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PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LEI. ERRO DE FATO. DOCUMENTO NOVO. NÃO CONFIGURADOS. TRF3. 0009509-13.2012.4.03.0000...

Data da publicação: 13/07/2020, 03:36:49

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LEI. ERRO DE FATO. DOCUMENTO NOVO. NÃO CONFIGURADOS. 1. Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18.03.2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC. 2. Quanto à alegação de inépcia da exordial, observo que os documentos trazidos pela autora com a petição inicial são suficientes para a compreensão e deslinde da demanda, bem como preenche todos os requisitos dos artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil de 1973, não se podendo falar em inépcia da petição inicial. A alegação de carência de ação confunde-se com o mérito da demanda e com ele será examinada. 3. A parte autora objetiva rescindir julgado que negou a concessão de benefício assistencial por entender ausente o requisito da miserabilidade. Alega a requerente que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS não é o único apto a caracterizar o estado de necessidade (miserabilidade) amparado pelo benefício. 4. A decisão rescindenda concluiu pela ausência do requisito de miserabilidade sopesando todos os elementos de prova produzidos no feito subjacente, não restando configurada a hipótese legal do inciso V do art. 485 do CPC/73 (art. 966, inciso V, do CPC/15). 5. Em que pese a irresignação da parte autora, não restou configurado erro de fato no julgado rescindendo. Não houve a admissão de fato inexistente, tampouco a ignorância de fato existente. O julgado foi claro em esclarecer que a situação econômica apresentada pela parte requerente, à época, caracterizava um padrão de vida simples, humilde, todavia insuficiente para encaixá-la no requisito de miserabilidade exigido pelo benefício assistencial. 6. Todavia, o documento em questão não configura "documentação nova", na acepção jurídica do termo, uma vez que emitido após a data do trânsito em julgado da decisão rescindenda, portanto não existia à época do julgamento da demanda subjacente. 7. Preliminares rejeitadas e rescisória improcedente. (TRF 3ª Região, TERCEIRA SEÇÃO, AR - AÇÃO RESCISÓRIA - 8655 - 0009509-13.2012.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL LUCIA URSAIA, julgado em 08/11/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/11/2018 )


Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO

D.E.

Publicado em 28/11/2018
AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0009509-13.2012.4.03.0000/SP
2012.03.00.009509-6/SP
RELATORA:Desembargadora Federal LUCIA URSAIA
AUTOR(A):MARIA GUIOMAR DE SOUZA
ADVOGADO:SP094702 JOSE LUIZ PENARIOL e outro(a)
RÉU/RÉ:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG.:00019602020064036124 Vr SAO PAULO/SP

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO DE LEI. ERRO DE FATO. DOCUMENTO NOVO. NÃO CONFIGURADOS.
1. Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18.03.2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.
2. Quanto à alegação de inépcia da exordial, observo que os documentos trazidos pela autora com a petição inicial são suficientes para a compreensão e deslinde da demanda, bem como preenche todos os requisitos dos artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil de 1973, não se podendo falar em inépcia da petição inicial. A alegação de carência de ação confunde-se com o mérito da demanda e com ele será examinada.
3. A parte autora objetiva rescindir julgado que negou a concessão de benefício assistencial por entender ausente o requisito da miserabilidade. Alega a requerente que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS não é o único apto a caracterizar o estado de necessidade (miserabilidade) amparado pelo benefício.
4. A decisão rescindenda concluiu pela ausência do requisito de miserabilidade sopesando todos os elementos de prova produzidos no feito subjacente, não restando configurada a hipótese legal do inciso V do art. 485 do CPC/73 (art. 966, inciso V, do CPC/15).
5. Em que pese a irresignação da parte autora, não restou configurado erro de fato no julgado rescindendo. Não houve a admissão de fato inexistente, tampouco a ignorância de fato existente. O julgado foi claro em esclarecer que a situação econômica apresentada pela parte requerente, à época, caracterizava um padrão de vida simples, humilde, todavia insuficiente para encaixá-la no requisito de miserabilidade exigido pelo benefício assistencial.
6. Todavia, o documento em questão não configura "documentação nova", na acepção jurídica do termo, uma vez que emitido após a data do trânsito em julgado da decisão rescindenda, portanto não existia à época do julgamento da demanda subjacente.
7. Preliminares rejeitadas e rescisória improcedente.


ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar e, no mérito, julgar improcedente o pedido formulado na ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.


São Paulo, 08 de novembro de 2018.
LUCIA URSAIA


Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por:
Signatário (a): MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063
Nº de Série do Certificado: 1B1C8410F7039C36
Data e Hora: 09/11/2018 18:37:10



AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0009509-13.2012.4.03.0000/SP
2012.03.00.009509-6/SP
RELATORA:Desembargadora Federal LUCIA URSAIA
AUTOR(A):MARIA GUIOMAR DE SOUZA
ADVOGADO:SP094702 JOSE LUIZ PENARIOL e outro(a)
RÉU/RÉ:Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADVOGADO:SP000030 HERMES ARRAIS ALENCAR
No. ORIG.:00019602020064036124 Vr SAO PAULO/SP

RELATÓRIO

A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Trata-se de ação rescisória ajuizada por MARIA GUIOMAR DE SOUZA em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com fundamento no artigo 485, incisos V (violação de lei), VII (documento novo) e IX (erro de fato) do Código de Processo Civil/1973, visando à desconstituição de decisão monocrática (fls. 73/74) que, ao negar provimento ao seu recurso de apelação, manteve a sentença (fls. 64/66) de improcedência do pedido de concessão de benefício assistencial.


Alega a parte autora que preenche todos os requisitos para a concessão do benefício assistencial conforme demonstra o relatório social. Além disso, alega violação de lei porque não se pode utilizar o critério de renda per capta superior a ¼ do salário mínimo para impedir a concessão do benefício quando por outros documentos probatórios se comprova a pobreza e miserabilidade da requerente, portanto, houve erro de fato no acórdão resultante da não apreciação das provas carreadas aos autos. Por fim, fornece relatório emitido pela Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social, datado de 10/11/2011, em que relata situação de vulnerabilidade social da requerente. Assim, postula a rescisão do julgado e o reconhecimento do seu direito ao recebimento do benefício assistencial.


Foram deferidos à autora os benefícios da assistência judiciária gratuita e a dispensa de efetuar o depósito prévio previsto no art. 488, II, do CPC/1973 (fl. 80).


Regularmente citada (fls. 84/85), a autarquia-ré apresentou contestação (fls. 87/104), alegando, preliminarmente, inépcia da inicial por ausência de documentos indispensáveis, bem como carência de ação, uma vez que pretende a parte autora utilizar-se da ação rescisória como sucedâneo de recurso. Refuta a ocorrência de erro de fato e ressalta que a autora quer uma nova leitura do conjunto fático debatido na ação originária. Alega que não configura documento novo aquele que a parte deixa de utilizar por negligência, que a declaração fornecida é posterior ao trânsito em julgado da decisão rescindenda e não garante a inversão do julgado, de modo que não atende ao conceito de documento novo. Assim, pugna pela improcedência do pedido rescisório.


A parte autora manifestou-se sobre a contestação (fls. 107/109).


Intimadas as partes, apenas o INSS apresentou razões finais, reiterando as teses até então sustentadas (fls. 115/117).


O Ministério Público Federal ofertou parecer às fls. 119/125, opinando pela improcedência da ação rescisória.


A parte autora apresentou petição e documentos (fls. 127/134), requerendo a prioridade no julgamento e concessão da tutela de urgência.


É o relatório.



VOTO

A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Registro que a presente ação rescisória foi ajuizada em 28/03/2012, ou seja, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973.


Impõe-se observar que, publicada a r. decisão rescindenda e interposta a presente ação rescisória em data anterior a 18.03.2016, a partir de quando se torna eficaz o Novo Código de Processo Civil, consoante as conhecidas orientações a respeito do tema adotadas pelos C. Conselho Nacional de Justiça e Superior Tribunal de Justiça, as regras de interposição da presente ação a serem observadas em sua apreciação são aquelas próprias ao CPC/1973. Inteligência do art. 14 do NCPC.


