
| D.E. Publicado em 23/02/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por maioria, rejeitar a preliminar suscitada e, em juízo rescindendo, julgar improcedente a presente ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0038193-50.2009.4.03.0000/SP
VOTO-VISTA
Rosalina da Cruz ajuizou a presente ação rescisória, com fulcro no artigo 485, inciso IX (erro de fato), do Código de Processo Civil/1973, atual art. 966, inciso VIII, do CPC/2015, visando a desconstituição de decisão monocrática terminativa de mérito, a fim de que lhe seja concedida aposentadoria rural por idade.
O Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Delgado, em seu brilhante voto de fls. 213/219, houve por bem rejeitar a preliminar suscitada e, em iudicium rescindens, julgar improcedente o pedido formulado na presente ação rescisória.
O d. Relator refutou a existência de erro de fato, sob o argumento de que houve pronunciamento judicial expresso sobre o fato, o qual entendeu não ser possível estender a qualidade de trabalhador rural do pai à autora em virtude de ter se declarado "casada", tanto na inicial, como no instrumento de mandato, descaracterizando eventual regime de economia familiar..", acrescentando, ainda, que Não se olvida que as testemunhas ouvidas declararam que a autora nunca se casou, verifica-se, contudo, que as provas apresentadas nos autos foram apreciadas e valoradas pelo Juízo originário, o qual adotou uma solução jurídica, dentre outras, admissível, segundo seu livre convencimento, de forma motivada e razoável, considerado todo o conjunto probatório, em que, reitera-se, a própria autora informou seu estado civil como pessoa casada...".
No tocante à existência de prova nova, o d. Relator assinalou que "...Em que pese a certidão atualizada de nascimento demonstre que a autora não se casou, mantendo seu estado civil de solteira, tenho que prova nova não seria capaz de, por si só, assegurar à autora pronunciamento favorável...". Prossegue em suas explanações, aduzindo que "...é possível constatar que o pai da autora, no mínimo desde 1977, deixou de prestar supostos serviços no Sítio Santo Onofre, sendo que, desde 1981, passou claramente a se dedicar à atividade de natureza urbana, em emprego formal como faxineiro, no Município de Itatiba, onde, reitera-se, residia já desde 1970...". Conclui, por fim, que "...não há como se estender o valor probatório do documento apresentado em nome de seu genitor para o fim de validar o exercício de atividade rural pela autora em período posterior à dedicação daquele à atividade de natureza urbana....".
Pedi vista dos autos apenas para melhor reflexão quanto à possibilidade da abertura da via rescisória com base nos fundamentos indicados pela ora autora.
Para que ocorra a rescisão respaldada no inciso IX do art. 485 do CPC/1973, atual art. 966, inciso VIII, do CPC/2015, deve ser demonstrada a conjugação dos seguintes fatores, a saber : a) o erro de fato deve ser determinante para a sentença; b) sobre o erro de fato suscitado não pode ter havido controvérsia entre as partes; c) sobre o erro de fato não pode ter havido pronunciamento judicial, d) o erro de fato deve ser apurável mediante simples exame das peças do processo originário.
No caso em tela, a r. decisão rescindenda, baseada nas próprias informações prestadas pela autora na ação subjacente (inicial e procuração ad judicia), no sentido de que era casada, entendeu que não era possível estender a condição de rurícola atribuída ao seu genitor em razão da constituição de novo núcleo familiar, conforme se vê do seguinte excerto, que abaixo transcrevo:
É certo que a r. decisão rescindenda não fez qualquer menção ao depoimento prestado pela testemunha Juracy Lopes, que assinalou que "...A autora não casou nem teve filhos...", todavia penso que mesmo que tal afirmação tivesse sido considerada, não teria o condão de alterar a conclusão do julgado, dado que o casamento somente poderia ser comprovado mediante respectiva certidão pública, e sua ausência foi consignada na fundamentação do julgado, consoante se vê do trecho acima transcrito.
