Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5212252-53.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal TORU YAMAMOTO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/03/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 01/04/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO/PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL NÃO APLICÁVEL. PRELIMINAR
REJEITADA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE/INCONSISTENTE. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO
DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE
PROVIDA.
1. Em sede preliminar, observo ser inaplicável a disposição sobre o reexame necessário ao caso
em tela, vez que o disposto no parágrafo 3º do artigo 496 do CPC atual dispensa do reexame
necessário o caso em questão, por se tratar de direito controvertido inferior ao limite previsto no
citado dispositivo legal.
2. Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento da
idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de contribuições
para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48 e 142 da Lei
8.213/91.
3. Por fim, verifico que, por meio de acórdão publicado no DJe 04/09/2019 (Resp 1.674.221/PR),
a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento sob o rito dos recursos
repetitivos, fixou a seguinte tese em relação ao Tema Repetitivo 1.007: "O tempo de serviço rural,
ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado
para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não
tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do artigo 48, parágrafo 3º, da
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou
o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento
administrativo", de modo a possibilitar o regular prosseguimento deste feito, que se encontrava
com o andamento processual suspenso em razão de questão agora dirimida em sede de recursos
repetitivos.
4. Entendo que a documentação trazida aos autos é parca e não comprova, adequadamente, o
alegado exercício de atividade campesina da autora, tanto como diarista, como em regime de
economia familiar. E a prova testemunhal, por sua vez, contrariou parcialmente as alegações
trazidas na exordial. A petição inicial indica que a autora, antes de se casar, teria laborado, como
diarista, com seus genitores, para diversos sitiantes da cidade de Clementina, situação diversa da
relatada pelas testemunhas, que afirmaram que seus pais seriam, em realidade, meeiros em
lavoura de café, no sítio de um “japonês”. Quanto ao período posterior ao casamento da
demandante, há também inconsistências relevantes. Na exordial, a autora disse que, depois de
casada (em 1966), começou a laborar em regime de economia familiar, tendo ido morar e tocar
roça no Sítio São José, no município de Parapuã/SP, onde o esposo já seria parceiro rural no
café e amendoim, onde permaneceram até 1978, quando então foram para a cidade. No entanto,
a Certidão de Casamento do casal diz que ambos seriam residentes em Clementina/SP na
ocasião do enlace matrimonial; a Certidão de Nascimento da filha Fátima (em 1967) diz que
ambos seriam residentes em Rinópolis/SP; a Certidão de Nascimento da filha Valéria (em 1969)
diz que ela nasceu em Parapuã/SP e a Certidão da filha Renata (em 1975) diz que ambos seriam
residentes em Clementina/SP. Observe-se, ainda que, em nenhum desses documentos, ela
chegou a ser qualificada como “trabalhadora rural”. O contrato de parceria alegado não foi
apresentado e é duvidosa a tese de que o casal teria morado e trabalhado no Sítio São José, por
todo o período indicado, já que os demais documentos só são capazes de indicar a presença do
esposo da autora no local em 1973. Em 1975, está comprovado que ele trabalharia no Sítio São
Joaquim, em Clementina (ID 30388552 - Pág. 8). E a Certidão de Nascimento da filha Cássia,
nascida em 1972, foi omitida no processado (ID 30388552 - Pág. 10). As inconsistências são, de
fato, inúmeras, o que torna de pouca credibilidade a versão trazida na petição inicial. Dessa
forma, considerando a insuficiência e inconsistência do conjunto probatório, entendo que a
reforma da r. sentença, com a improcedência do pleito inaugural, seria medida imperativa.
5. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
6. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5212252-53.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GLECY CARRETO FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: RAFAEL MARQUEZINI - SP319657-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5212252-53.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GLECY CARRETO FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: RAFAEL MARQUEZINI - SP319657-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra a r. sentença de primeiro grau que julgou
procedente o pedido inaugural para reconhecer que a autora trabalhou em atividade rural, no
período compreendido entre 05/09/1958 à 06/07/1978 sem registro em carteira, e condenou o
INSS a proceder a averbação do mencionado período rural, bem como a conceder em favor dela
a aposentadoria por idade híbrida, mais abono anual, a partir da data do requerimento
administrativo, com pagamento das prestações em atraso de uma só vez, acrescidas de correção
monetária, e juros de mora de 1% ao mês, contados da data em que seriam devidas, sendo o
valor do benefício calculado de acordo com a lei, nos termos do artigo 48, §4º da Lei nº 8.213/91.