Verifico que foi obedecido o prazo de dois anos estabelecido pelo artigo 495 do CPC/1973, considerando a certidão (fl. 75) de trânsito em julgado em 31/03/2011.


Quanto à alegação de inépcia da exordial, observo que os documentos trazidos pela autora com a petição inicial são suficientes para a compreensão e deslinde da demanda, bem como preenche todos os requisitos dos artigos 282 e 283 do Código de Processo Civil de 1973, não se podendo falar em inépcia da petição inicial.


A alegação de carência de ação confunde-se com o mérito da demanda e com ele será examinada.


Dado o caráter excepcional de que se reveste a ação rescisória, para a configuração da hipótese de rescisão em questão, é certo que o julgado impugnado deve violar preceito legal de sentido unívoco e incontroverso.


Sobre o tema, anota Theotonio Negrão:

"Art. 485: 20. 'Para que a ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC prospere, é necessário que a interpretação dada pelo 'decisum' rescindendo seja de tal modo aberrante que viole o dispositivo legal em sua literalidade. Se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merece vingar, sob pena de tornar-se recurso ordinário com prazo de interposição de dois anos' (RSTJ 93/416. no mesmo sentido: RT 634/93." (Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. São Paulo: Saraiva, 44ª edição, 2012, p. 600).

A parte autora objetiva rescindir julgado que negou a concessão de benefício assistencial por entender ausente o requisito da miserabilidade. Alega a requerente que o critério fixado pelo parágrafo 3º do artigo 20 da LOAS não é o único apto a caracterizar o estado de necessidade (miserabilidade) amparado pelo benefício.


O benefício assistencial está previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, bem como na Lei nº 8.742/93, com redação dada pela Lei 12.435/2011, e prevê "a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".


Por sua vez, a Lei 8.742/93 dispõe, em seu art. 20, caput, que "O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família".


Assim, extrai-se das normas citadas a imprescindibilidade de se satisfazer a dois requisitos para o deferimento do beneficio assistencial em tela, quais sejam: primeiro, a caracterização da incapacidade do requerente, em decorrência de sua deficiência (incapacidade) e/ou o caráter de idoso; e, segundo, a situação de penúria em que ele se encontra (miserabilidade), de sorte que, da conjugação desses dois pressupostos, transpareça a sua impossibilidade de prover o seu sustento ou de tê-lo provido por sua família.


Considera-se pessoa idosa, para fins de concessão do benefício de prestação continuada, aquela que possua 65 (sessenta e cinco) anos, nos termos do art. 20, caput, da supracitada lei.


No caso dos autos, a parte autora é idosa, contando, atualmente, com 82 (oitenta e dois anos) anos de idade (fl. 37); sendo que, à época da propositura do feito subjacente, contava com 70 (setenta) anos de idade.


A respeito do critério da comprovação da incapacidade da família para prover a manutenção do deficiente ou idoso, dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93: considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. Requisito que restou reproduzido no inciso IV do artigo 4º do Decreto 6.214/07.


Referido critério foi analisado pelo Supremo Tribunal Federal, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1.232/DF), a qual foi julgada improcedente, conforme ementa a seguir reproduzida:

CONSTITUCIONAL. IMPUGNA DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL QUE ESTABELECE O CRITÉRIO PARA RECEBER O BENEFÍCIO DO INCISO V DO ART. 203, DA CF. INEXISTE A RESTRIÇÃO ALEGADA EM FACE AO PRÓPRIO DISPOSITIVO CONSTITUCIONAL QUE REPORTA À LEI PARA FIXAR OS CRITÉRIOS DE GARANTIA DO BENEFÍCIO DE SALÁRIO MÍNIMO À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA E AO IDOSO. ESTA LEI TRAZ HIPÓTESE OBJETIVA DE PRESTAÇÃO ASSISTENCIAL DO ESTADO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
(STF ADI 1.234-DF. Rel. p/ Acórdão Min. Nelson Jobim. J. 01.06.01).