Portanto, tendo em vista que não seria possível detectar o alegado equívoco quanto ao estado civil da autora mediante simples exame das peças dos autos originários, não resta configurado o erro de fato.
De outra parte, é pacífico na jurisprudência o entendimento de que os brocardos jurídicos jura novit curia e da mihi factum, dabo tibi jus são aplicáveis à rescisória, de modo que, no caso vertente, não obstante o autor tenha indicado como fundamento para rescisão do julgado a ocorrência de erro de fato (inciso IX do art. 485), da narrativa da inicial é possível deduzir os elementos capazes de alicerçar a invocação da hipótese de rescisão com base em documento novo (inciso VII do art. 485), na medida em que instruiu a presente inicial com certidão de nascimento atualizada e declarações de terceiros com o escopo de demonstrar que é solteira.
Nesse sentido, confira-se a jurisprudência:
Insta acrescentar que o d. Relator apreciou o pedido, levando em conta também a hipótese de rescisão com base em documento novo.
Isto posto, penso que as declarações de terceiros, no sentido de que a autora é solteira, possuem a natureza de depoimento testemunhal reduzido a termo, não se prestando como prova material.
Por outro lado, como a autora objetiva comprovar o exercício de atividade rural, o documento carreado aos presentes autos, consistente em certidão de nascimento emitida pelo Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas de Bragança Paulista/SP, de 29.07.2009, indicando que na aludida data de expedição a autora permanece solteira, poderia ser admitido como novo, conforme pacífica jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, conforme se constata do julgado que a seguir transcrevo:
Com efeito, o fato de a autora não ter se casado altera profundamente a valoração do conjunto probatório, uma vez, não tendo se integrado a novo núcleo familiar, os documentos pertinentes a seu pai, os quais apontam sua condição de rurícola, poderiam ser reputados como início de prova material do alegado labor rural. Aliás, a própria r. decisão rescindenda reconhece expressamente tal situação, ao assinalar: "...perfilho do entendimento de que os documentos apresentados em nome dos pais, ou outros membros da família, que os qualifiquem como lavradores, possam ser aproveitados à autora, desde que se trate de mulher solteira...".
Impende salientar, outrossim, que os depoimentos testemunhais (fl. 88/89) foram unânimes em afirmar que a autora iniciou a faina campesina ainda criança, auxiliando os familiares na roça.
Em síntese, resta configurada, no caso vertente, a hipótese prevista no art. 485, inciso VII, do CPC/1973, atualizado para o art. 966, inciso VII, do CPC/2015, autorizando-se, assim, a abertura da via rescisória.
DO JUÍZO RESCISSORIUM
A parte autora completou 55 anos de idade em 01.10.2005, devendo, assim, comprovar 12 (doze) anos de atividade rural, nos termos dos artigos 142 e 143 da Lei n. 8.213/91, para a obtenção do benefício em epígrafe.
De outra parte, a jurisprudência do E. STJ firmou-se no sentido de que é insuficiente apenas a produção de prova testemunhal para a comprovação de atividade rural, na forma da Súmula 149 - STJ, in verbis:
No caso em tela, o título eleitoral em nome de seu pai, o Sr. João Marcolino da Cruz, datado de 27.07.1970, em que ostenta a profissão de lavrador (fl. 43), pode ser reputado como início de prova material do alegado labor rural, na medida em que apresenta contemporaneidade com os fatos que se pretende demonstrar.
Por seu turno, as testemunhas ouvidas em Juízo (fl. 88/89) asseveraram que conhecem a autora desde criança e que naquela época ela já ajudava sua família na roça, localizada no sítio Santo Onofre, no município de Morungaba/SP. Asseguraram, igualmente, que embora a autora tenha se mudado para a cidade, continuou trabalhando no mesmo local, pelo menos, até a data da audiência (23.10.2007; fl. 87).
Cumpre destacar que a autora reuniu vários documentos referentes ao sítio Santo Onofre (ITR do ano de 2002; certidão de matrícula do imóvel; memorial descritivo; fl. 44/46), o que indica um liame com o aludido imóvel rural, dando maior credibilidade, assim, aos depoimentos testemunhais.
