Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5003766-29.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal JOAO BATISTA GONCALVES
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
08/08/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 13/08/2020
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, §
3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-
DOENÇA. TRABALHADOR RURAL. LEI 8.213/1991. AUSÊNCIA DE EFICAZ PRINCÍPIO DE
PROVA MATERIAL DO LABOR CAMPESINO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO
DE MÉRITO. ARTIGOS 485, IV, E 320, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
- A hipótese em exame não excede 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, cumprida a carência mínima, quando
exigida, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício
de atividade que lhe garanta a subsistência, ao passo que o auxílio-doença destina-se àquele que
ficar temporariamente incapacitado para o exercício de sua atividade habitual.
- No que tange ao cumprimento dacarência,o art. 39, I, da Lei nº 8.213/91 assegura a concessão
de aposentadoria por invalidezou auxílio doença ao trabalhador rural, desde que comprove o
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, pelo período de 12 (doze) meses, correspondentes à carência dos
aludidos benefícios.
- A despeito da qualificação da autora na presente demanda, como trabalhadora rural, não há, na
espécie, início de prova material capaz de demonstrar o exercício do propalado labor campestre,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
apto a comprovar sua qualidade de segurado da Previdência Social e o cumprimento da carência,
na condição de rurícola, quando menos, por ocasião do requerimento administrativo, agilizado em
27/10/2014.
- A vagueza e imprecisão em torno dos períodos em que, de fato, a vindicante exerceu o alegado
afazer rural, agregado com atividades de natureza urbana, como empregada doméstica e caseira
em área rural, por ela declinadas na perícia, descaracteriza eventual condição de rurícola que
pudesse advir, por extensão, da qualificação do consorte posta na certidão de casamento.
Precedente do STJ, firmado em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp n.º 1.304.479/SP).
- O ofício de caseiro ostenta natureza urbana, conforme doutrina e jurisprudência, por se tratar de
situação parelha à do empregado doméstico.
- Na espécie, não se pode extrair, dos dados cadastrais da certidão emitida pela justiça eleitoral,
a eficácia probante que se pretende, à míngua de outras provas que os corroborem, visto que
aludidos dados são preenchidos de acordo com declaração efetivada pelo próprio requerente,
"sem valor probatório", conforme expressa advertência ali contida, salientando-se, no mais, que
nem se sabe, ao certo, se, àquela altura, a autora havia deixado seus afazeres laborais, em
decorrência da incapacidade que aduz ter se instalado.
- Não se pode olvidar do advento de precedente oriundo do c. Superior Tribunal de Justiça (Resp
201202342171, Napoleão Nunes Maia Filho, STJ - Corte Especial, DJE 28/04/2016), tirado na
sistemática dos recursos representativos de controvérsia, precisamente o REsp nº 1.352.721/SP,
no âmbito do qual se deliberou que a falta de eficaz princípio de prova material do labor
campesino traduz-se em ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do
processo, abrindo ensejo à extinção do processo sem resolução de mérito. Entendimento que
vem sendo adotado pela e. Terceira Seção desta Corte.
- Condenação da parte autora em honorários advocatícios, fixados em 10% do valor atualizado da
causa, observando-se o disposto no art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
- Extinção do processo, sem resolução do mérito, nos termos dos artigos 485, IV, e 320, do
Código de Processo Civil, restando, em decorrência, prejudicados os recursos interpostos.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003766-29.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ALVINA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: ALCI FERREIRA FRANCA - MS6591-A
APELADO: ALVINA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ALCI FERREIRA FRANCA - MS6591-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003766-29.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALVINA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ALCI FERREIRA FRANCA - MS6591-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recursos de apelação interpostos pela parte autora e pelo INSS em face da r.
sentença, não submetida ao reexame necessário, que julgou parcialmente procedente o pedido
deduzido na inicial, condenando a Autarquia Previdenciária a conceder, àquela, o benefício de
auxílio-doença, a partir da data de entrada do requerimento administrativo, em 16/10/2014, pelo
prazo de 120 (cento e vinte) dias, discriminados os consectários, antecipados os efeitos da tutela
de mérito. O decisum condenou, ainda, o ente autárquico, ao pagamento dos atrasados,
acrescidos de correção monetária pelo INPC, juros de mora pelos índices aplicáveis à caderneta
de poupança, custas, despesas processuais e verba honorária arbitrada em 10% do valor da
condenação, antecipados os efeitos da tutela de mérito.
