
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0007714-06.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LOURDES FERREIRA RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: WLADIMIR ALDRIN PEREIRA ZANDAVALLI - MS8738-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0007714-06.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LOURDES FERREIRA RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: WLADIMIR ALDRIN PEREIRA ZANDAVALLI - MS8738-A
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R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e por LOURDES FERREIRA RODRIGUES, em ação ajuizada pela última, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de aposentadoria por invalidez, desde a data da citação, que se deu em 16/06/2011 (ID 103016299, p. 36). Fixou correção monetária nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações em atraso, contabilizadas até a data da sua prolação. Por fim, determinou a imediata implantação do benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada (ID 103016299, p. 125/129).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a requerente não demonstrou ser segurada da Previdência Social, por meio de suposto trabalho na condição de rurícola, quando do surgimento da incapacidade. Subsidiariamente, requer seja afastada sua condenação no pagamento de custas processuais (ID 103016299, p. 139/156).
A parte autora também interpôs recurso de apelação, na forma adesiva (ID 103016299, p. 160/164), no qual pleiteia a majoração da verba honorária.
A última também apresentou contrarrazões (ID 103016299, p. 165/169).
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO (1728) Nº 0007714-06.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: LOURDES FERREIRA RODRIGUES
Advogado do(a) APELADO: WLADIMIR ALDRIN PEREIRA ZANDAVALLI - MS8738-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, ressalto, quanto ao recurso adesivo da parte autora, que, de acordo com disposição contida no art. 18 do CPC/15 (anteriormente reproduzida pelo art. 6º do CPC/73),
"ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico"
.Por outro lado, o art. 23 da Lei nº 8.906/94 é claro ao estabelecer que os honorários
"pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor".
Nesse passo, entendo que a verba honorária (tanto a contratual como a sucumbencial) possui caráter personalíssimo, detendo seu titular, exclusivamente, a legitimidade para pleiteá-los, vedado à parte fazê-lo, na medida em que a decisão não lhe trouxe prejuízo.
Em outras palavras, não tendo a parte autora experimentado qualquer sucumbência com a prolação da decisão impugnada, ressente-se, nitidamente, de interesse recursal.
Dito isso, e versando o recurso insurgência referente, exclusivamente, a honorários advocatícios, patente a ilegitimidade da parte no manejo do presente apelo.
Não é outra a orientação desta Egrégia 7ª Turma:
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. ARTIGO 557, § 1º, DO CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUTAIS. DESTAQUE. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL E DE LEGITIMIDADE DA AUTORA.
1. Os honorários advocatícios estabelecidos por contrato entre o advogado e seu constituinte têm caráter personalíssimo, sendo do advogado, e somente dele, a legitimidade para pleiteá-los.
2. O que se objetiva com este Agravo de Instrumento é obter o destaque da quantia correspondente aos honorários advocatícios, nos moldes do contrato celebrado entre a autora e o patrono. Verifica-se, portanto, que apenas o advogado (e não a autora) sucumbiu em face da decisão inicialmente agravada, de modo que, nesse caso, apenas ele é que teria legitimidade e interesse recursal.
3. Considerando que tanto o Agravo de Instrumento quanto o presente Agravo Legal foram interpostos em nome da autora, a despeito de as petições de interposição terem sido assinadas pelo advogado GUSTAVO MARTINI MULLER, conclui-se que os aludidos recursos não merecem ser conhecidos, tendo em vista a ausência de interesse recursal e a ilegitimidade da autora para pleitear a reforma da decisão agravada.
4. Ademais, ainda que se ignorasse o fato de constar o nome da autora na petição inicial do Agravo de Instrumento, e se entendesse que a parte agravante seria, na verdade, a pessoa de seu advogado, melhor sorte não aguardaria o patrono, pois este não recolheu as custas e o porte de remessa e retorno dos autos, de modo que teria havido deserção.
5. Agravo Legal não conhecido."
(Ag Legal em AI nº 2014.03.00.002523-6/SP, Rel. Des. Federal Fausto de Sanctis, DE 05/06/2014).
