
2ª Turma
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5011226-69.2020.4.03.6183
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
PARTE AUTORA: FRANCISCO JAVIER GONZALEZ GIL
Advogado do(a) PARTE AUTORA: EDSON MACHADO FILGUEIRAS JUNIOR - SP198158-A
PARTE RE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
2ª Turma
REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 5011226-69.2020.4.03.6183
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
PARTE AUTORA: FRANCISCO JAVIER GONZALEZ GIL
Advogado do(a) PARTE AUTORA: EDSON MACHADO FILGUEIRAS JUNIOR - SP198158-A
PARTE RE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Trata-se de mandado de segurança impetrado por FRANCISCO JAVIER GOLZALEZ GIL, com o objetivo de obter ordem para que a impetrada recalcule a indenização para a obtenção de certidão de contagem de tempo de serviço referente ao período compreendido entre outubro de 1994 a março de 2003, com base na legislação vigente à época dos fatos geradores.
Denegada a segurança e decorrido o prazo para a interposição de recursos voluntários, os autos subiram a esta E. Corte por força da remessa oficial. Em 05/12/2023, a Segunda Turma, por maioria, deu provimento à remessa oficial para anular a sentença (ID 283498899).
A parte autora opôs embargos de declaração, pendentes de julgamento. Em petição apresentada em 19/07/2024, aduz erro de procedimento, uma vez que a competência para o julgamento do presente feito, em segundo grau, seria da Terceira Seção. Informa que a natureza previdenciária da ação foi reconhecida no Conflito de Competência nº. 5005053-17.2021.4.03.000, no qual restou estabelecida a competência da 9ª Vara Previdenciária (ID 294110140).
É o relatório.
Q U E S T Ã O D E O R D E M
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): O contribuinte individual (figura jurídica que inclui o trabalhador autônomo) está sujeito ao recolhimento compulsório de contribuições previdenciárias que, ao mesmo tempo, servem para cálculos pertinentes a benefícios do Regime Geral de Previdência Social do INSS (ou para eventual aproveitamento em regime próprio do serviço público). Se configurada a decadência em relação a essas obrigações tributárias, o Fisco não poderá exigi-las mas o não recolhimento dessas imposições pretéritas impede que o contribuinte individual tenha plenos efeitos em pleitos previdenciários.
Embora seja certo que não se trate de tributo, sendo controversa a existência de típica obrigação de indenizar (já que, se assim fosse, o erário poderia ativamente exigir esse pagamento ao invés de decorrer de providência reclamada inicialmente pelo trabalhador), esse recolhimento das contribuições correspondentes visando efeitos em benefício previdenciário tem amparo legal (art. 45-A da Lei nº 8.212/1991, art. 55, §2º, e art. 96, IV, ambos da Lei nº 8.213/1991), e acolhimento no Poder Judiciário (p ex.., E.STJ, Tema nº 609).
A meu ver, deverão ser ajuizadas em face do INSS as controvérsias judiciais instauradas pelo contribuinte individual que pretenda contar como tempo de contribuição o período de atividade remunerada alcançada pela decadência, pois a exigência de que trata o art. 45-A da Lei nº 8.212/1991 tem natureza indenizatória e não tributária. Ademais, nos termos do art. 5º, I e III, da Lei nº 11.457/2007, cabe ao INSS o cálculo das contribuições (mesmo as indenizatórias) e a emissão da correspondente certidão relativa ao tempo de contribuição, de modo que a União Federal não integra o polo passivo de ação mandamental que combate esses atos administrativos.
Todavia, o entendimento jurisprudencial é pela ilegitimidade passiva do INSS porque a Lei nº 11.457/2007 unificou a Secretaria da Receita Federal e a Secretaria da Receita Previdenciária do Ministério da Previdência Social, criando a Secretaria da Receita Federal do Brasil. Assim, cabe à União Federal, judicialmente representada pela Procuradoria da Fazenda Nacional, a execução das atividades relativas à arrecadação, cobrança e recolhimento das contribuições sociais.