Em que pese o reconhecimento da constitucionalidade do §3º do artigo 20, da Lei 8.742/93, o requisito financeiro estabelecido pela lei começou a ter sua constitucionalidade contestada, pois, na prática, permitia que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Assim, a jurisprudência passou a admitir a possibilidade do exame de situações subjetivas tendentes a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Interpretação consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça em recurso especial julgado pela sistemática do artigo 543-C do CPC (REsp. 1.112.557-MG; Terceira Seção; Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho; j. 28/10/2009; DJ 20/11/2009).


Em decorrência, a questão voltou à análise do Supremo Tribunal Federal, que após o reconhecimento da existência da sua repercussão geral, no âmbito da Reclamação 4374 - PE, julgada em 18/04/2013, prevaleceu o entendimento segundo o qual as significativas mudanças econômicas, bem como as legislações em matéria de benefícios previdenciários e assistenciais trouxeram outros critérios econômicos que aumentaram o valor padrão da renda familiar per capita, de sorte que ao longo de vários anos desde a sua promulgação, o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização, conforme ementa a seguir transcrita:

Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203, V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu critérios para que o benefício mensal de um salário mínimo fosse concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovassem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º da Lei 8.742/1993 e a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que "considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo". O requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente. Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Reclamação como instrumento de (re)interpretação da decisão proferida em controle de constitucionalidade abstrato. Preliminarmente, arguido o prejuízo da reclamação, em virtude do prévio julgamento dos recursos extraordinários 580.963 e 567.985, o Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamação. O STF, no exercício da competência geral de fiscalizar a compatibilidade formal e material de qualquer ato normativo com a Constituição, pode declarar a inconstitucionalidade, incidentalmente, de normas tidas como fundamento da decisão ou do ato que é impugnado na reclamação. Isso decorre da própria competência atribuída ao STF para exercer o denominado controle difuso da constitucionalidade das leis e dos atos normativos. A oportunidade de reapreciação das decisões tomadas em sede de controle abstrato de normas tende a surgir com mais naturalidade e de forma mais recorrente no âmbito das reclamações. É no juízo hermenêutico típico da reclamação - no "balançar de olhos" entre objeto e parâmetro da reclamação - que surgirá com maior nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no controle de constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a determinada decisão do STF, o Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua própria decisão. E, inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisão-parâmetro da reclamação, se entender que, em virtude de evolução hermenêutica, tal decisão não se coaduna mais com a interpretação atual da Constituição. 4. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97 , que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6. Reclamação constitucional julgada improcedente.
(Órgão Julgador: Tribunal Pleno, J. 18/04/2013, DJe-173 DIVULG 03/09/2013, PUBLIC 04/09/2013).

Desta forma, como o objetivo da assistência social é prover o mínimo para a sobrevivência do idoso ou incapaz, de modo a assegurar uma sobrevivência digna, para sua concessão não há que se exigir uma situação de miserabilidade absoluta, bastando à caracterização de que o beneficiário não tem condições de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família. Por isso, nada impede que o juiz, diante de situações particularizadas, em face das provas produzidas, reconheça a condição de pobreza do requerente do benefício assistencial, ainda que o núcleo familiar tenha renda per capita superior ao valor correspondente a 1/4 do salário-mínimo.


Assim sendo, a utilização exclusiva do critério da renda per capita para fins de aferição do requisito da miserabilidade fere o espírito do benefício assistencial, que é de amparar os necessitados. Anoto que, à época da decisão rescindenda, a jurisprudência se direcionava no sentido de aferir a miserabilidade por outros meios além do critério aritmético, verificando-se no caso concreto situações de real necessidade econômica.


Tal posicionamento restou pacificado no REsp nº 1.112.557/MG, submetido ao procedimento dos recursos repetitivos, e restou consagrada no julgamento da Reclamação 4374 - PE, julgada em 18/04/2013, pelo STF, no sentido de que o §3º do art. 20 da LOAS passou por um processo de inconstitucionalização.


A r. sentença de fls 64/66, julgou improcedente o pedido, no mesmo sentido do parecer exarado pelo representante ministerial (fls. 67/71), nos seguintes termos:


"(...)

