
| D.E. Publicado em 07/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em juízo rescindendo, julgar improcedente a presente ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0021967-28.2013.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta por MARIA ALDA DA SILVA em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com fundamento nos artigos 485, VII e IX, do CPC/1973, objetivando rescindir acórdão proferido pela 8ª Turma deste e. Tribunal, a fim de que lhe seja concedida aposentadoria por invalidez, na condição de rurícola.
Aduziu que o julgado rescindendo incorreu em erro de fato, eis que, no seu entender, o conjunto probatório formado nos autos da demanda subjacente seria suficiente à comprovação da atividade rural exercida pelo período de carência. Sustentou que não poderia ser levado em consideração o exercício de atividade urbana por seu ex-marido após a separação do casal. Ainda, juntou documento novo a fim de reiterar e complementar o conjunto probatório da ação subjacente para comprovação de seu alegado direito ao benefício.
À fl. 241, foram deferidos à autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Citado (fls. 243-244), o réu apresentou contestação, às fls. 246-252, alegando, em preliminar, a ausência de interesse processual e, no mérito, a inexistência de erro de fato ou documento novo.
Instada para réplica (fl. 254), a autora se quedou inerte (fl. 258).
À fl. 259, foi rejeitada a preliminar e oportunizada a especificação de provas. As partes informaram não ter provas a produzir (fl. 260 e 262).
O Ministério Público Federal opinou pela procedência da ação, nos juízos rescindendo e rescisório (fls. 265-270).
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, verifico que a presente demanda foi ajuizada em 03.09.2013, observado o prazo decadencial previsto no artigo 495 do CPC/1973, dada o trânsito em julgado no processo originário ocorrido em 16.11.2011 (fl. 231).
A autora fundamenta a ação rescisória no artigo 485, VII e IX, do CPC/1973, alegando que o julgado rescindendo incorreu em erro de fato, eis que, no seu entender, o conjunto probatório formado nos autos da demanda subjacente seria suficiente à comprovação da atividade rural exercida pelo período de carência, bem como que não poderia ser levado em consideração o exercício de atividade urbana por seu ex-marido após a separação do casal. Ainda, juntou documento novo a fim de reiterar e complementar o conjunto probatório da ação subjacente para comprovação de seu alegado direito ao benefício.
Na ação subjacente, ajuizada em 03.05.2005 (fl. 69), a autora, nascida em 25.11.1952 (fl. 63), postulou a concessão de aposentadoria por invalidez, mediante o reconhecimento de sua condição de trabalhadora rural, na qualidade de diarista (fls. 70-71).
Para comprovação do alegado exercício de atividade rural, instruiu aquela demanda com:
1) sua certidão de casamento, ocorrido em 18.04.1970, em que constou qualificada como dedicada a "prendas domésticas" e seu marido como "lavrador" (fl. 81). Constam averbadas a separação judicial do casal, em 01.03.1983, e o divórcio, em 28.04.2000.
2) sua CTPS, emitida em 10.09.1984, constando vínculos de 01.09.1984 a 26.12.1990, na qualidade de trabalhadora rural, e de 25.01.1994 a 16.06.1994, como empregada doméstica (fls. 82-83);
3) certidão de nascimento de seu filho, ocorrido em 19.11.1971, não constando a qualificação profissional dos genitores (fl. 84);
4) certidão de nascimento de suas filhas, ocorridos em 16.10.1973 e 15.12.1975, em que constou qualificada como "doméstica" ou "do lar" e seu marido como "lavrador" (fls. 85-86).
Foram tomados depoimentos da autora e de suas testemunhas, em 14.03.2006 (fls. 130-132):
Consta laudo pericial (fls. 134-139), datado de 07.04.2006, em que o perito judicial afirmou que a autora é "portadora de doença valvar aórtica, tratada cirurgicamente. Evoluiu com residual comprometimento funcional desta como também com comprometimento da valva mitral", concluiu que "considerando-se a idade do periciando, sua qualificação profissional, as doenças diagnosticadas, as limitações inerentes às mesmas e as exigências da atividade exercida, caracterizo situação de incapacidade total e permanente para exercer atividade profissional formal remunerada com finalidade da manutenção do sustento". Ainda, "com relação a (sic) fixação da data do início da incapacidade, esta vem pelo menos desde a época da cirurgia em 19/04/2004".
