
| D.E. Publicado em 22/08/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar suscitada; em juízo rescindendo, julgar procedente a presente ação rescisória para desconstituir a sentença homologatória dos cálculos de liquidação na ação subjacente; e, em juízo rescisório, dou parcial provimento ao pedido pela autarquia, para determinar o prosseguimento da execução, facultando-se aos exequentes, inclusive por meio de ofício à Prefeitura Municipal de Jacareí, a comprovação dos doze últimos salários de contribuição anteriores ao desligamento do RGPS, em agosto de 1969, elaborando-se novo cálculo de liquidação, observados os critérios supra explicitados, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0074720-69.2007.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta por INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face de ISAAC RAMOS e MARIA CONCEIÇÃO APARECIDA DE SIQUEIRA, com fundamento nos artigos 485, V e IX, do CPC/1973, objetivando rescindir sentença homologatória de cálculo de liquidação, a fim de que sejam acolhidos seus cálculos.
Aduziu que o julgado violou disposição literal dos artigos 93, IX, da CF e 458 do CPC/1973.
Alegou, também, ter o julgado incorrido em erro de fato, in verbis (fl. 07):
Às fls. 250-251, consta decisão que reconheceu a observância do prazo bienal para ajuizamento da ação rescisória, dispensou o autor do depósito prévio e deferiu, em parte, a antecipação dos efeitos da tutela, apenas para suspender a execução dos valores controversos.
Citados (fls. 360-383), os réus apresentaram contestação, às fls. 268-338, alegando, em preliminar, a carência da ação e, no mérito, que a homologação dos cálculos se deu em procedimento regular, sem oposição de embargos à execução pela autarquia.
Em atenção à determinação de fls. 340, os réus juntaram procuração e requereram a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita (fls. 346-350).
A parte autora ofereceu réplica (fls. 357-358).
Deferidos os benefícios da assistência judiciária gratuita aos réus e instadas as partes à especificação de provas (fl. 385), o autor informou não ter provas a produzir e os réus se quedaram inertes (fls. 393 e 394).
O Ministério Público Federal juntou parecer contábil (fls. 395-415), sobre o qual as partes foram intimadas (fl.417), tendo apenas o autor se manifestado (fls. 421/422-423).
Oportunizada a apresentação de razões finais (fl. 425), também apenas o autor se manifestou (fls. 430-436).
O Ministério Público Federal opinou pela procedência da ação, em juízos rescindendo e rescisório (fls. 438-442).
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Rejeito a preliminar de carência da ação, relativa à viabilidade da rescisão do julgado pelos fundamentos pugnados pela parte autora, por se confundir com o mérito da demanda rescisória.
O autor fundamenta a ação rescisória no artigo 485, V e IX, do CPC/1973, sob a alegação de que o julgado violou a literal disposição dos artigos 93, IX, da CF e 458 do CPC/1973, dada a ausência de fundamentação, bem como incorreu em erro de fato ao: adotar período básico de cálculo não previsto na lei vigente à época da concessão; utilizar proventos de aposentadoria do RPPS como salários de contribuição; não respeitar o teto do salário de contribuição nas competências de junho e setembro a novembro de 1990; não observar o teto de pagamento da renda mensal; não aplicar os reajustes da renda mensal previstos em lei, confundindo-se índice de reajuste com índice de correção monetária.
Os segurados, ora réus, ajuizaram no ano de 1992, em litisconsórcio facultativo com outros, demanda previdenciária visando à concessão de aposentadoria por tempo de serviço, tendo em vista que, embora já estivessem aposentados pelo Regime Próprio de Previdência Social - RPPS do Município de Jacareí, teriam anteriormente vertido contribuições sociais para o Regime Geral de Previdência Social - RGPS (fls. 02-07).