Por outro lado, não obstante o genitor da autora tenha exercido atividade urbana (faxineiro), na condição de empregado, no período de 01.11.1981 a 04/1987, conforme se constata de extrato do CNIS de fl.168, anoto que a jurisprudência é pacífica no sentido de que o labor urbano exercido por um dos membros da família não descaracteriza, por si só, a qualidade de trabalhador rural, devendo ser aferida a importância desse trabalho urbano para o sustento da família. Nesse diapasão, confira-se a jurisprudência:
No caso vertente, o pai da autora exerceu a função de faxineiro, ou seja, atividade braçal, de baixa remuneração, podendo-se inferir daí que o trabalho campesino ainda se mostrava imprescindível para a subsistência do grupo familiar.
Assim sendo, não há como afastar a qualidade de rurícola da parte autora e de segurada obrigatória da Previdência Social, na condição de segurada especial, nos termos do disposto no artigo 11, inciso VII, da Lei nº 8.213/91.
Insta consignar que em relação aos trabalhadores rurais enquadrados como segurado especial, a lei previdenciária dispensou expressamente o período de carência, bastando comprovar, tão-somente, o exercício da atividade rural no período legalmente exigido, nos termos dos artigos 142 e 143, ambos da Lei n. 8.213/91, ou seja, por 144 meses, considerado o ano em que implementou o requisito etário (2005).
Em síntese, preenchidos os requisitos etário e de período de atividade rural, é de se conceder a aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo.
O termo inicial do benefício deve ser fixado a partir da data da citação realizada nos presentes autos (11.01.2010; fl. 156), conforme entendimento esposado por esta Seção, em se tratando de ação rescisória fundada em documento novo.
A correção monetária e os juros de mora deverão ser calculados de acordo com a lei de regência, observando-se as teses firmadas pelo E.STF no julgamento do RE 870.947, realizado em 20.09.2017. Quanto aos juros de mora será observado o índice de remuneração da caderneta de poupança a partir de 30.06.2009.
A base de cálculo dos honorários advocatícios corresponde às prestações vencidas até a data do presente julgamento, fixando-se o percentual em 15%, nos termos do art. 85, §2º, do CPC.
DO DISPOSITIVO DA RESCISÓRIA
Diante do exposto, divirjo, data vênia, do i. Relator e julgo parcialmente procedente o pedido deduzido na presente ação rescisória, para desconstituir a r. decisão proferida nos autos da AC. n. 2008.03.99.018075, com base no art. 485, inciso VII, do Código de Processo Civil/1973, atualizado para o art. 966, inciso VII, do CPC/2015 e, no juízo rescissorium, julgo procedente o pedido formulado pela autora na ação subjacente, para condenar o INSS a conceder-lhe o benefício de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo, a contar da data da citação no presente feito (11.01.2010). As verbas acessórias serão calculadas na forma retro explicitada. Honorários advocatícios arbitrados em 15% sobre o valor das prestações vencidas até a data do presente julgamento.
Independentemente do trânsito em julgado, expeça-se e.mail ao INSS, instruído com os devidos documentos da parte autora ROSALINA DA CRUZ a fim de serem adotadas as providências cabíveis para que seja o benefício de APOSENTADORIA RURAL POR IDADE implantado de imediato, com data de início - DIB em 11.01.2010, e renda mensal inicial no valor de um salário mínimo, tendo em vista o "caput" do artigo 497 do CPC/2015.
É como voto.
SERGIO NASCIMENTO
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0038193-50.2009.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta por ROSALINA DA CRUZ em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com fundamento no artigo 485, IX, do CPC/1973, objetivando rescindir decisão monocrática terminativa de mérito, a fim de que lhe seja concedida aposentadoria por idade rural.
