Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2074801 / SP
0023734-09.2015.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
10/06/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECIMENTO.
ART. 523, §1º, DO CPC/1973. AUSÊNCIA PARCIAL DE INTERESSE RECURSAL.
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO
PERICIAL. INCAPACIDADE PARCIAL E PERMANENTE. IDADE AVANÇADA. PATOLOGIAS
ORTOPÉDICAS. INVIABILIDADE DE PROCESSO REABILITATÓRIO. ANÁLISE DO
CONTEXTO SOCIOECONÔMICO E HISTÓRICO LABORAL. SÚMULA 47 DO TNU.
PRECEDENTE DO STJ. INCAPACIDADE ABSOLUTA E PERMANENTE CONFIGURADA.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA
INCAPACIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO
DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
PRECEDENTES DESTA CORTE. CORREÇÃO MONETÁRIA. AGRAVO RETIDO DO INSS
NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO DO INSS CONHECIDA EM PARTE E, NA PARTE
CONHECIDA, DESPROVIDA. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA
CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - Não conhecido o agravo retido do INSS, eis que não requerida sua apreciação em sede de
apelo, conforme determinava o art. 523, §1º, do CPC/1973.
2 - Ainda em sede preliminar, também não conheço de parte do recurso do INSS, no que toca
ao pedido de submissão da sentença à remessa necessária, uma vez que tal providência restou
consignada no decisum, restando evidenciado a ausência de interesse recursal no particular.
3 - A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
4 - A Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, preconiza que o benefício previdenciário da
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência
exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for
considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para exercício da atividade que lhe garanta
a subsistência.
5 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
6 - O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o
prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e
vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação
(§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
7 - Independe de carência, entretanto, a concessão do benefício nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, conforme art. 26, II, da Lei
nº 8.213/91, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social -
RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 do mesmo diploma
legislativo.
8 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o
deferimento do benefício se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da
moléstia.
9 - Necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, o qual pode ser prorrogado por
24 (vinte e quatro) meses aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, nos
termos do art. 15 e §1º da Lei.
10 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 6 (seis)
contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência,
para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da
Lei nº 8.213/91, incluído pela Lei 13.457, de 2017).
11 - No que tange à incapacidade, a primeira profissional médica, com base em exame
realizado em 28 de outubro de 2011, relatou: "Analisando a história, documentação
apresentada e o Exame Físico, pode-se que concluir que trata-se de periciando portadora de
lesão em menisco de joelho esquerdo, além da Hipertensão Arterial e Dislipidemia. As
patologias que a autora é portadora são passíveis de tratamento e controle clínico e a Lesão de
menisco esquerdo pode ser corrigida cirurgicamente, portanto não configura qualquer
incapacidade para a autora".
12 - Determinado, a princípio, que a perita prestasse esclarecimentos (fl. 150), sua nomeação
foi revogada e indicado outro profissional, uma vez que aquela, em outras demandas, não
estava sendo localizada.
13 - O novo profissional, com base em exame efetivado em 05 de novembro de 2012 (fls.
182/184), consignou o seguinte: "Trata-se de portadora de sequelas dolorosa de Artrose do
joelho esquerdo submetido à ressutura de ligamentos rompidos no início do benefício,
resultando dor perene e prejuízo à marcha e ao agachamento que necessita para continuar
desenvolvendo sua atividade na colheita de laranjas, o que faz com maior dificuldade
caracterizando na opinião deste Perito, redução de sua capacidade funcional compatível com
enquadramento no Anexo III do Decreto 3.048/99 desde a cessação do benefício em 02/07/10".
Por fim, concluiu pela incapacidade parcial e permanente da autora.
14 - Ainda que o último laudo pericial tenha apontado pelo impedimento parcial da autora, se
afigura pouco crível que, quem sempre exerceu serviços braçais no campo, já tendo passado
por procedimento cirúrgico em seu joelho, e que conta, atualmente, com mais de 62 (sessenta e
dois) anos de idade, vá conseguir, após reabilitação, capacitação e treinamento, recolocação
profissional em outras funções.
15 - Dessa forma, tem-se que a demandante é incapaz e totalmente insusceptível de
reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência, sobretudo, em virtude
do seu contexto socioeconômico, histórico laboral e das patologias de que é portadora, o que
enseja a concessão de aposentadoria por invalidez.
16 - Análise do contexto social e econômico, com base na Súmula 47 da Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais e da jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça: STJ - AgRg no Ag: 1270388 PR 2010/0010566-9, Relator: Ministro JORGE MUSSI,
Data de Julgamento: 29/04/2010, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2010.
17 - O fato de a demandante ter trabalhado após o surgimento do impedimento e até após a
fixação da DIB, não permite o desconto dos valores dos atrasados correspondentes ao período
laboral, nem infirma a conclusão supra.
18 - Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a
ausência da remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não
consegue exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade
temporária ou definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade
remunerada, após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação e na
necessidade de devolução das parcelas recebidas durante o período que o segurado auferiu
renda. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao
enriquecimento ilícito e da coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o
legislador no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
19 - Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter
de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária em manter seu benefício,
por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e
enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta,
senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante,
como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos,
enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que
desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é
intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado
fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então,
para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial
daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu
sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual.
20 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com
recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos
valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque,
nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho,
absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à
margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do
regime. Neste sentido já decidiu esta Corte: AC 0036499-51.2011.4.03.9999, 10ª Turma, Rel.
Des. Fed. Baptista Pereira, j. 05/02/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/02/2013; AR 0019784-
55.2011.4.03.0000, 3ª Seção, Rel. Des. Fed. Sérgio Nascimento, 3ª Seção, j. 13/10/2011, e-
DJF3 Judicial 1 DATA:18/11/2013.
21 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
22 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
23 - Agravo retido do INSS não conhecido. Apelação do INSS conhecida em parte e, na parte
conhecida, desprovida. Alteração dos critérios de aplicação da correção monetária e dos juros
de mora. Sentença reformada em parte.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, conhecer parcialmente da
apelação do INSS e, na parte conhecida, negar-lhe provimento; por fim, dar parcial provimento
à remessa necessária para estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá
ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos
índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício
requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
