
| D.E. Publicado em 23/01/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora tão somente para afastar a condenação por litigância de má-fé e para manter os benefícios da justiça gratuita, mantendo-se, no mais, a sentença proferida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0011436-87.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Vistos em autoinspeção.
Trata-se de apelação interposta por LUCINDA DE OLIVEIRA LARA, em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício previdenciário da pensão por morte.
A r. sentença de fls. 85/88, julgou improcedente o pedido inicial, revogou a gratuidade da justiça e condenou a autora no pagamento das custas, demais despesas processuais e multa correspondente a 1% do valor da causa e honorários advocatícios, estes arbitrados em R$ 2839,15.
Em razões recursais de fls. 92/108, a autora pugna, inicialmente, pela manutenção dos benefícios da Lei nº 1.060/50, eis que os artigos 4º, § 2º, determinam expressamente as hipóteses de alteração da condição de beneficiária, somente nos casos de alteração da condição financeira de quem a requer, e, no caso, lhe foi retirado do benefício de gratuidade, em razão do magistrado condená-la por litigância de má-fé, sem lhe oportunizar manifestação em contraditório. Ainda em sede preliminar, postula pelo afastamento da multa por litigância de má-fé, isto porque também não estão presentes nenhum dos requisitos do artigo 17 do CPC. No mérito, postula pelo reconhecimento do direito à pensão por morte de seu falecido marido, porque restou amplamente comprovado o labor rural, sendo a dependência da esposa presumida, nos termos do inciso I, do art. 16 da Lei nº 8.213/81.
Intimado, o INSS apresentou contrarrazões, (fls. 115/115-verso).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido, aposentado ou não.
O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
O evento morte ocorrido em 25/03/1994 e a condição de dependente da autora, foram devidamente comprovados pela certidão de óbito, (fl.27) e pela certidão de casamento, (fl. 26) e são questões incontroversas, tendo em vista que a presunção de dependência da esposa decorre de expressa previsão legislativa, artigo 16, I, da Lei nº 8.213/91.
A celeuma cinge-se em torno do requisito relativo à qualidade de segurado rurícola do falecido à época de seu passamento.
O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
A pretensa prova material juntada aos autos, a respeito do labor no campo do falecido:
a) cópia da certidão de casamento entre a autora Lucinda de Oliveira Lara e o falecido, em que o de cujus foi qualificado como lavrador, com data ilegível, (fl. 26);
b) cópia da certidão de óbito, sem menção à profissão do falecido e com menção da data de casamento com a autora em 01/02/1975, (fl. 27);
c) cópia da certidão de nascimento do filho Ronnie de Oliveira Lara, em 29/10/1986, em que o falecido foi qualificado como lavrador, (fls. 28);
Ainda, para comprovar o exercício de labor rural do de cujus, foram ouvidas a autora e duas testemunhas, em 26/09/2011, das quais transcrevo os depoimentos na íntegra, (fls. 79/82):
Sra. Lucinda de Oliveira Lara, autora cônjuge: "(...) trabalho na lavoura desde que casei. Há mais ou menos oito anos parei de trabalhar. A partir de então passei a viver trabalhando em outras atividades, como por exemplo, doméstica e babá. Meu marido faleceu em 1994. Ele se suicidou. Ele trabalhava para Hernani Batista. Para tal pessoa meu marido trabalhou por 19 anos. Ele exercia suas funções em uma fazenda de chá. Eu trabalhava com meu cônjuge na mesma atividade. Meu marido não chegou a trabalhar para outras pessoas, ou seja, somente trabalhou para Hernani Batista. As testemunhas Pedro e Antonia trabalhavam com meu marido na propriedade de Hernani Batista. Eles trabalhavam juntos por aproximadamente 34 anos. A partir do falecimento do meu marido, passei a morar com meus filhos. Eles se casaram e atualmente moro com uma neta e uma filha que está desempregada. Não me casei novamente e também não constitui união estável. Minha neta está sendo sustentada pela pensão alimentícia paga pelo pai."
