Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2121598 / SP
0002361-60.2012.4.03.6107
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
07/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:16/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 16, III e 74 A 79
DA LEI N.º 8.213/91. EX-ESPOSA. SEPARAÇÃO CONSENSUAL. DEPENDÊNCIA
ECONÔMICA NÃO DEMONSTRADA. APELAÇÃO DA AUTORA DESPROVIDA. SENTENÇA
MANTIDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
1 - A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força
do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 16, III e 74 a 79 da Lei
nº 8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido,
aposentado ou não.
2 - O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência
do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a
manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter
preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das
aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
3 - A Lei de Benefícios, no art.16, com a redação dada pela Lei nº 9.032/95, vigente à época
dos óbitos, prevê taxativamente as pessoas que podem ser consideradas dependentes: "I - o
cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição,
menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; II - os pais; III - o irmão não emancipado, de
qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido."
4 - Destaca-se também, a regra contida no § 1º do já citado artigo, de que a existência de
dependente de qualquer das classes exclui o direito às prestações dos eventuais dependentes
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
das classes seguintes.
5 - Conforme §4º do mesmo artigo a dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I
é presumida e a das demais deve ser comprovada.
6 - Ainda, nos termos do artigo 76, § 2º da Lei nº 8.213/91: "O cônjuge divorciado ou separado
judicialmente ou de fato que recebia pensão de alimentos concorrerá em igualdade de
condições com os dependentes referidos no inciso I do art. 16 desta Lei".
7 - O evento morte do Sr. Délcio de Souza Terra, ocorrido em 21/6/2005, restou devidamente
comprovado com a certidão de óbito (fl. 24). Igualmente, incontroverso o requisito relativo à
qualidade de segurado do de cujus, uma vez que este recebia o benefício de aposentadoria por
tempo de contribuição na época do passamento (fl. 21).
8 - A celeuma diz respeito à condição da autora como dependente do falecido. Segundo a
narrativa delineada na petição inicial, embora a demandante e o de cujus tivessem se separado
em 26 de junho de 1998, este jamais deixou de ampará-la financeiramente.
9 - A fim de corroborar suas alegações, coligiu aos autos cópia dos seguintes documentos: 1 -
acordo de separação consensual, no qual consta a previsão de pagamento de pensão
alimentícia aos filhos do casal, Fernando e Rafael, bem como consta cláusula de intenção de
última vontade, que prevê o desejo de conferir à esposa, ora demandante, e aos filhos "os
direitos da pensão deixada, bem como direitos hereditários que o requerente venha a ser
beneficiário futuramente" (fls. 34/38 e 47); 2 - conta de água, relativa a abril de 2005, e o
comprovante de que o falecido a pagou (fl. 50); 3 - conta de telefone e de TV a cabo (fls. 51 e
58), pagas pelo de cujus; 4 - contrato de seguro de vida, firmado pelo falecido em 19/07/1990,
no qual a autora é qualificada como beneficiária (fl. 60); 5 - comprovante de recebimento da
indenização referente ao seguro de vida pela demandante (fl. 59); 6 - demonstrativos de
pagamento do de cujus, nos quais constam descontos a título de pensão alimentícia (fl. 61/62).
10 - No que se refere ao acordo de separação, tal documento não é apto a demonstrar a
existência de dependência econômica entre a demandante e o falecido, pois a prestação de
alimentos ali consignada se destina a custear as necessidades materiais dos filhos do casal,
Fernando e Rafael.
11 - Quanto à cláusula que manifesta a intenção do falecido de conferir a titularidade dos
direitos previdenciários e sucessórios à autora, saliente-se que tal disposição carece de
validade jurídica, para o deslinde da controvérsia ora examinada.
12 - Neste sentido, embora a lei confira aos sujeitos de direito certa capacidade de estabelecer
normas que disciplinem suas relações privadas, a referida liberdade negocial não se sobrepõem
ao efeito vinculante de normas cogentes estabelecidas pelo Estado no regular exercício do
poder legiferante. De fato, a observância da licitude da disposição constitui requisito inarredável
para a sua validade, conforme preconiza o artigo 104, II, do Código Civil de 2002.
