
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006018-95.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: SAID MOHAMED ALMEIDA INACIO
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO VIDOTTI FAVARON - SP143716-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006018-95.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: S. M. A. I.
Advogado do(a) APELANTE: FERNANDO VIDOTTI FAVARON - SP143716-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
"Art. 33. A guarda obriga a prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.
§ 1º A guarda destina-se a regularizar a posse de fato, podendo ser deferida, liminar ou incidentalmente, nos procedimentos de tutela e adoção, exceto no de adoção por estrangeiros.
§ 2º Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.
§ 3º A guarda confere à criança ou adolescente a condição de dependente, para todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários".
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DE AGRAVO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 11.187/05. PROCESSAMENTO NA FORMA DE INSTRUMENTO. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ARTIGO 527, II, DO CPC. TUTELA ANTECIPADA. PENSÃO POR MORTE. NETA DE EX-PENSIONISTA. QUALIDADE DE DEPENDENTE RECONHECIDA. VEROSSIMILHANÇA DA EXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COM O EX-SEGURADO INSTITUIDOR DO BENEFÍCIO. APLICAÇÃO DO § 3º DO ARTIGO 33 DA LEI Nº 8.069/90 (ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE). PRELIMINAR REJEITADA. RECURSO PROVIDO.
(...)
IV - Os elementos de convicção coligidos no instrumento permitem inferir a verossimilhança do pedido, na medida em que a certidão de óbito da avó afirma o convívio desta em matrimônio com o segurado até o seu óbito, sendo que a inicial é expressa em afirmar que a agravada foi acolhida pela avó ainda em tenra idade, de maneira a evidenciar o convívio também com o segurado instituidor da pensão por morte e em período em muito anterior à concessão da sua guarda judicial à avó, com o que se deflui que a agravada, a priori, mantinha vínculo de dependência econômica com o segurado instituidor da pensão por morte, fazendo jus, portanto, à qualificação como dependente deste e à percepção do benefício.
V - O § 3º do artigo 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90) assegura ao menor sob guarda a condição de dependente pra todos os fins e efeitos de direito, inclusive previdenciários, de tal forma que a proteção previdenciária, ainda que fora da legislação especial de regência da previdência social, estaria assegurada na hipótese vertente, em contraposição ao artigo 16, § 2º da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 9.528/97, que excluiu o menor sob guarda judicial como dependente de segurado da previdência social.
VI - Conflito aparente de normas afastado mediante a compreensão das referidas leis sob a ótica da proteção social garantida à criança e ao adolescente pela Constituição Federal, segundo a qual tanto a proteção social como a seguridade social são instrumentos da Ordem Social destinados ao alcance do bem-estar social e do bem comum (arts. 194 a 204 e 226 a 230), de tal forma que, em sendo normas da mesma espécie, pois ambas dispõem sobre proteção social, e da mesma hierarquia, pois são leis ordinárias, aplica-se aquela que dá maior proteção social, com o que, mesmo sem direito adquirido, o menor sob guarda judicial é dependente para fins previdenciários.
VII - Preliminar afastada. Agravo de instrumento improvido".
(DJU 19.10.2006, p. 727).
"DIREITO CIVIL. PÁTRIO PODER. DEVER IRRENUNCIÁVEL E INDELEGÁVEL. DESTITUIÇÃO. CONSENTIMENTO DA MÃE. IRRELEVÂNCIA. HIPÓTESES ESPECÍFICAS. ART. 392 DO CÓDIGO CIVIL. CONTRADITÓRIO. NECESSIDADE. ARREPENDIMENTO POSTERIOR. ADOÇÃO. SITUAÇÃO DE FATO CONSOLIDADA. SEGURANÇA JURÍDICA. INTERESSES DO MENOR. ORIENTAÇÃO DA TURMA. PRECEDENTES. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I - O pátrio poder, por ser "um conjunto de obrigações, a cargo dos pais, no tocante à pessoas e bens dos filhos menores" é irrenunciável e indelegável. Em outras palavras, por se tratar de ônus, não pode ser objeto de renúncia. II - As hipóteses de extinção do pátrio poder estão previstas no art. 392 do Código Civil e as de destituição no 395, sendo certo que são estas exaustivas, a dependerem de procedimento próprio, previsto nos arts. 155/163 do Estatuto da Criança e do Adolescente, consoante dispõe o art. 24 do mesmo diploma. III - A entrega do filho pela mãe pode ensejar futura adoção (art. 45 do Estatuto), e, conseqüentemente, a extinção do pátrio poder, mas jamais pode constituir causa para a sua destituição, sabido, ademais, que "a falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio poder" (art. 23 do mesmo diploma) IV - Na linha de precedente desta Corte, "a legislação que dispõe sobre a proteção à criança e ao adolescente proclama enfaticamente a especial atenção que se deve dar aos seus direitos e interesses e à hermenêutica valorativa e teleológica na sua exegese". V - Situação de fato consolidada enseja o provimento do recurso a fim de que prevaleçam os superiores interesses do menor" (STJ, 4ª Turma, REsp 158920, relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 24.05.1999)
"O menor sob guarda tem direito à concessão do benefício de pensão por morte do seu mantenedor, comprovada a sua dependência econômica
"[...] Deve ser exigida, porém, como requisito à concessão do benefício, a comprovação da dependência econômica, em relação ao falecido segurado Essa exigência, por certo, pode evitar eventuais abusos, pois, se apesar da guarda, restar comprovado que o menor não dependia economicamente do instituidor da pensão, não deverá ser concedido o benefício
"PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. PENSÃO POR MORTE DA AVÓ. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL E DA GUARDA DE FATO.
