Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5002013-81.2018.4.03.6127
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
08/11/2019
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 22/11/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO/PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO RECEBIDA
NO EFEITO SUSPENSIVO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
ATINGIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO COMPROVADA.
APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. TUTELA REVOGADA.
1. Em sede preliminar, não entendo que a imediata execução da sentença ora recorrida resulte,
necessariamente, em lesão grave ou de difícil reparação à Previdência Social, uma vez que se
deve observar que, no presente caso, colidem o bem jurídico vida e o bem jurídico pecuniário, daí
porque aquele primeiro é que deve predominar, mesmo porque, embora, talvez, não seja,
realmente, possível a restituição dos valores pagos a título de tutela antecipada, se não
confirmada a r. sentença em grau recursal, ainda será factível a revogação do benefício
concedido, impedindo, destarte, a manutenção da produção de seus efeitos. Além disso, ao
menos em sede de cognição primária, verifico não ter sido apresentada pela parte apelante
qualquer fundamentação relevante que ensejasse a atribuição de efeito suspensivo à apelação,
nos termos do artigo 1012, § 4º, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual deve ser o seu
pedido indeferido, rejeitando a preliminar arguida.
2. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
corroborado por prova testemunhal.
3. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
4. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
5. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
6. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
7. Feitas tais considerações, entendo que não restou configurado nos autos o direito do autor à
benesse vindicada, pois o que se verifica do processado não é a simples realização de eventual
trabalho urbano por curto interregno, mas de verdadeira alternância do autor em atividades
urbanas e rurais para fins de subsistência, situação essa que desqualifica sua condição de mero
trabalhador rural, não fazendo jus à redução de idade prevista na legislação de regência. Dessa
forma, diante do que consta do conjunto probatório, entendo que não restaram configurados os
requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, de modo que a reforma integral da r.
sentença é medida que se impõe.
8. Revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, determinando a imediata
cessação do benefício concedido pela r. sentença. Expeça-se ofício ao INSS, com os
documentos necessários, para as providências cabíveis, independentemente do trânsito em
julgado. A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela
parte autora deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução, após a eventual revisão do
entendimento firmado no Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de
Justiça.
9. Apelação do INSS provida. Tutela revogada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002013-81.2018.4.03.6127
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO INACIO BENTO
Advogados do(a) APELADO: NATALIA ALVES DA CUNHA - MG155863-A, FERNANDO DE
PAIVA RESTIFFE - SP209626-A, MARCOS OLIMPIO DE ANDRADE LOPES DA SILVA -
SP314933-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002013-81.2018.4.03.6127
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO INACIO BENTO
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SP314933-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
procedente o pedido inicial, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 487, I, do Código de
Processo Civil de 2015, para o fim de condenar o INSS a conceder à parte autora o benefício de
aposentadoria por idade de trabalhador rural, com data de início (DIB) em 26/05/2015, data do
requerimento administrativo (NB 41/161.818.805-1) e renda mensal inicial (RMI) de um salário
mínimo. Deferiu a tutela provisória e determinou ao INSS a implantação da benesse requerida.
Determinou que os valores em atraso deverão ser pagos após o trânsito em julgado, descontadas
eventuais quantias pagas administrativamente ou por força da antecipação dos efeitos da tutela, a
serem atualizados monetariamente a partir do vencimento e acrescidos de juros de mora a partir
da data da citação, de acordo com os critérios previstos no Manual de Cálculos da Justiça
Federal. Condenou o INSS, por fim, a pagar honorários advocatícios correspondentes a 10% do
valor da condenação, nos termos do art. 85, 2º e 3º, I do Código de Processo Civil.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Requer a Autarquia apelante, preliminarmente, a concessão de efeito suspensivo ao recurso,
considerando a tutela concedida no processado e o perigo de irreversibilidade do provimento. No
mérito, em apertada síntese, sustenta que a parte autora não comprovou o exercício de atividade
campesina durante o período de carência exigido pela Lei de Benefícios e nem no período
imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, salientando, ainda, a alternância de
atividades rurais e urbanas exercidas pelo autor durante sua vida laboral. Subsidiariamente,
pleiteia a alteração dos consectários legais aplicados e da verba honorária fixada.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
Convertido o feito em diligência para que fossem colacionados documentos legíveis, tal
providência foi atendida.