Registro, igualmente, que, assentada a legitimidade recursal exclusiva do patrono, o que, de per si, conduz ao não conhecimento do apelo, caberia ao mesmo o recolhimento das custas de preparo, máxime em razão de não ser a ele extensiva a gratuidade de justiça conferida à parte autora.
Nesse particular, nem se alegue que o art. 932, parágrafo único, do CPC, prevê a concessão de prazo para que seja sanado o vício que conduza à inadmissibilidade do recurso.
Isso porque o caso em exame, a meu julgar, não se subsome à hipótese referida, na medida em que não se cuida, aqui, de vício formal passível de saneamento, e sim de pressuposto recursal (legitimidade de parte), de natureza insanável.
Confira-se, a respeito, o Enunciado nº 06 do Superior Tribunal de Justiça:
"Nos recursos tempestivos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016), somente será concedido o prazo previsto no art. 932, parágrafo único, c/c o art. 1.029, § 3º, do novo CPC para que a parte sane vício estritamente formal."
Desta feita, deixo de conhecer o apelo adesivo da parte autora.
Ainda em sede preliminar, destaco o não cabimento da remessa necessária no presente caso.
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 09/09/2014, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, §2º, do CPC/1973:
"Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).
§1º Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.
§2º Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.
§3º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente".
No caso, houve condenação do INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de aposentadoria por invalidez, desde a data da citação, que se deu em 16/06/2011 (ID 103016299, p. 36).
Informações extraídas dos autos noticiam a implantação do benefício, em virtude do deferimento da tutela antecipada, com renda mensal inicial (RMI) de um salário mínimo (ID 103016299, p. 135/136).
Constata-se, portanto, que desde o termo inicial do benefício (16/06/2011) até a data da prolação da sentença - 09/09/2014 - passaram-se pouco mais de 38 (trinta e oito) meses, totalizando assim 38 (trinta e oito) prestações no valor de um salário mínimo que, mesmo que devidamente corrigidas e com a incidência dos juros de mora e verba honorária, ainda se afigura inferior ao limite de alçada estabelecido na lei processual.
Passo à análise do mérito
.A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo
a quo
, com base em exame realizado em 09 de agosto de 2012 (ID 103016299, p. 82/85), quando a demandante possuía 53 (cinquenta e três) anos de idade, a diagnosticou como portadora de “glaucoma secundário à inflamação ocular (CID: H40.5) e visão subnormal de ambos os olhos (CID: H54.2)
”.Concluiu por sua incapacidade total e permanente para o labor, fixando seu início em 2002, de acordo com as informações prestadas pela própria autora.
Esclareceu que “
a periciada referiu que trabalhava na roça até o ano de 2002 quando teve que se afastar de suas atividades por apresentar problemas de visão, cardíacos, diabetes e na coluna lombar. Ao exame médico pericial desta data, a periciada encontra-se em bom estado geral, lúcida, orientada, obesa, marcha livre, aparentemente com comprometimento visual no olho direito, força muscular preservada, sem limitações de movimentos, PA: 180x110
”.Entretanto, a requerente não conseguiu comprovar que era segurada da Previdência, por meio da demonstração de trabalho efetuado na condição de rurícola.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal.
Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS. 1. (...). 3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento.(...)" (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº 0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/12/2015 - grifos nossos).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua eficácia probatória. (...)" (AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP
, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.No caso em apreço, para a comprovação do trabalho na condição de rurícola para terceiros, a autora não trouxe aos autos qualquer prova material válida que indicasse ser sua atividade profissional habitual a de "lavradora".
O único documento que comprovaria o seu trabalho rural (ID 103016299, p. 14), consistente em carteirinha junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mundo Novo/MS, foi emitida em 11/01/2010, ou seja, mais de 8 (oito) anos depois de ter deixado de trabalhar no campo, segundo a própria informou ao
expert
.Por outro lado, esse documento, por depender apenas de declarações do próprio filiado, trata-se de prova de pouca confiabilidade. Não por outro motivo alteração no Regulamento da Previdência Social (Dec. 3.048/1999), efetivada em 2008 (Dec. 6.722), excluiu do rol de documentos aptos a demonstrar o trabalho desenvolvido no campo, justamente, a “declaração de sindicato de trabalhadores rurais” (antigo inciso VIII do art. 62, §2º).
