
| D.E. Publicado em 30/10/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação do INSS, para alterar a data de início do benefício para a data da citação (25/07/2012), compensando-se os valores pagos a título de tutela antecipada, e, de ofício, estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, com acréscimo de fundamentação, a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 23/10/2018 18:00:41 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0035937-37.2014.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por IVO NARDES, objetivando a concessão do benefício previdenciário da pensão por morte.
A r. sentença, de fls. 119/121-verso, julgou procedente o pedido inicial, para condenar o INSS na implantação da pensão por morte ao autor, a partir da data do óbito (20/08/1994), observada a prescrição quinquenal, incidindo sobre os atrasados juros e correção monetária, pelos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), ressalvando-se a possibilidade de alteração na fase executiva a depender da modulação dos efeitos na ADI nº 4.357. Condenou, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, incidente sobre as prestações vencidas até a sentença, nos termos da Súmula 111 do STJ. Isenção das custas e despesas processuais. Com concessão de tutela específica. Sem remessa necessária.
Em razões recursais de fls. 130/135, postula, preliminarmente, a suspensão da tutela antecipada. No mérito, requer a reforma da sentença ao fundamento de que não restou comprovada a qualidade de segurada da falecida como trabalhadora rural, ante a ausência de prova material e de inscrição como segurada especial na Previdência Social. Subsidiariamente, pugna a alteração da data de início do benefício para a data da citação, eis que transcorridos quase 18 (dezoito) anos entre a data do óbito e o ajuizamento da ação. Por fim, prequestiona a matéria.
Intimado, o autor apresentou contrarrazões às fls. 146/152.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Insta salientar que, nesta fase processual, a análise do pedido de suspensão da antecipação da tutela será efetuada juntamente com o mérito das questões trazidas a debate pelo recurso de apelação.
A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido, aposentado ou não.
O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
A celeuma cinge-se em torno do requisito relativo à qualidade de rurícola da falecida, à época do óbito.
Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu art. 11, inciso VII, nos seguintes termos:
É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91, como se pode observar nos seguintes precedentes:
O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Para comprovar o labor rurícola da falecida, o autor anexou a pretensa prova material:
a) Cópia da certidão de casamento, ocorrido em 1º/03/1967, em que o autor é qualificado como pescador e a falecida como doméstica (fl.18);
b) Cópia da certidão de nascimento de Pedro Ferreira Nardes, em 19/09/1955, em que o autor e a falecida são qualificados como lavradores (fl. 19);
c) Cópia da certidão de nascimento de Geni Ferreira Nardes, em 03/04/1957, em que o autor e a falecida são qualificados como lavradores (fl. 20);
d) Cópia da certidão de nascimento de Flávio Ferreira Nardes, em 25/03/1959, em que o autor e a falecida são qualificados como lavradores (fl. 21);
e) Cópia da certidão de nascimento de Ivone Ferreira Nardes, em 29/01/1961, em que o autor e a falecida são qualificados como lavradores (fl. 22);
f) Cópia da certidão de nascimento de Terezinha Ferreira Nardes, em 20/08/1962, em que o autor e a falecida são qualificados como lavradores (fl. 23);
g) Cópia da certidão de nascimento de Daniel Ferreira Nardes, em 14/02/1970, em que o autor e a falecida são qualificados como lavradores (fl. 24);
h) Cópia da certidão de nascimento de Andréia Ferreira Nardes, em 23/03/1976, em que o autor é qualificado como pescador e a falecida como doméstica (fl. 25);
i) Cópia da certidão de óbito, ocorrido em 20/08/1994, em que a falecida foi qualificada como doméstica (fl.26);
j) Certidão da Justiça Eleitoral, emitida em 11/11/2008, em que consta a profissão do requerente como pescador, domiciliado desde 18/09/1986 (fl. 28);
k) Declaração de filiação emitida pela "Colônia de Pescadores Z-7 Veiga Miranda", dando conta da inscrição do autor como pescador profissional de 19/05/1971 a 11/01/1993 (fl. 29);
l) Cópia da carteira de identificação de pescador amador em nome do requerente, emitida pelo Ministério do Meio Ambiente, sem data (fl. 30);
m) Cópia da carteira de identificação de pescador profissional em nome do requerente, na categoria "artesanal embarcado", emitida pelo Ministério do Meio Ambiente, constando como data de registro 22/06/2001 e com validade em 22/06/2002 (fl. 31);
n) Declaração de pedido de entrada na "Carteira de Pescador Profissional", na "Colônia de Pescadores Z-7 Veiga Miranda", sem data (fl. 32);
o) Ficha de sócio na "Colônia de Pescadores Z-7 Veiga Miranda", datada em 19/05/1971, acusando pagamentos até o ano de 1991 (fls. 33/34).
Depreende-se que, como início de prova material, o autor juntou aos autos documentos em que sua falecida esposa é qualificada como lavradora, sendo o primeiro de 1955 e o último de 1970, bem como documentos em que ele é qualificado como pescador profissional entre 19/05/1971 e 11/01/1993, do que se conclui que, para o período posterior a 1971, pretende a comprovação do exercício de atividade rural à sua falecida esposa pela extensão da sua qualificação de pescador, para fins de percepção da pensão por morte.
Nesse particular, entendo que a extensão de efeitos em decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - parece-me viável apenas quando se trata de agricultura de subsistência, em regime de economia familiar.