Aduziu que o julgado rescindendo incorreu em erro de fato por considerá-la casada, e assim lhe negar o aproveitamento de prova em nome de seu genitor, quando na verdade é solteira, conforme certidão de nascimento atualizada e declarações de terceiros, que juntou com a inicial desta rescisória.
Em atenção à determinação de fl. 134, a autora instruiu o feito com cópia da certidão de trânsito em julgado dos autos da demanda subjacente (fls. 137-149).
À fl. 151, consta despacho que reconheceu a observância do prazo decadencial para ajuizamento da ação rescisória.
Citado (fls. 155-156), o réu apresentou contestação e documentos, às fls. 158-171, alegando, em preliminar, a ausência de interesse de agir e, no mérito, a inexistência de erro de fato e a não comprovação do exercício da atividade rural em regime de economia familiar, inclusive porque o genitor da autora exerceu atividade de natureza urbana.
A autora ofereceu réplica, silenciando quanto à suposta ocupação urbana de seu genitor (fls. 176-178).
Instadas à especificação de provas (fl. 180), a autora se manteve inerte (fl. 182) e o réu informou não ter outras provas a produzir (fl. 183).
Em atenção à determinação de fl. 185, as partes apresentaram suas razões finais (fls. 187-189 e 191-195).
O Ministério Público Federal opinou pela improcedência da ação rescisória (fls. 199-202).
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Rejeito a preliminar de ausência de interesse de agir, relativa à inadequação da via eleita para rediscussão do quadro fático da lide subjacente, por se confundir com o mérito da demanda rescisória.
A autora fundamenta a ação rescisória no artigo 485, IX, do CPC/1973, sob a alegação de ocorrência de erro de fato no julgado rescindendo, por ter sido considerada casada, negando-se-lhe o aproveitamento de prova em nome de seu genitor, quando na verdade é solteira, conforme certidão de nascimento atualizada e declarações de terceiros, que juntou com a inicial desta rescisória.
Em que pese a autora deduzir sua pretensão sob tal alegação, de erro de fato, não resta dúvida que também juntou documentos novos, aos quais faz expressa menção na inicial para o fim de demonstrar o aduzido erro, desta sorte, aplicando-se os princípios da mihi factum, dabo tibi ius e iura novit curia, entendo também presente alegação da hipótese rescisória prevista no inciso VII, do artigo 485, do CPC/1973.
Quanto ao ponto, não reconheço qualquer prejuízo à autarquia, a qual em exercício de contraditório e ampla defesa, defendeu-se quanto aos fatos apontados pelo autor, sustentando seu entendimento de que não houve comprovação do exercício da atividade rural, tendo, inclusive, juntado documentos, que, a seu ver, demonstrariam o contrário ao alegado na inicial.
Nascida em 01.10.1950 (fl. 38), a autora postulou na ação subjacente, ajuizada em 04.06.2007 (fl. 26) a concessão de aposentadoria por idade rural, mediante o reconhecimento de sua condição de trabalhadora rural, exercida apenas na propriedade de Abílio Petroni.
Por ter completado a idade mínima necessária em 2005, deveria comprovar o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao implemento do requisito anterior ou ao requerimento do benefício, equivalente à carência, no caso, de 144 (cento e quarenta e quatro) meses, ou seja, entre 1993 e 2005.
Juntou àqueles autos os seguintes documentos:
1) conta de luz do imóvel em que reside, à Rua Vicente Squilante, 45, Vila Capeletto, na zona urbana da cidade de Itatiba/SP, em nome de terceira pessoa (Antonio da Cruz), à fl. 39;
2) cópia de sua carteira profissional, emitida em 14.01.1971, em Itatiba/SP, sem vínculos registrados (fls. 40-42);
3) título eleitoral de seu genitor João Marcolino da Cruz, emitido em 27.07.1970, em que consta qualificado como "lavrador" e residente na "Vila Capeletto 45", em Itatiba/SP (fl. 43);
4) declarações de ITR e certidão de matrícula referente ao imóvel rural (Sítio Santo Onofre) de propriedade de Abílio Petroni, localizado em Morungaba/SP (fls. 44-52).