Pretende, a autora, que seja reformada a sentença, debatendo, em síntese, a presença dos
requisitos à outorga do benefício de aposentadoria por invalidez.
Por sua vez, postula, o INSS, preambularmente, a recepção do apelo no duplo efeito. No mérito,
sustenta a inexistência de prova material contemporânea, apta a comprovar a qualidade de
segurado especial da proponente, bem assim a ausência de incapacidade laboral. Insurge-se,
ainda, quanto ao termo inicial do benefício, correção monetária, juros de mora e custas
processuais. Suscita, por fim, o prequestionamento legal para efeito de interposição de recursos.
Com as contrarrazões da parte autora, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5003766-29.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 30 - DES. FED. BATISTA GONÇALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ALVINA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ALCI FERREIRA FRANCA - MS6591-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Afigura-se correta a não submissão da r. sentença à remessa oficial.
De fato, o art. 496, § 3º, inciso I do Código de Processo Civil atual, que entrou em vigor em 18 de
março de 2016, dispõe que a sentença não será submetida ao reexame necessário quando a
condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000
(mil) salários mínimos, em desfavor da União ou das respectivas autarquias e fundações de
direito público.
No caso dos autos, considero as datas dos termos inicial e final do benefício. Atenho-me ao teto
para o salário-de-benefício como parâmetro de determinação do valor da benesse. Verifico que a
hipótese em exame não excede os mil salários mínimos.
Não sendo, pois, o caso de submeter o decisum de primeiro grau à remessa oficial, passo à
análise do recurso em seus exatos limites, uma vez que cumpridos os requisitos de
admissibilidade previstos no Código de Processo Civil atual.
Discute-se, in casu, o direito da parte autora a benefício por incapacidade de trabalhador rural.
Nos termos do art. 42 da Lei n. 8.213/91, a aposentadoria por invalidez é devida ao segurado
que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz para o trabalho e
insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
Por sua vez, o auxílio-doença é devido ao segurado temporariamente incapacitado, nos termos
do disposto no art. 59 da mesma lei. Trata-se de incapacidade "não para quaisquer atividades
laborativas, mas para aquela exercida pelo segurado (sua atividade habitual)" (Direito da
Seguridade Social, Simone Barbisan Fortes e Leandro Paulsen, Livraria do Advogado e Esmafe,
Porto Alegre, 2005, pág. 128).
Assim, o evento determinante para a concessão desses benefícios é a incapacidade para o
trabalho de forma permanente e insuscetível de recuperação ou de reabilitação para outra
atividade que garanta a subsistência - aposentadoria por invalidez, ou a incapacidade temporária
- auxílio-doença, observados os seguintes requisitos: 1 - a qualidade de segurado; 2 -
cumprimento da carência de doze contribuições mensais - quando exigida; e 3 - demonstração de
que o segurado não era portador da alegada enfermidade ao filiar-se ao Regime Geral da
Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento
dessa doença ou lesão.
No que tange ao cumprimento dacarência,o art. 39, I, da Lei nº 8.213/91 assegura a concessão
de aposentadoria por invalidezou auxílio doença ao trabalhador rural, desde que comprove o
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, pelo período de 12 (doze) meses, correspondentes à carência dos
aludidos benefícios.
Realizada a perícia médica em 07/06/2017, o laudo coligido ao doc. 131917805, págs. 26/43,
considerou a autora, então, com 54 anos de idade, "escolaridade baixa" e que reportou o ofício de
trabalhadora rural, portadora de alterações degenerativas na coluna vertebral e nos ombros, com
as limitações próprias da idade, hipertensão arterial e obesidade.