Por outro lado, vejo, às folhas 49/52, a partir das conclusões constantes do laudo pericial social produzido no curso da instrução processual, que o âmbito familiar da autora é composto de três pessoas: Maria Guiomar de Souza (autora), Anacleto Alves de Souza (marido, e Silvana Alves de Souza (filha). O marido recebe por mês R$ 460,00a título de aposentadoria. Quando em atividade, teria sido contribuinte do INSS. Na verdade, a partir dos dados do banco de informações do CNIS - Cadastro Nacional de informações Sociais, à folha 45, constato que, em dezembro de 1998, foi aposentado como estatutário vinculado à Prefeitura Municipal de Dirce Reis. A filha, por ser deficiente, titulariza o benefício assistencial no valor do salário mínimo. Há menção ainda, no laudo de que a autora teria outros dez filhos, todos maiores e casados. Seus nomes foram passados à perita. A casa em que reside a família conta com boa estrutura física , e, no momento da visita pericial, estava em bom estado de conservação e de higiene. Construída em alvenaria, conta com dois quartos, sala, cozinha, banheiro, lavanderia, e varanda, e está localizada em bairro servido de importantes equipamentos públicos (água encanada, asfalto, energia elétrica, rede de esgotos e dejetos, e limpeza pública). Todos os cômodos estão devidamente guarnecidos por móveis e demais utensílios domésticos. A organização interna da residência e sua higiene obtiveram ótima avaliação pela perita judicial. Não foram retratados gastos extraordinários no estudo. Os medicamentos necessários são fornecidos pela rede pública de saúde.


Diante do quadro probatório formado, na minha visão, a autora não tem direito ao benefício, e isto porque os rendimentos per capita no ambiente familiar retratado constituem empecilho ao seu reconhecimento. Significa que a família não pode ser considerada necessitada ao ponto de justificar a concessão, o que não quer dizer que não seja pobre. Apenas os realmente miseráveis tem direito. Não custa dizer que tenho me pautado pelo entendimento que permite a exclusão dos rendimentos auferidos a título de aposentadoria por um dos membros da família, do cálculo da renda mensal per capita familiar. Levo em consideração o art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/2003. Ora, se a lei não considera, para fins de mensuração da renda familiar per capita, os rendimentos recebidos por um de seus membros a título de benefício assistencial, seria desproporcional excluir, também, os rendimentos auferidos a título de aposentadoria, desde que, é claro, situada a renda mensal do benefício em um salário mínimo. E nem seria este o caso, já que a renda da aposentadoria do marido da autora está situada acima do patamar mínimo. Entretanto, esse entendimento é apenas aplicado naqueles casos em que a família corra risco social premente derivado de situações concretas peculiares, hipótese que não se subsume à situação concreta demonstrada. Serviria, assim, a concessão, apenas para complemento de renda existente ali. Inexiste, portanto, no meu entender, a miserabilidade exigida para a concessão do benefício, sendo certo que a conformação legislativa, na forma já explicitada acima, em consonância com o que dispõe a previsão constitucional, optou somente pelos realmente miseráveis, haja vista o real objetivo da assistência social. Nada obsta que a lei seja mudada e a partir de então preveja novos critérios para a concessão da prestação assistencial, entendimento que leva em conta o princípio da separação dos poderes. Ademais, como visto, se a autora possui outros dez filhos maiores, deveria ter feito prova cabal durante a instrução de que eles realmente não possuem condições financeiras de socorrê-la. O ônus, no caso, cabia apenas a ela. Osa dados relativos aos filhos constantes do estudo social foram apenas passados pela própria interessada na concessão. Esta é, aliás, a disciplina legal (v. art. 14 da Lei nº 10.741/03 - "Se o idoso ou seus familiares não possuírem condições econômicas de prover o seu sustento, impõe-se ao Poder Público esse provimento, no âmbito da assistência social" - grifei).

(...)"