No caso, a fim de demonstrar o regime de economia familiar, foram ouvidas três testemunhas, em 20/06/2013 (fls. 104 e 105) e 19/09/2013 (mídia à fl. 118), cujos depoimentos corroboram a atividade desenvolvida pelo autor e por sua falecida esposa. Vejamos:
O Sr. Aparecido Rosseto afirmou: "Conheci Lurdes Ferreira Nardes, que por muito tempo trabalhou e pescou com Ivo Nardes, seu marido. Ela era lavradora e pescadora e exerceu essas atividades por uns vinte anos. Sei que Ivo trabalhou uns quarenta anos na lavoura e na pesca". Às reperguntas, acrescentou: "Sei que Ivo e Lurdes trabalhavam juntos, mas não sei se os filhos ajudavam. Eles não tinham empregados. Eles plantavam milho, mandioca, feijão, para a própria subsistência. O excedente era vendido. Eles moravam na Enseada e pescavam tainha, robalo, vivoca, bagre e parati. Utilizavam um pequeno barco para a pesca. Eu presenciei Lurdes saindo para a pesca junto com Ivo. Eles também trabalhavam com cerco. Eles pescavam no Mar Pequeno. Lurdes trabalhou na pesca e na lavoura até morrer. Eu os conheci durante uns vinte e cinco anos. Sei que Lurdes não teve outra atividade" (fl. 104).
Por sua vez, a Sra. Magali Nepomuceno Ribeiro, pontificou: "Conheci Lurdes quando fui sua vizinha, no bairro Canto do Morro, há trinta e cinco anos. Ela ajudava o marido Ivo Nardes na pescaria e cuidava dos filhos. Não sei se Lurdes trabalhou na cidade. Ivo pescava e plantava mandioca em seu sítio. Não sei por quanto tempo Ivo exerceu essas atividades". Acrescentou, ainda: "Não sei eles tinham empregados. Lurdes trabalhava com o marido na pesca e na lavoura. Não sei por quanto tempo. Não sei se ela trabalhou até falecer. Eles pescavam no rio que ficava na Enseada, utilizando canoa. Eles peixe que mais pescavam era manjuba. Eu via Lurdes com frequência, pois éramos vizinhas. Não me recordo por quanto tempo éramos vizinhas" (sic - fl. 105).
Por derradeiro, o Sr. Maurício Aguiar Costa alegou conhecer o autor e sua falecida esposa, desde 1990, mais ou menos. Sustentou que o casal pescava e que a Sra. Lourdes trabalhava na lavoura, plantando mandioca, batata, feijão, para consumo próprio e da família, e ajudava também o marido na pesca, cuja embarcação era canoa, pescando tainha, "curvinhas", no Rio Ribeira. Acrescentou que eles não tinham ajuda de empegados em nenhuma atividade, não se recordando se trabalharam na cidade (mídia à fl. 118).
Como se vê, a prova oral se revelou apta a complementar o início de prova material, demonstrando que a parte autora se dedicou ao labor campesino, bem como à atividade pesqueira de forma artesanal, juntamente com o requerente, em momento anterior ao óbito e em regime de economia familiar, de modo que ostentava a qualidade de segurada. Sendo assim, mantenho o r. decisum a quo neste ponto.
Acrescento, por oportuno, tal como alegado na exordial, que, nascida em 14/10/1933, completou 55 (cinquenta e cinco) anos de idade em 14/10/1988, época em que a idade mínima para se aposentar ainda era de 60 anos, os quais somente foram atingidos em 1993, de modo que, somente com a edição da Lei n.º 8.213/91 e em conformidade com as disposições da Constituição de 1988, implementou o requisito etário.
Destarte, considerando-se os documentos de fls. 19 a 24 (certidões do nascimento dos filhos), em que qualificada como lavradora em 1955, 1957, 1959, 1961, 1962 e 1970, aliada a prova testemunhal, verifica-se que teria preenchido os requisitos necessários (idade e carência de sessenta meses, nos termos do art. 142 da Lei nº 8.213/91) à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, fazendo jus o autor, também por este ângulo, à concessão da pensão por morte, nos termos do art. 102, §2º, da Lei nº 8.213/91.
No tocante ao termo inicial do benefício, à época, vigia o art. 74 da Lei nº 8.213/91, em sua redação originária, o qual dispunha que: "Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data do óbito ou da decisão judicial, no caso de morte presumida."
Assim, o termo inicial do benefício deveria ser na data do óbito, em 20/08/1994 (fl. 26), todavia, tendo em vista que não se pode atribuir à autarquia as consequências da postura desidiosa do administrado que levou quase 18 (dezoito) anos para judicializar a questão, fixo a DIB do beneplácito na data da citação (25/07/2012 - fl. 51), compensando-se com os valores pagos a título de tutela antecipada.
Impende salientar que se está aqui a tratar da extração ou não de efeitos decorrentes da conduta daquele que demora em demasia para buscar satisfação à sua pretensão. Os efeitos da sentença condenatória via de regra, retroagem à data da citação, eis que somente a partir dela é que se afigura em mora o devedor, situação que não se abala quando da existência de requerimento administrativo prévio, mas efetuado em data muito anterior ao ajuizamento da ação, como sói ocorrer no caso dos autos. Significa dizer, em outras palavras, que o decurso de tempo significativo apaga os efeitos interruptivos da prescrição, fazendo com que o marco inicial para o pagamento seja aquele considerado o da comunicação ao réu da existência de lide e de controvérsia judicial.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso de apelação do INSS, para alterar a data de início do benefício para a data da citação (25/07/2012), compensando-se os valores pagos a título de tutela antecipada, e, de ofício, estabeleço que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, com acréscimo de fundamentação, a r. sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | CARLOS EDUARDO DELGADO:10083 |
| Nº de Série do Certificado: | 11A217031744F093 |
| Data e Hora: | 23/10/2018 18:00:44 |