A outra prova que se refere especificamente à autora, sua certidão de casamento (ID 103016299, p. 17), a qualifica como “do lar”.
Com relação à CTPS do seu esposo, com vínculos rurais anotados, ressalto que a extensão de efeitos em decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - parece-me viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, sendo que os depoimentos das testemunhas - JANUÁRIO RAMOS MATTOS e NELI RIBEIRO DA SILVA ANDRADE (ID 103016299, p. 104 e 115) -, que não encontram substrato material suficiente, se mostram aptos tão somente para comprovar o labor rural exercido por seu esposo, para terceiros.
Aliás, seu ex-esposo, já que, quando requereu administrativamente benefício assistencial de prestação continuada ao INSS, a autora relatou que estava separada de fato (ID 103016299, p. 50/59). Ou seja, nem se tivesse alegado ter trabalhado no campo, em regime de economia familiar, a prova acostada aos autos sustentaria suas alegações.
Em suma, diante da ausência de substrato material mínimo do trabalho rural (Súmula 149 do STJ), tenho que a autora não comprovou a qualidade de segurado junto ao RGPS, restando inviabilizada a concessão de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença, nos exatos termos dos arts. 42 e 59 da Lei 8.213/91.
Por conseguinte, imperiosa a extinção da demanda, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a propositura de nova ação, caso a requerente venha a conseguir documentos que comprovem o labor desenvolvido na qualidade de rurícola no período alegado.
Nesse sentido, transcrevo o entendimento consolidado do C. STJ, em julgado proferido sob a sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido".
(REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Observo que a sentença concedeu a tutela antecipada.
Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) que é tema cuja análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo (STJ, Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo ao andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
Condeno a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC, já que deu causa à extinção do processo sem resolução do mérito.
Ante o exposto,
não conheço
do apelo da parte autora e da remessa necessária e,de ofício,
julgo extinto o processo, sem exame do mérito
, em atenção ao determinado no REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, e condeno a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (CPC/73, art. 20, §3º), ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, com a revogação da tutela anteriormente concedida, restando, ao fim,prejudicada
a análise da apelação do INSS.Encaminhe-se a mídia à Subsecretaria da Turma para descarte após a interposição de recurso excepcional ou a certificação do trânsito em julgado.
Oficie-se ao INSS.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. ILEGITIMIDADE. RECURSO NÃO CONHECIDO. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 475, §2º, DO CPC/1973. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE TOTAL E PERMANENTE CONFIGURADA. TRABALHO NA CONDIÇÃO DE RURÍCOLA. NÃO COMPROVAÇÃO. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DOCUMENTOS EXTEMPORÂNEOS. EXTENSÃO DA QUALIDADE DE SEGURADO DE PARENTE PRÓXIMO. INVIABILIDADE. SÚMULA 149 DO STJ. APELO ADESIVO DA PARTE AUTORA E REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDOS. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. INVERSÃO DAS VERBAS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. APELO DO INSS PREJUDICADO.
1 - Não conhecido o recurso adesivo da autora, eis que versando insurgência referente, exclusivamente, à verba honorária, evidencia-se a ilegitimidade da parte no manejo do apelo.
2 - Não cabimento da remessa necessária no presente caso. A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 09/09/2014, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973. No caso, houve condenação do INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de aposentadoria por invalidez, desde a data da citação, que se deu em 16/06/2011 (ID 103016299, p. 36).
3 - Informações extraídas dos autos noticiam a implantação do benefício, em virtude do deferimento da tutela antecipada, com renda mensal inicial (RMI) de um salário mínimo (ID 103016299, p. 135/136).
4 - Constata-se, portanto, que desde o termo inicial do benefício (16/06/2011) até a data da prolação da sentença - 09/09/2014 - passaram-se pouco mais de 38 (trinta e oito) meses, totalizando assim 38 (trinta e oito) prestações no valor de um salário mínimo que, mesmo que devidamente corrigidas e com a incidência dos juros de mora e verba honorária, ainda se afigura inferior ao limite de alçada estabelecido na lei processual.
