
| D.E. Publicado em 27/06/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar suscitada e, em juízo rescindendo, julgar improcedente a presente ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0003520-26.2012.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta por ALICE RODRIGUES BRANDÃO em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com fundamento no artigo 485, VII, do CPC/1973, objetivando rescindir sentença de mérito, a fim de que lhe seja concedida aposentadoria por invalidez ou, sucessivamente, restabelecido seu auxílio-doença.
Juntou documentos novos que entende serem hábeis à complementação do conjunto probatório da demanda subjacente, a fim de comprovar sua incapacidade laborativa.
Em atenção à determinação de fl. 230, a autora juntou procuração e declaração de hipossuficiência econômica (fls. 232-234).
À fl. 236, foram deferidos à autora os benefícios da assistência judiciária gratuita, dispensando-a do depósito prévio.
Citado (fls. 240-241), o réu apresentou contestação e documentos, às fls. 243-254, alegando, em preliminar, a ausência de interesse de agir e, no mérito, a inexistência de documento novo, seja porque não comprovado o desconhecimento ou impossibilidade de sua oportuna utilização, seja porque não demonstram a existência de incapacidade laborativa.
A autora ofereceu réplica (fl. 258-263).
Oportunizada a apresentação de razões finais (fl. 265), as partes se manifestaram às fls. 267-270 e 271.
O Ministério Público Federal opinou pela improcedência da ação rescisória (fls. 272-275).
A autora juntou novos documentos (fls. 277-286), sobre os quais o réu se manifestou à fl. 288v.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, verifico que a presente demanda foi ajuizada em 10.02.2012, observado o prazo decadencial previsto no artigo 495 do CPC/1973, dada o trânsito em julgado no processo originário ocorrido em 07.11.2011 (fl. 186).
Rejeito a preliminar de ausência de interesse de agir, relativa à inadequação da via eleita para rediscussão do quadro fático da lide subjacente, por se confundir com o mérito da demanda rescisória.
A autora fundamenta a ação rescisória no artigo 485, VII, do CPC/1973, alegando a existência de documentos novos que entende serem hábeis à complementação do conjunto probatório da demanda subjacente, a fim de comprovar sua incapacidade laborativa.
Nascida em 25.07.1949 (fl. 17), a autora postulou na ação subjacente, ajuizada em 06.12.2007 (fls. 19), a concessão de aposentadoria por invalidez ou, sucessivamente, o restabelecimento de seu auxílio-doença cessado em 16.05.2003, aduzindo estar acometida por "Transtorno Depressivo Recorrente, Lesão Sequelar Crânio, Calcificação grosseira do Centro Semi-Oval à Direita, Perda Memória, Hipertensão Arterial, Lombalgia e Tontura dentre outros, que ainda se submete a tratamentos" (fl. 22).
Para comprovação da alegada incapacidade laborativa, juntou:
a) resultado de tomografia computadorizada do crânio, datado de 11.09.2007, indicando "calcificação grosseira do centro semi-oval à direita, posteriormente, sem edema periférico, compatível com lesão sequelar" (fl. 38);
b) atestado de médico psiquiatra, datado de 22.11.2007, informando que autora está matriculada no CIAPS - Centro Integrado de Atenção Psicossocial da Secretaria Municipal de Saúde de Assis/SP, tendo se submetido "a tratamento especializado desde 12/11/2004, com diagnóstico CID 10 (F.44 + F.60.4)" (fls. 39-40);
c) encaminhamento para perícia médica do INSS, emitido por médico neurologista do CIAPS, datado de 21.11.2017, indicando ser a autora portadora de "transtorno depressivo recorrente CID F33" (fl. 41).
Registe-se que conforme cópias de suas CTPS (fls. 28-37), a autora teve vínculos empregatícios de 01.10.1987 a 30.11.1988 (faxineira), 01.05.1989 a 27.05.1989 (doméstica), 01.02.1990 a 26.04.1990 (cozinheira), 14.06.1993 a 31.05.1994 (auxiliar de limpeza) e 01.01.1995 a 30.12.1995 (serviços gerais). Ainda recolheu contribuições como segurada facultativa de 01.04.2002 a 31.12.2002 e de 01.04.2007 a 31.07.2007 (fls. 42-43).
O laudo pericial (fls. 125-130), referente a exame realizado em 29.06.2009, assertivamente concluiu que a autora não apresentava quadro de incapacidade laborativa.
Afirmou o perito que a autora apresentava "hipertensão arterial, neurocisticercose, transtorno de somatização, personalidade histriônica", indicando o início do tratamento psiquiátrico em 12.11.2004. Respondeu afirmativamente, quanto à existência de tratamento que possibilitasse reversão, cura e exercício de atividade laborativa, e respondeu negativamente, em relação à existência de perdas anatômicas ou redução da capacidade de trabalho em decorrência das moléstias.
