Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
0013294-46.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
22/04/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 30/04/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. VALOR DA CONDENAÇÃO
INFERIOR AO LIMITE DE ALÇADA. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 74 A
79 E 55, § 3º. LEI N.º 8.213/91. LABOR RURAL DO DE CUJUS. INEXISTÊNCIA DE
SUBSTRATO MATERIAL MÍNIMO. SÚMULA 149 DO STJ. VERBAS DE SUCUMBÊNCIA.
PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA
JUSTIÇA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. APELAÇÕES DO INSS
E DA AUTORA PREJUDICADAS.
1 - Inicialmente, em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação,
levando em conta o termo inicial do benefício (29/09/2014) e a data da prolação da r. sentença
(02/09/2016), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência
Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e
verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º
do artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
2 - A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força
do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 74 a 79 da Lei nº
8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido,
aposentado ou não.
3 - O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da
qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida
os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no
Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova
exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal
de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que
se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o
raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ.
6 - Os documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no
sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
7 - O evento morte do Sr. Jorge Gomes da Silva, ocorrido em 16/08/2014, e a condição de
dependente da autora restaram comprovados pelas certidões de óbito e de casamento, sendo
questões incontroversas.
8 - A celeuma diz respeito à qualidade de rurícola do falecido à época do passamento.
9 - Anexou-se, como pretensa prova material, a respeito do labor do falecido no campo: 1 -
certidão de casamento entre a autora e o falecido, celebrado em 16/12/1978, na qual ele está
qualificado como "lavrador" e ela como "doméstica" (ID 107187428 - p. 19); 2 - ficha de inscrição
do falecido junto ao Sindicato de Trabalhadores Rurais de Regente Feijó (ID 107187428 - p. 22);
3 - notas fiscais de comercialização de produção agrícola em nome do autor ou de seu irmão,
Francisco, emitidas, de forma descontínua, até o ano de 2008 (ID 107187428 - p. 24-27 e 29-39);
4 - título de eleitor, emitido em 21/01/1975, no qual o de cujus está qualificado como agricultor (ID
107187428 - p. 28); 5 - certidão de óbito, na qual se declara que o instituidor era "lavrador"; 6 -
escritura pública, lavrada em 20/09/2002, referente à doação de lotes de terras da propriedade
denominada "Sítio São José", com reserva de usufruto e cláusula de impenhorabilidade, feita
pelos pais aos filhos, dentre eles o de cujus, tendo este último sido qualificado na ocasião como
"lavrador".
10 - São inadmissíveis os documentos emitidos pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais para
demonstrar o labor do instituidor no campo, uma vez que não foram homologados pelo INSS,
conforme preconizava o então vigente artigo 106, III, da Lei 8.213/91.
11 - Igualmente não pode ser admitida, como indício do labor rural do de cujus, a certidão de
óbito do falecido.
12 - É entendimento corrente que Certidões emitidas por órgãos públicos - e, portanto, detentoras
de fé pública - em que conste a qualificação de lavrador, constituem meio probatório legítimo para
a demonstração do labor campesino, desde que confirmadas por prova testemunhal. Mas, não se
pode perder de vista que a premissa sobre a qual se assenta a validade, para fins
previdenciários, de tal documento seja a de que a qualificação de lavrador tenha sido declinada
pelo próprio interessado por ocasião da respectiva lavratura. Em outras palavras, é o humilde
campesino, em pessoa, que informa a sua ocupação profissional ao escrivão de um cartório, seja
por ocasião da celebração de seu matrimônio, ou mesmo para registrar o nascimento de um filho.
13 - In casu, a condição de trabalhador rural, na certidão de óbito, fora atribuída por um dos filhos
do falecido, o Sr. Paulo Sérgio Lima Gomes, o que reduz a importância deste documento - ao
menos para o que aqui interessa. Desse modo, não há como se dar valor probatório à certidão de
óbito para o fim de validar o exercício da faina campesina pelo falecido. Era imprescindível, no
caso concreto, que a autora tivesse apresentado início de prova material em nome daquele, a fim
de, em conjunto com outros meios probatórios (como a prova oral), demonstrar o mourejo rural
em data contemporânea ao óbito.
14 - Por derradeiro, ainda que se estendesse a condição de lavrador apontada nos demais
documentos, de se ressaltar que conquanto tenha sido produzida prova oral, esta não basta, por
si só, para demonstrar o labor rural do de cujus por 6 (seis) anos, entre 25/07/2008 (data da
emissão da última nota fiscal) e 16/08/2014 (data do óbito), inexistindo, para o período, substrato
material.
