Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5005838-38.2019.4.03.6114
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
11/11/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 13/11/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. RAZÕES DISSOCIADAS. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ILÍQUIDA.
NÃO OCORRÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. APOSENTADORIA
ESPECIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS.
I- Inaceitável conhecer de parte do recurso que se apresenta desprovido de conexão lógica com a
decisão impugnada, apresentando razões dissociadas do caso concreto.
II- Quanto à sujeição da sentença ao duplo grau de jurisdição por ser ilíquida, observo que líquida
é a sentença cujo quantum debeatur pode ser obtido por meros cálculos aritméticos, sem a
necessidade de nova fase de produção de provas ou de atividade cognitiva futura que venha a
complementar o título judicial. Inviável, portanto, acolher a interpretação conferida pela autarquia
ao conceito de sentença ilíquida.
III- No que se refere ao reconhecimento da atividade especial, a jurisprudência é pacífica no
sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do
princípio tempus regit actum.
IV- Em se tratando do agente nocivo ruído, a atividade deve ser considerada especial se exposta
a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. No entanto, após 5/3/97, o limite
foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172. A partir de 19/11/03 o referido limite foi
reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03.
V- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial do período
pleiteado.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
VI- Com relação à aposentadoria especial, houve o cumprimento dos requisitos previstos no art.
57 da Lei nº 8.213/91.
VII- Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os
posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema
810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o
IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários. A
taxa de juros deve incidir de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F
da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial
Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
VIII- Matéria preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente conhecida e improvida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005838-38.2019.4.03.6114
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO LOURENCO DE ALMEIDA
Advogado do(a) APELADO: EURICO NOGUEIRA DE SOUZA - SP152031-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005838-38.2019.4.03.6114
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO LOURENCO DE ALMEIDA
Advogado do(a) APELADO: EURICO NOGUEIRA DE SOUZA - SP152031-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 19/11/19 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à
concessão da aposentadoria especial a partir da data do requerimento administrativo formulado
em 10/3/16, mediante o reconhecimento do caráter especial das atividades exercidas no período
de 11/9/90 a 31/10/14. Aduz a parte autora que, “em 08 de março de 2017, requereu e lhe foi
concedida junto ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS – a Aposentadoria por Tempo de
Contribuição, que recebeu o nº 42/180.811.037-1. Ocorre que, em 10 de março de 2016, o autor
havia requerido junto ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS – a Aposentadoria Especial,
que recebeu o nº 46/178.602.013-8, e que foi indeferida sob o argumento de falta de tempo de
contribuição” (ID 124855594, pág. 2).
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quojulgou procedente o pedido, para reconhecer o caráter especial das atividades
exercidas no período de 11/9/90 a 31/10/14, bem como condenar o INSS ao pagamento da
aposentadoria especial (NB 46/178.602.013-8) a partir da data do requerimento administrativo
formulado em 10/3/16. “Os valores em atraso, compensados os valores recebidos pelo benefício
NB 42/180.811.037-1, o qual deverá ser cessado quando da implantação da aposentadoria
especial ora concedida, serão acrescidos de juros e correção monetária conforme o Manual de
Cálculos da JF vigente na data da liquidação” (ID 124855614, pág. 2). Os honorários advocatícios
foram arbitrados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença.
Inconformada, apelou a autarquia, alegando, preliminarmente, a necessidade de a sentença ser
submetida ao duplo grau obrigatório por ser ilíquida, bem como “o recebimento do presente
recurso em ambos os efeitos, na forma dos dispositivos legais mencionados, suspendendo-se a
eficácia da decisão antecipatória de tutela” (ID 124855617, pág. 12). No mérito, sustenta a
improcedência do pedido.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5005838-38.2019.4.03.6114
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CICERO LOURENCO DE ALMEIDA
Advogado do(a) APELADO: EURICO NOGUEIRA DE SOUZA - SP152031-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Inicialmente,
não conheço de parte do recurso do INSS, no tocante ao “recebimento do presente recurso em
ambos os efeitos, na forma dos dispositivos legais mencionados, suspendendo-se a eficácia da
decisão antecipatória de tutela” (ID 124855617, pág. 12). Tenho como inaceitável conhecer dessa
parte do recurso que se apresenta desprovido de conexão lógica com a decisão impugnada,
apresentando razões dissociadas do caso concreto, uma vez que não foi concedida a tutela
antecipada.
