tutela antecipada, se não
confirmada a r. sentença em grau recursal, ainda será factível a revogação do benefício
concedido, impedindo, destarte, a manutenção da produção de seus efeitos. Além disso, ao
menos em sede de cognição primária, verifico não ter sido apresentada pela parte apelante
qualquer fundamentação relevante que ensejasse a atribuição de efeito suspensivo à apelação,
nos termos do artigo 1012, § 4º, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual deve ser o seu
pedido indeferido, rejeitando a preliminar arguida.
2. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
3. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
4. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
5. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
6. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
7. De início, destaco que o labor rural prestado na qualidade de diarista/boia-fria (hipótese dos
autos), iniciado a partir de 01/01/2011, deveria ter sido comprovado por prova material (e não
apenas por início de prova), e estaria sujeito a certa quantidade de contribuições vertidas pelo
demandante, ambas as situações inexistentes no caso vertente. Nesses termos, a partir de 2011,
o trabalho campesino eventualmente prestado pelo autor nessa condição não pode ser
reconhecido, restando comprovados, somente, os interregnos constantes de CTPS. Nada mais.
Quanto ao principal período controverso (02/05/1974 a 30/03/2007), entendo que o conjunto
probatório é frágil e insubsistente para comprovar as alegações trazidas pela exordial, pois o
documento inicial a atestar sua condição de “lavrador” é de natureza meramente declaratória e foi
emitido em 1975, não sendo capaz de comprovar sua permanência nas lides campesinas por
longos 32 anos, ou seja, até 2007, quando apresentou seu primeiro vínculo formal de trabalho.
8. Quanto à prova testemunhal, pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento de
que apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo a
existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". E nem esta se apresenta
efetivamente robusta, pois apesar de afirmar o trabalho rural do autor, é genérica e não
especificou, de forma minimamente razoável, quando isso ocorreu, por quanto tempo perdurou,
para quem trabalhou, sua carga horária, quanto recebia de remuneração e de que forma
percebiam tal pagamento. É o que se observa da transcrição constante da r. sentença, pois os
áudios correspondentes estão inaudíveis.
9. Dessa forma, não restando comprovada a realização de trabalho rural pelo período necessário
de carência, entendo que não restaram configurados os requisitos necessários à concessão da
benesse vindicada, motivo pelo qual a reforma da r. sentença seria medida imperativa.
10. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito (artigo 485, IV,
do CPC).
11. Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, determinando a
imediata cessação do benefício concedido pela r. sentença. Expeça-se ofício ao INSS, com os
documentos necessários, para as providências cabíveis, independentemente do trânsito em
julgado. A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela
parte autora deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução, após a eventual revisão do
entendimento firmado no Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de
Justiça.
12. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto. Tutela
revogada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar e dar parcial provimento à apelação do INSS,
extinguindo o processo nos termos do artigo 485, IV, do CPC, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
