
| D.E. Publicado em 01/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e conhecer da remessa necessária para dar-lhe parcial provimento para fixar os juros de mora de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e para determinar que a correção monetária dos valores em atraso seja calculada segundo o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009, mantendo, no mais, a r. sentença de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0061609-57.2008.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada pela parte autora, objetivando a concessão dos benefícios de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença, de fls. 472/477, julgou procedente o pedido deduzido na inicial, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de benefício de auxílio-doença, desde a data do laudo pericial (14/12/2005). Fixou a correção monetária sobre as parcelas em atraso conforme a Súmula nº 8 desta Corte. Determinou os juros de mora na ordem de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação. Por fim, condenou o INSS no pagamento de honorários advocatícios no valor de 10% (dez por cento) sobre as prestações vencidas até a data de sua prolação (Súmula 111 do STJ).
Em razões recursais de fls. 480/482, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a parte autora não preenche os requisitos para a concessão do auxílio-doença.
Contrarrazões da parte autora às fls. 485/487.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
De início, destaco o cabimento da remessa necessária no presente caso.
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 17/06/2008, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, §2º, do CPC/1973:
No caso, houve condenação do INSS na condenação e no pagamento dos atrasados de benefício de auxílio-doença à parte autora, desde a data do laudo pericial, em 14/12/2005 (fl. 369), acrescidos de correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios.
Ante a evidente iliquidez do decisum, cabível a remessa necessária, nos termos da Súmula 490 do Superior Tribunal de Justiça.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento do benefício se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento do beneplácito em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão do benefício de auxílio-doença (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo, com base em exame pericial de fls. 363/370, diagnosticou o autor como portador de "alterações na semiologia neurológica em decorrência de distúrbios epilépticos não controlados".
O expert aduz que, "em face dos elementos clínicos encontrados no exame pericial realizado por este jurisperito associado ao conteúdo do atestado médico em anexo, nos permite afirma que o requerente - portador de distúrbio neurológico não controlado (Epilepsia) cujo males o impede trabalhar habitualmente, necessitando de tratamento especializado"(sic).
Conclui que "apresenta-se incapacitado de forma total e temporária para o trabalho".
Embora não haja fixação no laudo, quanto ao surgimento da incapacidade (DII), tenho que esta se iniciou quando o requerente era segurado da Previdência Social, recebendo, inclusive, auxílio-doença após o seu início, o qual foi indevidamente cessado no ano de 2002, como se verá adiante.
Realizada audiência de instrução e julgamento, em 28 de fevereiro de 2008 (fls. 430/433), foram colhidos depoimentos de testemunhas arroladas pelo requerente.
MARIA ARLANGIA SARAIVA afirmou que "é vizinha do autor e tem conhecimento de que desde 1999 ele deixou de ter condições de trabalhar em razões de crises de epilepsia e convulsões. Ele trabalhava na lavoura de cana e após o ano mencionado não mais trabalhou" (...) "Sabe que o autor toma remédios para tratar de seus problemas de saúde"(...) "Após 1999, o autor chegou a procurar por novos empregos, mas tem de abandoná-los logo no início em razão de seus problemas de saúde. Sabe que o autor apresenta crises convulsivas com certa frequência, sem saber precisar a cada quantos dias".
RIVALDO DE SOUZA informou que "trabalhou com o autor e dele foi vizinho durante vários anos. Trabalhou com ele de 1995 à 1999 na lavoura de cana e no final desse período o autor começou a se sentir mal durante o trabalho, chegando até a desmaiar durante o serviço. Ele precisou se afastar-se do trabalho. Não sabe quem provê a subsistência do autor atualmente, já que não é mais seu vizinho. Pode afirmar que ele passou a apresentar crises de saúde com frequência, mas não todos os dias. Sabe ainda que o autor toma medicamentos".
AVELINO MOREIRA DOS SANTOS asseverou que "conhece o autor há 9 anos e desde então ele passou a apresentar problemas de saúde e crises com desmaios. Várias vezes presenciou o autor desmaiado na rua. Sabe que ele trabalhava na lavoura de cana e nesse serviço utilizava facão e enxadão. Não sabe quem provê a subsistência do autor, pois atualmente ele não trabalha".
Diante da prova oral, tem-se que a partir de 1999 (série de convulsões e desmaios), quando era o autor segurado junto ao RGPS, se iniciaram obstáculos ao exercício de trabalho remunerado, o que revela ser indevida a cessação de benefício de auxílio-doença em 14/04/2002, consoante informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, que ora seguem anexas a esta decisão.
Ademais, se me afigura pouco crível que, após pouco mais de 2 (dois) anos percebendo o referido benefício, entre 24/01/2000 e 14/04/2002, o autor tenha se tornado apto para o trabalho, sobretudo, em razão da gravidade da moléstia da qual é portador - "epilepsia" e de seu caráter degenerativo, tendo o próprio expert consignado que essa moléstia pode se agravar com o tempo (fl. 159).
Portanto, reconhecida a qualidade de segurado no momento do início da incapacidade (DII) e de sua persistência após a cessação de benefício precedente, de rigor o restabelecimento do auxílio-doença, se não for caso de sua conversão em aposentadoria por invalidez. No entanto, haja vista a não interposição de recurso pela parte autora, e, em estrita observância do principio da "non reformatio in pejus", de rigor a manutenção do auxílio-doença.
Alie-se que, o fato de o demandante continuar trabalhando, de forma esporádica, após o cancelamento do beneplácito, conforme consta do seu CNIS, não permite a desconsideração da conclusão do perito judicial. Ao contrário, o fato de ter vínculos de trabalho de curta duração corrobora a sua dificuldade de reinserção no mercado profissional e o equívoco na cassação de benefício precedente.
Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a ausência da remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não consegue exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade temporária ou definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada, após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação e na necessidade de devolução das parcelas recebidas durante o período que o segurado auferiu renda. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária de lhe conceder o benefício vindicado, por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual.
Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime. Neste sentido já decidiu esta Corte, conforme arestos a seguir reproduzidos:
Acerca da data de início do benefício (DIB), o entendimento consolidado do E. STJ é de que, "ausente requerimento administrativo no INSS, o termo inicial para a implantação da aposentadoria por invalidez concedida judicialmente será a data da citação válida" (Súmula 576).
No entanto, a DIB deve ser mantida tal e qual fixada na sentença, ante o princípio da "non reformatio in pejus".
Em atenção à remessa necessária, os juros de mora devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Já a correção monetária dos valores em atraso também deverá ser calculada de acordo com Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Por fim, ressalto que, segundo informações obtidas junto ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, o autor veio a falecer em 16/10/2008.
Assim sendo, a execução dos atrasados ficará condicionada à habilitação dos dependentes ou herdeiros, sob pena de extinção da execução, iniciando-se a contagem do prazo prescricional, eis que, com o falecimento do autor, extinguiu-se também o contrato de mandato e, com isso, eventuais poderes especiais para o recebimento dos valores apurados na fase de liquidação, à exceção da verba honorária, que pertence aos patronos do demandante.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e conheço da remessa necessária para dar-lhe parcial provimento para fixar os juros de mora de acordo com os critérios estabelecidos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, e para determinar que a correção monetária dos valores em atraso seja calculada segundo o mesmo Manual, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009, mantendo, no mais, a r. sentença de 1º grau.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 23/08/2017 10:57:35 |
