Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2023905 / SP
0038940-97.2014.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
09/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/09/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA TIDA POR
INTERPOSTA. SENTENÇA ULTRA PETITA. ANULAÇÃO. ATIVIDADE RURAL.
COMPROVAÇÃO. ESPECIALIDADE NÃO COMPROVADA. CERTIDÃO DE TEMPO DE
SERVIÇO DEVIDA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. REMESSA NECESSÁRIA PROVIDA.
SENTENÇA ANULADA. PEDIDO INICIAL PARCIALMENTE PROCEDENTE. APELAÇÃO DO
INSS PREJUDICADA.
1 - No caso, o INSS foi condenado a reconhecer período de labor rural e a conceder, se
preenchidos os requisitos, o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
2 - Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e
sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula
490 do STJ.
3 - Fixados os limites da lide pela parte autora, veda-se ao magistrado decidir além (ultra petita),
aquém (citra petita) ou diversamente do pedido (extra petita), consoante art. 492 do CPC/2015.
4 - In casu, configurado está, primeiramente, o julgamento ultra petita, eis que, conquanto a
parte autora tenha postulado a expedição de "Certidão de Tempo de Serviço", mediante o
reconhecimento de labor rural não registrado em CTPS, bem como a sua especialidade, a r.
sentença reconheceu o tempo de serviço e condenou o INSS a conceder o benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição, se preenchidos os requisitos necessários. Ademais, a
d. Juíza a quo ao condicionar a providência concessória à presença de requisitos a serem
averiguados pelo próprio INSS, proferiu sentença condicional.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
5 - Dessa forma, não foi analisado o pedido formulado na inicial, restando violado o princípio da
congruência, insculpido no art. 460 do CPC/73, atual art. 492 do CPC/2015.
6 - O caso, entretanto, não é de remessa dos autos à Primeira Instância, uma vez que a
legislação autoriza expressamente o julgamento imediato do processo, quando presentes as
condições para tanto. É o que se extrai do art. 1.013, § 3º, II, do Código de Processo Civil em
vigor.
7 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
8 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
9 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
10 - É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91.
11 - Pretende a parte autora o reconhecimento do labor rural no período de 20/12/1976 a
18/01/1987.
12 - Os documentos "b", "c" "d", "e", "j" e "k" não podem ser admitidos como início de prova
material, uma vez que ou não apresentam a qualificação do autor e de seus genitores, ou não
se compreendem no período que se pretende ver reconhecido. No entanto, os demais
documentos são suficientes para a configuração do início de prova material exigido. Como se
vê dos elementos de prova carreados autos, o autor traz documentos, em que apenas seu pai é
qualificado como lavrador. Nesse particular, entende-se que a extensão de efeitos em
decorrência de documento de terceiro - familiar próximo - é viável apenas quando se trata de
agricultura de subsistência, em regime de economia familiar, o que é o caso dos autos.
13 - Em audiências realizadas em 15/05/2012 (fls. 46/47) e em 20/06/2012 (fl. 106), a prova
testemunhal (fls. 59/63 e 109/110-verso) corroborou o labor rural da parte autora.
14 - Dessa forma, é possível o reconhecimento do labor rural da parte autora entre 20/12/1978
(data em que a parte autora completou 12 anos) a 18/01/1987.
15 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
16 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais. Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade
laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por
qualquer modalidade de prova.
17 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador.
18 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
18 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
19 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
20 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
21 - No caso dos autos, a parte autora pretende ver reconhecida a especialidade do período
laborado na lavoura, em regime de economia familiar. Entretanto, não é possível constatar a
especialidade do labor, uma vez que não há nos autos prova de exposição a qualquer agente
agressivo, bem como não é a atividade da parte autora prevista na legislação que rege a
matéria (ressalte-se que o autor não é trabalhador em empresa agropecuária), o que inviabiliza
o reconhecimento da especialidade por enquadramento profissional.
22 - Conclui-se que faz jus o demandante à expedição da "Certidão de Tempo de Serviço", com
o tempo de serviço comum de 20/12/1978 a 18/01/1987.
23 - Sagrou-se vitoriosa a parte autora ao ver reconhecida parte do período rural vindicado. Por
outro lado, não foi reconhecida a especialidade da atividade, restando vencedora nesse ponto a
autarquia. Desta feita, os honorários advocatícios são compensados entre as partes, ante a
sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixa-se de condenar qualquer delas no
reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça
gratuita e o INSS delas isento.
24 - Remessa necessária, tida por interposta, provida. Sentença anulada. Pedido inicial
parcialmente procedente. Apelação do INSS prejudicada.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa
necessária, tida por interposta, para anular a r. sentença de 1º grau, por se tratar de sentença
ultra petita e dar parcial provimento ao pedido inicial, restando prejudicada a apelação do INSS,
nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
