
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0005465-48.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIO DE BARROS
Advogado do(a) APELADO: WATSON ROBERTO FERREIRA - SP89287-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0005465-48.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIO DE BARROS
Advogado do(a) APELADO: WATSON ROBERTO FERREIRA - SP89287-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por CÉLIO DE BARROS, objetivando a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de auxílio-doença, desde a data da apresentação de requerimento administrativo, que se deu em 30.07.2012 (ID 102378203, p. 53), até 6 (seis) meses a contar do trânsito e julgado da demanda, a partir de quando deverá o autor ser submetido a perícias administrativas periódicas a fim de apurar a persistência ou não do seu quadro incapacitante. Fixou juros de mora à razão de 1% (um por cento) ao mês. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas em atraso, contabilizadas até a data da sua prolação. Por fim, confirmou os efeitos da antecipação da tutela (ID 102378187, p. 06-09).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma parcial da sentença, para que a DIB seja fixada na data da juntada do laudo pericial aos autos; seja estabelecida a DCB do auxílio-doença dentro de 6 (seis) meses, contados da realização da perícia médica judicial; para que ocorra o desconto dos valores dos atrasados correspondentes ao período em que o autor desenvolveu atividade remunerada após a DIB fixada no
decisum
; e, ainda, sejam alterados os critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora (ID 102378187, p. 27-30).O requerente apresentou contrarrazões (ID 102378187, p. 36-39).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0005465-48.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELIO DE BARROS
Advogado do(a) APELADO: WATSON ROBERTO FERREIRA - SP89287-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Acerca do termo inicial do benefício, o entendimento consolidado do E. STJ, exposto na súmula 576, enuncia que: "ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida".
Haja vista a apresentação de requerimento administrativo pelo demandante em 30.07.2012 (ID 102378203, p. 53), acertada a fixação da DIB nesta data.
A despeito de o
expert
ter fixado data de início da incapacidade no momento da perícia (ID 102378203, p. 135-144), se me afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece no dia a dia (art. 335 do CPC/1973, reproduzido no art. 375 do CPC/2015), que o autor não estava incapacitado na DER. Isso porque é portador de moléstias ortopédicas de caráter degenerativo, que se caracterizam justamente pelo desenvolvimento paulatino ao longo dos anos, sendo certo, outrossim, que lhe havia sido concedido por quase 3 (três) anos auxílio-doença em período anterior em razão dos mesmos males.Com efeito, informações extraídas do SABI - Sistema de Administração de Benefícios por Incapacidade, que ora faço anexar aos autos, dão conta que o demandante percebeu auxílio-doença, de NB: 505.172.159-8, de 05.12.2003 a 12.03.2006, em virtude de “lesões do ombro (CID10 - M75)”.
Aliás, o perito judicial assevera que o requerente esta incapacitado total e temporariamente para o trabalho, por ser portador de “
alterações ortopédicas com limitação nos movimentos de rotação, lateralidade, adução e abdução dos membros superiores e ombros com dor local à palpação devido a quadro de tendinopatia do subescapular e supra espinhal bilateral
”.Em suma, é praticamente impossível que o autor tenha permanecido incapacitado para o labor, de 2003 a 2006, recobrado sua aptidão laboral, e retornado ao estado incapacitante, apenas em 2014 (ano da perícia), em razão das mesmas doenças, de modo que, a meu sentir, na data da apresentação do requerimento administrativo (30.07.2012) era incapaz de exercer qualquer trabalho, fazendo jus ao auxílio-doença desde então.
Quanto à fixação de uma DCB, é cediço que o auxílio-doença, nos termos do art. 101,
caput,
da Lei nº 8.213/91, é benefício previdenciário de caráter temporário, cabendo ao segurado a submissão a exames médicos a cargo da Previdência, a fim de se verificar eventual alteração no estado de saúde e na situação fática que culminou a concessão.Também denominada de COPES (Cobertura Previdenciária Estimada), a "alta programada" consiste na cessação do benefício, na data fixada pelo INSS, sem realização de nova perícia. Era prevista apenas no art. 78, §1º, do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99), encontrando, atualmente, guarida no art. 60, §§8º e 9º, da Lei nº 8.213/91, alterado pela MP 739/2016 (que perdeu vigência) e pela MP 767/2017, que, por sua, vez foi convertida na Lei 13.457/2017.