5 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
6 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
7 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).8 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
9 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
10 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
11 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
12 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo
a quo
, com base em exame realizado em 09 de agosto de 2012 (ID 103016299, p. 82/85), quando a demandante possuía 53 (cinquenta e três) anos de idade, a diagnosticou como portadora de “glaucoma secundário à inflamação ocular (CID: H40.5) e visão subnormal de ambos os olhos (CID: H54.2)”. Concluiu por sua incapacidade total e permanente para o labor, fixando seu início em 2002, de acordo com as informações prestadas pela própria autora.13 - Esclareceu que “a periciada referiu que trabalhava na roça até o ano de 2002 quando teve que se afastar de suas atividades por apresentar problemas de visão, cardíacos, diabetes e na coluna lombar. Ao exame médico pericial desta data, a periciada encontra-se em bom estado geral, lúcida, orientada, obesa, marcha livre, aparentemente com comprometimento visual no olho direito, força muscular preservada, sem limitações de movimentos, PA: 180x110”.
14 - A requerente não conseguiu comprovar que era segurada da Previdência, por meio da demonstração de trabalho efetuado na condição de rurícola.
15 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
16 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela.
17 - Observa-se, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado. Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP
, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.18 - No caso em apreço, para a comprovação do trabalho na condição de rurícola para terceiros, a autora não trouxe aos autos qualquer prova material válida que indicasse ser sua atividade profissional habitual a de "lavradora".
19 - O único documento que comprovaria o seu trabalho rural (ID 103016299, p. 14), consistente em carteirinha junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Mundo Novo/MS, foi emitida em 11/01/2010, ou seja, mais de 8 (oito) anos depois de ter deixado de trabalhar no campo, segundo a própria informou ao
expert
. Esse documento, por depender apenas de declarações do próprio filiado, trata-se de prova de pouca confiabilidade. Não por outro motivo alteração no Regulamento da Previdência Social (Dec. 3.048/1999), efetivada em 2008 (Dec. 6.722), excluiu do rol de documentos aptos a demonstrar o trabalho desenvolvido no campo, justamente, a “declaração de sindicato de trabalhadores rurais” (antigo inciso VIII do art. 62, §2º).20 - A outra prova que se refere especificamente à autora, sua certidão de casamento (ID 103016299, p. 17), a qualifica como “do lar”.
21 - Com relação à CTPS do seu esposo, com vínculos rurais anotados, ressalto que a extensão de efeitos em decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - parece-me viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, sendo que os depoimentos das testemunhas - JANUÁRIO RAMOS MATTOS e NELI RIBEIRO DA SILVA ANDRADE (ID 103016299, p. 104 e 115) -, que não encontram substrato material suficiente, se mostram aptos tão somente para comprovar o labor rural exercido por seu esposo, para terceiros.
22 - Aliás, seu ex-esposo, já que, quando requereu administrativamente benefício assistencial de prestação continuada ao INSS, a autora relatou que estava separada de fato (ID 103016299, p. 50/59). Ou seja, nem se tivesse alegado ter trabalhado no campo, em regime de economia familiar, a prova acostada aos autos sustentaria suas alegações.
23 - Em suma, diante da ausência de substrato material mínimo do trabalho rural (Súmula 149 do STJ), tem-se que a autora não comprovou a qualidade de segurado junto ao RGPS, restando inviabilizada a concessão de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença, nos exatos termos dos arts. 42 e 59 da Lei 8.213/91.
24 - Imperiosa a extinção da demanda, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a propositura de nova ação, caso a requerente venha a conseguir documentos que comprovem o labor desenvolvido na qualidade de rurícola no período alegado.
25 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
26 - Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, os quais se arbitra em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
27 - Apelo adesivo da parte autora e remessa necessária não conhecidos. Extinção do processo sem resolução do mérito. Revogação da tutela. Devolução de valores. Juízo da execução. Inversão das verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça. Apelo do INSS prejudicado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu não conhecer do apelo da parte autora e da remessa necessária e, de ofício, julgar extinto o processo, sem exame do mérito, em atenção ao determinado no REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (CPC/73, art. 20, §3º), ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, com a revogação da tutela anteriormente concedida, restando, ao fim, prejudicada a análise da apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