Passo, então, à análise do recurso, relativamente à parte conhecida.
Preliminarmente, quanto à sujeição da sentença ao duplo grau de jurisdição por ser ilíquida,
observo que líquida é a sentença cujo quantum debeatur pode ser obtido por meros cálculos
aritméticos, sem a necessidade de nova fase de produção de provas ou de atividade cognitiva
futura que venha a complementar o título judicial. Neste sentido, explica Cândido Rangel
Dinamarco: "Liqüidez é o conhecimento da quantidade de bens devidos ao credor. Uma
obrigação é líqüida (a) quando já se encontra perfeitamente determinada a quantidade dos bens
que lhe constituem o objeto ou (b) quando essa quantidade é determinável mediante a realização
de meros cálculos aritméticos, sempre sem a necessidade de buscar elementos ou provas
necessários ao conhecimento do quantum. O estado de determinação da quantidade de bens
devidos resulta desde logo do título que representa o direito ou mesmo lhe dá origem, ou será
atingido mediante providências inerentes ao incidente de liquidação de sentença (arts. 475-A ss.);
quando o valor de obrigação reconhecida em sentença ou em título extrajudicial é determinável
por mero cálculo, não há iliqüidez nem é necessária liquidação alguma, bastando ao credor a
elaboração da memória de cálculo indicada nos arts. 475-B e 614, inc. II, do Código de Processo
Civil. (Instituições de Direito Processual Civil, vol. IV, 3ª ed., rev. e atual., São Paulo: Malheiros,
2009, pp. 231/232 e 235, grifos meus)
Inviável, portanto, acolher a interpretação conferida pela autarquia ao conceito de sentença
ilíquida.
Passo ao exame do mérito.
No que se refere ao reconhecimento da atividadeespecial, a jurisprudência é pacífica no sentido
de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio
tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.310.034-PR).
Quanto aos meios de comprovação do exercício da atividade em condições especiais, até
28/4/95, bastava a constatação de que o segurado exercia uma das atividades constantes dos
anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. O rol dos referidos anexos é considerado
meramente exemplificativo (Súmula nº 198 do extinto TFR).
Com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário
específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do
Seguro Social.
A Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, ao
incluir o § 1º ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, dispôs sobre a necessidade da comprovação da
efetiva sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde do segurado por meio de laudo técnico,
motivo pelo qual considerava necessária a apresentação de tal documento a partir de 11/10/96.
No entanto, a fim de não dificultar ainda mais o oferecimento da prestação jurisdicional, passei a
adotar o posicionamento no sentido de exigir a apresentação de laudo técnico somente a partir
6/3/97, data da publicação do Decreto nº 2.172, de 5/3/97, que aprovou o Regulamento dos
Benefícios da Previdência Social. Nesse sentido, quadra mencionar os precedentes do C.
Superior Tribunal de Justiça: Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Petição nº 9.194/PR,
Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. em 28/5/14, v.u., DJe 2/6/14; AgRg no
AREsp. nº 228.590, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, j. em 18/3/14, v.u.,
DJe 1º/4/14; bem como o acórdão proferido pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados
Especiais Federais no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal nº
0024288-60.2004.4.03.6302, Relator para Acórdão Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel
Gonçalves, j. 14/2/14, DOU 14/2/14.
Por fim, observo que o art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Medida Provisória nº
1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, em seu § 4º, instituiu o Perfil
Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo que, com a edição do Decreto nº 4.032/01, o qual
alterou a redação dos §§ 2º e 6º e inseriu o § 8º ao art. 68 do Decreto nº 3048/99, passou-se a
admitir o referido PPP para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes
nocivos. Ademais, verifico que, com o advento do Decreto nº 8.123/13, o referido artigo assim
dispôs:
"Art. 68.
(...)
§ 3º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante
formulário emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições
ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
(...)