É o sucinto relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002013-81.2018.4.03.6127
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOAO INACIO BENTO
Advogados do(a) APELADO: NATALIA ALVES DA CUNHA - MG155863-A, FERNANDO DE
PAIVA RESTIFFE - SP209626-A, MARCOS OLIMPIO DE ANDRADE LOPES DA SILVA -
SP314933-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Em sede preliminar, não entendo que a imediata execução da sentença ora recorrida resulte,
necessariamente, em lesão grave ou de difícil reparação à Previdência Social, uma vez que se
deve observar que, no presente caso, colidem o bem jurídico vida e o bem jurídico pecuniário, daí
porque aquele primeiro é que deve predominar, mesmo porque, embora, talvez, não seja,
realmente, possível a restituição dos valores pagos a título de tutela antecipada, se não
confirmada a r. sentença em grau recursal, ainda será factível a revogação do benefício
concedido, impedindo, destarte, a manutenção da produção de seus efeitos.
Além disso, ao menos em sede de cognição primária, verifico não ter sido apresentada pela parte
apelante qualquer fundamentação relevante que ensejasse a atribuição de efeito suspensivo à
apelação, nos termos do artigo 1012, § 4º, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual deve
ser o seu pedido indeferido, rejeitando a preliminar arguida.
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o no efeito devolutivo (considerando a tutela
concedida no processado), devendo ser apreciado nos termos do artigo 1.011 do Código de
Processo Civil.
A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55 anos,
se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de atividade
rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal. Ademais, para a concessão de benefícios rurais, houve um
abrandamento no rigorismo da lei quanto à comprovação da condição de rurícola dos
trabalhadores do campo, permitindo-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até
mesmo dos pais aos filhos, ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou conviventes, aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da
atividade campesina não tenha se dado sob o regime de economia familiar.
Cumpre ressaltar que, em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social,
não se pode exigir dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições
previdenciárias, quando é de notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são
desenvolvidas, cumprindo aqui dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma
subordinação, haja vista que a contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos
chamados "gatos". Semelhante exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores
qualquer possibilidade de auferir o benefício conferido, em razão de sua atividade.
O art. 143 da Lei n.º 8.213/1991, com a redação dada pela Lei n.º 9.063, de 28.04.1995, dispõe
que: "O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de
Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei,
pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante 15 (quinze) anos,
contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade
rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício,
em número de meses idêntico à carência do referido benefício".
Quanto a se provar o efetivo exercício de atividade rural, o Superior Tribunal de Justiça considera
prescindível a abrangência de todo o período de carência previsto no art. 142 da Lei de
Benefícios pela prova material, desde que a prova testemunhal demonstre sua solidez, permitindo
sua vinculação ao tempo de carência. Tal solução, conhecida como "pro misero", se dá em
virtude da precariedade dos registros de vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda
comum em tempos recentes e bastante disseminada em outras épocas.
Saliento, ainda, que, segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp
1354908, em sede de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo
no momento em que completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade,
a fim de atender ao segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o
segurado especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
No caso dos autos, a parte autora, nascida em 20/06/1962, comprovou o cumprimento do
requisito etário no ano de 2012. Assim, considerando que o implemento do requisito em questão
se deu quando já havia encerrado a prorrogação prevista no art. 143, da Lei de Benefícios, é
necessário, após 31/12/2010, a comprovação do recolhimento de contribuições para os
empregados rurais, trabalhadores avulsos e diaristas e o cumprimento da carência de 180 meses,
a teor do que dispõe o art. 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91, existindo a necessidade de
comprovação de recolhimentos de contribuições previdenciárias a fim de ser concedido o
benefício.
Antes de analisar os requisitos relativos à qualidade de segurado e ao cumprimento da carência,
cumpre salientar que o esgotamento do prazo acima referido não constitui óbice à percepção de
benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo, nos termos do disposto no art. 39, I, da
Lei nº 8.213/91.
No entanto, o exercício de atividades rurais relativo ao período encerrado em 31/12/2010 há de
ser comprovado de igual modo, ou seja, bastando a apresentação de início de prova material
corroborada por testemunhos. E, quanto ao período posterior, iniciado em 01/01/2011 até
31/12/2015, o labor rural deve ser comprovado por prova material, não bastando o início de
prova, correspondendo cada mês comprovado a três meses de carência, limitados a 12 meses
dentro do ano civil. E a partir de 01/01/2016 até 31/12/2020, o labor rural deve ser comprovado da
forma anteriormente consignada, correspondendo cada mês comprovado, agora, a dois meses de
carência, limitados a 12 meses dentro do ano civil, conforme as regras introduzidas pela Lei
11.718/08, em seu art. 2º, parágrafo único e art. 3º, incisos I, II e III
Em suma, considera-se que a simples limitação temporal das regras prescritas pelo art. 143 da
Lei de Benefícios, por si só, não obsta a comprovação do exercício de atividades rurais nem a
percepção do benefício, desde que comprovado os recolhimentos obrigatórios, que passaram a
ser exigidos após o advento das novas regras introduzidas pela Lei nº 11.718/08.
