
| D.E. Publicado em 05/02/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em juízo rescindendo, julgar procedente a presente ação rescisória para desconstituir em parte o julgado na ação subjacente tão somente quanto à incidência do prazo prescricional; e, em juízo rescisório, determinar a observância da prescrição quinquenal contada a partir de 24.09.2010, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0007827-18.2015.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta por INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS contra JOSE FLAVIO OTTE, com fundamento no artigo 485, V, do CPC/1973, objetivando rescindir acórdão proferido pela 10ª Turma deste e. Tribunal, a fim de que seja reconhecida a decadência do direito de revisão do ato de indeferimento do benefício n.º 110.763.096-4 ou, subsidiariamente, a prescrição quinquenal das parcelas vencidas anteriormente ao ajuizamento da ação subjacente.
Informou que o primeiro requerimento administrativo (n.º 110.763.096-4), para concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, foi protocolado em 19.10.1998 e indeferido em 23.10.1998, sem interposição de recurso; enquanto que segundo requerimento administrativo (n.º 151.944.735-0), teria sido protocolado em 21.09.2010 e indeferido em 11.10.2010, tendo sido objeto de recurso indeferido em 23.02.2011.
Aduziu, quanto à fixação da data de início do benefício concedido, violação à literal disposição dos artigos 103 da Lei n.º 8.213/91 e 1º do Decreto n.º 20.910/32, seja em razão do interregno decadencial desde o indeferimento do benefício em 1998, seja por força da prescrição das parcelas vencidas no último quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação subjacente, dado que o recurso administrativo se referiu ao segundo requerimento administrativo e não àquele protocolado em 1998.
À fl. 513, consta decisão monocrática que verificou a observância do prazo decadencial, a dispensa da parte autora quanto ao depósito prévio e postergou a apreciação do pleito de tutela antecipada para momento posterior à vinda da contestação.
Citado (fls. 528-530), o réu apresentou contestação e documentos, às fls. 531-911, aduzindo, em preliminar, o não cabimento da ação rescisória por inocorrência das hipóteses legais de rescisão da coisa julgada e, no mérito, a inocorrência da decadência ou da prescrição, uma vez que protocolou o recurso administrativo tempestivamente, dada a demora na sua notificação quanto ao indeferimento do primeiro requerimento, o que foi reconhecido pelo Conselho de Recursos; alegou, ainda, a inocorrência de decadência relativa ao ato de indeferimento de benefício, o alinhamento do julgado à jurisprudência quanto à não ocorrência da prescrição, bem como competir à autarquia recorrer do julgado em momento próprio. Requereu a concessão da gratuidade da justiça, a condenação da autora por litigância de má-fé, bem como impugnou o valor atribuído à causa (R$ 1.000,00), pugnando pela sua fixação em R$ 598.212,01, correspondente ao valor da execução.
Às fls. 915-917, consta decisão que deferiu ao réu os benefícios da gratuidade da justiça; rejeitou a matéria preliminar; acolheu a impugnação ao valor da causa, para fixá-lo em R$ 598.212,01; e deferiu, em parte, a antecipação dos efeitos da tutela para determinar que fosse reservado, do valor principal eventualmente depositado nos autos da execução da ação subjacente, em conta judicial remunerada, aquilo que excedesse o prazo prescricional quinquenal contado do ajuizamento da ação subjacente.
Instada para se manifestar sobre a contestação e documentos, o autor se manteve inerte (fl. 919v).
O Ministério Público Federal, não vislumbrando interesse público que justificasse sua intervenção, manifestou-se pelo regular processamento do feito (fl. 920).
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
O autor fundamentou a ação rescisória em suposta violação à literal disposição dos artigos 103 da Lei n.º 8.213/91 e 1º do Decreto n.º 20.910/32, ante o transcurso do interregno decadencial desde o indeferimento do benefício em 1998, além da necessidade de observância da prescrição das parcelas vencidas no último quinquênio que antecedeu o ajuizamento da ação subjacente. Aduziu, em suma, que foram protocolados dois requerimentos administrativos para concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, sendo que o primeiro não foi objeto de recurso, razão pela qual a fixação judicial da data de início do benefício na data daquele primeiro requerimento é indevida.
Na ação subjacente, ajuizada em 23.08.2011 (fl. 16), Jose Flavio Otte postulou a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional, mediante reconhecimento de atividade rural e especial, com pagamento a partir de 19.10.1998 (fls. 16-50), alegando:
Além dos documentos necessários ao reconhecimento dos tempos de atividade pretendidos, foi juntada (fls. 53-138) cópia parcial dos autos do procedimento administrativo relativo ao primeiro requerimento de benefício (42/110.763.096-4, DER 19.10.1998).