Em 1ª Instância, o pedido foi julgado procedente (fls. 151-155), sentença reformada em 2º grau de jurisdição, dando-se provimento à apelação autárquica para julgar improcedente o pedido, conforme decisão terminativa monocrática proferida pela Juíza Federal convocada Marcia Hoffmann (fls. 185-186), da qual destaco o seguinte:
Ao agravo interposto pela autora foi negado provimento, conforme acórdão unânime da 8ª Turma desta Corte (fls. 226-229).
Sem interposição de outros recursos pelas partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 16.11.2011 (fl. 231).
Para o reconhecimento de erro de fato, hábil à rescisão da coisa julgada na forma do artigo 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, exige-se que, sem que tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva para a conclusão do decidido.
Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo.
Nesse sentido, encontra-se sedimentada a jurisprudência dos Tribunais superiores e desta Corte:
É patente a inexistência de erro de fato no julgado, seja em decorrência da controvérsia entre as partes quanto ao efetivo exercício da alegada atividade rural, seja porque houve pronunciamento judicial expresso sobre o fato.
Embora, realmente, tenho sido feita alusão à atividade urbana exercida pelo ex-marido da autora após a separação conjugal, o julgado rescindendo é claro e expresso no sentido de que "a autora está separada desde 01.03.1983, situação que impossibilita a extensão da qualificação profissional de seu ex-marido". Assim, ao contrário do que pretende fazer crer a autora, não foi a posterior dedicação urbana de seu marido o fator determinante para a desconsideração da prova material em nome daquele, mas a própria separação do casal.
Outrossim, o julgado rescindendo também levou em consideração, para concluir pela inexistência de prova material do mourejo rurícola no período imediatamente anterior ao início da incapacidade laborativa, o fato de que o último vinculo empregatício se deu em atividade urbana.
Destaco, que, embora a perda da qualidade de segurado não seja óbice à aposentação por idade, tal como expresso no artigo 3º, § 1º, da Lei n.º 10.666/03, bem como no artigo 102 da Lei n.º 8.213/91, desde sua redação original e de acordo com a atual redação dada pela Lei n.º 9.528/97, no caso de aposentação por invalidez faz-se imprescindível a demonstração do efetivo exercício da atividade campesina, quando do acometimento ou agravamento do mal incapacitante. Além disso, no caso dos trabalhadores rurais, cujo tempo de serviço é contado independentemente de efetiva contribuição, sempre se exigiu o exercício da atividade rural no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, ou implementação do requisito etário, e pelo tempo equivalente à carência (artigo 48 da Lei n.º 8.213/91, desde sua redação original até sua atual redação dada pela Lei n.º 11.718/08).
Nesse sentido, a 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça fixou tese no julgamento do Recurso Especial autuado sob nº 1.354.908/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos representativos de controvérsia, quanto à necessária a demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento dos requisitos necessários à concessão do benefício.
Ressalte-se que, em se tratando de pleito de concessão de aposentadoria à rurícola por invalidez, cujo início do mal incapacitante foi estimado pelo perito médico em 2004, competia à autora ter comprovado que efetivamente exercia o labor campesino nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores.
Ademais, é forte o entendimento de que, ainda que não se exija prova material para todo o período de carência, a prova material indiciária deve se referir ao menos à parte desse interregno, isto é, deve haver concomitância temporal entre a prova material inicial e o lapso que se pretende comprovar em juízo, mormente quando verificado significativo decurso de tempo entre um e outro.
Nesse sentido, tem-se o enunciado de Súmula n.º 34 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais - TNU ("Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser contemporâneo à época dos fatos a provar."), bem como os seguintes precedentes do c. Superior Tribunal de Justiça e desta Corte:
Fazia-se imprescindível que a autora tivesse apresentado início de prova material relativo ao período de carência, a fim de, em conjunto com outros meios probatórios (como a prova oral), demonstrar que se dedicava ao mourejo rural no período imediatamente anterior ao início da incapacidade laborativa.
Dessa forma, não reconheço existência de erro de fato no julgado, uma vez que houve apreciação do conjunto probatório, o qual foi valorado pelo Juízo originário segundo seu livre convencimento, de forma motivada e razoável, tendo sido adotado uma solução jurídica, dentre outras, admissível.
O julgado rescindendo não se afastou dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época.
A excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas. Nesse sentido, confira-se precedentes desta 3ª Seção:
Em relação à possibilidade de rescisão da coisa julgada em decorrência de documento novo, tem-se que a prova material nova deve ser, por si só, suficiente para modificar o julgado rescindendo, ainda que de forma parcial.
