
| D.E. Publicado em 28/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a matéria preliminar suscitada e, em juízo rescindendo, julgar improcedente a presente ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0010809-68.2016.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS em face de NILZA DE FATIMA ANDRETA COSTA, com fundamento no artigo 966, V e VIII, do CPC/2015, objetivando rescindir decisão monocrática terminativa de mérito, a fim de que seja julgado improcedente o pleito formulado na ação subjacente para concessão de aposentadoria especial.
Aduziu que o julgado rescindendo violou disposição literal dos artigos 22, II, da Lei n.º 8.212/91 e 195, § 5º, da Constituição, bem como incorreu eu erro de fato, pois, segundo alegou, as atividades exercidas no período de 15.11.2007 a 08.04.2013, desempenhadas para a empresa Sterimed Cedral Serviços de Esterilização Ltda., foram realizadas na qualidade de autônoma (contribuinte individual), de sorte que não haveria direito à aposentadoria especial por ausência de contribuição específica, bem como porque a atividade assim exercida elidiria a exposição, de forma habitual e permanente, a agentes nocivos. Ainda, pontuou que não foram recolhidas as contribuições previdenciárias dos períodos de 15.11.2007 a 30.06.2008 e de 01.08.2008 a 30.04.2009, razão pela qual não houve cumprimento dos requisitos legais para concessão da aposentadoria especial.
Às fls. 171-172, consta decisão que reconheceu a observância do prazo decadencial para ajuizamento da ação rescisória e indeferiu a tutela provisória de urgência.
Citada (fls. 174-176), a ré apresentou contestação e documentos, às fls. 177-229, alegando a comprovação do exercício de atividade sob condições especiais, de forma habitual e permanente, bem como que o recolhimento das contribuições previdenciárias é obrigação do tomador de serviço, na forma do artigo 4º da Lei n.º 10.666/03. Pugnou pela improcedência da ação rescisória e, subsidiariamente, que lhe seja permitido integralizar as contribuições faltantes ou que seja computado o período de atividade posterior ao requerimento administrativo.
À fl. 231, foram deferidos à ré os benefícios da gratuidade da justiça.
O autor ofereceu réplica (fls. 232-233).
O Ministério Público Federal opinou extinção do processo sem resolução de mérito, dado o caráter recursal da ação, e, subsidiariamente, pela parcial procedência da ação rescisória, apenas para determinar à ré o recolhimento das contribuições reputadas faltantes (fls. 235-237).
O autor se manifestou quanto à preliminar suscitada pelo MPF (fl. 240).
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Rejeito a preliminar de carência da ação, relativa ao suposto caráter recursal da ação, por se confundir com o mérito da demanda rescisória. Ademais, o esgotamento da via recursal não é requisito para ajuizamento da ação rescisória, mas tão somente a existência da coisa julgada material, em que se verifique a ocorrência de quaisquer dos vícios elencados taxativamente nos artigos 485 do CPC/1973 e 966 do CPC/2015. Nesse sentido é o enunciado de Súmula n.º 514 do e. Supremo Tribunal Federal: "Admite-se ação rescisória contra sentença transitada em julgado, ainda que contra ela não se tenha esgotado todos os recursos".
O autor fundamenta a ação rescisória no artigo 966, V e VIII, do CPC/2015, sob a alegação de violação ao disposto nos artigos 22, II, da Lei n.º 8.212/91 e 195, § 5º, da Constituição, bem como ocorrência de erro de fato, pois, segundo alegou, as atividades exercidas no período de 15.11.2007 a 08.04.2013, desempenhadas para a empresa Sterimed Cedral Serviços de Esterilização Ltda., foram realizadas na qualidade de autônoma (contribuinte individual), de sorte que não haveria direito à aposentadoria especial por ausência de contribuição específica, bem como porque a atividade assim exercida elidiria a exposição, de forma habitual e permanente, a agentes nocivos. Ainda, pontuou que não foram recolhidas as contribuições previdenciárias dos períodos de 15.11.2007 a 30.06.2008 e de 01.08.2008 a 30.04.2009, razão pela qual não houve cumprimento dos requisitos legais para concessão da aposentadoria especial.
Na ação subjacente, ajuizada em 22.11.2013, Nilza de Fátima Andreta Costa postulou a concessão de aposentadoria especial, desde a data do requerimento administrativo (em 08.04.2013), mediante o reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais, dentre outros, no período de 15.11.2007 a 08.04.2013, junto a Sterimed Cedral Serviços de Esterilização Ltda.