Em contestação (fls. 186-218), o INSS aduziu, brevemente, que o recurso em face do requerimento administrativo formulado em 1998 (n.º 110.763.096-4), era intempestivo. Alegou que a decisão proferida em grau de recurso disse respeito ao requerimento formulado em 24.09.2010 (n.º 151.944.735-0), tendo pugnado pelo reconhecimento da decadência de revisão do ato de indeferimento. Defendeu, também, a prescrição quinquenal das parcelas eventualmente em atraso.
A inicial foi indeferida por inépcia (fls. 286-292), sentença modificada em 2º grau de jurisdição, conforme decisão proferida pelo Juiz Federal convocado Renato Becho (fls. 334-343), que, dando parcial provimento à apelação do autor, condenou a autarquia à concessão, com data de início em 24.09.2010, da aposentadoria por tempo de contribuição, conforme critérios de opção elencados. Registro que não foi apreciada a alegada decadência, bem como não foi avaliada a existência do requerimento de 1998. Segue o trecho pertinente da decisão:
Ao agravo interposto pelo autor, foi dado provimento, fixando-se a data de início do benefício em 19.10.1998, conforme acórdão proferido pela 10ª Turma desta Corte (fls. 369-374), nos termos do voto do i. relator, Desembargador Federal Sérgio Nascimento, do qual destaco:
Sem interposição de outros recursos pelas partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 25.09.2014 (fl. 378).
A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta (confira-se: STJ, S1, AR 4264, relator Ministro Humberto Martins, DJe 02.05.2016).
Ressalto que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento, objeto do enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais".
Para que seja possível a rescisão do julgado por violação literal de lei decorrente de valoração da prova, esta deve ter sido de tal modo desconexa que resulte em pungente ofensa à norma vigente ou em absoluto descompasso com os princípios do contraditório ou da ampla defesa. A excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas.
Antes de adentrar ao mérito do juízo rescindendo, faço um breve relato do quanto constante dos autos da demanda subjacente em relação aos procedimentos administrativos, eis que essencial ao julgamento da presente ação.
O autor daquela demanda efetuou requerimento administrativo de aposentadoria por tempo de serviço (110.763.096-4), em 19.10.1998, o qual restou indeferido em razão da falta de tempo de contribuição necessário, sob a justificativa administrativa de que "todo o tempo trabalhado foi considerado como 'tempo de serviço comum', em virtude da ausência de documentos que, eventualmente, permitiriam a conversão de alguns períodos que poderiam ser considerados como 'tempo de serviço especial" (fl. 61).
Embora o indeferimento tenha ocorrido em 23.10.1998, não consta que o autor tivesse sido intimado, o que somente teria ocorrido em 26.02.2007, quando sua procuradora teve acesso aos autos para extração de cópias (fl. 65). E aqui há de se ressaltar causar estranheza que o interessado tenha buscado informar-se da sorte do seu requerimento administrativo quase 10 (dez) anos depois do seu indeferimento.
Por sua vez, em 24.09.2010 (fl. 104), o autor protocolou novo requerimento de benefício (151.944.735-0), sem juntada de documentos relativos ao reconhecimento de atividade rural ou especial, o qual também restou indeferido por falta de tempo de contribuição (fls. 152-153), com ciência do autor em 13.10.2010.
Nesta mesma data (13.10.2010), o autor efetuou o agendamento de atendimento para protocolo de recurso (fl. 68), indicando o número de seu primeiro requerimento de benefício (110.763.096-4). Na data agendada (18.10.2010), foi realizado o protocolo de recurso (fls. 69-70), porém - e nem poderia ser diferente, eis que, friso, transcorridos mais de 10 (dez) anos entre o primeiro e o segundo requerimentos de benefício -, em relação ao segundo requerimento de benefício (151.944.735-0). Com seu recurso, juntou o autor documentos para fins de reconhecimento de atividades exercidas sob condições especiais (fls. 72-73) e de mourejo rurícola (fls. 80-103).
A 26º Junta de Recursos do Conselho de Recursos da Previdência Social negou provimento ao recurso (fls. 155-157). Registro que embora a decisão indique, em seu cabeçalho, o benefício n.º 151.944.735-0 como recorrido, consta de seu corpo a, ao meu sentir equivocada,menção ao benefício n.º 110.763.096-4:
O autor foi intimado da referida decisão em 06.04.2011, conforme aviso de recebimento de fl. 159, ajuizando a demanda subjacente em 23.08.2011.