Em 1ª Instância, o pedido foi julgado improcedente (fls. 562-66), sentença reformada em 2º grau de jurisdição, em que seu deu provimento à apelação dos autores, conforme acórdão da 2ª Turma desta Corte, constando o quanto segue no dispositivo do voto condutor da relatora, então Juíza Federal convocada, Dra. Marisa Santos (fls. 75-81):
Rejeitados os embargos de declaração opostos pela autarquia (fls. 95-98 e 104-106), relativamente a não comprovação de tempo de serviço necessário à aposentadoria por tempo de serviço, foi certificado o trânsito em julgado (fl. 108).
Iniciada a execução, o INSS apresentou seus cálculos de liquidação para os coautores, ora réus, no total de R$ 143.576,37, posicionado para 11/2005 (fls. 120-132), em que se verifica que a renda mensal do benefício de cada um equivale a um salário mínimo.
Em 20.01.2006, os exequentes, ora réus, expressamente concordaram com os cálculos da autarquia (fl. 134).
Contudo, o juízo entendeu que caberia aos exequentes apresentar memória do débito para início da execução (fl. 135), sendo que estes requereram a expedição de ofício à Prefeitura Municipal de Jacareí para informação dos salários de contribuição compreendidos entre janeiro de 1988 a dezembro de 1992 (fl.136), os quais foram informados às fls. 138-173.
Com base nesses documentos, os exequentes apresentaram seus cálculos de liquidação, no total de R$ 2.080.058,68, posicionado para 04/2006 (fls. 175-182/183-190).
Citado para os fins do artigo 730 do CPC/1973 (fls. 193-194), o INSS deixou de opor embargos à execução (fl. 297), tendo sido proferida, em 06.10.2006, a sentença, ora rescindenda, que segue na íntegra (fl. 196):
A autarquia, então, informou ao juízo os equívocos do cálculo homologado, apontando como devido o valor total de R$ 152.958,41, posicionado também para 04/2006 (fls. 204-219), tendo o juízo se pronunciado nos seguintes termos:
A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta (confira-se: STJ, S1, AR 4264, relator Ministro Humberto Martins, DJe 02.05.2016).
Ainda, para que seja reconhecido erro de fato, hábil à rescisão da coisa julgada na forma do artigo 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, exige-se que, sem que tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva para a conclusão do decidido.
Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo.
Nesse sentido, encontra-se sedimentada a jurisprudência dos Tribunais superiores e desta Corte:
No caso em apreço, há que se evidenciar, inicialmente, alguns dados relevantes para a execução:
a) o título judicial é silente quanto ao cálculo da renda mensal inicial do benefício (aposentadoria por tempo de contribuição), tendo apenas fixado a sua data de início na data da citação (em 16.12.1992) e determinado a incidência de correção monetária, a partir de cada vencimento, e de juros moratórios, desde a citação;
b) Isaac Ramos é servidor público municipal estatutário, aposentado desde 07.01.1986 no RPPS, tendo contribuído para o RGPS, já como servidor da Prefeitura Municipal de Jacareí, no período de 01/1964 a 08/1969 (fls. 34/39);
c) Maria Conceição Aparecida de Siqueira é servidora pública municipal estatutária, aposentada desde 30.06.1980 no RPPS, tendo contribuído para o RGPS, já como servidor da Prefeitura Municipal de Jacareí, nos períodos de 01/1961 e de 07/1961 a 08/1969 (fls. 34/46);
d) as informações prestadas pela Prefeitura Municipal de Jacareí sobre os "salários de contribuição" dos réus-exequentes no período de 01/1988 a 12/1992 se referem aos proventos de aposentadoria pagos aos servidores aposentados.
O INSS, considerando a data de início do benefício, a lei vigente à época (Lei n.º 8.213/91 - LBPS) e a ausência de comprovação dos salários de contribuições no período básico de cálculo, calculou a renda mensal inicial no valor de um salário mínimo (artigo 35 da LBPS), procedendo à aplicação dos reajustes, correção monetária e juros de mora, tendo calculado o valor total de execução em R$ 143.576,37, posicionado para 11/2005, ou R$ 152.958,41, atualizado até 04/2006.