A decisão rescindenda (fls. 73/74), por sua vez, esclarece que a miserabilidade do grupo familiar pode ser aferida de modo objetivo com base na renda igual ou inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo, todavia, deixa claro que a concessão do benefício não exige uma condição de miserabilidade absoluta, de modo que analisou as demais informações trazidas no feito subjacente concluindo que:

"Entretanto, pelas informações expostas no estudo social (fls. 48/52), o núcleo familiar é composto pela Autora, pelo marido e por um filha inválida. A casa por eles habitada apresenta condições razoáveis, com a presença de infra-estrutura básica e móveis em bom estado. O marido recebe rendimento no valor de R$ 460,00 e não houve a especificação de despesas que pudessem revelar a insuficiência do ganho para a cobertura das necessidades elementares da família.
Assim, o padrão de vida exibido, embora não seja ideal, não integra certamente o estrato social mirado pela política assistencial do Estado.
Dessa forma, a parte Autora não faz jus ao benefício assistencial uma vez que a renda mensal per capita familiar ultrapassa a ¼ do salário mínimo.
Assim, ausente o requisito da hipossuficiência econômica, resta prejudicada a análise dos demais requisitos ensejadores à concessão do benefício" (fl. 74vº).

Desta forma, tanto a sentença quanto a decisão rescindenda concluíram pela ausência do requisito de miserabilidade sopesando todos os elementos de prova produzidos no feito subjacente, não restando configurada a hipótese legal do inciso V do art. 485 do CPC/73 (art. 966, inciso V, do CPC/15).


Tampouco resta configurada a hipótese prevista no artigo 485, inciso IX e §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil/1973, pois para a verificação do erro de fato, a ensejar a rescisão do julgado, é necessário que este tenha admitido fato inexistente ou considerado inexistente fato efetivamente ocorrido, bem como não tenha ocorrido controvérsia e nem pronunciamento judicial sobre o fato.


Não se presta a rescisória ao rejulgamento do feito, como ocorre na apreciação dos recursos. Para se desconstituir a coisa julgada com fundamento em erro de fato é necessária a verificação de sua efetiva ocorrência, no conceito estabelecido pelo próprio legislador.


Nas palavras do eminente processualista Cassio Scarpinella Bueno: "O erro de fato não autoriza a rescisão da sentença e o proferimento de nova decisão por má avaliação da prova ou da matéria controvertida em julgamento. Não se trata de uma "nova chance" para rejulgamento da causa. Muito diferentemente, o erro de fato que autoriza a ação rescisória é o que se verifica quando a decisão leva em consideração fato inexistente nos autos ou desconsidera fato inconteste nos autos. Erro de fato se dá, por outras palavras, quando existe nos autos elemento capaz, por si só, de modificar o resultado do julgamento, embora ele não tenha sido considerado quando do seu proferimento ou, inversamente, quando leva-se em consideração elemento bastante para julgamento que não consta dos autos do processo" (in Código de Processo Civil Interpretado. Coordenador Antonio Carlos Marcato. São Paulo: Atlas, 2004, p. 1480).


Confira-se, ainda, o entendimento adotado à unanimidade pela Terceira Seção desta Corte Regional:

"AÇÃO RESCISÓRIA - BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NO ARTIGO 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - INEXISTÊNCIA DE ERRO DE FATO E AUSENTE A VIOLAÇÃO DE DISPOSITIVOS LEGAIS. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO RESCISÓRIA.
- Rejeitada a preliminar arguida pelo INSS em contestação, vez que a presença ou não dos requisitos para a propositura da ação rescisória, elencados taxativamente no artigo 485 do Código de Processo Civil, diz respeito ao mérito.
- No caso dos autos houve a apreciação da prova documental, evidência essa que obsta o reconhecimento do "erro de fato".
- O v. acórdão rescindendo analisou a prova constante dos autos da ação originária, à luz da legislação específica que rege a matéria, inexistindo, assim, violação aos dispositivos constitucionais e dos artigos da Lei nº 8.742/93, mencionados na inicial do pedido rescisório.
- A autora não comprova que é "deficiente" nos termos da lei, posto que consoante laudo de fls. 147/150, tem independência para os atos da vida civil, para os afazeres domésticos e para ter uma vida normal.
- Aliada a essa independência funcional, estão as condições econômicas favoráveis em que vive a autora, com marido aposentado, desde o ano de 1995 (NB 025024532) e uma filha professora, que com ela reside, exercendo a profissão junto à Prefeitura de Mineiros do Tietê, percebendo salário de aproximadamente mil reais, consoante informações extraídas do Sistema CNIS.
- Além de não estar caracterizada a sua condição de deficiente, a família da autora possui rendimentos suficientes para suprir suas necessidades básicas, residindo, inclusive, em casa própria.
- Não atendidas as exigências previstas na lei, o direito ao benefício previsto no artigo 203 da Constituição Federal não pode ser reconhecido. - Deferidos à autora os benefícios da justiça gratuita.
- Ação rescisória improcedente."
(AR n.º 0028418-84.2004.4.03.0000, Relatora Desembargadora Federal Leide Polo, j. 09/06/2011, DJ-e 16/06/2011, p. 66).