Não obstante a celeuma em torno do tema, comungo da opinião daqueles que entendem inexistir óbice à fixação de data para a cessação do auxílio-doença, eis que a previsão de alta é feita com supedâneo em perícia médica e, ainda, se oportuniza ao segurado, nos termos do RPS, a possibilidade de solicitar a realização de novo exame pericial, com consequente pedido de prorrogação do benefício, na forma estabelecida pelo INSS (geralmente, nos 15 dias anteriores à data preestabelecida).
Se possível a fixação da data de alta pelo INSS, com fundamento em perícia administrativa, com mais razão o magistrado pode também assim o determinar, já que sua decisão é lastreada em prova médica elaborada por profissional equidistante das partes. Não por outra razão todas as modificações legislativas, que trataram sobre a COPES, admitiam e admitem a possibilidade de o próprio Juízo fixar na sentença a data da alta do postulante.
O §8º do art. 60 da Lei 8.213/91, em sua atual redação, é inequívoco ao prescrever que, “
sempre que possível
, o ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença,judicial
ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício” (grifos nossos).No presente caso, contudo, não era e ainda não é possível estabelecer uma data específica para a cessação da benesse do autor.
Diferentemente do alegado pelo INSS, o vistor oficial afirma de maneira expressa que o prazo de 6 (seis) meses, a contar da data do exame, é para
reavaliação
do quadro de saúde do demandante e não que este estará apto para laborar após tal interregno. Ademais, como ditosupra
, é pouco provável que isso ocorreu, uma vez que as patologias incapacitantes já existiam mais de 10 (dez) anos antes da perícia, desde ao menos o ano de 2003.Como se tanto não bastasse, extrato atualizado do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS que também segue anexo aos autos, denota que a benesse, concedida judicialmente e mantida na via administrativa, está com data de alta programada prevista para janeiro de 2022, afastando por completo a hipótese de fixação de uma DCB de 6 (seis) meses, a contar da perícia médica judicial, para ela.
Passo à análise da questão envolvendo o trabalho da parte autora no período em que reconhecida a incapacidade laborativa, com o desdobramento no pagamento das parcelas em atraso.
Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a ausência da remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não consegue exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade temporária ou definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada, após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária em conceder benefício previdenciário, por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual.
Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado, com a impossibilidade de concessão de benefício judicialmente, em virtude de suposta ausência de incapacidade. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime.
Neste sentido já decidiu esta Corte, conforme arestos a seguir reproduzidos:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORATIVA APÓS A CESSAÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA. DESCONTO DOS VALORES NO PERÍODO DO SUPOSTO TRABALHO. IMPOSSIBILIDADE. LEI 11.960/09. APLICAÇÃO COM RELAÇÃO À CORREÇÃO MONETÁRIA. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O fato da autora ter trabalhado ou voltado a trabalhar, por si só, não significa que tenha recuperado a capacidade laborativa, uma vez que pode tê-lo feito por razão de extrema necessidade e de sobrevivência, ainda mais se tratando de empregada doméstica, não obstante incapacitada para tal. 2. A autora, que deveria ter sido aposentada por invalidez, porém continuou a contribuir após referido período, em função de indevida negativa do benefício pelo INSS, não pode ser penalizada com o desconto dos salários-de-contribuição sobre os quais verteu contribuições, pois, se buscou atividade remunerada, por falta de alternativa, para o próprio sustento, em que pese a incapacidade laborativa, no período em que a autarquia opôs-se ilegalmente ao seu direito, não cabe ao INSS tirar proveito de sua própria conduta. 3. No que tange à correção monetária, devem ser aplicados os índices oficiais de remuneração básica, a partir da vigência da Lei 11.960/09. 4. Agravo parcialmente provido." (AC 0036499-51.2011.4.03.9999, 10ª Turma, Rel. Des. Fed. Baptista Pereira, j. 05/02/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/02/2013)".
"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. MATÉRIA PRELIMINAR. ESPERA PELA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RETORNO À ATIVIDADE LABORATIVA. POSSIBILIDADE DE PERCEPÇÃO CONJUNTA DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE E SALÁRIO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. INOCORRÊNCIA. VALORAÇÃO DE TODAS AS PROVAS ACOSTADOS AOS AUTOS SUBJACENTES. ERRO FATO. INEXISTÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - A matéria preliminar confunde-se com o mérito e com ele será examinada.