§ 8º A empresa deverá elaborar e manter atualizado o perfil profissiográfico do trabalhador,
contemplando as atividades desenvolvidas durante o período laboral, documento que a ele
deverá ser fornecido, por cópia autêntica, no prazo de trinta dias da rescisão do seu contrato de
trabalho, sob pena de sujeição às sanções previstas na legislação aplicável.
§ 9º Considera-se perfil profissiográfico, para os efeitos do § 8º, o documento com o histórico
laboral do trabalhador, segundo modelo instituído pelo INSS, que, entre outras informações, deve
conter o resultado das avaliações ambientais, o nome dos responsáveis pela monitoração
biológica e das avaliações ambientais, os resultados de monitoração biológica e os dados
administrativos correspondentes.
(...)"
Devo salientar também que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não
impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração
expressiva no ambiente de trabalho.
Ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes
nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era
menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do
trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.
Quadra ressaltar, por oportuno, que o PPP é o formulário padronizado, redigido e fornecido pela
própria autarquia, sendo que no referido documento não consta campo específico indagando
sobre a habitualidade e permanência da exposição do trabalhador ao agente nocivo,
diferentemente do que ocorria nos anteriores formulários SB-40, DIRBEN 8030 ou DSS 8030, nos
quais tal questionamento encontrava-se de forma expressa e com campo próprio para aposição
da informação. Dessa forma, não me parece razoável que a deficiência contida no PPP possa
prejudicar o segurado e deixar de reconhecer a especialidade da atividade à míngua de
informação expressa com relação à habitualidade e permanência.
Vale ressaltar que o uso de equipamentos de proteção individual - EPInão é suficiente para
descaracterizar a especialidadeda atividade, a não ser que comprovada a real efetividade do
aparelho na neutralização do agente nocivo, sendo que, em se tratando, especificamente, do
agente ruído, não há, no momento, equipamento capaz de neutralizar a nocividade gerada pelo
referido agente agressivo, conforme o julgamento realizado, em sessão de 4/12/14, pelo Plenário
do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário
com Agravo nº 664.335/SC, de Relatoria do E. Ministro Luiz Fux.
Observo, ainda, que a informação registrada pelo empregador no Perfil Profissiográfico
Previdenciário (PPP) sobre a eficácia do EPI não tem o condão de descaracterizar a sujeição do
segurado aos agentes nocivos. Conforme tratado na decisão proferida pelo C. STF na
Repercussão Geral acima mencionada, a legislação previdenciária criou, com relação à
aposentadoria especial, uma sistemática na qual é colocado a cargo do empregador o dever de
elaborar laudo técnico voltado a determinar os fatores de risco existentes no ambiente de
trabalho, ficando o Ministério da Previdência Social responsável por fiscalizar a regularidade do
referido laudo. Ao mesmo tempo, autoriza-se que o empregador obtenha benefício tributário caso
apresente simples declaração no sentido de que existiu o fornecimento de EPI eficaz ao
empregado.
Notório que o sistema criado pela legislação é falho e incapaz de promover a real comprovação
de que o empregado esteve, de fato, absolutamente protegido contra o fator de risco. A respeito,
é precisa a observação do E. Ministro Luís Roberto Barroso, ao sustentar que "considerar que a
declaração, por parte do empregador, acerca do fornecimento de EPI eficaz consiste em condição
suficiente para afastar a aposentadoria especial, e, como será desenvolvido adiante, para obter
relevante isenção tributária, cria incentivos econômicos contrários ao cumprimento dessas
normas" (Normas Regulamentadoras relacionadas à Segurança do Trabalho).
Exata, ainda, a manifestação do E. Ministro Marco Aurélio, ao invocar o princípio da primazia da
realidade, segundo o qual uma verdade formal não pode se sobrepor aos fatos que realmente
ocorrem - sobretudo em hipótese na qual a declaração formal é prestada com objetivos
econômicos.