Condenou a Autarquia Previdenciária ao pagamento de honorários advocatícios, estes fixados em
10% do valor da condenação, isentando-a do pagamento de custas processuais.
Sentença não submetida ao reexame necessário.
Sustenta a Autarquia apelante, em suas razões recursais e em apertada síntese, que a parte
autora não preencheu os requisitos necessários à concessão da benesse pretendida, motivando
as razões de sua insurgência, requerendo, preliminarmente, a submissão do feito ao reexame
necessário. Postula, nesses termos, a reforma da r. sentença para julgar improcedente o pleito
inaugural. Efetuou, ainda, diversos pedidos subsidiários.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5212252-53.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 23 - DES. FED. TORU YAMAMOTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GLECY CARRETO FERNANDES
Advogado do(a) APELADO: RAFAEL MARQUEZINI - SP319657-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Toru Yamamoto (Relator):
Verifico, em juízo de admissibilidade, que o recurso ora analisado mostra-se formalmente regular,
motivado (artigo 1.010 CPC) e com partes legítimas, preenchendo os requisitos de adequação
(art. 1009 CPC) e tempestividade (art. 1.003 CPC). Assim, presente o interesse recursal e
inexistindo fato impeditivo ou extintivo, recebo-o e passo a apreciá-lo nos termos do artigo 1.011
do Código de Processo Civil.
Em sede preliminar, observo ser inaplicável a disposição sobre o reexame necessário ao caso em
tela, vez que o disposto no parágrafo 3º do artigo 496 do CPC atual dispensa do reexame
necessário o caso em questão, por se tratar de direito controvertido inferior ao limite previsto no
citado dispositivo legal, conforme se verifica abaixo, in verbis:
"Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de
confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas
autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1o Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará a
remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-á.
§ 2o Em qualquer dos casos referidos no § 1o, o tribunal julgará a remessa necessária.
§ 3o Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico obtido
na causa for de valor certo e líquido inferior a:
I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito
público;
II - 500 (quinhentos) salários-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas
autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;
III - 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e
fundações de direito público." (g.n.)
Por conseguinte, considerando os valores atrasados a que a parte autora eventualmente fará jus,
caso mantida a decisão guerreada, conclui-se que o valor da condenação, obviamente, não
ultrapassará 1000 (mil) salários-mínimos, o que permite a aplicação da regra constante do
dispositivo legal supracitado.
Desse modo, rejeito a preliminar arguida.
Passo à análise do mérito.
Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento da
idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de contribuições
para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48 e 142 da Lei
8.213/91.
Cumpre ressaltar que, com o advento da Lei nº 10.666, de 08 de maio de 2003, a perda da
qualidade de segurado se tornou irrelevante para a concessão da aposentadoria por idade, desde
que o segurado já conte com o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de
carência, na data de requerimento do benefício.
"Art. 3º: A perda da qualidade do segurado não será considerada para a concessão das
aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§1º Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será
considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o
tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento
do benefício.
§2º A concessão do benefício de aposentadoria por idade, nos termos do §1º, observará, para os
fins de cálculo do valor do benefício, o disposto no art. 3º, caput e §2°, da Lei nº 9.876, de 26 de
novembro de 1999, ou, não havendo salários de contribuição recolhidos no período a partir da
competência julho de 1994, o disposto no art. 35 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991."
Muito embora o art. 3º, §1º, da Lei 10.666/2003 estabeleça que o segurado conte com no mínimo
o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do
requerimento do benefício, a Jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça entende que
a carência exigida deve levar em conta a data em que o segurado implementou as condições
necessárias à concessão do benefício e não a data do requerimento administrativo.