Foram ouvidas testemunhas, em 23.10.2007 (fls. 88-89):
Em 1ª Instância, o pedido foi julgado procedente (fls. 91-97), sentença modificada em 2º grau de jurisdição, dando-se provimento à apelação autárquica, conforme decisão monocrática terminativa de mérito proferida pelo Desembargador Federal Nelson Bernardes (fls. 113-119), da qual destaco o seguinte:
Sem interposição de recurso pelas partes, foi certifica o trânsito em julgado ocorrido em 21.11.2008 (fl. 148v).
Para que seja reconhecido erro de fato, hábil à rescisão da coisa julgada na forma do artigo 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, exige-se que, sem que tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva para a conclusão do decidido.
Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo.
Nesse sentido, encontra-se sedimentada a jurisprudência dos Tribunais superiores e desta Corte:
É patente a inexistência de erro de fato no julgado, pois houve pronunciamento judicial expresso sobre o fato, o qual entendeu não ser possível estender a qualidade de trabalhador rural do pai à autora em virtude de ter se declarado "casada", tanto na inicial, como no instrumento de mandato, descaracterizando eventual regime de economia familiar.
Não se olvida que as testemunhas ouvidas declararam que a autora nunca se casou, verifica-se, contudo, que as provas apresentadas nos autos foram apreciadas e valoradas pelo Juízo originário, o qual adotou uma solução jurídica, dentre outras, admissível, segundo seu livre convencimento, de forma motivada e razoável, considerado todo o conjunto probatório, em que, reitera-se, a própria autora informou seu estado civil como pessoa casada.
Assim, o julgado que não se afastou dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época.
A excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas. Nesse sentido, confira-se precedentes desta 3ª Seção:
Em relação à possibilidade de rescisão da coisa julgada em decorrência de documento novo, tem-se que a prova material nova deve ser, por si só, suficiente para modificar o julgado rescindendo, ainda que de forma parcial.
Não se objetiva reabrir a dilação probatória para, simplesmente, suprir deficiência do conjunto probatório produzido na ação originária, decorrente da não observância pela parte, por desídia ou negligência, de seu ônus processual probatório, mas, sim, viabilizar a apresentação de prova material nova, cuja existência a parte ignorava ou de que não podia fazer uso, bem como, em casos excepcionais, documento cujo valor probatório era desconhecido pela parte em razão de circunstâncias vulnerabilizantes, como aquelas vivenciadas por trabalhadores rurais.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:
Como documentos novos a autora carreou:
a) certidão atualizada de seu nascimento, emitida em 29.07.2009, sem anotações sobre alteração de seu estado civil (fl. 15);
b) declarações de terceiros, vizinhos da autora à Rua Vicente Squilante, informando conhecerem a autora entre 15 e 20 anos e que é solteira (fls. 16-17).
Em que pese a certidão atualizada de nascimento demonstre que a autora não se casou, mantendo seu estado civil de solteira, tenho que prova nova não seria capaz de, por si só, assegurar à autora pronunciamento favorável.
No caso concreto, a autora pretende lhe seja estendida a qualidade de trabalhador rural de seu pai, sob alegação de que o ajudava nas atividades rurais exercidas na propriedade de terceiro, localizada no Município de Morungaba/SP, desde sua puberdade até o momento do ajuizamento da ação subjacente.
Tal versão se mostra incongruente contraditória com os documentos juntados nos autos.
Destaco causar estranheza que, alegando o exercício, em conjunto com sua família e por toda sua vida, de atividade rural prestada para o sr. Abílio Petroni, no Sítio Santo Onofre (em Morungaba), a autora possua residência na zona urbana de Itatiba já desde 1970, conforme constante no título eleitoral de seu pai.