Logo, se a legislação previdenciária cria situação que resulta, na prática, na inexistência de dados
confiáveis sobre a eficácia ou não do EPI, não se pode impor ao segurado - que não concorre
para a elaboração do laudo, nem para sua fiscalização - o dever de fazer prova da ineficácia do
equipamento de proteção que lhe foi fornecido. Caberá, portanto, ao INSS o ônus de provar que o
trabalhador foi totalmente protegido contra a situação de risco, pois não se pode impor ao
empregado - que labora em condições nocivas à sua saúde - a obrigação de suportar
individualmente os riscos inerentes à atividade produtiva perigosa, cujos benefícios são
compartilhados por toda a sociedade.
Ressalto, adicionalmente, que a Corte Suprema, ao apreciar a Repercussão Geral acima
mencionada, afastou a alegação, suscitada pelo INSS, de ausência de prévia fonte de custeio
para o direito à aposentadoria especial. O E. Relator, em seu voto, deixou bem explicitada a regra
que se deve adotar ao afirmar: "Destarte, não há ofensa ao princípio da preservação do equilíbrio
financeiro e atuarial, pois existe a previsão na própria sistemática da aposentadoria especial da
figura do incentivo (art. 22, II e § 3º, Lei n.º 8.212/91), que, por si só, não consubstancia a
concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88).
Corroborando o supra esposado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal considera que o
art. 195, § 5º, da CRFB/88, contém norma dirigida ao legislador ordinário, disposição inexigível
quando se tratar de benefício criado diretamente pela própria constituição".
Quanto à aposentadoria especial, em atenção ao princípio tempus regit actum, o benefício deve
ser disciplinado pela lei vigente à época em que implementados os requisitos para a sua
concessão, devendo ser observadas as disposições do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
Cumpre ressaltar que, no cálculo do salário de benefício da aposentadoria especial, não há a
incidência do fator previdenciário, tendo em vista o disposto no inc. II do art. 29 da Lei nº
8.213/91.
Passo à análise do caso concreto.
1) Período: 11/9/90 a 31/10/14.
Empresa: Volkswagen do Brasil – Indústria de Veículos Automotores Ltda (Anchieta).
Atividades/funções: Operador de máquinas I (de 11/9/90 a 30/11/90 e 1º/4/95 a 30/4/97),
Operador de máquinas universal (de 1º/12/90 a 31/3/95) e Operador de máquinas II (de 1º/9/09 a
31/10/14).
Agente(s) nocivo(s): Ruído de 91 dB (de 11/9/90 a 31/8/09), 98,1 dB (de 1º/9/09 a 31/12/10) e
93,5 dB (de 1º/1/11 a 31/10/14).
Enquadramento legal: Código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 (acima de 80 decibéis), Decreto nº
2.172/97 (acima de 90 decibéis) e Decreto nº 4.882/03 (acima de 85 decibéis).
Prova: Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP (ID 124855599, pág. 13/16) datado de 3/3/16.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no
período de 11/9/90 a 31/10/14, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, ao
agente ruído acima do limite de tolerância. Quanto à alegação sobre a metodologia utilizada pelo
empregador para a avaliação do agente ruído, verifico que o PPP juntado aos autos encontra-se
devidamente preenchido e assinado, contendo a técnica utilizada e a quantidade de decibéis a
que o segurado esteve exposto, bem como o nome do profissional responsável pelos registros
ambientais e assinatura do representante legal da empresa. Assim, não verifico nenhuma
contradição entre a metodologia adotada pelo emitente do PPP e os critérios aceitos pela
legislação regulamentadora que pudesse aluir a confiabilidade do método empregado pela
empresa para a aferição dos fatores de risco existentes no ambiente de trabalho. Devido
recordar, conforme acima mencionado, que a responsabilidade pelo preenchimento do PPP é
imposta ao empregador, não podendo o empregado ser penalizado por eventuais imperfeições
quanto à colheita de informações técnicas pela empresa, desde que inexista falha grave capaz de
comprometer a idoneidade dos dados técnicos informados pelo tomador dos serviços.