15 - Diante da não demonstração do trabalho desenvolvido na lide campesina, imperiosa a
extinção da demanda, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a propositura de nova ação,
caso a requerente venha a conseguir documentos que comprovem o labor desenvolvido na
qualidade de rurícola do de cujus à época do passamento. Entendimento consolidado do C. STJ,
em julgado proferido sob a sistemática dos recursos repetitivos, conforme art. 543-C do
CPC/1973: REsp 1.352.721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE
ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016.
16 - Condenada a autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente
desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento das custas e honorários advocatícios,
os quais se arbitra em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade
suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que
fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos
arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC/2015, já
que deu causa à extinção do processo sem resolução do mérito .
17 - Remessa necessária não conhecida. Processo extinto, sem exame do mérito. Verbas de
sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça. Apelações da autora e do
INSS prejudicadas.
Acórdao
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0013294-46.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUZA LIMA GOMES
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO CARDOSO RIBEIRO DE MOURA - SP259278-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0013294-46.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUZA LIMA GOMES
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO CARDOSO RIBEIRO DE MOURA - SP259278-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS e por NEUZA LIMA GOMES, em ação ajuizada por esta última,
objetivando a concessão do benefício previdenciário de pensão por morte.
A r. sentença, prolatada em 02/09/2016, julgou procedente o pedido deduzido na inicial e
condenou o INSS a implantar, em favor da autora, o benefício de pensão por morte, pagando as
prestações atrasadas, desde a data do requerimento administrativo (29/09/2014), acrescidas de
correção monetária e juros de mora. A fixação dos honorários advocatícios foi delegada à fase de
liquidação, observando-se o disposto na Súmula 111 do C. STJ. Condenada ainda a Autarquia
Previdenciária no pagamento de custas e despesas processuais. A sentença foi submetida ao
reexame necessário.
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma do r. decisum, ao fundamento de que não foram
preenchidos os requisitos para a concessão do benefício, pois o falecido não detinha a qualidade
de segurado na época do passamento. Subsidiariamente, pede o cálculo da correção monetária
de acordo com a Lei n. 11.960/2009.
A parte autora, por sua vez, pede a fixação do termo inicial do benefício na data do óbito.
Devidamente processados os recursos, sem contrarrazões, foram os autos remetidos a este
Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0013294-46.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUZA LIMA GOMES
Advogado do(a) APELADO: RODRIGO CARDOSO RIBEIRO DE MOURA - SP259278-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Inicialmente, em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação,
levando em conta o termo inicial do benefício (29/09/2014) e a data da prolação da r. sentença
(02/09/2016), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência
Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e
verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º
do artigo 496 do Código de Processo Civil.
Dessa forma, incabível a remessa necessária no presente caso.
Passo, então, ao exame do mérito recursal.
A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força do
princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 74 a 79 da Lei nº 8.213/91.
Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido, aposentado
ou não.
O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do
evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da
qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida
os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no
Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente
produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova
exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal
de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se
pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o
raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS
NÃO DEMONSTRADOS.
1. (...).
3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é
imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o
documento.(...)"
(APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº 0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des.
Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/12/2015 - grifos nossos).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.
(...)
2) Não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência
estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua
eficácia probatória. (...)"
(AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA
TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver
comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP
nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o
entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em
momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de
prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
Do caso concreto.
O evento morte do Sr. Jorge Gomes da Silva, ocorrido em 16/08/2014, e a condição de
dependente da autora restaram comprovados pelas certidões de óbito e de casamento, sendo
questões incontroversas.
A celeuma diz respeito à qualidade de rurícola do falecido à época do passamento.
Anexou-se, como pretensa prova material, a respeito do labor do falecido no campo:
1 - certidão de casamento entre a autora e o falecido, celebrado em 16/12/1978, na qual ele está
qualificado como "lavrador" e ela como "doméstica" (ID 107187428 - p. 19);
2 - ficha de inscrição do falecido junto ao Sindicato de Trabalhadores Rurais de Regente Feijó (ID
107187428 - p. 22);
3 - notas fiscais de comercialização de produção agrícola em nome do autor ou de seu irmão,
Francisco, emitidas, de forma descontínua, até o ano de 2008 (ID 107187428 - p. 24-27 e 29-39);
4 - título de eleitor, emitido em 21/01/1975, no qual o de cujus está qualificado como agricultor (ID
107187428 - p. 28);
5 - certidão de óbito, na qual se declara que o instituidor era "lavrador";
6 - escritura pública, lavrada em 20/09/2002, referente à doação de lotes de terras da propriedade
denominada "Sítio São José", com reserva de usufruto e cláusula de impenhorabilidade, feita
pelos pais aos filhos, dentre eles o de cujus, tendo este último sido qualificado na ocasião como
"lavrador".