Os réus-exequentes utilizaram para o cálculo do salário de benefício o valor dos proventos de aposentadoria recebidos da Prefeitura Municipal de Jacareí, apurando o total de R$ 2.080.058,68, posicionado para 04/2006.
Destaco, dado o caráter imparcial da manifestação ministerial, as impropriedades do cálculo dos exequentes apuradas segundo parecer contábil elaborado por analista pericial contador do Ministério Público Federal (fls. 396-399):
O juízo da execução não se arvorou em cálculo de contador judicial e, ao homologar os cálculos elaborados pela parte exequente, não se manifestou, sequer sucintamente, sobre a aberrante diferença de valores apurados pelas partes.
Não se olvida que a autarquia, citada para os fins do artigo 730 do CPC/1973, deixou de se opor à execução.
Contudo, é cediço que à Fazenda Pública não se aplicam os efeitos materiais da revelia, haja vista a natureza indisponível dos direitos protegidos, conforme precedentes abaixo, mormente quando se trata do RGPS, em que há necessidade de proteção não só dos direitos do segurado que litiga contra o INSS, mas também dos direitos do conjunto de igualmente hipossuficientes segurados representados pela autarquia, de sorte que não se pague a um determinado segurado valores indevidos, utilizando-se de recursos de todo o conjunto de segurados.
Tampouco se desconhece sedimentado entendimento referente à mitigação do rigor e formalismo quanto à decisão homologatória de cálculos de liquidação em que não há divergência entre as partes, entretanto, esse não foi o caso concreto.
Ainda que não tenha formalmente se oposto à execução, por meio de embargos, o INSS já havia apresentado o cálculo do valor que entendia devido, montante este gritantemente inferior ao quanto apurado posteriormente pelos exequentes, o qual, reitero, foi calculado em vultosos R$ 2.080.058,68 (dois milhões, oitenta mil e cinquenta e oito reais e sessenta e oito centavos), valor equivalente a mais do o décuplo do quanto reconhecido pela autarquia (R$ 152.958,41), daí exsurgindo, nitidamente, a divergência entre as partes.
Além da expressa diferença dos valores apurados pelas partes, que, por si só, exigia do julgador originário postura mais cautelosa quanto à eventual lesão ao patrimônio público, há que se destacar que os "salários de contribuição" utilizados no cálculo dos exequentes se referiam a proventos de aposentadoria, inclusive pagos com recursos de RPPS, isto é, em momento algum se trataram de salários pagos em razão do exercício de atividade de filiação obrigatória ao RGPS, com as devidas contribuições ao regime geral.
A absoluta ausência de fundamentação para acolhimento dos cálculos da parte exequente implica efetiva violação aos preceitos expressos nos artigos 93, IX, da Constituição e 458, II, do CPC/1973, que exigem que todas as decisões judiciais sejam motivadas, ainda que sucintamente,, sob pena de nulidade.
Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:
Ainda, é patente o erro de fato quanto à utilização de proventos de aposentadoria pagos pelo RPPS como salários de contribuição para o fim de cálculo do salário de benefício vinculado ao RGPS.
Em iudicium rescindens, portanto, imperativa a procedência da presente rescisória, com a desconstituição do julgado rescindendo.
Passo ao mérito, em iudicium rescisorium.
Conforme supra exposado, o título judicial é silente quanto ao cálculo da renda mensal inicial do benefício (aposentadoria por tempo de contribuição), tendo apenas fixado a sua data de início na data da citação (em 16.12.1992), bem como determinado a incidência de correção monetária, a partir de cada vencimento, e de juros moratórios, desde a citação, sem especificação sobre índices de correção e percentuais de juros.
Encontra-se sedimentado o entendimento de que, por força do princípio tempus regit actum, aplicam-se aos benefícios a lei vigente à época da aquisição do respectivo direito. Confira-se:
Assim, a renda mensal inicial deve ser calculada de acordo com a lei vigente na data da aquisição do direito à aposentadoria.