No tocante à comprovação da exposição ao agente nocivo ruído, há a exigência de apresentação
de laudo técnico ou PPP para comprovar a efetiva exposição a ruídos acima de 80 dB, nos
termos do Decreto nº 53.831/64. Após 5/3/97, o limite foi elevado para 90 dB, conforme Decreto
nº 2.172/97. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto
nº 4.882/03. Quadra mencionar, ainda, que o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do
Recurso EspecialRepetitivo Representativo de Controvérsia nº 1.398.260/PR (2013/0268413-2),
firmou posicionamento no sentido da impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto nº
4.882/03, uma vez que deve ser aplicada a lei em vigor no momento da prestação do serviço. Por
derradeiro, ressalto que, conforme já mencionado, o Plenário do C. Supremo Tribunal Federal, no
julgamento da Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário com Agravo nº
664.335/SC, fixou a tese de que, em se tratando do agente nocivo ruído, "a eficácia do
Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para
aposentadoria."
Dessa forma, somando-se o período especial reconhecido nos presentes autos, com o período já
enquadrado como especial pela autarquia na esfera administrativa, perfaz o autor mais de 25
anos de atividade especial, motivo pelo qual faz jus à concessão da aposentadoria especial.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os
posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema
810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o
IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários.
Quadra ressaltar haver constado expressamente do voto do Recurso Repetitivo que “a adoção do
INPC não configura afronta ao que foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de
repercussão geral (RE 870.947/SE). Isso porque, naquela ocasião, determinou-se a aplicação do
IPCA-E para fins de correção monetária de benefício de prestação continuada (BPC), o qual se
trata de benefício de natureza assistencial, previsto na Lei 8.742/93. Assim, é imperioso concluir
que o INPC, previsto no art. 41-A da Lei 8.213/91, abrange apenas a correção monetária dos
benefícios de natureza previdenciária.” Outrossim, como bem observou o E. Desembargador
Federal João Batista Pinto Silveira: “Importante ter presente, para a adequada compreensão do
eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência – INPC e IPCA-
E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a
TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo
STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões
judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.” (TRF-
4ª Região, AI nº 5035720-27.2019.4.04.0000/PR, 6ª Turma, v.u., j. 16/10/19).
A taxa de juros deve incidir de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F
da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial
Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
Ante o exposto, não conheço de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, rejeito a
preliminar de necessidade de a sentença ser submetida ao duplo grau de jurisdição e, no mérito,
nego-lhe provimento, devendo a correção monetária e os juros de mora incidir na forma acima
indicada.
É o meu voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. RAZÕES DISSOCIADAS. REMESSA OFICIAL. SENTENÇA ILÍQUIDA.
NÃO OCORRÊNCIA. PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. APOSENTADORIA
ESPECIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS.
I- Inaceitável conhecer de parte do recurso que se apresenta desprovido de conexão lógica com a
decisão impugnada, apresentando razões dissociadas do caso concreto.
II- Quanto à sujeição da sentença ao duplo grau de jurisdição por ser ilíquida, observo que líquida
é a sentença cujo quantum debeatur pode ser obtido por meros cálculos aritméticos, sem a
necessidade de nova fase de produção de provas ou de atividade cognitiva futura que venha a
complementar o título judicial. Inviável, portanto, acolher a interpretação conferida pela autarquia
ao conceito de sentença ilíquida.
III- No que se refere ao reconhecimento da atividade especial, a jurisprudência é pacífica no
sentido de que deve ser aplicada a lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do
princípio tempus regit actum.
IV- Em se tratando do agente nocivo ruído, a atividade deve ser considerada especial se exposta
a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. No entanto, após 5/3/97, o limite
foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172. A partir de 19/11/03 o referido limite foi
reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03.
V- A documentação apresentada permite o reconhecimento da atividade especial do período
pleiteado.
VI- Com relação à aposentadoria especial, houve o cumprimento dos requisitos previstos no art.
57 da Lei nº 8.213/91.
VII- Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros, devem ser observados os
posicionamentos firmados na Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema
810) e no Recurso Especial Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905), adotando-se, dessa forma, o
IPCA-E nos processos relativos a benefício assistencial e o INPC nos feitos previdenciários. A
taxa de juros deve incidir de acordo com a remuneração das cadernetas de poupança (art. 1º-F
da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09), conforme determinado na
Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810) e no Recurso Especial
Repetitivo nº 1.492.221 (Tema 905).
VIII- Matéria preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente conhecida e improvida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer de parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, rejeitar
a preliminar e, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