De acordo com a conclusão do perito, as patologias diagnosticadas não acarretavam, àquela
altura, incapacidade laborativa à proponente.
Em nova perícia médica, procedida em 23/03/2018, por especialista em ortopedia, foi constatado,
ao exame, que a requerente é portadora de espondilodiscartrose lombar, torácica e cervical,
crônica e degenerativa, que a incapacita para o trabalho, de forma total temporária (doc.
131917805, págs. 76/88).
O expert estabeleceu a data de início da incapacidade, na data da perícia, sugerindo o
afastamento das atividades desempenhadas pela autora, por seis meses, a partir da perícia, para
adequado repouso e tratamento médico, visando à recuperação de sua capacidade funcional.
Conquanto os documentos acostados à exordial tragam diagnósticos idênticos aos inseridos nos
laudos periciais e atestem a inaptidão laboral da autora, por ocasião do requerimento
administrativo, agilizado em 27/10/2014 (doc. 131917804, págs. 13, 14, 17, 20 e 27), desimporta,
na hipótese, problematizar a questão em torno da data de início da incapacidade, visto que o
cumprimento dos requisitos pertinentes à carência e à sua qualidade de segurado, na condição
de trabalhadora rural, quando menos, por ocasião do aludido requerimento, não restou
devidamente comprovado.
Deveras, foram acostadas ao doc. 131917804, págs. 33 e 40, cópia da certidão de casamento da
proponente, celebrado em 24/05/1986, em que o cônjuge acha-se qualificado como lavrador, e
certidão emitida pela Justiça Eleitoral, em 26/11/2014, da qual se verifica haver a autora se
declarado como trabalhadora rural.
De se lembrar, a esta altura, que são extensíveis à mulher, a partir da celebração do matrimônio
ou do limiar da união estável, os documentos em que os cônjuges, ou conviventes, aparecem
qualificados como lavradores. Confira-se, a propósito: STJ, AGARESP 201402280175, Relatora
Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJE 11/12/2014.
Contudo, a própria autora declinou, ao segundo perito, histórico laboral de boia-fria, empregada
doméstica e caseira em área rural.
De se salientar que o ofício de caseiro ostenta natureza urbana, conforme doutrina e
jurisprudência, por se tratar de situação parelha à do empregado doméstico, conferindo-se
julgados desta Corte (AC n. 00052296720154039999, 7ª Turma, Relator Des. Fed. Paulo
Domingues, e-DJF3 Judicial 1, de 07/12/2015; AC n. 00208512620144039999, 7ª Turma, Relator
Des. Fed. Fausto de Sanctis, e-DJF3 Judicial 1, de 27/11/2014).
Destarte, a vagueza e imprecisão em torno dos períodos em que, de fato, a vindicante exerceu o
alegado afazer rural, agregado com atividades de natureza urbana, descaracteriza eventual
condição de rurícola que pudesse advir, por extensão, da qualificação do consorte posta na
certidão de casamento.
A propósito, o entendimento firmado pela Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, no
julgamento do Recurso Especial Repetitivo n.º 1.304.479/SP, processado sob o rito do art. 543-C
do CPC/1973, no sentido de que "a extensão de prova material em nome de um integrante do
núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com
o labor rurícola como o de natureza urbana", nos termos da seguinte ementa:
"RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ
8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11,
VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA.
TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO.
NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE
PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da
qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e,
com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art.
535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os
demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do
trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias
(Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de
um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho
incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas provas em nome do marido da
recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova
material em nome desta em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e
em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está em conformidade com os parâmetros
estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e
da Resolução 8/2008 do STJ." (destaquei)
(Rel. Min. Herman Benjamin, DJe de 19/12/2012)
Ainda que tenham sido apresentados os dados cadastrais da certidão emitida pela justiça eleitoral
em 26/11/2014, em nome da parte autora, não se pode, também, extrair dali, a eficácia probante
que se pretende, à míngua de outras provas que os corroborem.