Pois bem, feito essa breve narrativa, tenho que a questão submetida a juízo nesta demanda rescisória perpassa pela análise da bastante confusa narrativa descrita na inicial da ação subjacente e pela imprescindível avaliação do que efetivamente ocorreu nos procedimentos administrativos autuados sob os n.ºs 110.763.096-4 (de 19.10.1998) e 151.944.735-0 (de 24.09.2010), inclusive quanto à existência de pedido administrativo relacionado aos tempos de atividade rural e especial, objetos da demanda judicial.
Quanto ao ponto destaco que naquela inicial o autor ora se reportava ao requerimento de 1998, ora ao do ano 2010. No próprio recurso administrativo, que, segundo o julgado rescindendo, obstaria o reconhecimento do lapso prescricional quinquenal, também se verifica aparente confusão entre os dois requerimentos, bem como a juntada de documentos para comprovação da atividade especial somente na via recursal.
Diga-se, por oportuno, que o atendimento para protocolo do recurso administrativo foi agendado em 13.10.2010, na mesma data da ciência do indeferimento do segundo requerimento de benefício, sendo que em relação ao primeiro requerimento, indeferido em 23.10.1998, teria havido ciência do segurado em 26.02.2007.
Desta sorte, embora inexistente a decadência quando ao fundo de direito ao benefício previdenciário, patente a intempestividade do recurso protocolado, caso considerado o primeiro pleito de benefício, haja vista que o prazo de interposição recursal é de trinta dias (artigo 305, § 1º, do Decreto n.º 3.048/99). De outro lado, foi possível a interposição recursal justamente porque cadastrado em relação ao segundo requerimento de benefício, para o qual, sim, mostrava-se tempestivo o recurso manejado. E nem poderia ser diferente, eis que o autor, após a cientificação do resultado do primeiro requerimento administrativo não recorreu, mas sim manejou novo requerimento dirigido à administração autárquica.
Além disso, independentemente da confusão que se estabeleceu em relação aos dois requerimentos administrativos, não há como se afastar, no caso concreto, a ocorrência da prescrição quinquenal em relação ao primeiro requerimento administrativo.
Isso porque, embora tenha sido objeto da contestação, a questão da existência dos dois requerimentos administrativos e de suposta vinculação do recurso ao segundo, a matéria não foi apreciada no julgado rescindendo, que, sem maiores ilações, entendeu que o recurso se referia ao requerimento de 1998, sem qualquer menção àquele brandido no ano de 2010, e, de forma singela, afastou a alegada prescrição.
Friso que não se está a simplesmente reapreciar o quadro fático-probatório, revalorando o acervo probante em sentido diverso daquele motivadamente adotado no julgado originário, mas, sim, distinguindo, na situação concreta, a ocorrência de decisum flagrantemente dissociado do conjunto probatório. Não há que se confundir o princípio da persuasão racional, que vincula o magistrado às provas constantes dos autos, com ausência de motivação.
Assim, em iudicium rescindens, reconheço violação direta ao artigo 103, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91, razão pela qual entendo cabível a desconstituição parcial do julgado rescindendo, apenas no que tange à incidência da prescrição quinquenal.
Procedente o pleito no juízo rescindendo, fica, automaticamente, afastada a hipótese de condenação do autor nas penas da litigância de má-fé.
Consequentemente e considerando o quanto supra exposto, não restando maiores dilações a respeito do tema, em iudicium rescisorium, determino a observância da prescrição quinquenal contada a partir do segundo requerimento administrativo de benefício, protocolado em 24.09.2010.
Quanto ao ponto, em que pese o pleito autárquico para fixação do termo inicial de contagem do prazo prescricional na data do ajuizamento da demanda subjacente (23.08.2011), não há como se olvidar que entre o indeferimento administrativo do primeiro requerimento de benefício (em 1998) e o ajuizamento da ação originária houve protocolo de novo requerimento administrativo, a ser considerado para fins do cômputo da prescrição.
Ante o exposto, em iudicium rescindens, com fundamento nos artigos 485, V, do CPC/1973 e 966, V, do CPC/2015, julgo procedente a presente ação rescisória para desconstituir em parte o julgado na ação subjacente tão somente quanto à incidência do prazo prescricional; e, em iudicium rescisorium, determino a observância da prescrição quinquenal contada a partir de 24.09.2010.
Custas na forma da lei.
Condeno o réu no pagamento de honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
Comunique-se o Juízo da execução.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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