
| D.E. Publicado em 09/05/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação da parte autora, para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e julgar procedente o pedido inicial, condenando o INSS no pagamento do benefício da pensão por morte, a contar da citação (30/11/2004), bem como das parcelas em atraso, acrescidas de juros de mora, de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e de correção monetária de acordo com o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009; honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0029401-54.2007.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por JOSEFA CARNEIRO DOS SANTOS, em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício previdenciário da pensão por morte.
A r. sentença de fls. 79/81, julgou improcedente o pedido inicial, condenando a autora no pagamento das custas e despesas processuais, corrigidas desde o desembolso, e dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, exigíveis na forma da Lei nº 1.060/50.
Em razões recursais de fls. 86/87, postula a reforma da sentença e, consequentemente, a concessão do benefício previdenciário da pensão por morte, ao fundamento de ter comprovada a união estável.
Intimada, a autarquia apresentou contrarrazões às fls. 92/102.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido, aposentado ou não.
O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
O evento morte restou comprovado com a certidão de óbito de fl.10, na qual consta o falecimento do Sr. José dos Santos em 11/12/1995.
O requisito relativo à qualidade de segurado do de cujus restou incontroverso, considerando a concessão do benefício previdenciário da pensão por morte aos filhos Rafael Carneiro Santos, Roque Carneiro dos Santos, Gilberto Carneiro Santos, Jose Carneiro Santos e Josué Gonzaga Carneiro dos Santos (fl. 21), a Carteira de Trabalho - CTPS de fls. 12/14 e o extrato do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS que ora se anexa ao presente voto.
A celeuma cinge-se em torno da condição da parte autora como dependente do segurado.
A Lei de Benefícios, no art.16, com a redação dada pela Lei nº 9.032/95, vigente à época do óbito, prevê taxativamente as pessoas que podem ser consideradas dependentes, in verbis:
O §3º do art. 16 da Lei de Benefícios dispõe que: "Considera-se companheira ou companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal".
Por sua vez, o Decreto nº 3.048/99, no seu art. 16, § 6º, com a redação vigente à época do óbito, considera união estável "aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham prole em comum, enquanto não se separarem".
Já a Lei nº 9.278/96, que regulamenta o art. 226, § 3º da Constituição Federal, dispõe que: "É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família". Saliente-se que referido conceito consta da atual redação do §6º do art. 16 do RPS e no art. 1.723 do CC.
In casu, a parte autora e o de cujus separaram-se judicialmente em 18/02/1986, conforme averbação constante na certidão de casamento de fl. 09. Aduziu a autora, na inicial, que depois da separação, o Sr. José dos Santos passou a viver maritalmente com outra pessoa, e que, em meados de 1993, após contrair trombose, retornou a conviver consigo e com seus filhos.
A certidão de óbito e o documento de fl. 22 trazem como endereço do segurado falecido o mesmo da autora.
As testemunhas, Sra. Isabel Moreira Barbosa e Sra. Isaura Baldin Antunes de Lima, não obstante pequena contradição quanto à circunstância de quem sustentava o lar, declararam que o Sr. José dos Santos, após ficar doente, retornou a viver com a autora, a qual parou de trabalhar para cuidar dele (fls. 69/70).
A demandante, em depoimento pessoal, afirmou que o marido "teve problema de trombose, ficou internado teve que ser operado e eu que o acompanhei no hospital. Entre nossa 'reconciliação' e o óbito decorreram mais de um ano e meio" (sic - fl. 71).
Desta feita, comprovada para mim a condição de companheira da autora em relação ao de cujus.
Saliente-se que, segundo os dizeres de Maria Berenice Dias, "se pode afirmar que a união estável inicia de um vínculo afetivo. O envolvimento mútuo acaba transbordando o limite do privado, e as duas pessoas começam a ser identificadas no meio social como um par. Com isso o relacionamento se torna uma unidade. A visibilidade do vínculo o faz ente autônomo merecedor da tutela jurídica como uma entidade familiar. (...) Daí serem a vida em comum e a mútua assistência apontadas como seus elementos caracterizadores. Nada mais do que a prova da presença do enlaçamento de vida, do comprometimento recíproco" (Manual de direito das famílias, 11ª ed. rev., atual. e ampl.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016, pg. 246) (grifos no original).