Ainda, verifica-se que, conforme consta do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (fls. 168-171), o pai da autora passou a trabalhar para Matias Machline (pessoa física) em 03.01.1977, permanecendo nesse emprego até 1981, sendo que, desde 01.11.1981 até 29.06.1988, exerceu atividade de "faxineiro", na empresa "Rosa do Sul Agropecuária Ltda.", localizada em Itatiba.
Embora não seja possível identificar a natureza da atividade exercida para Matias Machline, é possível constatar que o pai da autora, no mínimo desde 1977, deixou de prestar supostos serviços no Sítio Santo Onofre, sendo que, desde 1981, passou claramente a se dedicar à atividade de natureza urbana, em emprego formal como faxineiro, no Município de Itatiba, onde, reitera-se, residia já desde 1970.
Assim, não há como se estender o valor probatório do documento apresentado em nome de seu genitor para o fim de validar o exercício de atividade rural pela autora em período posterior à dedicação daquele à atividade de natureza urbana.
Ademais, o aproveitamento por extensão de documentos em nome de terceiro deve guardar correlação lógica com a situação que se pressupõe comum. Explico. Razoável a presunção de que, ante a comprovação de que algum dos membros do núcleo familiar trabalhava em regime de economia familiar, os demais também o fizessem, eis que é pressuposto necessário e comum dessa atividade o apoio mútuo e o esforço comum, sem os quais o grupo não conseguiria se manter. A mesma presunção, entretanto, não vale para o diarista, eis que o fato de um dos membros exercer funções laborativas nesta qualidade, não faz presumir que os demais também o façam, ante a inexistência de pressuposto comum ou de caraterística integrativa da parte ao todo.
Por oportuno, destaco trecho do voto condutor da relatora Desembargadora Federal Marisa Santos, no julgamento proferido, em 22.06.2017, à unanimidade desta 3ª Seção, com relação à Ação Rescisória n.º 2015.03.00.004818-6:
Ainda, ressalto que a prova testemunhal tampouco se mostrou robusta ou idônea para o fim de confirmar a atividade rural supostamente exercida, haja vista que ambas as testemunhas, há muitos anos, mudaram-se de Morungaba, de sorte que não poderiam afirmar, como não o fizeram, ter visto a autora na lida campesina supostamente exercida no Sítio Santo Onofre, limitando-se a declarar que "pelo que sabem" a autora continuou a trabalhar na roça. Registra-se que as testemunhas sequer souberam precisar quando se deu a mudança da autora para a cidade, sendo que em momento algum disseram que a mudança se deu para outro município (Itatiba).
É de se estranhar que, tendo a vida toda prestado seus serviços rurícolas à mesma terceira pessoa, a autora sequer tenha conseguido arrolar testemunhas que, efetivamente, tenham-na visto no mourejo rural, em Morungaba, pelo período equivalente à carência.
Era imprescindível que a autora tivesse apresentado início de prova material em nome próprio, a fim de, em conjunto com outros meios probatórios (como a prova oral, desde que robusta e idônea), demonstrar que efetivamente permaneceu no mourejo rural, no Sítio Santo Onofre, até a implementação do requisito etário para sua aposentação.
Por fim, ressalto o quanto disposto nas teses firmadas pela 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Recursos Especiais autuados sob n.ºs 1.354.908/SP, 1.304.479/SP e 1.348.633/SP, sob a sistemática dos recursos repetitivos representativos de controvérsia, respectivamente no sentido de que é necessária a demonstração do exercício da atividade campesina em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário; de que o trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracterize, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, sendo que, em exceção a essa regra geral, tem-se que a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana; e, de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior ou posterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, mas desde que tal período venha delineado em prova testemunhal idônea e robusta.
Desse modo, também não reconheço a existência de documento novo para fins de rescisão da coisa julgada.
Ante o exposto, rejeito a preliminar suscitada e, em iudicium rescindens, julgo improcedente a presente ação rescisória, nos termos dos artigos 269, I, do CPC/1973 e 487, I, do CPC/2015.
Custas na forma da lei.
Condeno o autor no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade das verbas honorárias devidas ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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