Nesse sentido, trago à colação o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 142 DA LEI Nº
8.213/91. PERÍODO DE CARÊNCIA. PREENCHIMENTO. PERDA DA QUALIDADE DE
SEGURADO. ATENDIMENTO PRÉVIO DOS REQUISITOS. BENEFÍCIO DEVIDO.
1. Na forma da atual redação do art. 142 da Lei nº 8.213/91, alterado pela Lei nº 9.032/95, a
carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá à tabela ali
prevista, mas levando-se em consideração o ano em que o segurado implementou as condições
necessárias à concessão do benefício e não a data do requerimento administrativo.
2. Aplica-se ao caso o art. 102, § 1º, da Lei nº 8.213/91, que dispõe que a perda da qualidade de
segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos
todos os requisitos segundo a legislação então em vigor (arts. 52 e 53 da Lei nº 8.213/91).
3. Recurso especial provido."
(REsp. nº 490.585/PR, Relator o Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, DJU de 23/8/2005).
O artigo 24 da Lei nº 8.213/1991 dispõe que: "Período de carência é o número mínimo de
contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas
a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências."
Por seu turno, o art. 25, inciso II, da referida Lei estabelece que:
"A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos
seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:
(...)
II - aposentadoria por idade, aposentadoria por tempo de serviço e aposentadoria especial: 180
contribuições mensais."
Porém, para os segurados inscritos na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, o art.
142 da Lei nº 8.213/1991, trouxe uma regra de transição, consubstanciada em uma tabela
progressiva de carência, de acordo com o ano em que foram implementadas as condições para a
aposentadoria por idade.
Deve-se observar que para aferir a carência a ser cumprida deverá ser levada em consideração a
data em que foi implementado o requisito etário para a obtenção do benefício e não aquele em
que a pessoa ingressa com o requerimento de aposentadoria por idade junto ao Instituto Nacional
do Seguro Social.
Trata-se de observância do mandamento constitucional de que todos são iguais perante a lei (art.
5º, caput, da Constituição Federal). Se, por exemplo, aquele que tivesse preenchido as condições
de idade e de carência, mas que fizesse o requerimento administrativo posteriormente seria
prejudicado com a postergação do seu pedido, já que estaria obrigado a cumprir um período
maior de carência do que aquele que o fizesse no mesmo momento em que tivesse completado a
idade mínima exigida, o que obviamente não se coaduna com o princípio da isonomia, que requer
que pessoas em situações iguais sejam tratadas da mesma maneira.
Por outro lado, no caso de cumprimento do requisito etário, mas não da carência, o aferimento
desta, relativamente à aposentadoria por idade, será realizado quando do atingimento da idade
esperada, ainda que, naquele momento a pessoa não tivesse completado a carência necessária.
Nessa situação, o próprio adiamento da possibilidade de obtenção do benefício para o momento
em que fosse cumprida a carência exigida no artigo 142 da Lei de Benefícios Previdenciários já
estabeleceria diferença entre aquele que cumpriu a carência no momento em que completara a
idade mínima, não havendo que se falar em necessidade de qualquer prazo adicional.
Corroborando este entendimento, cito a Súmula nº 02 da Turma Regional de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais da 4ª Região, que assim dispôs: Para a concessão da aposentadoria
por idade, não é necessário que os requisitos da idade e da carência sejam preenchidos
simultaneamente.
Anoto, por oportuno, que a edição da Lei nº 11.718, de 20 de junho de 2008, promoveu uma
alteração no art. 48 da Lei 8.213/91, que possibilitou a contagem mista do tempo de labor rural e
urbano para fins de concessão de aposentadoria por idade, com a majoração do requisito etário
mínimo para 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, respectivamente, para mulheres e
homens.
Trago à colação a redação mencionada, in litteris:
"§2º: Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o
efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente
anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição
correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os
incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei.
§3º: Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no §
2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de
contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65
(sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher.
§4º: Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de
acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-
de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-
contribuição da Previdência Social." (g.n.)