De início, cumpre salientar serem inadmissíveis os documentos emitidos pelo Sindicato dos
Trabalhadores Rurais para demonstrar o labor do instituidor no campo, uma vez que não foram
homologados pelo INSS, conforme preconizava o então vigente artigo 106, III, da Lei 8.213/91.
Igualmente não pode ser admitida, como indício do labor rural do de cujus, a certidão de óbito do
falecido.
É entendimento corrente que Certidões emitidas por órgãos públicos - e, portanto, detentoras de
fé pública - em que conste a qualificação de lavrador, constituem meio probatório legítimo para a
demonstração do labor campesino, desde que confirmadas por prova testemunhal.
Mas, não se pode perder de vista que a premissa sobre a qual se assenta a validade, para fins
previdenciários, de tal documento seja a de que a qualificação de lavrador tenha sido declinada
pelo próprio interessado por ocasião da respectiva lavratura. Em outras palavras, é o humilde
campesino, em pessoa, que informa a sua ocupação profissional ao escrivão de um cartório, seja
por ocasião da celebração de seu matrimônio, ou mesmo para registrar o nascimento de um filho.
In casu, a condição de trabalhador rural, na certidão de óbito, fora atribuída por um dos filhos do
falecido, o Sr. Paulo Sérgio Lima Gomes, o que reduz a importância deste documento - ao menos
para o que aqui interessa.
Desse modo, não há como se dar valor probatório à certidão de óbito para o fim de validar o
exercício da faina campesina pelo falecido. Era imprescindível, no caso concreto, que a autora
tivesse apresentado início de prova material em nome daquele, a fim de, em conjunto com outros
meios probatórios (como a prova oral), demonstrar o mourejo rural em data contemporânea ao
óbito.
Por derradeiro, ainda que se estendesse a condição de lavrador apontada nos demais
documentos, de se ressaltar que conquanto tenha sido produzida prova oral, esta não basta, por
si só, para demonstrar o labor rural do de cujus por 6 (seis) anos, entre 25/07/2008 (data da
emissão da última nota fiscal) e 16/08/2014 (data do óbito), inexistindo, para o período, substrato
material.
Desse modo, diante da não demonstração do trabalho desenvolvido na lide campesina, imperiosa
a extinção da demanda, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a propositura de nova
ação, caso a requerente venha a conseguir documentos que comprovem o labor desenvolvido na
qualidade de rurícola pelo de cujus à época do passamento.
Nesse sentido, transcrevo o entendimento consolidado do C. STJ, em julgado proferido sob a
sistemática de recursos repetitivos, conforme art. 543-C, do CPC/1973:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS
ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL
DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus
procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta
os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social
adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da
Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência
Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a
parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização
dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica
previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as
normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação
previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido".
(REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado
em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Por conseguinte, condeno a autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente
desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento das custas e honorários advocatícios,
os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade
suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que
fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos
arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC/2015, já
que deu causa à extinção do processo sem resolução do mérito.
Ante o exposto, não conheço da remessa necessária e, em atenção ao determinado no REsp
1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, extingo, de ofício, o processo, sem
resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do mesmo diploma legislativo (art. 485, IV, do
CPC/2015), diante da não comprovação do trabalho rural, e condeno a demandante no
pagamento das custas e despesas processuais, bem como nos honorários advocatícios,
observada a Lei nº 1.060/50, dando por prejudicadas as apelações interpostas por ela e pelo
INSS.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. VALOR DA CONDENAÇÃO
INFERIOR AO LIMITE DE ALÇADA. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 74 A
79 E 55, § 3º. LEI N.º 8.213/91. LABOR RURAL DO DE CUJUS. INEXISTÊNCIA DE
SUBSTRATO MATERIAL MÍNIMO. SÚMULA 149 DO STJ. VERBAS DE SUCUMBÊNCIA.
PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA
JUSTIÇA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. APELAÇÕES DO INSS
E DA AUTORA PREJUDICADAS.
1 - Inicialmente, em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação,
levando em conta o termo inicial do benefício (29/09/2014) e a data da prolação da r. sentença
(02/09/2016), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência
Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e
verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º
do artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
2 - A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força
do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 74 a 79 da Lei nº
8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido,
aposentado ou não.
3 - O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência do
evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a manutenção da
qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter preenchido em vida
os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das aposentadorias previstas no
Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova
exclusivamente testemunhal. Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal
de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que
se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o
raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ.
6 - Os documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no
sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
7 - O evento morte do Sr. Jorge Gomes da Silva, ocorrido em 16/08/2014, e a condição de
dependente da autora restaram comprovados pelas certidões de óbito e de casamento, sendo
questões incontroversas.
8 - A celeuma diz respeito à qualidade de rurícola do falecido à época do passamento.