1. A situação de dependência econômica, por si só, não se presta para justificar o enquadramento de alguém como dependente para fins previdenciários. A dependência econômica efetiva somente tem relevância jurídica se houver possibilidade de enquadramento em uma das hipóteses previstas na legislação de regência (art. 16 da Lei 8.213/91).
2. O conjunto probatório dos autos não autoriza a caracterização de uma eventual guarda de fato exercida pela avó.
3. A guarda pressupõe a orfandade ou, quando menos, a destituição do pátrio poder. De guarda (ou mesmo tutela) de fato, pois, somente se poderia cogitar, em se tratando de menor não tem pai ou mãe, e é criado e mantido por outra pessoa. Ou, ainda, de menor que informalmente foi colocado em família substituta. Nas situações em que o menor convive, ainda que esporadicamente, com seus pais, mas é mantido economicamente por outra pessoa, não se pode cogitar de tutela ou guarda de fato. Há, pura e simplesmente, dependência econômica. Dependência econômica, todavia, não é hipótese de dependência para fins previdenciários (art. 16 da Lei 8.213/91). Fosse assim, a qualidade de dependente para fins previdenciários poderia ser alegada em relação a qualquer pessoa, mesmo sem vínculo de parentesco."
(TRF 4ª Região, Embargos Infringentes em Apelação Cível 2006.72.990007038/SC, rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, 3ª Seção, DJU de 14.03.2007)
Em decorrência, não estando preenchidos todos os requisitos necessários à concessão do benefício, inviável o acolhimento do pedido inicial, sendo de rigor a improcedência.
Ante o exposto,
nego provimento
ao recurso de apelação da parte autora e, em atenção ao disposto no artigo 85, §11, do CPC, majoro os honorários advocatícios em 2% (dois por cento), respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo, devendo o demandante oportunamenteregularizar sua representação processual
, uma vez que já atingiu a maioridade civil.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MENOR SOB GUARDA. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA NÃO COMPROVADA. ARTIGO 16, § 2º DA LEI Nº 8.213/91. REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 9.528/97. EXCLUSÃO DO MENOR SOB GUARDA JUDICIAL COMO DEPENDENTE DE SEGURADO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM SEDE RECURSAL.
1 - A condição de dependente é verificada com amparo no rol estabelecido pelo art. 16 da Lei de Benefícios, segundo o qual possuem dependência econômica presumida: o cônjuge, o(a) companheiro(a) e o filho menor de 21 (vinte e um) anos, não emancipado ou inválido. Também ostentam a condição de dependente do segurado, desde que comprovada a dependência econômica, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
2 - De acordo com o §2º do supramencionado artigo, o enteado e o menor tutelado são equiparados aos filhos mediante declaração do segurado e desde que comprovem a dependência econômica.
3 - Impende considerar, aprioristicamente, que o menor sob guarda deixou de ser considerado dependente com a edição da Medida Provisória n.º 1.523, de 11 de outubro de 1996, a qual foi convertida na Lei n.º 9.528/97.
4 - O artigo 33, § 3º, do ECA (Lei n.º 8.069/90) confere ao menor sob guarda, inclusive para fins previdenciários, a qualidade de dependente; contudo, deve se manter em vista o fato de que o requisito legal, para a finalidade de se determinar a qualidade de dependente no âmbito do RGPS, é a situação de dependência econômica em relação ao segurado (artigo 16, §§ 2º e 4º, da LBPS), o que, no caso do menor sob guarda, deve ser avaliada também quanto à ausência de capacidade dos pais do menor para prover sua assistência material, eis que ilegítima a tentativa de transmissão ao Estado, na condição de representante da coletividade, do dever legal de prover o sustento dos filhos (artigo 1.697 do CC).
5 - Aliás, a concessão de guarda aos avós, quando vivo(s) algum(s) do(s) pais, seria excepcionalíssima, e somente nos casos justificados por lei, pois o pátrio poder - e as obrigações a ele inerentes - é irrenunciável.