Assim porque aludidos dados são preenchidos de acordo com declaração efetivada pelo próprio
requerente, "sem valor probatório", conforme expressa advertência contida na certidão.
No ponto abordado, confira-se o entendimento deste e. Tribunal:
AC 00160584920114039999, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1626566, Relator JUIZ CONVOCADO
VALDECI DOS SANTOS, TRF3, DÉCIMA TURMA, e-DJF3 01/07/2015:
AGRAVO LEGAL. APELAÇÃO CÍVEL. JULGAMENTO POR DECISÃO MONOCRÁTICA. ART.
557 DO CPC. APOSENTADORIA POR IDADE. RURAL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS. (...) o
documento acostado na fl. 12, também não pode ser aceito como início de prova material da
atividade rural exercida, uma vez que a certidão da Justiça eleitoral é um documento recente,
expedido de acordo com as informações fornecidas pela própria interessada perante aquele
órgão, em 27.11.2007, tratando-se de mera declaração de sua ocupação profissional. Portanto,
tais documentos não podem constituir início de prova material do exercício da atividade rural. 6.
Agravo legal desprovido.
AC 00025385620104039999, AC 1482334, Relatora DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA
MARANGONI, TRF3, OITAVA TURMA, e-DJF3 16/04/2015:
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. AUXÍLIO-DOENÇA OU APOSENTADORIA POR
INVALIDEZ. AUSÊNCIA DA QUALIDADE DE SEGURADO ESPECIAL. (...) A certidão emitida
pela Justiça Eleitoral não pode ser considerada como prova material, em razão de ter sido
expedida de acordo com informações fornecidas pelo próprio autor, além do que é recente e não
comprova o exercício de atividade rural pelo período de carência legalmente exigido. - O exame
do conjunto probatório mostra que o requerente não logrou comprovar a qualidade de segurado
especial, de forma que o direito que persegue não merece ser reconhecido. (...) Agravo
improvido.
Ainda que assim não fosse, nem se sabe, ao certo, se, àquela altura, a autora havia deixado seus
afazeres laborais, em decorrência da incapacidade que aduz ter se instalado.
Veja-se, a esse respeito, a discrepância haurida dos autos.
A demandante afirmou, na resposta ao quesito nº 12 do Juízo, posta no derradeiro laudo, que não
trabalhava há mais de cinco anos – então, em idos de 2012/2013 – e, ao responder ao quesito nº
1 do requerido, alegou que estava sem trabalhar desde o ano de 2014 (doc. 131917805, págs. 79
e 82).
Por sua vez, a testemunha Maria Pereira de Souza Lima, única que compareceu à audiência
realizada em 11/12/2018, conforme termo de assentada colacionado ao doc. 131917805, pág.
105, asseverou que há mais de vinte anos trabalha com a vindicante como boia-fria. Não
obstante, aduziu que esta deixou o afazer rural, há dois anos, por problemas de saúde, portanto,
no final do ano de 2016.
No mais, as certidões de nascimento dos filhos da demandante, juntadas ao doc. 131917804,
págs. 34/36, sequer trazem a qualificação da autora ou do esposo.
Destarte, a despeito da qualificação da autora na presente demanda como trabalhadora rural,
nota-se que não há, na espécie, início de prova material capaz de demonstrar o exercício do
propalado labor campestre.
Nesse contexto, não se pode olvidar do advento de precedente oriundo do colendo Superior
Tribunal de Justiça, tirado na sistemática dos recursos representativos de controvérsia,
precisamente o REsp nº 1.352.721/SP, no âmbito do qual se deliberou que a falta de eficaz
princípio de prova material do labor campesino traduz-se em ausência de pressuposto de
constituição e desenvolvimento válido do processo, abrindo ensejo à extinção do processo sem
resolução de mérito, verbis:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA
CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR
IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA
ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E
DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS
ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL
DO INSS DESPROVIDO.
