
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009632-45.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CYRO FAUCON FIGUEIREDO MAGALHAES - SP262215-N
APELADO: VALDIR PONCIANO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA DE ANDRADE RICARDO SOSTENA - SP300511-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009632-45.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CYRO FAUCON FIGUEIREDO MAGALHAES - SP262215-N
APELADO: VALDIR PONCIANO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA DE ANDRADE RICARDO SOSTENA - SP300511-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a revisão da RMI da aposentadoria por invalidez, mediante a inclusão das verbas deferidas em reclamação trabalhista.
A sentença, proferida em 13/04/15, julgou procedente o pedido para determinar proceda o INSS ao recálculo da RMI do benefício da parte autora observando, na apuração dos salários de contribuição que integram o PBC, as verbas reconhecidas em reclamação trabalhista, revisando a RMI conforme apurado pela Contadoria Judicial, condenando-o ao pagamento das diferenças devidas no montante de R$ 27.066,27, apurado até 25/03/15. Condenou, ainda, o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação apurado até a data da sentença.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Apela o INSS, arguindo, exclusivamente, a carência de ação por falta de interesse de agir, ante a inexistência de prévio requerimento administrativo de revisão. Aduz, que a revisão do benefício se dá a partir das informações constantes no CNIS e nesse cadastro não consta qualquer pedido de alteração de dados do segurado.
Com contrarrazões da parte apelada, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0009632-45.2016.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: CYRO FAUCON FIGUEIREDO MAGALHAES - SP262215-N
APELADO: VALDIR PONCIANO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: PRISCILA DE ANDRADE RICARDO SOSTENA - SP300511-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, passo ao exame da admissibilidade da remessa necessária prevista no seu artigo 475.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo cálculo fixado na r. sentença, que o valor total da condenação não alcançará a importância de 60 (sessenta) salários mínimos estabelecida no § 2º.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
No mais, presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação.
No tocante à necessidade de prévio requerimento administrativo. O art. 5º, XXXV, da Constituição, assegura o pleno acesso ao Poder Judiciário para a proteção dos cidadãos em caso de lesão ou ameaça a direito. Contudo, essa garantia fundamental não deixa de trazer em si a exigência da existência de uma lide, justificando a atuação do Poder Judiciário como forma democrática de composição de conflitos, o que também se revela como interesse de agir (necessidade e utilidade da intervenção judicial).
Existindo lide (provável ou concreta), é perfeitamente possível o acesso direto à via judicial, sem a necessidade de prévio requerimento na via administrativa.
Contudo, em casos nos quais a lide não está claramente caracterizada, vale dizer, em situações nas quais é potencialmente possível que o cidadão obtenha a satisfação de seu direito perante a própria Administração Pública, é imprescindível o requerimento na via administrativa, justamente para a demonstração da necessidade da intervenção judicial e, portanto, do interesse de agir que compõe as condições da ação. Imprescindível, assim, a existência do que a doutrina processual denomina de fato contrário, a caracterizar a resistência à pretensão do autor.
Deveras, de acordo com o entendimento jurisprudencial adotado por esta Corte Regional, tratando-se de ação de cunho previdenciário, ainda que não se possa condicionar a busca da prestação jurisdicional ao exaurimento da via administrativa, tem-se por razoável exigir que o autor tenha ao menos formulado um pleito administrativo - e recebido resposta negativa - de forma a demonstrar a necessidade de intervenção do Poder Judiciário ante a configuração de uma pretensão resistida.
Conclui-se, assim, pela aplicação aos segurados da exigência de prévia provocação da instância administrativa para obtenção do benefício e, somente diante de sua resistência, viabilizar a propositura de ação judicial.
Aliás, é nesse sentido a decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 631.240/MG, com repercussão geral reconhecida:
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir."
(Tribunal Pleno, Rel. Min. Roberto Barroso, DJe 10/11/2014)
Contudo, nas ações ajuizadas em data anterior à essa decisão, há que se observar as regras de transição nele estabelecidas.
In casu, o feito foi ajuizado em 06.05.14, data anterior ao julgamento do paradigma de repercussão geral. O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por sua vez, apresentou contestação em 10.11.2014, o que, consoante a modulação de efeitos ali consignadas, caracteriza o interesse de agir consubstanciado na resistência à lide.
Ademais, o feito encontra-se sentenciado com análise de mérito, tendo sido julgada procedente a pretensão do autor com a revisão pretendida. Desta forma, ainda que não tenha havido o requerimento administrativo prévio, nesta fase processual não se mostra aceitável a sua exigência, posto que mais do que constituída a lide, já foi declarado o direito.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. REVISÃO DA RMI. AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. FEITO SENTENCIADO COM ANÁLISE DE MÉRITO. POSSIBILIDADE.
1. Valor da condenação inferior a 60 salários mínimos. Remessa necessária não conhecida.
2. O art. 5º, XXXV, da Constituição, assegura o pleno acesso ao Poder Judiciário para a proteção dos cidadãos em caso de lesão ou ameaça a direito. Contudo, essa garantia fundamental não deixa de trazer em si a exigência da existência de uma lide, justificando a atuação do Poder Judiciário como forma democrática de composição de conflitos, o que também se revela como interesse de agir (necessidade e utilidade da intervenção judicial). Existindo lide (provável ou concreta), é perfeitamente possível o acesso direto à via judicial, sem a necessidade de prévio requerimento na via administrativa.
3. Em casos nos quais a lide não está claramente caracterizada, vale dizer, em situações nas quais é potencialmente possível que o cidadão obtenha a satisfação de seu direito perante a própria Administração Pública, é imprescindível o requerimento na via administrativa, justamente para a demonstração da necessidade da intervenção judicial e, portanto, do interesse de agir que compõe as condições da ação.
4. In casu, todavia, verifica-se que o feito, ajuizado anteriormente ao precedente firmado no STF, encontra-se sentenciado com análise de mérito, tendo sido julgada procedente a pretensão do autor com a revisão pretendida. Desta forma, ainda que não tenha havido o requerimento administrativo prévio, que em um primeiro momento poderia se caracterizar como um impeditivo para o prosseguimento do feito, nesta fase processual não se mostra aceitável a sua exigência, posto que mais do que constituída a lide, já foi declarado o direito.
5. Apelação do INSS não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
