Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2297958 / SP
0008510-26.2018.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONVIVÊNCIA MARITAL.
COMPROVAÇÃO INVIABILIZADA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. MATÉRIA
FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. SENTENÇA
ANULADA. OITIVA DE TESTEMUNHAS. NECESSIDADE. APELAÇÃO DO INSS
PREJUDICADA.
1 - A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força
do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 74 a 79 da Lei nº
8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido,
aposentado ou não.
2 - O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência
do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a
manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter
preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das
aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
3 - A Lei de Benefícios, no art.16, com a redação originária, vigente à época do óbito, prevê
taxativamente as pessoas que podem ser consideradas dependentes.
4 - Por sua vez, o Decreto nº 3.048/99, no seu art. 16, § 6º, com a redação vigente à época do
óbito, considera união estável "aquela verificada entre o homem e a mulher como entidade
familiar, quando forem solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, ou tenham
prole em comum, enquanto não se separarem".
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
5 - Já a Lei nº 9.278/96, que regulamenta o art. 226, § 3º da Constituição Federal, dispõe que:
"É. reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um
homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família". Saliente-se que
referido conceito consta da atual redação do §6º do art. 16 do RPS e no art. 1.723 do CC.
6 - O evento morte da Sr.ª Maria da Silva Moraes, ocorrido em 17/07/2016, restou comprovado
com a certidão de óbito (fl. 22). O requisito relativo à qualidade de segurado do de cujus restou
incontroverso, considerando que a falecida era titular do benefício de aposentadoria por
invalidez na data do óbito, conforme demonstra extrato do Sistema Único de Benefícios (fl. 47).
7 - A celeuma diz respeito à condição do autor como dependente da segurada instituidora.
8 - Segundo os fatos narrados na inicial, o autor conviveu maritalmente com a falecida desde a
década de 60 até o seu óbito e, portanto, faria jus ao benefício de pensão por morte. A fim de
corroborar suas alegações, o demandante anexou cópia dos seguintes documentos: 1-
comprovantes de compra de eletrodomésticos, efetuada pela falecida nos anos de 2007 e 2008,
nos quais consta como endereço de entrega o domicílio do autor (fls. 24/25); 2 - contrato de
empréstimo consignado firmado pela falecida em 2007, no qual o demandante é qualificado
como seu cônjuge (fls. 26/27).
9 - Em que pesem tais documentos possam ser considerados indícios materiais da convivência
marital entre o autor e o de cujus - já que indicam a provável coabitação e publicidade do
vínculo marital entre os anos de 2007 e 2008 -, eles não comprovam, por si só, que tal
convivência perdurou por mais nove anos até o falecimento da segurada instituidora, em 2016.
Aliás, na ficha proposta de empréstimo pessoal preenchida em 03/04/2012, o autor deixou em
branco o campo "cônjuge" e informou que seu estado civil era "solteiro" à época (fls. 31/32).
10 - Assim, no que tange à comprovação da qualidade de dependente do autor, careciam estes
autos da devida instrução em Primeira Instância, pois a sentença apreciou o pedido posto na
inicial sem a inquirição de testemunhas que corroborassem a natureza e a duração do vínculo
afetivo entre a falecida e o demandante.
11 - Seria aceitável a dispensa da referida oitiva, caso esta não se mostrasse relevante à
formação da convicção e ao deslinde da causa. Nesse sentido, preconiza o artigo 370 do
Código de Processo Civil de 2015.
12 - O julgamento de mérito, sem a elaboração de prova indispensável para a apreciação do
pretendido direito, não satisfaz legalmente às exigências do devido processo legal, ainda mais
quando a parte autora protestou pela realização de prova oral apta a esclarecer o vínculo
afetivo entre ele e a falecida.
13 - Referida nulidade não pode ser superada, eis que, na ausência de oitiva de testemunhas
que corroborem o início de prova material, impossível a constatação da existência, ou não, da
convivência marital entre a parte autora e o de cujus no momento do óbito, a fim de aferir
eventual direito ao benefício vindicado.
14 - Sentença anulada de ofício. Apelação do INSS prejudicada.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, anular, de ofício, a r.
sentença vergastada, determinando o retorno dos autos ao Juízo 'a quo' para regular
processamento do feito, com a realização de oitiva de testemunhas, a fim de esclarecer a
existência, ou não, de convivência marital entre o demandante e a falecida na data do óbito, e a
prolação de novo julgamento acerca do direito do autor ao benefício vindicado, dando por
prejudicada a apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