6 - A aplicação de tal entendimento procede-se mediante a verificação fática da dependência econômica do menor sob guarda, uma vez que os comandos legais em comento não estão a colidir, senão a trazer equilíbrio jurídico à relação intersubjetiva que se estabelece entre o menor e o Instituto Autárquico, visto que ambos são detentores de direitos indisponíveis.
7 - O art. 33 do Estatuto da Criança e do Adolescente e o § 2º do art. 16 da Lei de Benefícios, com redação alterada pela Lei 9.528/97, não discrepam na essência, embora o enfoque teleológico de cada dispositivo seja diverso. Ou seja, enquanto ambas as normas encontram seu nascedouro nos princípios constitucionais de proteção à Ordem Social, é certo que o art. 33 da Lei 8.069/90, tem sua tônica na tutela dos interesses do menor, enquanto o § 2º do art. 16 da Lei de Benefícios ressalta a necessidade de verificação de dependência econômica, a fim de não a ter por presumida.
8 - Portanto, mister se faz análise individualizada de cada situação fática, no intuito de se adequar à legislação aplicável.
9 - O óbito da avó, Srª. Jerônima Feliciano Almeida, ocorrido em 18/11/2014, está comprovado pela certidão de óbito. Também restou superado o requisito da qualidade de segurado da falecida, uma vez que ela usufruía do benefício de aposentadoria por idade à época do passamento (NB 085814875-7), de acordo com o extrato do CNIS anexado aos autos.
10 - Foi anexada ainda cópia da sentença prolatada pela 2ª Vara Cível da Comarca de Monte Aprazível, prolatada em 17/03/2006, na qual o Juízo homologou o acordo firmado entre os pais e a falecida, a fim de transferir a esta última a guarda do demandante.
11 - Todavia, não restou comprovada a dependência econômica do autor em relação ao
de cujus
. O extrato do CNIS anexado aos autos revela que a mãe do autor mantinha vínculo empregatício formal com empresa de construção civil por ocasião do óbito da guardiã, em 2014.12 - Ademais, extrai-se do pedido de entrega de guarda que a única finalidade de tal medida era viabilizar o exercício da atividade profissional dos pais, sem prejuízo à educação e à estabilidade social e afetiva do demandante. Jamais se alegou que os genitores não tinham condições materiais de assegurar-lhe a subsistência. A propósito, consta da proposta de acordo firmada na citada demanda de transferência de guarda que os pais se comprometeriam a pagar à falecida prestações alimentícias, equivalentes a "
1/3 do salário mínimo, a ser pago todo dia 10 de cada mês
", além de ajudarem a custear "vestuário, remédios, despesas com escola, tudo o que tiver relacionado com seu filho
".13 - Ora, a concessão de guarda não desobriga os pais dos menores das obrigações inerentes a seu pátrio poder, de sorte que, ainda que sob os cuidados do guardião, os menores tem o direito de ter alimentos prestados por seus genitores. Não é demais lembrar que o instituto de guarda não implica mera assistência material, mas, também, moral e educacional.
14 - Portanto, a avaliação sobre a necessidade de acolhimento do menor aos cuidados de guardião não se limita à capacidade econômica dos genitores de proverem o sustento material de seus filhos.
15 - De outro lado, a comprovação de dependência econômica perpassa tão somente sob o aspecto material. Vale dizer, se os genitores (pai e mãe) do menor sob guarda, os quais tem o dever legal de prestar alimentos, possuem condições econômicas de fazê-lo, tal como claramente se verifica no caso concreto, não se caracteriza efetiva dependência econômica dos menores em relação ao guardião.
16 - Não parece ser possível, em interpretação sistemática do ordenamento jurídico pátrio, utilizar-se o Regime Geral Previdenciário para substituir dever legal imposto aos pais, de manutenção dos filhos. Aliás, esta foi a razão da alteração legislativa imprimida pelo legislador ordinário.
17 - Desta forma, possuindo o autor mãe e pais vivos, cabia a eles o poder familiar, de onde decorria a dependência econômica para fins previdenciários. Precedente.
18 - Em decorrência, não estando preenchidos todos os requisitos necessários à concessão do benefício, inviável o acolhimento do pedido inicial, sendo de rigor a improcedência.
19 - Majoração dos honorários advocatícios nos termos do artigo 85, §11, CPC, respeitados os limites dos §§2º e 3º do mesmo artigo.
20 - Apelação do autor desprovida. Sentença mantida. Ação julgada improcedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso de apelação da parte autora e, em atenção ao disposto no artigo 85, §11, do CPC, majorar os honorários advocatícios em 2% (dois por cento), respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo, devendo o demandante oportunamente regularizar sua representação processual, uma vez que já atingiu a maioridade civil, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