13 - O mero acordo de vontades, firmado por ocasião da separação do casal, portanto, não tem
o condão de suprimir a necessidade de satisfação dos requisitos estabelecidos pelos artigos 16
e 76 da Lei n. 8.213/91, para fins de enquadrar a demandante como dependente valida do
falecido.
14 - Igualmente, não socorrem a demandante os demonstrativos de descontos de pensão
alimentícia no salário do falecido, uma vez que tais valores se destinavam apenas ao custeio
das necessidades materiais dos filhos do casal, conforme consignado no acordo de separação
(fl. 37).
15 - As contas de água, telefone e TV a cabo também não são aptas a comprovar a alegada
dependência entre a demandante e o falecido na data do óbito (fls. 50/51 e 58). Não restou
demonstrado que tais dispêndios eram custeados habitualmente.
16 - Ademais, é relevante destacar que o extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais
revela ter a autora mantido longo vínculo empregatício com a Municipalidade de Araçatuba que,
iniciado em 01/03/1977, findou-se apenas em 07/2004, quando ela passou a receber
aposentadoria por tempo de contribuição (NB 133917097-0) (fl. 99), no valor atualizado de
2.381,61 (dois mil, trezentos e oitenta e um reais e sessenta e um centavos), referentes a
agosto de 2019, conforme o extrato do Sistema Único de Benefícios ora anexo.
17 - Desse modo, é pouco crível que contas que totalizavam cerca de R$ 520,00 (quinhentos
reais), representassem um auxílio financeiro substancial dentro do orçamento familiar, ao
menos, para fins de comprovar a dependência econômica da autora em relação ao falecido.
18 - No mais, as testemunhas ouvidas nas audiências, realizadas em 8 de outubro de 2014 e
em 19 de novembro de 2014 (mídias às fls. 165 e 175), foram uníssonas no sentido de que não
havia uma relação de dependência econômica da autora em relação ao de cujus. Nestes
termos, de se repisar o r. decisum a quo, verbis (fl.210): "ALZIRA BARBARA DE CASTRO
RIBEIRO CORREA (testemunha arrolada pela autora) afirmou que conhece a Dona Claudete
há mais de 15 anos, em razão de ter sido vizinha dela; Esclarecendo que antes de falecer, o Sr.
Délcio teve que fazer uma cirurgia na cidade de Rio Preto/SP e ao retornar ele ficou por mais de
uma ano na casa da Sra. Claudete se recuperando. Com isso, ela teve que se ausentar do
próprio serviço para cuidar dele e muitas vezes ficou sem condições financeiras, tendo que
vender alguns de seus bens para pagar as despesas com a farmácia, já que os medicamentos
de operação são caros; Em decorrência do alto custo dos medicamentos e ele ter que se
afastar do serviço quando adoeceu, o Sr. Décio precisou da ajuda financeira de Claudete, que
pagava tudo pra ele e inclusive alguns amigos que fizeram um caderno para arrecadar dinheiro
para ajudá-lo." (...) "Como se extrai da prova oral, não havia dependência econômica da autora
com relação a seu ex-marido, tanto é que a autora, com sua renda própria, foi quem custeou as
despesas do de cujus durante seu tratamento médico".
19 - Não se pode confundir mero auxílio com dependência econômica, caracterizando esta
última a prestação habitual de recursos que, no âmbito do orçamento doméstico, represente
uma importância substancial para o custeio das despesas familiares. Precedente.
20 - Cabia à autora demonstrar o fato constitutivo de seu direito, nos termos preconizados pelo
art. 373, I, do Código de Processo Civil. No entanto, nos presentes autos não foram juntados
quaisquer documentos indiciários do preenchimento do requisito relativo à dependência
econômica.
21 - Diante disso, não há nos autos elementos de convicção que apontem para a comprovação
do requisito em apreço, razão pela qual a manutenção da sentença de improcedência é medida
que se impõe.
22 - Apelação da autora desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