Para comprovação do alegado, juntou àqueles autos:
1) extrato do CNIS (fls. 26-36), constando, além de vínculos empregatícios, recolhimentos na qualidade de contribuinte individual, realizados por GFIP, nas competências 07/2008, 08/2008 e 05/2009 a 04/2013;
2) PPP emitido por Sterimed Cedral Serviços de Esterilização Ltda. (fls. 48-49), em 20.04.2013, sobre o exercício de atividade na qualidade de "responsável técnica", no período de 08.11.2006 "à data atual", com exposição "permanente" a "agentes químicos para o processo de esterilização" e agentes biológicos, "bactéria. Microbactérias. Fungos. Vírus, entre outros". Indicou-se que a autora "é responsável por atender os clientes, planejar a (sic) atividades técnicas relativas ao reprocessamento e esterilização dos materiais, acompanhar os trabalhos nos setores de desenvolvimento dos serviços (recebimento. conferência e limpeza dos materiais, secagem preparo e empacotamento, esterilização, separação e distribuição). Qualificar a equipe técnica. auxiliar na limpeza de produtos contaminados de maior complexidade. programar manutenção preventivas (sic) dos equipamentos como ultrassônica, seladoras e autoclaves. acompanhar o funcionamento das autoclaves. intervir quando necessário. Elaboração de protocolos e implantação de novos processos relacionados ao serviço de reprocessamentos de materiais. Exposição a agentes químicos e biológicos". Há indicação dos dados do responsável pelos registros ambientais.
3) LTCAT relativo a Sterimed Cedral Serviços de Esterilização Ltda. (fls. 48-49), datado de 26.04.2013 (fls. 78-101).
Ressalto que a autarquia, na contestação (fls. 55-62) e na apelação (fls. 137-142), nada manifestou sobre não ser possível o reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais na qualidade de contribuinte individual, no que tange aos serviços prestados a Sterimed Cedral Serviços de Esterilização Ltda., ou sobre a ausência de recolhimentos nos períodos de 15.11.2007 a 30.06.2008 e de 01.08.2008 a 30.04.2009.
Em 1ª Instância, o pedido foi julgado procedente (fls. 126-132), sentença confirmada em 2º grau de jurisdição, dando-se parcial provimento à apelação autárquica tão somente para fixar os consectários legais e alterar a DIB para a data da citação, conforme decisão monocrática proferida pelo Desembargador Federal Souza Ribeiro (fls. 150-154), da qual destaco o seguinte:
Sem interposição de recurso pelas partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 10.02.2016 (fl. 157).
A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta (confira-se: STJ, S1, AR 4264, relator Ministro Humberto Martins, DJe 02.05.2016).
Ressalto que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento, objeto do enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais".
Para que seja possível a rescisão do julgado por violação literal de lei decorrente de valoração da prova, esta deve ter sido de tal modo desconexa que resulte em pungente ofensa à norma vigente ou em absoluto descompasso com os princípios do contraditório ou da ampla defesa.
Por seu turno, para que seja reconhecido erro de fato, hábil à rescisão da coisa julgada na forma do artigo 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, exige-se que, sem que tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva para a conclusão do decidido.
Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo.
Nesse sentido, encontra-se sedimentada a jurisprudência dos Tribunais superiores e desta Corte:
Em que pese não ventilada a matéria na demanda subjacente e, portanto, não tratada no julgado rescindendo, entendo cabível a apreciação da hipótese de sua rescisão, haja vista que a observância de todos os requisitos para concessão dos benefícios possui natureza cogente.
É inconteste que a autora, no período de 15.11.2007 a 08.04.2013, prestou serviços, na qualidade de contribuinte individual, a Sterimed Cedral Serviços de Esterilização Ltda.
O julgado rescindendo reconheceu que referida atividade foi exercida sob condições especiais, ante a exposição a agentes nocivos biológicos, conforme constante do PPP apresentado. Somando-se tal período a outros em que também foi exercida atividade de natureza especial, foi concedida aposentadoria especial à segurada.
Insurge-se a autarquia, em suma, por dois fatores: 1) impossibilidade de reconhecimento do exercício de atividade especial a contribuintes individuais, haja vista ausência da respectiva fonte de custeio para concessão de benefícios previdenciários; 2) não comprovação de recolhimentos previdenciários em determinados períodos (15.11.2007 a 30.06.2008 e de 01.08.2008 a 30.04.2009).
A aposentadoria especial, conforme prevista no artigo 57 da Lei n.º 8.213/91, "será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei" (g.n.).
Portanto, a legislação previdenciária não faz qualquer distinção quanto à classificação do segurado para fins de lhe garantir a cobertura previdenciária. É irrelevante o fato de ser ele empregado, trabalhador avulso, cooperado, autônomo etc., cabendo-lhe tão somente comprovar o desenvolvimento de suas atividades sob condições especiais, na forma da legislação vigente.