Assim, em que pese a irresignação da parte autora, não restou configurado erro de fato no julgado rescindendo. Não houve a admissão de fato inexistente, tampouco a ignorância de fato existente. O julgado foi claro em esclarecer que a situação econômica apresentada pela parte requerente, à época, caracterizava um padrão de vida simples, humilde, todavia insuficiente para encaixá-la no requisito de miserabilidade exigido pelo benefício assistencial.


Por fim, a parte requerente pretende a rescisão do julgado com fundamento em documento novo.


Para que o documento seja considerado novo, para fins de rescisão do julgado com fundamento no artigo 485, inciso VII, do Código de Processo Civil/73, é necessário que ele já exista quando da prolação da sentença, mas sua existência era ignorada pelo autor da ação rescisória, ou que dele não pôde fazer uso. O documento deve ser de tal ordem que, por si só, seja capaz de alterar o resultado da decisão rescindenda e assegurar pronunciamento favorável.


Imprescindível, ainda, a inexistência de desídia ou negligência da parte na não utilização de documento preexistente, por ocasião da demanda originária.


Nas palavras do eminente processualista Vicente Grecco Filho: "O documento novo não quer dizer produzido após a sentença, mas documento até então desconhecido ou de utilização impossível. A impossibilidade de utilização deve ser causada por circunstâncias alheias à vontade do autor da rescisória. A negligência não justifica o seu não-uso na ação anterior. Aliás, esta última situação é de ocorrência comum. A parte (ou o advogado) negligencia na pesquisa de documentos, que muitas vezes estão à sua disposição em repartições públicas ou cartórios. Essa omissão não propicia a rescisão, mesmo que a culpa seja do advogado e não da parte. A esta cabe ação de perdas e danos, eventualmente. Como no inciso anterior, o documento novo deve ser suficiente para alterar o julgamento, ao menos em parte, senão a sentença se mantém." (Direito Processual Civil Brasileiro. 2º v., São Paulo: Saraiva, 1996, p. 426).


No caso dos autos, a parte autora acosta, como documento novo, declaração da Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social de Dirce Reis, emitida em 10 de novembro de 2011, na qual a assistente social declara que a parte autora encontra-se em situação de vulnerabilidade social (fl. 43).


Todavia, o documento em questão não configura "documentação nova", na acepção jurídica do termo, uma vez que emitido após a data do trânsito em julgado da decisão rescindenda, portanto não existia à época do julgamento da demanda subjacente. Além disso, conforme dito pela parte autora, "É de se ressaltar, que referido documento só não foi usado em face de uma falha quando da propositura da ação, o que, entretanto, não o desnatura" (fl. 33).


Ademais, tratando-se o benefício assistencial de relação jurídica continuativa e sobrevindo modificação no estado de fato ou de direito, torna-se possível a realização de novo pedido do benefício, sem que isso interfira em julgamento que se deu em momento anterior.


Diante do exposto, REJEITO A MATÉRIA PRELIMINAR E JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO formulado na presente ação rescisória, nos termos da fundamentação acima.


Condeno a parte autora no pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$1.000,00 (mil reais), cuja exigibilidade fica suspensa, nos termos do art. 98, §3º, do CPC/2015, por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita, conforme entendimento majoritário da 3ª Seção desta Corte.


É o voto.



LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal


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