Por fim, verifico que, por meio de acórdão publicado no DJe 04/09/2019 (Resp 1.674.221/PR), a
Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento sob o rito dos recursos
repetitivos, fixou a seguinte tese em relação ao Tema Repetitivo 1.007: "O tempo de serviço rural,
ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado
para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não
tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do artigo 48, parágrafo 3º, da
Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou
o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento
administrativo", de modo a possibilitar o regular prosseguimento deste feito, que se encontrava
com o andamento processual suspenso em razão de questão agora dirimida em sede de recursos
repetitivos.
Feitas tais considerações, passo à análise dos requisitos necessários. A idade mínima de 60 anos
exigida para a obtenção do benefício foi atingida pela parte autora em 2006, haja vista haver
nascido em 05/09/1946, segundo atesta sua documentação. Desse modo, necessária agora a
comprovação da carência no montante de 150 meses, conforme redação dada ao art. 142 da Lei
8.213/91, após sua modificação pela Lei 9.032/95.
Com relação ao labor rural, a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente
apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na forma da
Súmula 149 - STJ, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à com provação da atividade rurícola, para efeito
de obtenção de benefício previdenciário.".
Ainda de acordo com a jurisprudência, necessária demonstração razoável de início de prova
material, a ser corroborada por prova testemunhal, atentando-se, dentre outros aspectos, que, em
regra, são extensíveis aos postulantes rurícolas os documentos em que os genitores, os
cônjuges, ou os conviventes, aparecem qualificados como lavradores.
Vale destacar, ainda, que início de prova material não significa completude, mas elemento
indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica discutida, desde que associada a
outros dados probatórios.
Cumpre salientar, por derradeiro, que o trabalho campesino exercido em regime de economia
familiar pressupõe a exploração de atividade primária pelo indivíduo, como principal forma de
sustento, acompanhado ou não pelo grupo familiar, mas sem o auxílio de empregados (art. 11,
VII, "a" e § 1º, da Lei 8.213/91). Assim, nos termos do art. 11, VII, da Lei 8.213/91, consideram-se
segurados especiais, em regime de economia familiar, os produtores, parceiros, meeiros,
arrendatários rurais, pescadores artesanais e assemelhados, que exerçam atividades
individualmente ou com auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou
companheiros e filhos, ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o
grupo familiar respectivo, residindo na área rural ou em imóvel próximo ao local onde a atividade
rural é exercida e com participação significativa nas atividades rurais do grupo familiar, em área
não superior a quatro módulos fiscais.
Na exordial, a parte autora, que percebe pensão por morte instituída por se falecido esposo
desde1994, alega, in litteris:
“(...)
A Autora nasceu em 05 de setembro de 1946. Conta, portanto, com 71 anos de idade (doc.
anexo).
Aos 12 anos, a Requerente começou a trabalhar na lavoura de café com os pais, como diaristas,
para diversos sitiantes do Bairro Taboleta, Zona Rural pertencente ao Município de
Clementina/SP, onde moravam.
Ademais, em 21/05/1966, com 19 anos, a Postulante se casou com Domingos Aldemir
Fernandes, também lavrador, com o qual foi morar e tocar roça no Sítio São José, no município
de Parapuã/SP, onde o esposo era parceiro rural no café e amendoim (notas do produtor rural
anexas).
De se consignar que citada situação se manteve inalterada até 06/07/1978, dia anterior ao
primeiro registro urbano do marido (CTPS anexa), ocasião em que a família passou a residir na
cidade e abandonou as lides rurais.
Nesse diapasão, tem-se que a Autora foi segurada especial entre, pelo menos: 05/09/1958 e
06/07/1978, ou seja, por quase 20 anos.
Dito isso, cumpre registrar que, conforme comprova a CTPS ora ofertada, a Demandante
trabalhou registrada nos seguintes períodos:
• 15/09/1978 e 25/08/1980;
• 02/10/1980 e 02/10/1981.
Além disso, conforme faz prova o CNIS anexo, ela verteu contribuições como “segurada
facultativa e individual” nos seguintes interregnos:
• 01/12/2011 e 31/12/2011;
• 01/02/2012 e 30/04/2012.
Frisa-se, por fim, que Autora completou 60 anos em 2006, sendo sua carência, a teor do que
dispõe o art. 142 da Lei n.º 8.213/91, de 150 meses.