Outra, aliás, não poderia ser a disposição normativa, haja vista que a Constituição, em seu artigo 201, § 1º, veda a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social. Quanto ao ponto, a Carta ressalva justamente os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, para o fim de garantir aos segurados, sem distinção de sua classificação, cobertura diferenciada em razão desse tipo de labor.
Não se olvida a regra prevista no artigo 195, § 5º, da Constituição, no sentido de que nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total. Contudo, e essa distinção que se faz necessária ao deslinde da controvérsia, não há confundir a cobertura previdenciária com a opção legislativa quanto à respectiva fonte de custeio e à forma de sua distribuição.
Por critério legislativo, conforme disposto no artigo 57, § 6º, da lei n.º 8.213/91, a aposentadoria especial tem sua fonte de custeio fixada nas contribuições a cargo da empresa, incidente sobre o total das remunerações pagas ou creditadas aos segurados empregados e trabalhadores avulsos (artigo 22, II, da Lei n.º 8.212/91) ou sobre o valor bruto da nota fiscal ou fatura de prestação de serviços pelo cooperado filiado à cooperativa de trabalho e de produção (artigo 1º, § 1º, da Lei n.º 10.666/03).
A criação de uma contribuição específica para as empresas que exploram atividades que, tipicamente, possuem grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho não implica dizer que apenas e tão somente os segurados que prestam serviços a essas empresas, na qualidade de empregados, trabalhadores avulsos ou cooperados, terão garantida a cobertura previdenciária decorrente do exercício de labor sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.
O fato de não haver previsão para que o benefício seja também custeado por adicional contribuição do contribuinte individual ou do tomador de serviços por estes prestados não exclui tais segurados da cobertura previdenciária, justamente em razão da característica solidária do Regime.
Nesse sentido cito os seguintes precedentes, há muito sedimentados:
Assim, é possível o reconhecimento do exercício de atividade sob condições especiais pelo segurado contribuinte individual, desde que comprovados o efetivo exercício da atividade considerada de natureza especial, na forma da legislação vigente à época, e os recolhimentos das respectivas contribuições previdenciárias.
Quanto ao ponto das contribuições previdenciárias, é cediço que o segurado filiado ao RGPS na condição de contribuinte individual é responsável pelo recolhimento das contribuições correspondentes, a fim de ter garantida a devida cobertura previdenciária, conforme disposto no artigo 30, II, da Lei n.º 8.212/91.
Contudo, conforme expressa disposição dos artigos 4º da Lei n.º 10.666/03 e 30, I, b, da Lei n.º 8.212/91, a empresa tomadora de serviço está obrigada a arrecadar a contribuição do segurado contribuinte individual a seu serviço, descontando-a da respectiva remuneração, e a recolher o valor arrecadado juntamente com a contribuição a seu cargo.
Uma vez que o recolhimento da contribuição passou a ser de exclusiva responsabilidade da empresa tomadora de serviço, equipara-se o contribuinte individual ao empregado no que tange à impossibilidade de ser prejudicado por eventual ausência de repasse, aos cofres públicos, do montante devido a título de contribuição previdenciária, cumprindo à autoridade administrativa fiscalizar o devido recolhimento das contribuições devidas e, se o caso, cobrá-las da empresa tomadora.
Assim, comprovado que a autora, no período de 15.11.2007 a 08.04.2013, prestava serviços a Sterimed Cedral Serviços de Esterilização Ltda., na qualidade de contribuinte individual autônoma, tem-se que o recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias era obrigação exclusiva da tomadora de serviço, de sorte que inexigível, para o fim de reconhecimento do direito da segurada a benefício previdenciário, que esta promova o recolhimento eventualmente não efetuado pela empresa, tal como no caso concreto, em que se verifica a ausência de contribuições nos períodos de 15.11.2007 a 30.06.2008 e de 01.08.2008 a 30.04.2009.
Nesse sentido, já se manifestou esta 3ª Seção, reconhecendo a existência de direta violação à disposição literal de lei ao se exigir do contribuinte individual o recolhimento das contribuições quando tal responsabilidade cumpria à empresa tomadora do serviço:
Desse modo, o julgado rescindendo não se afastou dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época, de sorte que não há falar em ocorrência de violação direta à lei ou erro de fato.
Tem-se que o Juízo originário apreciou as provas segundo seu livre convencimento, de forma motivada e razoável, tendo adotado uma solução jurídica, dentre outras, admissível.
A excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas. Nesse sentido, confira-se precedentes desta 3ª Seção:
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar suscitada e, em iudicium rescindens, julgo improcedente a presente ação rescisória, nos termos dos artigos 269, I, do CPC/1973 e 487, I, do CPC/2015.
Custas na forma da lei.
Condeno o autor no pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal para as dívidas civis, conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC.
É como voto.
Desembargador Federal
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