II - Há que prevalecer o entendimento já adotado na 10ª Turma, no sentido de que comprovada a incapacidade laborativa e não tendo sido concedida tutela para implantação do benefício, não se justifica a exclusão do período em que o segurado, mesmo tendo direito ao benefício, teve que trabalhar para garantir a sua subsistência, já que não é razoável que se exija que o segurado tenha recursos para se manter até que o seu feito seja julgado.
III - Malgrado o ora réu tenha exercido atividade remunerada desde o termo inicial do benefício de auxílio-doença fixado pela r. decisão rescindenda (05.02.2006) até agosto de 2011, conforme extrato do CNIS acostado aos autos, cabe ponderar que este havia sido contemplado com benefício de auxílio-doença nos períodos de 25.06.2004 a 04.07.2005, de 16.10.2005 a 30.11.2005 e de 25.01.2006 a 05.02.2006, havendo, ainda, documentos médicos apontando a ocorrência da mesma enfermidade constatada pela perícia oficial (epicondilite lateral do cotovelo direito) desde agosto de 2004. Assim sendo, é razoável inferir que o ora réu teve que buscar o mercado de trabalho mesmo sem plenas condições físicas para tal.
IV - A r. decisão rescindenda apreciou o conjunto probatório em sua inteireza, segundo o princípio da livre convicção motivada, tendo concluído pela existência de incapacidade parcial e temporária do réu para o trabalho, a ensejar a concessão do benefício de auxílio-doença.
V - Não se admitiu um fato inexistente ou se considerou inexistente um fato efetivamente ocorrido, pois foram consideradas as provas acostadas aos autos originários, com pronunciamento judicial sobre o tema, mesmo porque não constava das peças que compuseram os aludidos autos o extrato de CNIS indicando a manutenção de atividade laborativa após a cessação do benefício de auxílio-doença concedido na esfera administrativa.
VI - Honorários advocatícios arbitrados em R$ 700,00 (setecentos reais) a serem suportados pelo INSS.
VII - Preliminar rejeitada. Ação rescisória cujo pedido se julga improcedente."
(AR nº 0019784-55.2011.4.03.0000, Rel. Des. Federal Sérgio Nascimento, 3ª Seção, e-DJF3 18/11/2013)”.
A confirmar tal entendimento, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva, fixou a “Tese nº 1.013”, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.786.590/SP, ocorrido em 24.06.2020, com o seguinte teor:
“No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente."
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto,
dou parcial provimento
à apelação do INSS para que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, sejam fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, bem como à remessa necessária, esta em maior extensão, para determinar que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o mesmo Manual até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E.É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. DIB. DATA DA APRESENTAÇÃO DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. SÚMULA 576 DO STJ. MÁXIMAS DA EXPERIÊNCIA. ART. 375 DO CPC. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. ALTA PROGRAMADA JUDICIAL. ART. 78, §1º, DO DECRETO 3.048/99. ART. 60, §§8º E 9º, DA LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA INCAPACIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DESCONTO. DESCABIMENTO. TEMA REPETITIVO Nº 1.013/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - Acerca do termo inicial do benefício, o entendimento consolidado do E. STJ, exposto na súmula 576, enuncia que: "ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida". Haja vista a apresentação de requerimento administrativo pelo demandante em 30.07.2012 (ID 102378203, p. 53), acertada a fixação da DIB nesta data.
2 - A despeito de o
expert
ter fixado data de início da incapacidade no momento da perícia (ID 102378203, p. 135-144), se afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece no dia a dia (art. 335 do CPC/1973, reproduzido no art. 375 do CPC/2015), que o autor não estava incapacitado na DER. Isso porque é portador de moléstias ortopédicas de caráter degenerativo, que se caracterizam justamente pelo desenvolvimento paulatino ao longo dos anos, sendo certo, outrossim, que lhe havia sido concedido por quase 3 (três) anos auxílio-doença em período anterior em razão dos mesmos males.3 - Informações extraídas do SABI - Sistema de Administração de Benefícios por Incapacidade, que seguem anexas aos autos, dão conta que o demandante percebeu auxílio-doença, de NB: 505.172.159-8, de 05.12.2003 a 12.03.2006, em virtude de “lesões do ombro (CID10 - M75)”.