9 - Anexou-se, como pretensa prova material, a respeito do labor do falecido no campo: 1 -
certidão de casamento entre a autora e o falecido, celebrado em 16/12/1978, na qual ele está
qualificado como "lavrador" e ela como "doméstica" (ID 107187428 - p. 19); 2 - ficha de inscrição
do falecido junto ao Sindicato de Trabalhadores Rurais de Regente Feijó (ID 107187428 - p. 22);
3 - notas fiscais de comercialização de produção agrícola em nome do autor ou de seu irmão,
Francisco, emitidas, de forma descontínua, até o ano de 2008 (ID 107187428 - p. 24-27 e 29-39);
4 - título de eleitor, emitido em 21/01/1975, no qual o de cujus está qualificado como agricultor (ID
107187428 - p. 28); 5 - certidão de óbito, na qual se declara que o instituidor era "lavrador"; 6 -
escritura pública, lavrada em 20/09/2002, referente à doação de lotes de terras da propriedade
denominada "Sítio São José", com reserva de usufruto e cláusula de impenhorabilidade, feita
pelos pais aos filhos, dentre eles o de cujus, tendo este último sido qualificado na ocasião como
"lavrador".
10 - São inadmissíveis os documentos emitidos pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais para
demonstrar o labor do instituidor no campo, uma vez que não foram homologados pelo INSS,
conforme preconizava o então vigente artigo 106, III, da Lei 8.213/91.
11 - Igualmente não pode ser admitida, como indício do labor rural do de cujus, a certidão de
óbito do falecido.
12 - É entendimento corrente que Certidões emitidas por órgãos públicos - e, portanto, detentoras
de fé pública - em que conste a qualificação de lavrador, constituem meio probatório legítimo para
a demonstração do labor campesino, desde que confirmadas por prova testemunhal. Mas, não se
pode perder de vista que a premissa sobre a qual se assenta a validade, para fins
previdenciários, de tal documento seja a de que a qualificação de lavrador tenha sido declinada
pelo próprio interessado por ocasião da respectiva lavratura. Em outras palavras, é o humilde
campesino, em pessoa, que informa a sua ocupação profissional ao escrivão de um cartório, seja
por ocasião da celebração de seu matrimônio, ou mesmo para registrar o nascimento de um filho.
13 - In casu, a condição de trabalhador rural, na certidão de óbito, fora atribuída por um dos filhos
do falecido, o Sr. Paulo Sérgio Lima Gomes, o que reduz a importância deste documento - ao
menos para o que aqui interessa. Desse modo, não há como se dar valor probatório à certidão de
óbito para o fim de validar o exercício da faina campesina pelo falecido. Era imprescindível, no
caso concreto, que a autora tivesse apresentado início de prova material em nome daquele, a fim
de, em conjunto com outros meios probatórios (como a prova oral), demonstrar o mourejo rural
em data contemporânea ao óbito.
14 - Por derradeiro, ainda que se estendesse a condição de lavrador apontada nos demais
documentos, de se ressaltar que conquanto tenha sido produzida prova oral, esta não basta, por
si só, para demonstrar o labor rural do de cujus por 6 (seis) anos, entre 25/07/2008 (data da
emissão da última nota fiscal) e 16/08/2014 (data do óbito), inexistindo, para o período, substrato
material.
15 - Diante da não demonstração do trabalho desenvolvido na lide campesina, imperiosa a
extinção da demanda, sem resolução do mérito, a fim de possibilitar a propositura de nova ação,
caso a requerente venha a conseguir documentos que comprovem o labor desenvolvido na
qualidade de rurícola do de cujus à época do passamento. Entendimento consolidado do C. STJ,
em julgado proferido sob a sistemática dos recursos repetitivos, conforme art. 543-C do
CPC/1973: REsp 1.352.721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE
ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016.
16 - Condenada a autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente
desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento das custas e honorários advocatícios,
os quais se arbitra em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade
suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que
fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos
arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC/2015, já
que deu causa à extinção do processo sem resolução do mérito .
17 - Remessa necessária não conhecida. Processo extinto, sem exame do mérito. Verbas de
sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça. Apelações da autora e do
INSS prejudicadas. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer da remessa necessária e, em atenção ao determinado no
REsp 1.352.721/SP, julgado na forma do art. 543-C do CPC/1973, extinguir, de ofício, o processo,
sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, IV, do mesmo diploma legislativo (art. 485, IV,
do CPC/2015), diante da não comprovação do trabalho rural, e condenar a demandante no
pagamento das custas e despesas processuais, bem como nos honorários advocatícios,
observada a Lei nº 1.060/50, dando por prejudicadas as apelações interpostas por ela e pelo
INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