- Sr. Pedro Vitor Rodrigues: "trabalho em uma mercearia. Há três anos trabalho lá. Sou casado com a mãe de Hernani Batista e no sítio desta pessoa trabalhei por 42 anos. Eu apenas trabalhava com chá. A autora e seu marido trabalhavam para Hernani Batista, no mesmo sítio onde eu exercia as minhas atividades. O falecido trabalhou para tal pessoa por aproximadamente 34 anos. A autora passou a trabalhar para Hernani após o casamento. Não sei há quanto tempo o marido da autora faleceu, mas posso dizer que foi há mais de cinco anos. Logo após o falecimento do marido a autora parou de trabalhar. Ela não trabalhou mais, até porque ficou doente. A autora ainda mora no sítio. Os filhos da autora casaram e não moram mais com ela. Não sei se atualmente alguém está residindo com a autora. (...) há mais ou menos 05 anos deixou-se de plantar chá na propriedade."
- Sra Antonia Motta: "(...) conheço a autora desde que ela casou, ou seja, há 34 anos. Ela mora no sítio da minha família Eu vivia em união estável com o irmão de Hernani batista. O marido da autora passou a trabalhar na propriedade quando tinha mais ou menos 20 anos. Após o falecimento de seu marido, a autora trabalhou por mais 15 anos. Há mais ou menos 05 anos a autora deixou de trabalhar. A autora ainda mora no sítio. Desde a morte do marido, a autora mora com uma de suas filhas e com a neta (...)."
Não é possível concluir pela dilação probatória e pelos documentos juntados que o falecido tenha trabalhado no campo. Nos autos não há nenhum documento datado à época do falecimento ou em período imediatamente anterior ao óbito que aponte que ele exercia atividade rural, os documentos juntados como inicio de prova material são datados de 1975 e 1986, momento muito distante do período o qual se quer comprovar. E não se pode admitir prova exclusivamente testemunhal para esse fim.
Desta forma, ausente a comprovação de que o falecido era segurado da previdência social na condição de rurícola, no momento em que configurado o evento morte.
No que diz respeito à litigância de má-fé, o então vigente Código de Processo Civil de 1973, disciplina suas hipóteses de ocorrência, a saber: deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; alterar a verdade dos fatos; usar do processo para conseguir objetivo ilegal; opuser resistência injustificada ao andamento do processo; proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; provocar incidentes manifestamente infundados; e interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório expresso (art. 17).
Excetuadas as circunstâncias acima previstas, o exercício do direito de ação, perante a Justiça Estadual em detrimento do Juizado Especial, por si só, não se presta a caracterizar a litigância de má-fé.
In casu, vejo que a autora não incidiu em comportamento apto à subsunção a quaisquer das hipóteses de cabimento da condenação referida, razão pela qual a referida multa deve ser afastada.
Do mesmo modo, a concessão da justiça gratuita deve ser mantida, tendo em vista que não restou demonstrado nos autos a alteração daquela condição de hipossuficiência.
Ainda, o magistrado de primeiro grau revogou a gratuidade de justiça em razão de ter aplicado a multa de litigância de má-fé, ora afastada.
Na esteira da orientação jurisprudencial, tenho que a presunção relativa de hipossuficiência pode ser afastada mediante verificação, pelo magistrado, da possibilidade econômica do agravante em arcar com as custas do processo.
De fato, os arts. 5º e 6º da Lei nº 1.060/50 permitem ao magistrado indeferir os benefícios inerentes à assistência judiciária gratuita no caso de "fundadas razões". Permite, em consequência, que o Juiz que atua em contato direto com a prova dos autos, perquira acerca da real condição econômica do demandante.
Nesse sentido, precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça:
Dessa forma, à míngua de elementos que permitam afastar a presunção relativa de hipossuficiência, entendo de rigor a manutenção dos benefícios da justiça gratuita.
No mais, mantenho a condenação no pagamento das custas e demais despesas processuais e dos honorários advocatícios, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
Ante o exposto, dou parcial provimento à apelação tão somente para afastar a condenação da parte autora à multa por litigância de má-fé e para manter os benefícios da justiça gratuita, mantendo-se, no mais, a sentença proferida.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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