4 - Aliás, o perito judicial assevera que o requerente esta incapacitado total e temporariamente para o trabalho, por ser portador de “alterações ortopédicas com limitação nos movimentos de rotação, lateralidade, adução e abdução dos membros superiores e ombros com dor local à palpação devido a quadro de tendinopatia do subescapular e supra espinhal bilateral”.
5 - Em suma, é praticamente impossível que o autor tenha permanecido incapacitado para o labor, de 2003 a 2006, recobrado sua aptidão laboral, e retornado ao estado incapacitante, apenas em 2014 (ano da perícia), em razão das mesmas doenças, de modo que na data da apresentação do requerimento administrativo (30.07.2012) era incapaz de exercer qualquer trabalho, fazendo jus ao auxílio-doença desde então.
6 - É cediço que o auxílio-doença, nos termos do art. 101,
caput,
da Lei nº 8.213/91, é benefício previdenciário de caráter temporário, cabendo ao segurado a submissão a exames médicos a cargo da Previdência, a fim de se verificar eventual alteração no estado de saúde e na situação fática que culminou a concessão.7 - Também denominada de COPES (Cobertura Previdenciária Estimada), a "alta programada" consiste na cessação do benefício, na data fixada pelo INSS, sem realização de nova perícia. Era prevista apenas no art. 78, §1º, do Regulamento da Previdência Social (Decreto nº 3.048/99), encontrando, atualmente, guarida no art. 60, §§8º e 9º, da Lei nº 8.213/91, alterado pela MP 739/2016 (que perdeu vigência) e pela MP 767/2017, que, por sua, vez foi convertida na Lei 13.457/2017.
8 - Não obstante a celeuma em torno do tema, inexiste óbice, de fato, à fixação de data para a cessação do auxílio-doença, eis que a previsão de alta é feita com supedâneo em perícia médica e, ainda, se oportuniza ao segurado, nos termos do RPS, a possibilidade de solicitar a realização de novo exame pericial, com consequente pedido de prorrogação do benefício, na forma estabelecida pelo INSS (geralmente, nos 15 dias anteriores à data preestabelecida).
9 - Se possível a fixação da data de alta pelo INSS, com fundamento em perícia administrativa, com mais razão o magistrado pode também assim o determinar, já que sua decisão é lastreada em prova médica elaborada por profissional equidistante das partes. Não por outra razão todas as modificações legislativas, que trataram sobre a COPES, admitiam e admitem a possibilidade de o próprio Juízo fixar na sentença a data da alta do postulante.
10 - No presente caso, contudo, não era e ainda não é possível estabelecer uma data específica para a cessação da benesse do autor.
11 - Diferentemente do alegado pelo INSS, o vistor oficial afirma de maneira expressa que o prazo de 6 (seis) meses, a contar da data do exame, é para reavaliação do quadro de saúde do demandante e não que este estará apto para laborar após tal interregno. Ademais, como dito
supra
, é pouco provável que isso ocorreu, uma vez que as patologias incapacitantes já existiam mais de 10 (dez) anos antes da perícia, desde ao menos o ano de 2003.12 - Como se tanto não bastasse, extrato atualizado do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, que também segue anexo aos autos, denota que a benesse, concedida judicialmente e mantida na via administrativa, está com data de alta programada prevista para janeiro de 2022, afastando por completo a hipótese de fixação de uma DCB de 6 (seis) meses, a contar da perícia médica judicial, para ela.
13 - Descabe o abatimento, sobre as parcelas devidas, do período em que o segurado manteve vínculo empregatício ou verteu recolhimentos na condição de contribuinte individual. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual.
14 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime.
15 - A confirmar tal entendimento, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (REsp nº 1.786.590/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 24/06/2020, DJe 01/07/2020), fixou a “Tese nº 1.013” com o seguinte teor: “No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente.".
16 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.17 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
18 - Apelação do INSS e remessa necessária parcialmente providas. Alteração dos critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora. Sentença reformada em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação do INSS para que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, sejam fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, bem como à remessa necessária, esta em maior extensão, para determinar que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o mesmo Manual até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