Ressalto que ao quesito "É a autora portadora de problemas de transtorno depressivo recorrente, lesão sequelar do crânio, calcificação grosseira do Centro Semi-Oval a direita, perda de memória, hipertensão arterial, lombalgia e tonturas? Qual a gravidade?", o perito respondeu expressamente "Sim. Não há gravidade do quadro" (g.n.), bem como que "paciente com quadro de somatização e dentre as patologias que apresenta nenhuma delas é incapacitante" (g.n.)., concluiu ainda que "a pacienta apresenta transtorno de somatização e não há seqüelas ou deficiência que lhe impeça de exercer suas atividades a não ser a idade" (g.n.).
Após a realização da perícia médica, a autora juntou:
d) resultado de exame do crânio, datado de 01.11.2010, indicando "calcificação patológica intracraniana" (fl. 150);
e) atestado médico, cuja cópia nesta via rescisória se encontra incompleta, não sendo possível identificar a data ou o emissor, constando relatado que a autora "tem perdas de sentidos, sofrendo contusões e equimose e os exames complementares mostram a presença de cisticercose cerebral. Agora, refere perda de força muscular dos membros superiores, deixando cair objetos que segura" (fl. 155);
f) atestado médico, emitido em 24.08.2011, indicando a necessidade de afastamento do trabalho por noventa dias em razão de a autora ser "portadora de calcificação cerebral, cefaleia crânio e depressão", CID F32.9, R51 e G93.8 (fl. 167).
Em 1ª Instância, o pedido foi julgado improcedente (fls. 175-177), verbis:
Sem interposição de recurso pelas partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 07.11.2011 (fl. 186).
Em relação à possibilidade de rescisão da coisa julgada em decorrência de documento novo, tem-se que a prova material nova deve ser, por si só, suficiente para modificar o julgado rescindendo, ainda que de forma parcial.
Não se objetiva reabrir a dilação probatória para, simplesmente, suprir deficiência do conjunto probatório produzido na ação originária, decorrente da não observância pela parte, por desídia ou negligência, de seu ônus processual probatório, mas, sim, viabilizar a apresentação de prova material nova, cuja existência a parte ignorava ou de que não podia fazer uso, bem como, em casos excepcionais, documento cujo valor probatório era desconhecido pela parte em razão de circunstâncias vulnerabilizantes, como aquelas vivenciadas por trabalhadores rurais.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:
Como supostos documentos novos, a autora juntou:
1) ficha de matrícula no CIAPS, em 12.11.2004 (fl. 188);
2) prontuário médico do CIAPS, constando vários atendimentos de 2004 a 2011, em que a autora reportou hipertensão, "bicho de porco na cabeça", tonturas, cefaleia, depressão (fls. 189-193);
3) fichas de atendimento médico em pronto socorro no SUS, entre 2008 e 2011 (fls. 194-207);
4) protocolos de agendamento de serviços e requerimento de benefícios nas agências do INSS (fls. 208-209, 214-219)
5) atestado de médico psiquiatra, datado de 29.09.2011, informando que autora está matriculada no CIAPS - Centro Integrado de Atenção Psicossocial da Secretaria Municipal de Saúde de Assis/SP, tendo se submetido "a tratamento especializado desde 12/11/2004, com diagnóstico CID 10 (F.60.4)" (fl. 210);
6) atestado médico, emitido em 24.08.2011, indicando a necessidade de afastamento do trabalho por noventa dias em razão de a autora ser "portadora de calcificação cerebral, cefaleia crânio e depressão", CID F32.9, R51 e G93.8 (fl. 211);
7) atestados de médico psiquiatra, datados de 27.07.2007, 17.10.2007 e 24.10.2007, informando que autora está matriculada no CIAPS - Centro Integrado de Atenção Psicossocial da Secretaria Municipal de Saúde de Assis/SP, tendo se submetido "a tratamento especializado desde 12/11/2004, com diagnóstico CID 10 (F.44)" (respectivamente às fls. 223, 220, 221);
8) atestado médico, emitido em 18.06.2007, indicando a necessidade de afastamento do trabalho no dia 18.06.2007, com indicação do CID F44 (fl. 222);
9) resultados de perícias médicas administrativas do INSS indicando a inexistência de incapacidade laborativa (datados de 03.06.2003, 31.03.2004 e 20.10.2011) e a existência de incapacidade desde 12.11.2004 com data de cessação para 22.12.2007(datado de 25.10.2007), às fls. 224-227.