1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus
procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas
previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta
os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social
adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários.
2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da
Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência
Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a
parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização
dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica
previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as
normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação
previdenciária a que faz jus o segurado.
3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística
civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar
prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas
demandas.
4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual
garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir
como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo
certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente
dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura
previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela
via da assistência social.
5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa.
6. Recurso Especial do INSS desprovido." (RESP 201202342171, NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, STJ - CORTE ESPECIAL, DJE 28/04/2016)
Muito embora ciente do posicionamento desta Turma Julgadora, do qual comungo, a caracterizar
a improcedência do pedido em casos tais, reputo curial revisitar tal exegese, pela força
incontrastável do leading case retrotranscrito, inclusive em homenagem à celeridade
procedimental, tendo em conta a possibilidade de devolução de feitos pela egrégia Vice-
Presidência para eventual exercício de juízo de retratação. Adite-se que a egrégia Terceira Seção
desta Corte, incumbida do apaziguamento de posicionamentos jurisprudenciais na seara
previdenciária, vem adotando o entendimento da Corte Superior, como dá conta o seguinte
precedente:
"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA RURAL
POR IDADE. ATIVIDADE URBANA DO CÔNJUGE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
DESCARACTERIZADO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSIÇÃO LEGAL. OCORRÊNCIA.
AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DESNECESSIDADE DE VALORAÇÃO DOS
DEPOIMENTOS TESTEMUNHAIS. SÚMULA N. 149 DO E. STJ. IMPEDIMENTO PARA O
DESENVOLVIMENTO REGULAR DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM
RESOLUÇÃO DO MÉRITO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE
TÍTULO JUDICIAL QUE ORA SE RESCINDE. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA ALIMENTAR E
BOA-FÉ. REVELIA. NÃO APLICAÇÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. (...) IX - A finalidade do
legislador e da jurisprudência ao afastar a prova exclusivamente testemunhal não foi criar
dificuldades inúteis para a comprovação do tempo de serviço urbano ou rural e encontra respaldo
na segunda parte do art. 400 do CPC de 1973, atual artigo 443 do Novo CPC. X - A interpretação
teleológica dos dispositivos legais que versam sobre a questão em exame leva à conclusão que a
ausência nos autos de documento tido por inicio de prova material é causa de extinção do feito
sem resolução do mérito, com base no art. 485, IV, do Novo CPC, pois o art. 55, § 3º, da Lei n.
8.213/91 e a Súmula 149 do E. STJ, ao vedarem a prova exclusivamente testemunhal em tais
casos, criaram um óbice de procedibilidade nos processos que envolvam o reconhecimento de
tempo de serviço, que a rigor acarretaria o indeferimento da inicial, nos termos dos arts. 320 e
321 do atual CPC. XI - Carece a autora da ação subjacente de comprovação material sobre o
exercício de atividade rural por ela desempenhado (art. 39, I, da Lei nº 8.213/91), restando
prejudicada a apreciação do pedido de reconhecimento da atividade rural. (...) XIV - Ação
rescisória cujo pedido se julga procedente. Processo subjacente que se julga extinto, sem
resolução do mérito. Tutela que se concede em maior extensão". (AR 00086993320154030000,
Relator DESEMBARGADOR FEDERAL SERGIO NASCIMENTO, e-DJF3 Judicial 1 17/06/2016).
Note-se que, apesar de proferido no bojo de discussão acerca de aposentadoria por idade rural, o
entendimento firmado nos supracitados precedentes é aplicável ao caso em análise, uma vez que
relativo à comprovação da condição de rurícola.
Destarte, o pretenso direito ao benefício postulado não se sustenta, à falta de mínima prova
documental acerca do labor rural da parte autora.