Trago à colação julgados do E. STJ nesse sentido:
TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. CONTAGEM RECÍPROCA DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. JUROS E MULTA. PERÍODO ANTERIOR À MP N. 1.523/1996. NÃO INCIDÊNCIA. PROCESSUAL CIVIL. FAZENDA NACIONAL. LEGITIMIDADE PASSIVA. OFENSA AO ART. 535 DO CPC/73 NÃO CONFIGURADA.
I - Na origem, trata-se de ação que objetiva o reconhecimento da inexigibilidade de juros de mora e de multa no cálculo de indenização necessária à expedição de certidão de tempo de serviço, para contagem recíproca de tempo de contribuição da segurada, nos períodos compreendidos entre 1º/2/1976 a 22/8/1982 e 25/7/1984 a 20/1/1986.
(...)
III - A Fazenda Nacional detém legitimidade passiva para a atuação nos processos em que se pleiteia a inexigibilidade de multa e de juros de mora incidentes sobre o montante relativo ao recolhimento, em atraso, das contribuições previdenciárias mencionadas no art. 2º da Lei n. 11.457/07. Precedentes: AgInt no REsp n. 1.666.949/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, DJe 10/9/2018; REsp n. 1.607.544/RS, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 29/9/2017.
IV - As contribuições previdenciárias não pagas em época própria, para fins de contagem recíproca de tempo de serviço, somente sofrerão acréscimos de juros e multa quando o período a ser indenizado for posterior à Medida Provisória n. 1.523/1996, convertida na Lei n. 9.528/1997. A hipótese dos autos, contudo, refere-se aos períodos compreendidos entre 1º.2.1976 a 22.8.1982 e 25.7.1984 a 20.1.1986. Precedentes: REsp n. 1.681.403/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 9/10/2017; REsp n. 1.564.562/RS, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 29/9/2017.
V - Recurso especial da Fazenda Nacional improvido. Recurso Especial do Instituto Nacional do Seguro Social parcialmente conhecido e nesta parte improvido.
(REsp n. 1.607.075/SC, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 2/4/2019, DJe de 5/4/2019.)
Extrai-se, ainda, da íntegra do referido acórdão que “quanto à alegação de ilegitimidade passiva da Fazenda Nacional, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento segundo o qual se atribui à Fazenda Nacional a legitimidade para a atuação nos processos em que se pleiteia a inexigibilidade de multa e de juros de mora incidentes sobre o montante relativo ao recolhimento, em atraso, das contribuições previdenciárias mencionadas no art. 2º da Lei 11.457/07. Isso porque, ao tempo em que ocorreu a transferência da responsabilidade do recolhimento dessas contribuições previdenciárias à Secretaria da Receita Federal do Brasil, operou-se também o repasse da atribuição de sua cobrança judicial para a Fazenda Nacional. Desse modo, da mesma forma que se atribui à Fazenda Nacional a legitimidade ativa para a cobrança judicial da dívida ativa da União Federal, atribui-se-lhe também a legitimidade, no caso, passiva, para a sua defesa em processos como o ora analisado”.
Houvesse alguma lide estritamente vinculada à emissão da certidão de tempo de serviço requerida, a legitimidade passiva seria do INSS, mas não em se tratando de elementos concernentes ao cálculo de que trata o art. 45-A, da Lei nº 8.212/1991.
Posto isso, com a devida vênia, no caso dos autos, não há litígio pertinente a benefício previdenciário que possa ensejar a competência da Terceira Seção deste e.TRF, uma vez que as contribuições em tela são exigidas como indenização, com legitimidade processual confiada à União Federal.
C0ntudo, no caso específico deste feito, verifica-se, de fato, que a questão da competência para julgamento da presente ação foi analisada em conflito negativo de competência suscitado pelo Juízo Federal da 26ª Vara Cível da Seção Judiciária de São Paulo em face do Juízo Federal da 9ª Vara Previdenciária da Seção Judiciária de São Paulo.