Ainda, após apresentação das razões finais, juntou:
10) comunicados de decisão de prorrogação de auxílio-doença a partir de 30.09.2014 e 05.01.2015 (fls. 280 e 279, respectivamente);
11) atestado de médico neurologista, emitido em 04.08.2014, informando que a autora "é portadora de neurocisticercose + cefaleia crônica diária refratária + depressão + hipertensão. Está sob meus cuidados profissionais e necessita auxílio-doença ininterrupto ou aposentadoria pois não pode mais fazer esforços, por motivo de tratamento médico, em repouso e uso contínuo de psicotrópicos e está parcialmente incapacitada definitivamente" (fl. 282);
12) atestado médico, datado de 27.03.2015, informando que autora tem "diagnóstico CID 10 - C18 F93.3 EC III" (fl. 285);
13) atestado de médico oncologista, datado de 29.09.2014, informando que a autora se encontra em tratamento no Hospital Regional de Assis "desde a data de 29.09.2014, devendo ficar afastada do trabalho por 180 (cento e oitenta0 dias, a partir desta, por motivo de doenças CID C18.9" (fl. 286).
Inicialmente, incabível a admissão dos documentos juntados após o encerramento da instrução, seja por força de expressa vedação do artigo 264, parágrafo único, do CPC/1973, então vigente, seja porque indicam a existência de moléstia surgida após o trânsito em julgado da demanda subjacente.
Quanto àqueles carreados na inicial, embora seja evidente que a autora tinha pleno conhecimento da sua existência, bem como que não havia qualquer óbice à sua utilização quando do ajuizamento da demanda subjacente, há que se considerar os parâmetros de razoabilidade que norteiam a solução pro misero, uma vez que é possível compreender que não tivesse a percepção de sua importância para fim da comprovação de seu alegado direito ao benefício previdenciário. Quanto ao ponto, destaco que, embora se trate de trabalhadora urbana, é pessoa de baixo grau de escolaridade (com formação de primeiro grau incompleta - fl. 45), que sempre se dedicou a atividade de natureza braçal e sem exigência de grau de qualificação técnica (exerceu apenas atividades relacionados a serviços de limpeza e de cozinha em casa de família).
Contudo, ainda que aceita a tese da sua novidade, os documentos carreados não seriam suficientes à inversão do resultado do julgamento.
Todos os documentos juntados pela autora vêm reiterar o quanto já havia sido reconhecido expressamente no julgado rescindendo, isto é, que está acometida por diversas moléstias enunciadas nominalmente na inicial da demanda subjacente e confirmadas na perícia judicial. Afinal os tais "documentos novos" apenas informam que a autora sofria daquelas moléstias e se encontrava em constante acompanhamento médico, inclusive com tratamento medicamentoso.
Em que pese tal fato, o fundamento determinante que levou à improcedência do pedido foi a constatação assertiva do perito judicial no sentido de que tais moléstias não apresentavam grau de gravidade e não ensejavam incapacidade laborativa.
Certo ou errado o julgado rescindendo analisou e valorou o conjunto probatório e, forte na prova técnica, segundo seu livre convencimento, de forma motivada e razoável, adotou uma solução jurídica, dentre outras, admissível.
Ressalto que, da mesma forma que o juízo não está adstrito ao laudo pericial, ante o princípio do livre convencimento motivado e o disposto nos artigos 436 do CPC/1973 e 479 do CPC/2015, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juízo o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame (Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010).
Tem-se que os benefícios previdenciários por incapacidade são concedidos ou indeferidos rebus sic stantibus, ou seja, conforme a situação no momento da decisão. Com efeito, o próprio legislador estabeleceu a necessidade de perícias periódicas tendo em vista que a incapacidade laborativa, por sua própria essência, pode ser suscetível de alteração com o decurso do tempo. Assim, a decisão judicial exarada se mantém íntegra enquanto perdurarem as condições aferidas ao tempo da sua prolação, revelando-se a excepcionalidade de rescisão de julgados revestidos da característica rebus sic stantibus. Em caso de alteração da situação jurídica ou fática, inclusive por meio de novas provas, os pedidos podem ser renovados na esfera administrativa e/ou judicial.
Registro que a ação rescisória não é meio adequado para corrigir eventuais interpretações equivocadas de provas, erros de julgamento ou injustiças da decisão rescindenda, justamente porque não se trata de sucedâneo recursal.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar suscitada e, em iudicium rescindens, julgo improcedente a presente ação rescisória, nos termos dos artigos 269, I, do CPC/1973 e 487, I, do CPC/2015.
Custas na forma da lei.
Condeno a autora no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade das verbas honorárias devidas ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 14/06/2018 17:48:51 |