Diante do exposto, nos termos dos artigos 485, IV, e 320, do Código de Processo Civil, JULGO
EXTINTO O PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, restando, em decorrência,
prejudicados os recursos interpostos.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REMESSA OFICIAL. NÃO CABIMENTO. ART. 496, §
3º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-
DOENÇA. TRABALHADOR RURAL. LEI 8.213/1991. AUSÊNCIA DE EFICAZ PRINCÍPIO DE
PROVA MATERIAL DO LABOR CAMPESINO. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO
DE MÉRITO. ARTIGOS 485, IV, E 320, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
- A hipótese em exame não excede 1.000 salários mínimos, sendo incabível a remessa oficial,
nos termos do art. 496, § 3º, inciso I, do Código de Processo Civil.
- A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, cumprida a carência mínima, quando
exigida, for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício
de atividade que lhe garanta a subsistência, ao passo que o auxílio-doença destina-se àquele que
ficar temporariamente incapacitado para o exercício de sua atividade habitual.
- No que tange ao cumprimento dacarência,o art. 39, I, da Lei nº 8.213/91 assegura a concessão
de aposentadoria por invalidezou auxílio doença ao trabalhador rural, desde que comprove o
exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior
ao requerimento do benefício, pelo período de 12 (doze) meses, correspondentes à carência dos
aludidos benefícios.
- A despeito da qualificação da autora na presente demanda, como trabalhadora rural, não há, na
espécie, início de prova material capaz de demonstrar o exercício do propalado labor campestre,
apto a comprovar sua qualidade de segurado da Previdência Social e o cumprimento da carência,
na condição de rurícola, quando menos, por ocasião do requerimento administrativo, agilizado em
27/10/2014.
- A vagueza e imprecisão em torno dos períodos em que, de fato, a vindicante exerceu o alegado
afazer rural, agregado com atividades de natureza urbana, como empregada doméstica e caseira
em área rural, por ela declinadas na perícia, descaracteriza eventual condição de rurícola que
pudesse advir, por extensão, da qualificação do consorte posta na certidão de casamento.
Precedente do STJ, firmado em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp n.º 1.304.479/SP).
- O ofício de caseiro ostenta natureza urbana, conforme doutrina e jurisprudência, por se tratar de
situação parelha à do empregado doméstico.
- Na espécie, não se pode extrair, dos dados cadastrais da certidão emitida pela justiça eleitoral,
a eficácia probante que se pretende, à míngua de outras provas que os corroborem, visto que
aludidos dados são preenchidos de acordo com declaração efetivada pelo próprio requerente,
"sem valor probatório", conforme expressa advertência ali contida, salientando-se, no mais, que
nem se sabe, ao certo, se, àquela altura, a autora havia deixado seus afazeres laborais, em
decorrência da incapacidade que aduz ter se instalado.
- Não se pode olvidar do advento de precedente oriundo do c. Superior Tribunal de Justiça (Resp
201202342171, Napoleão Nunes Maia Filho, STJ - Corte Especial, DJE 28/04/2016), tirado na
sistemática dos recursos representativos de controvérsia, precisamente o REsp nº 1.352.721/SP,
no âmbito do qual se deliberou que a falta de eficaz princípio de prova material do labor
campesino traduz-se em ausência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do
processo, abrindo ensejo à extinção do processo sem resolução de mérito. Entendimento que
vem sendo adotado pela e. Terceira Seção desta Corte.
- Condenação da parte autora em honorários advocatícios, fixados em 10% do valor atualizado da
causa, observando-se o disposto no art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil, por ser
beneficiária da justiça gratuita.
- Extinção do processo, sem resolução do mérito, nos termos dos artigos 485, IV, e 320, do
Código de Processo Civil, restando, em decorrência, prejudicados os recursos interpostos.
ACÓRDÃOVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma,
por unanimidade, decidiu, nos termos dos artigos 485, IV, e 320, do Código de Processo Civil,
JULGAR EXTINTO O PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, restando, em decorrência,
prejudicados os recursos interpostos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