Sendo notório o preenchimento dos requisitos necessários à concessão de Aposentadoria por
Idade, a Requerente, em 23/01/2017, postulou, junto ao INSS, o NB 179.253.108-4, o qual, no
entanto, foi indeferido sob o fundamento de que o exercício da atividade rural e a respectiva
carência não foram comprovados (Dec. junt).
Entendendo fazer jus ao benefício mencionado, a Autora bate às portas do Judiciário, buscando a
satisfação de seu direito.
(...)”
No caso dos autos, a parte autora apresentou, como início de prova material da alegada atividade
campesina, os seguintes documentos, por ela assim descritos na peça inaugural:
“(...)
In casu, objetivando comprovar o exercício de atividade rural (para posterior soma ao tempo
urbano), a Postulante oferta os seguintes documentos:
• EM NOME DO PAI:
Documentação Escolar da Autora, onde seu genitor (Sr. Joaquim Carreto) foi qualificado como
LAVRADOR e consta que o domicílio da Família era na Zona Rural de Clementina/SP.
• EM NOME DO MARIDO:
Certidão de Casamento da Requerente, datada de 21/05/1966, onde seu esposo (Sr. Domingos
Aldemir Fernandes) foi qualificado como LAVRADOR;
Certidões de Nascimento das filhas da Postulante, dos anos de 1967, 1969 e 1975, onde seu
marido voltou a ser qualificados como LAVRADOR;
Notas do Produtor Rural e de Notas Fiscais, em nome do esposo, dos anos de 1973,
comprovando a comercialização de produtos agrícolas, bem assim a qualidade de Parceiro do
mesmo do Sítio São José, no município de Parapuã/SP;
Orçamento Bancário para Custeio Agrícola, referente ao ano de 1975;
Declaração de Rendimentos, do ano de 1975, onde o esposo está qualificado como
AGRICULTOR;
Título de Eleitor, onde o cônjuge foi qualificado como LAVRADOR;
CTPS do marido, demonstrando que ele só passou a exercer atividade urbana a partir de
07/07/1978.
• EM NOME DA AUTORA:
CTPS da Demandante, comprovante que seu primeiro vínculo formal de emprego foi em
15/09/1978, o que também corrobora sua afirmação de que, até meados de referido ano, foi
TRABALHADORA RURAL.
(...)”
Quanto à prova oral, assim restou produzida:
- Testemunha FRANCISCO CORREIA LIMA:
“ÀS DE COSTUME DISSE NADA. COMPROMISSADA E INQUIRIDA PELA MERITÍSSIMA JUÍZA
DE DIREITO, NA FORMA E SOB AS PENAS DA LEI RESPONDEU: Conhece a autora desde
que ela tem 10 anos. Ela começou a trabalhar na roça com a família, com 109 anos de idade, em
lavoura de café, No Bairro Tabuleto, perto de Clementina. O sítio era de um japonês. Via a autora
trabalhando na roça pois trabalhava perto dela. A autora trabalhava na roça 5 dias por semana. A
autora trabalhou na roça até se casar. Depois que se casou a autora se mudou para Parapuã
onde trabalhou na roça de café. Em seguida ela foi para o sítio do Lontra também trabalhando em
lavoura de café. A autora trabalhou na roça até 1980 quando se mudou para São Paulo. Eles não
tinham empregados. DADA A PALAVRA AO(A) DR(A). PATRONO(A) DO(A) REQUERENTE
NADA FOI REPERGUNTADO. DADA A PALAVRA AO DR. PATRONO DO REQUERIDO NADA
FOI REPERGUNTADO. NADA MAIS.”.