E no que tange ao exercício de atividade rural, para fins de comprovação de início de prova
material, a parte autora apresentou, entre outros parcos documentos, suas CTPS’s, contendo os
seguintes vínculos laborais:
1 – Citsal – Comércio – Industria e Representações – de 02/04/1984 a 17/10/1984 – Auxiliar de
Armazém;
2 - Citsal – Comércio – Industria e Representações – de 02/05/1990 a 06/07/1990 – Ensacador;
3 – Alexis Hakin Filho – Sítio São José dos Pinhais – de 01/05/1991 a 06/05/1993 – Serviços
Gerais (agricultura);
4 – Marcelo Mancini Nogueira – Sítio da Serra – de 03/01/1994 a 02/03/1995 - Serviços Gerais
(pecuária);
5 – Paulo Fernando Ribeiro – Sítio Santa Luzia – de 01/11/1995 a 16/09/1997 - Serviços Gerais
(agropecuária);
6 – José Pessanha – Fazenda Santa Alice Aliança – de 02/08/1999 a 30/11/1999 - Serviços
Gerais (agropecuária);
7 – Airton Reis Scanavachi – Sítio Santo Antônio – de 02/05/2000 a 24/09/2001 - Safrista;
8 – Cafés Bom Retiro Ltda – Empreendimento Agrícola - Contrato por Prazo Determinado – de
09/08/2006 a 15/09/2006;
9 – Fazenda Aliança Ltda – de 21/05/2007 a 01/06/2007 – Trabalhador Rural Safrista;
10 – Luiz Antônio Fernandes Valente – Fazenda Santa Efigênia – Trabalhador na Cultura de Café
- de 01/06/2008 a 24/10/2008
11 – Neria Binatti Canella ME – Plantador de Grama – de 17/11/2008 a 13/12/2009;
12 – Francisco Donizetti Lopes – Servente de Pedreiro – de 15/12/2009 a 31/05/2010;
13 – Rodrigo Duarte – Servente de Obras – de 04/04/2012 a 31/10/2012;
14 – Rodrigo Duarte - Servente de Obras – de 01/11/2012 a 14/08/2013;
15 – Galvani Agropecuária – Safrista – de 02/05/2014 a 14/08/2014;
16 – Izidoro Corso e outros – Trabalhador Volante da Agricultura – de 10/12/2014 a 22/02/2016;
17 – Janaína Garbossa Mazi Bittar e outras – Trabalhador Rural – de 01/03/2017 a 12/05/2017;
18 – Natalino Trevisan Júnior – Trabalhador na safra de café – de 15/05/2017 a 31/08/2017.
Quanto à prova testemunhal, pacificado no C. Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que
apenas esta não basta, isoladamente, para a comprovação da atividade rural, requerendo a
existência de início razoável de prova material, conforme entendimento cristalizado na Súmula
149, que assim dispõe: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da
atividade rurícola, para efeito da obtenção do benefício previdenciário". E, por ocasião da
realização de depoimento pessoal do requerente e das testemunhas arroladas, observa-se que
tanto o autor, como também a testemunha Elpio Recchia, confirmaram o exercício de atividades
urbanas do postulante como servente de pedreiro (“bicos”), em períodos onde não consegue
trabalho no campo, a fim de sustentar sua família.
Pois bem.
Feitas tais considerações, entendo que não restou configurado nos autos o direito do autor à
benesse vindicada, pois o que se verifica do processado não é a simples realização de eventual
trabalho urbano por curto interregno, mas de verdadeira alternância do autor em atividades
urbanas e rurais para fins de subsistência, situação essa que desqualifica sua condição de mero
trabalhador rural, não fazendo jus à redução de idade prevista na legislação de regência.
Dessa forma, diante do que consta do conjunto probatório, entendo que não restaram
configurados os requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, de modo que a
reforma integral da r. sentença é medida que se impõe.
Saliento, pois pertinente, que deixo de analisar os requisitos para eventual concessão de
aposentadoria por idade na modalidade híbrida em razão de que, na distribuição do feito, a parte
autora não possuía o requisito etário necessário.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários
advocatícios fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja exigibilidade observará o disposto no artigo
12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de Processo Civil/2015), por ser a autora
beneficiária da justiça gratuita.
Por fim, revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, determinando a
imediata cessação do benefício concedido pela r. sentença. Expeça-se ofício ao INSS, com os
documentos necessários, para as providências cabíveis, independentemente do trânsito em
julgado.
A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela parte autora
deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução, após a eventual revisão do entendimento firmado no
Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça.
Por esses fundamentos, rejeito a preliminar e dou provimento à apelação do INSS, conforme ora
consignado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO/PROCESSUAL CIVIL. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO RECEBIDA
NO EFEITO SUSPENSIVO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS NÃO
ATINGIDOS. ATIVIDADE RURAL PELO PERÍODO DE CARÊNCIA NÃO COMPROVADA.
APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. TUTELA REVOGADA.
1. Em sede preliminar, não entendo que a imediata execução da sentença ora recorrida resulte,
necessariamente, em lesão grave ou de difícil reparação à Previdência Social, uma vez que se
deve observar que, no presente caso, colidem o bem jurídico vida e o bem jurídico pecuniário, daí
porque aquele primeiro é que deve predominar, mesmo porque, embora, talvez, não seja,
realmente, possível a restituição dos valores pagos a título de tutela antecipada, se não
confirmada a r. sentença em grau recursal, ainda será factível a revogação do benefício
concedido, impedindo, destarte, a manutenção da produção de seus efeitos. Além disso, ao
menos em sede de cognição primária, verifico não ter sido apresentada pela parte apelante
qualquer fundamentação relevante que ensejasse a atribuição de efeito suspensivo à apelação,
nos termos do artigo 1012, § 4º, do Código de Processo Civil, motivo pelo qual deve ser o seu
pedido indeferido, rejeitando a preliminar arguida.
2. A aposentadoria por idade de rurícola reclama idade mínima de 60 anos, se homem, e 55
anos, se mulher (§ 1º do art. 48 da Lei nº 8.213/91), além da demonstração do exercício de
atividade rural, bem como o cumprimento da carência mínima exigida no art. 142 da referida lei.
De acordo com a jurisprudência, é suficiente a tal demonstração o início de prova material
corroborado por prova testemunhal.
3. Permite-se a extensão dessa qualidade do marido à esposa, ou até mesmo dos pais aos filhos,
ou seja, são extensíveis os documentos em que os genitores, os cônjuges, ou conviventes,
aparecem qualificados como lavradores, ainda que o desempenho da atividade campesina não
tenha se dado sob o regime de economia familiar.
4. Em face do caráter protetivo social de que se reveste a Previdência Social, não se pode exigir
dos trabalhadores campesinos o recolhimento de contribuições previdenciárias, quando é de
notório conhecimento a informalidade em que suas atividades são desenvolvidas, cumprindo aqui
dizer que, sob tal informalidade, verifica-se a existência de uma subordinação, haja vista que a
contratação acontece diretamente pelo produtor rural ou pelos chamados "gatos". Semelhante
exigência equivaleria a retirar dessa classe de trabalhadores qualquer possibilidade de auferir o
benefício conferido, em razão de sua atividade.
5. O Superior Tribunal de Justiça considera prescindível a abrangência de todo o período de
carência previsto no art. 142 da Lei de Benefícios pela prova material, desde que a prova
testemunhal demonstre sua solidez, permitindo sua vinculação ao tempo de carência. Tal
solução, conhecida como "pro misero", se dá em virtude da precariedade dos registros de
vínculos trabalhistas nas áreas rurais, prática ainda comum em tempos recentes e bastante
disseminada em outras épocas.
6. Segundo o recente entendimento adotado pelo STJ no julgamento do REsp 1354908, em sede
de recurso repetitivo, o segurado especial deve estar trabalhando no campo no momento em que
completar a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural por idade, a fim de atender ao
segundo requisito exigido pela Lei de Benefícios: "período imediatamente anterior ao
requerimento do benefício", ressalvada a hipótese de direito adquirido, na qual o segurado
especial, embora não tenha ainda requerido sua aposentadoria por idade rural, já tenha
preenchido concomitantemente, no passado, ambos os requisitos - carência e idade.
7. Feitas tais considerações, entendo que não restou configurado nos autos o direito do autor à
benesse vindicada, pois o que se verifica do processado não é a simples realização de eventual
trabalho urbano por curto interregno, mas de verdadeira alternância do autor em atividades
urbanas e rurais para fins de subsistência, situação essa que desqualifica sua condição de mero
trabalhador rural, não fazendo jus à redução de idade prevista na legislação de regência. Dessa
forma, diante do que consta do conjunto probatório, entendo que não restaram configurados os
requisitos necessários à concessão da benesse vindicada, de modo que a reforma integral da r.
sentença é medida que se impõe.
8. Revogo a antecipação dos efeitos da tutela anteriormente concedida, determinando a imediata
cessação do benefício concedido pela r. sentença. Expeça-se ofício ao INSS, com os
documentos necessários, para as providências cabíveis, independentemente do trânsito em
julgado. A questão relativa à obrigatoriedade ou não de devolução dos valores recebidos pela
parte autora deverá ser dirimida pelo Juízo da Execução, após a eventual revisão do
entendimento firmado no Tema Repetitivo 692 pela C. Primeira Seção do Superior Tribunal de
Justiça.
9. Apelação do INSS provida. Tutela revogada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar e dar provimento à apelação do INSS, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