Considerando que a partir de setembro de 1969 tanto Isaac Ramos como Maria Conceição Aparecida de Siqueira passaram a ser vinculados ao RPPS instituído no Município de Jacareí, com sua última contribuição ao RGPS em agosto de 1969, há que se aplicar a lei vigente à época da aquisição do direito à aposentadoria por tempo de serviço, qual seja, a Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS (Lei n.º 3.807/60), com as alterações do Decreto-Lei n.º 66/66 e da Lei n.º 5.440-A/68.
O período básico de cálculo (PBC) deverá observar os estritos termos do artigo 23 da LOPS. O salário de benefício será calculado com base nos últimos dozes salários de contribuição, considerado o termo inicial do PBC em agosto de 1969.
Ressalto que houve contribuição no período, conforme informação prestada pela Prefeitura Municipal de Jacareí, contudo, verifica-se que não consta nos autos da ação subjacente a relação de salários de contribuição do período, devendo ser facultado aos exequentes, inclusive por meio de ofício à referida Prefeitura, a comprovação dos salários de contribuições do período e, caso não comprovados, utilizar-se-á o valor do salário mínimo.
Deverão ser observados no cálculo do salário de benefício e da renda mensal, os valores máximos do salário de contribuição e do salário de benefício previstos à respectiva época.
Quanto ao ponto, destaco que a LOPS previa a possibilidade de que a renda mensal do benefício fosse inferior ao valor do salário mínimo, assim, calculando-se o salário de benefício e a renda mensal inicial do benefício nos estritos termos da LOPS, após seus devidos reajustamentos deverá ser observada, a partir de sua promulgação, a Constituição de 1988 que vedou o pagamento da renda mensal do benefício em valor inferior a um salário mínimo (artigo 201, §5º, na redação original, e § 2º na atual redação dada pela EC n.º 20/98).
O reajustamento do valor da renda mensal, que não se confunde com a correção monetária das prestações atrasadas, deverá observar as datas e índices de reajuste previstos em lei, bem como o disposto no enunciado de Súmula n.º 260 do extinto Tribunal Federal de Recursos ("No primeiro reajuste do benefício previdenciário, deve-se aplicar o índice integral do aumento verificado, independentemente do mês da concessão, considerado, nos reajustes subseqüentes, o salário mínimo então atualizado.").
Ressalto que a aplicação do índice integral de aumento se deve, justamente, porque a LOPS não previa a atualização dos salários de contribuição para cálculo da renda mensal inicial.
Os juros de mora, devidos desde a citação na fase de conhecimento da ação subjacente, devem ser fixados de acordo com o Manual de Cálculos e Procedimentos aplicável à Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Já a correção monetária dos valores em atraso, incidente sobre a renda mensal devida a partir da data de cada vencimento, deverá ser calculada de acordo com o Manual de Cálculos e Procedimentos da Justiça Federal, naquilo em que não conflitar com o disposto na Lei nº 11.960/09, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Ante o exposto, rejeito a preliminar suscitada; em iudicium rescindens, com fundamento nos artigos 485, V e IX, do CPC/1973 e 966, V e VIII, do CPC/2015, julgo procedente a presente ação rescisória para desconstituir a sentença homologatória dos cálculos de liquidação na ação subjacente; e, em iudicium rescisorium, dou parcial provimento ao pedido pela autarquia, para determinar o prosseguimento da execução, facultando-se aos exequentes, inclusive por meio de ofício à Prefeitura Municipal de Jacareí, a comprovação dos doze últimos salários de contribuição anteriores ao desligamento do RGPS, em agosto de 1969, elaborando-se novo cálculo de liquidação, observados os critérios supra explicitados.
Custas na forma da lei.
Condeno os réus no pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$ 2.000,00 (dois mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal para as dívidas civis, conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
É como voto.
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 17/08/2017 13:16:13 |