Em acórdão prolatado em 06/09/2022, o Órgão Especial deste E. Tribunal entendeu que “a questão relativa à forma de cálculo de indenização devida pelo segurado por contribuições não recolhidas tempestivamente com o fim de concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que tal pleito seja objeto de discussão apenas na via administrativa, é matéria de Direito Previdenciário”, julgando procedente o conflito e determinando o retorno dos autos à 9ª Vara Previdenciária. O acórdão transitou em julgado em 21/11/2022 (ID 275812593).
Tendo em vista a existência de decisão específica estabelecendo a competência previdenciária nos presentes autos, de rigor a anulação do julgamento colegiado realizado em 05/12/2023 (ID 283568954), e a redistribuição da presente ação para a Terceira Seção.
Diante do exposto, suscito a presente questão de ordem para anular o v. acórdão que deu provimento à remessa oficial (sessão de julgamento de 05/12/2023 - ID 283568954) e determinar a redistribuição da presente ação no âmbito da Terceira Seção. Prejudicados os embargos de declaração.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. QUESTÃO DE ORDEM. DIREITO FINANCEIRO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. RECOLHIMENTO DE PERÍODOS PRETÉRITOS. EXIGÊNCIA PARA RECONHECIMENTO EM BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIO. ART. 45-A DA LEI Nº 8.212/1991. COMPETÊNCIA. CASO ESPECÍFICO DOS AUTOS.
- O contribuinte individual (figura jurídica que inclui o trabalhador autônomo) está sujeito ao recolhimento compulsório de contribuições previdenciárias que, ao mesmo tempo, servem para cálculos pertinentes a benefícios do Regime Geral de Previdência Social do INSS (ou para eventual aproveitamento em regime próprio do serviço público). Se configurada a decadência em relação a essas obrigações tributárias, o Fisco não poderá exigi-las mas o não recolhimento dessas imposições pretéritas impede que o contribuinte individual tenha plenos efeitos em pleitos previdenciários.
- Embora seja certo que não se trate de tributo, sendo controversa a existência de típica obrigação de indenizar (já que, se assim fosse, o erário poderia ativamente exigir esse pagamento ao invés de decorrer de providência reclamada inicialmente pelo trabalhador), esse recolhimento das contribuições correspondentes visando efeitos em benefício previdenciário tem amparo legal (art. 45-A da Lei nº 8.212/1991, art. 55, §2º, e art. 96, IV, ambos da Lei nº 8.213/1991), e acolhimento no Poder Judiciário (p ex.., E.STJ, Tema nº 609).
- Com a ressalva do entendimento do relator, o entendimento jurisprudencial é pela ilegitimidade passiva do INSS porque a Lei nº 11.457/2007 unificou a Secretaria da Receita Federal e a Secretaria da Receita Previdenciária do Ministério da Previdência Social, criando a Secretaria da Receita Federal do Brasil. Assim, cabe à União Federal, judicialmente representada pela Procuradoria da Fazenda Nacional, a execução das atividades relativas à arrecadação, cobrança e recolhimento das contribuições sociais.
- Com a devida vênia, no caso dos autos, não há litígio pertinente a benefício previdenciário que possa ensejar a competência da Terceira Seção deste e.TRF, uma vez que as indenizações em tela são exigidas pela União Federal. C0ntudo, no caso específico deste feito, verifica-se que a questão da competência para julgamento da presente ação foi analisada em conflito negativo de competência suscitado pelo Juízo Federal da 26ª Vara Cível da Seção Judiciária de São Paulo em face do Juízo Federal da 9ª Vara Previdenciária da Seção Judiciária de São Paulo.
- Em acórdão prolatado em 06/09/2022, o Órgão Especial deste E. Tribunal entendeu que “a questão relativa à forma de cálculo de indenização devida pelo segurado por contribuições não recolhidas tempestivamente com o fim de concessão de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que tal pleito seja objeto de discussão apenas na via administrativa, é matéria de Direito Previdenciário”, julgando procedente o conflito e determinando o retorno dos autos à 9ª Vara Previdenciária.
- Questão de ordem suscitada para anular o acórdão que julgou a remessa oficial (sessão de julgamento de 05/12/2023), e determinar a redistribuição da presente ação no âmbito da Terceira Seção. Prejudicados os embargos de declaração.