Não se objetiva reabrir a dilação probatória para, simplesmente, suprir deficiência do conjunto probatório produzido na ação originária, decorrente da não observância pela parte, por desídia ou negligência, de seu ônus processual probatório, mas, sim, viabilizar a apresentação de prova material nova, cuja existência a parte ignorava ou de que não podia fazer uso, bem como, em casos excepcionais, documento cujo valor probatório era desconhecido pela parte em razão de circunstâncias vulnerabilizantes, como aquelas vivenciadas por trabalhadores rurais.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:
Como "documento novo", a autora juntou contrato particular de parceira agrícola, datado de 02.01.2000 (fls. 65).
Em princípio, contratos de parceria agrícola constituem início de prova material do labor campesino. Contudo, no caso concreto, cabem algumas ponderações.
Referido contrato particular não tem reconhecimento de firma do parceiro proprietário, nem está assinado por testemunhas, o que dificulta a confirmação sobre sua veracidade e sobre realmente ter sido celebrado na data constante do documento. Reveste-se, portanto, de fragilidade para o fim de rescisão do julgado na ação subjacente.
Alie-se, como elemento de convicção da fragilidade probatória do documento, o fato de que nem a autora (na inicial ou em depoimento pessoal), nem suas testemunhas, mencionaram que a autora tivesse exercido atividade no cultivo de milho, em parceria agrícola com Valdomiro Meneguini, no Sítio Santa Luzia, pelo menos no período de 02.01.2000 a 31.12.2001, segundo os dados do referido contrato de parceria agrícola.
Ressalto se tratar de dois anos de atividade em período bastante próximo ao início da incapacidade, não sendo crível que ninguém se lembrasse.
Na inicial da demanda subjacente a autora informou que antes de seu casamento, trabalhou "nas lavouras de café da propriedade rural do Sr. Thomás Casado". Após seu casamento, "passou a residir na propriedade rural do sr. Carlos Soublia, trabalhando nas lavouras de café, algodão e milho e arroz, lá permanecendo com seu cônjuge até o ano de 1982". Após a separação conjugal "deixou o local, mas a autora permaneceu trabalhando naquela propriedade rural", inclusive "com registro em CTPS dos anos de 1.984 à (sic) 1.990". Posteriormente, a autora informou que "passou a residir no perímetro urbano do município de Sebastianopolis/SP e trabalhar nas roças espalhadas, como diarista, dentre outros ara gatos daquela localidade, tais quais se destacam: Dorival Pernambuco e Paulão, conhecidos da localidade, e que levavam os bóias-frias quase sempre para trabalharem nas propriedades rurais dos Srs: Filicio Alves colhendo manga e em carpinagem; Jossé, também na colheita de mangas e carpinagem; Labib, na colheita de laranja e carpinagem; Carlos Soublia, nas lavouras de café e pastagem". Repiso, em nenhum momento mencionou o cultivo de milho em parceria com Valdomiro Meneguini.
Além de "não se recordarem" de dois anos de parceria agrícola entre a autora e o sr. Valdomiro Meneguini, os depoimentos da autora e de suas testemunhas são concisos tão somente em afirmar que a autora trabalhou na lavoura na época em que consta registro formal do vínculo empregatício e na suposta colheita de laranjas em 2004 para Felício Alves, logo antes de seus problemas de saúde a impedirem de trabalhar.
As testemunhas não souberam informar qualquer detalhe sobre o hiato existente desde sua saída da Fazenda Varjão (empregador Carlos Soubhia) e o período supostamente trabalhado em 2004 para Felício Alves. Aliás, contraditoriamente à prova dos autos, afirmaram que a autora se dedicava apenas às lidas da roça, embora tivesse, de fato, exercido atividade como empregada doméstica após o término do vínculo empregatício com Carlos Soubhia.
Trata-se de prova oral frágil, já que demonstrado pouco conhecimento das testemunhas em relação à autora e aos fatos essenciais ao deslinde da controvérsia.
Assim, também não reconheço a existência de documento novo para fins de rescisão da coisa julgada, pois, ainda que observados os parâmetros de razoabilidade que norteiam a solução pro misero e aceita a tese da sua novidade, o documento carreado não seria suficiente à inversão do resultado do julgamento.
Registro, por fim, que a autora percebe o benefício de amparo assistencial ao idoso desde 14.12.2017.
Ante o exposto, em iudicium rescindens, julgo improcedente a presente ação rescisória, nos termos dos artigos 269, I, do CPC/1973 e 487, I, do CPC/2015.
Custas na forma da lei.
Condeno a autora no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade das verbas honorárias devidas ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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