Assim, tendo a Constituição Federal erigido a união estável ao status de entidade familiar e, sendo esta, atualmente, entendida com base nos laços de afetividade, não há como afastar o reconhecimento do instituto no caso em apreço, ante a clara demonstração de afeto, auxílio mútuo, assistência moral e convivência duradoura, pública e contínua.
A autora acolheu o ex-marido em sua residência - falecido segurado - enfermo, emprestando-lhe os cuidados necessários inerentes e necessários a um final de vida digno. Cuidava daquele que anos antes a abandonou, e assim foi por mais de ano, tendo inclusive, segundo o depoimento das testemunhas Isabel Moreira Barbosa e Isaura Baldin Antunes de Lima (fls. 69/70) deixado o seu último trabalho remunerado para lhe prestar assistência por mais de ano. Parece-me óbvio que, pela duração do casamento antes da separação, pelo número de filhos que tiveram na sua constância (oito - fl. 10), pelas circunstâncias do rompimento - em razão de outra mulher - a acolhida em casa do de cujus restabeleceu a situação jurídica familiar, que perdurou até o óbito. União estável pressupõe a criação de vínculos familiares duradouros, de cuidado, preocupação e assistência mútuas, compreensão, bem querer e afeto capaz de sepultar divergências pretéritas. Convenci-me à saciedade, de que isto existia entre a autora e seu falecido ex-marido/companheiro. Fraudes e oportunismos, reconheço, não têm aptidão de gerar efeitos jurídicos positivos aqueles envolvidos, mas, repiso, não se evidencia dos autos estas reprováveis situações.
Acresça-se, por oportuno, que, conforme ensinam Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Júnior, "o inciso V do art. 201 da CF consagrou o direito de pensão ao companheiro ou companheira, conceito que sem dúvida é mais amplo do que o de união estável" (Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social, 14ª ed. rev., atual. e ampl.. São Paulo: Atlas, 2016, pg. 113).
Por fim, não há que se falar em ausência de dependência econômica, isto porque há presunção legal (art. 16, §4º, da Lei nº 8.213/91) que só cederia mediante a produção de robusta prova em sentido contrário.
Neste sentido, já se posicionou o E. Superior Tribunal de Justiça:
Na situação concreta, ambas as testemunhas aduziram que a autora parou de trabalhar após o retorno do de cujus ao lar, sendo que a Sra. Isabel declarou acreditar que o marido é quem sustentava a casa, e a Sra. Isaura mencionou que a filha mais velha era quem laborava para o sustento do lar (fls. 69/70). Referida contradição não tem o condão de afastar eventual dependência sobretudo porque a afirmação de interrupção laboral restou confirmada pelo CNIS da demandante, no qual consta término de vínculo empregatício em 31/10/1994, período em que o segurado falecido já havia retornado ao convívio da autora.
Oportuno esclarecer que, diferentemente do alegado pela autarquia nas contrarrazões, a ausência de inscrição da requerente junto ao INSS, não impede seja ela considerada dependente, nem que efetue a sua inscrição após o falecimento do segurado.
O benefício da pensão por morte é devido desde a citação (30/11/2004 - fl. 31), ante a ausência de requerimento administrativo, inexistindo, na hipótese, retroação, eis que o INSS já pagava integralmente a pensão por morte aos filhos do segurado falecido, a qual cessou por completo em 28/04/2003, conforme CNIS em anexo.
Os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Já a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Em se tratando de beneficiário da assistência judiciária gratuita, não há custas, nem despesas processuais a serem reembolsadas.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial condenando o INSS no pagamento dos honorários advocatícios, em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas devidas até a sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente.
Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso de apelação da parte autora, para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e julgar procedente o pedido inicial, condenando o INSS no pagamento do benefício da pensão por morte, a contar da citação (30/11/2004), bem como das parcelas em atraso, acrescidas de juros de mora, de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e de correção monetária de acordo com o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009; honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 28/04/2017 10:33:08 |