- Testemunha JOSÉ SOARES DE AZEVEDO FILHO:
“ÀS DE COSTUME DISSE NADA. COMPROMISSADA E INQUIRIDA PELA MERITÍSSIMA JUÍZA
DE DIREITO, NA FORMA E SOB AS PENAS DA LEI RESPONDEU: Conhece a autora desde
que ela tinha 10 anos de idade. A autora começou a trabalhar na roça com 10 anos com a família
no sítio de um japonês. Eles eram meeiros em lavoura de café. Via a autora trabalhando pois
morava perto dela. A autora trabalhava na roça todos os dias da semana. O pai da autora não
tinha empregados. Depois que se casou a autora continuou trabalhando na roça em Parapuã em
lavoura de café. Depois a autora se mudou para o Bairro do Lontra onde o pai dela comprou uma
propriedade e lá também trabalhou na lavoura de café. A autora trabalhou na roça até completar
28 ou 30 anos de idade. DADA A PALAVRA AO(A) DR(A). PATRONO(A) DO(A) REQUERENTE
FOI REPERGUNTADO: Viu a autora trabalhando em Parapuã. Os pais da autora se chamavam
Joaquim e Teresa. O sítio do Lontra ficava há 5 quilometros de onde o depoente morava. Depois
que a autora se casou a viu trabalhando. DADA A PALAVRA AO DR. PATRONO DO
REQUERIDO NADA FOI REPERGUNTADO. NADA MAIS.”.
(...)”
Pois bem.
Entendo que a documentação trazida aos autos é parca e não comprova, adequadamente, o
alegado exercício de atividade campesina da autora, tanto como diarista, como em regime de
economia familiar. E a prova testemunhal, por sua vez, contrariou parcialmente as alegações
trazidas na exordial.
A petição inicial indica que a autora, antes de se casar, teria laborado, como diarista, com seus
genitores, para diversos sitiantes da cidade de Clementina, situação diversa da relatada pelas
testemunhas, que afirmaram que seus pais seriam, em realidade, meeiros em lavoura de café, no
sítio de um “japonês”.
Quanto ao período posterior ao casamento da demandante, há também inconsistências
relevantes. Na exordial, a autora disse que, depois de casada (em 1966), começou a laborar em
regime de economia familiar, tendo ido morar e tocar roça no Sítio São José, no município de
Parapuã/SP, onde o esposo já seria parceiro rural no café e amendoim, onde permaneceram até
1978, quando então foram para a cidade. No entanto, a Certidão de Casamento do casal diz que
ambos seriam residentes em Clementina/SP na ocasião do enlace matrimonial; a Certidão de
Nascimento da filha Fátima (em 1967) diz que ambos seriam residentes em Rinópolis/SP; a
Certidão de Nascimento da filha Valéria (em 1969) diz que ela nasceu em Parapuã/SP e a
Certidão da filha Renata (em 1975) diz que ambos seriam residentes em Clementina/SP.
Observe-se, ainda que, em nenhum desses documentos, ela chegou a ser qualificada como
“trabalhadora rural”. O contrato de parceria alegado não foi apresentado e é duvidosa a tese de
que o casal teria morado e trabalhado no Sítio São José, por todo o período indicado, já que os
demais documentos só são capazes de indicar a presença do esposo da autora no local em 1973.
Em 1975, está comprovado que ele trabalharia no Sítio São Joaquim, em Clementina (ID
30388552 - Pág. 8). E a Certidão de Nascimento da filha Cássia, nascida em 1972, foi omitida no
processado (ID 30388552 - Pág. 10). As inconsistências são, de fato, inúmeras, o que torna de
pouca credibilidade a versão trazida na petição inicial.
Dessa forma, considerando a insuficiência e inconsistência do conjunto probatório, entendo que a
reforma da r. sentença, com a improcedência do pleito inaugural, seria medida imperativa.
Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP).
Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito previdenciário da parte autora,
a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários fixados em R$ 1.000,00 (mil reais), cuja
exigibilidade observará o disposto no artigo 12 da Lei nº 1.060/1950 (artigo 98, § 3º, do Código de
Processo Civil/2015), por ser beneficiária da justiça gratuita.
Por esses fundamentos, rejeito a preliminar e dou parcial provimento à apelação do INSS,
extinguindo o processo nos termos do artigo 485, IV, do CPC, conforme ora consignado.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO/PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL NÃO APLICÁVEL. PRELIMINAR
REJEITADA. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE/INCONSISTENTE. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO
DE MÉRITO. RESP REPETITIVO 1352721/SP. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE
PROVIDA.
1. Em sede preliminar, observo ser inaplicável a disposição sobre o reexame necessário ao caso
em tela, vez que o disposto no parágrafo 3º do artigo 496 do CPC atual dispensa do reexame
necessário o caso em questão, por se tratar de direito controvertido inferior ao limite previsto no
citado dispositivo legal.
2. Para a percepção de Aposentadoria por Idade, o segurado deve demonstrar o cumprimento da
idade mínima de 65 anos, se homem, e 60 anos, se mulher, e número mínimo de contribuições
para preenchimento do período de carência correspondente, conforme artigos 48 e 142 da Lei
8.213/91.
3. Por fim, verifico que, por meio de acórdão publicado no DJe 04/09/2019 (Resp 1.674.221/PR),
a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça – STJ, em julgamento sob o rito dos recursos
repetitivos, fixou a seguinte tese em relação ao Tema Repetitivo 1.007: "O tempo de serviço rural,
ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado
para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não
tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do artigo 48, parágrafo 3º, da
Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou
o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento
administrativo", de modo a possibilitar o regular prosseguimento deste feito, que se encontrava
com o andamento processual suspenso em razão de questão agora dirimida em sede de recursos
repetitivos.
4. Entendo que a documentação trazida aos autos é parca e não comprova, adequadamente, o
alegado exercício de atividade campesina da autora, tanto como diarista, como em regime de
economia familiar. E a prova testemunhal, por sua vez, contrariou parcialmente as alegações
trazidas na exordial. A petição inicial indica que a autora, antes de se casar, teria laborado, como
diarista, com seus genitores, para diversos sitiantes da cidade de Clementina, situação diversa da
relatada pelas testemunhas, que afirmaram que seus pais seriam, em realidade, meeiros em
lavoura de café, no sítio de um “japonês”. Quanto ao período posterior ao casamento da
demandante, há também inconsistências relevantes. Na exordial, a autora disse que, depois de
casada (em 1966), começou a laborar em regime de economia familiar, tendo ido morar e tocar
roça no Sítio São José, no município de Parapuã/SP, onde o esposo já seria parceiro rural no
café e amendoim, onde permaneceram até 1978, quando então foram para a cidade. No entanto,
a Certidão de Casamento do casal diz que ambos seriam residentes em Clementina/SP na
ocasião do enlace matrimonial; a Certidão de Nascimento da filha Fátima (em 1967) diz que
ambos seriam residentes em Rinópolis/SP; a Certidão de Nascimento da filha Valéria (em 1969)
diz que ela nasceu em Parapuã/SP e a Certidão da filha Renata (em 1975) diz que ambos seriam
residentes em Clementina/SP. Observe-se, ainda que, em nenhum desses documentos, ela
chegou a ser qualificada como “trabalhadora rural”. O contrato de parceria alegado não foi
apresentado e é duvidosa a tese de que o casal teria morado e trabalhado no Sítio São José, por
todo o período indicado, já que os demais documentos só são capazes de indicar a presença do
esposo da autora no local em 1973. Em 1975, está comprovado que ele trabalharia no Sítio São
Joaquim, em Clementina (ID 30388552 - Pág. 8). E a Certidão de Nascimento da filha Cássia,
nascida em 1972, foi omitida no processado (ID 30388552 - Pág. 10). As inconsistências são, de
fato, inúmeras, o que torna de pouca credibilidade a versão trazida na petição inicial. Dessa
forma, considerando a insuficiência e inconsistência do conjunto probatório, entendo que a
reforma da r. sentença, com a improcedência do pleito inaugural, seria medida imperativa.
5. Contudo, de acordo com o atual entendimento adotado pelo STJ: "A ausência de conteúdo
probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa."
(REsp 1352721/SP). Impõe-se, por isso, face à ausência de prova constitutiva do direito
previdenciário da parte autora, a extinção do processo sem julgamento do mérito.
6. Preliminar rejeitada. Apelação do INSS parcialmente provida. Processo extinto. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar e dar parcial provimento à apelação do INSS,
extinguindo o processo nos termos do artigo 485, IV, do CPC, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
