Processo
AR - AÇÃO RESCISÓRIA / SP
5013330-56.2020.4.03.0000
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
3ª Seção
Data do Julgamento
14/09/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 16/09/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO LITERAL À DISPOSITIVO
DE LEI. ERRO DE FATO. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL SOBRE O FATO. VALORAÇÃO DE
PROVA. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. RAZOABILIDADE. SOLUÇÃO JURÍDICA
ADMISSÍVEL. PARÂMETROS LEGAIS E JURISPRUDENCIAIS DE ÉPOCA. INCABÍVEL
REANÁLISE DE PROVAS. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. MOLÉSTIA
ISENTA DE CARÊNCIA. QUALIDADE DE SEGURADO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL.
FILIAÇÃO OBRIGATÓRIA. PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE. CARÁTER CONTRIBUTIVO DO
SISTEMA. PRESERVAÇÃO DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL. NECESSIDADE DE
RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. IUDICIUM RESCINDENS.
IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. VERBA HONORÁRIA. CONDENAÇÃO.
1. A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal
e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta.
Ressalte-se, ainda, que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento,
objeto do enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a
literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de
interpretação controvertida nos tribunais".
2. Para que seja possível a rescisão do julgado por violação literal de lei decorrente de valoração
da prova, esta deve ter sido de tal modo desconexa que resulte em pungente ofensa à norma
vigente ou em absoluto descompasso com os princípios do contraditório ou da ampla defesa.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
3. A viabilidade da ação rescisória por erro de fato pressupõe que, sem que tenha havido
controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente
ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva
para a conclusão do decidido.
4. O erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível
pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção
de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo..
5. É patente a inexistência de erro de fato, seja em decorrência da controvérsia entre as partes
quanto à qualidade de segurado à época do início da incapacidade laborativa (em 2006), seja
porque houve pronunciamento judicial sobre o fato, considerada a existência de contribuições
previdenciárias apenas em período anterior a 1986 e posterior a 2008.
6. Não há dúvida que o sócio gerente é considerado segurado obrigatório do RGPS, na qualidade
de contribuinte individual, conforme disposição do artigo 11, V, f, da Lei n.º 8.213/91. Não
obstante, é igualmente cediço que o segurado filiado ao RGPS na condição de contribuinte
individual é responsável pelo recolhimento das contribuições correspondentes, a fim de ter
garantida a devida cobertura previdenciária, conforme disposto no artigo 30, II, da Lei n.º
8.212/91.
7. A concessão dos benefícios previdenciários mantidos pelo Regime Geral de Previdência Social
deve observar as estritas hipóteses legais, dado o caráter contributivo do sistema e a
necessidade de preservação do seu equilíbrio financeiro e atuarial.
8. É necessário frisar que a Seguridade Social brasileira está construída sobre os parâmetros
jurídicos da solidariedade, de modo que o seguro social depende do cumprimento de um conjunto
de requisitos distribuídos por toda sociedade e também para o Estado, especialmente por
trabalhadores, sendo certo que as contribuições necessárias ao custeio desse conjunto de
benefícios pecuniários devem ser recolhidas quando o trabalhador não está acometido de
doenças incapacitantes. Não havendo contribuições por parte dos trabalhadores (contribuintes
obrigatórios ou facultativos) sob a lógica solidária que mantém o sistema de seguridade, ou se
esses trabalhadores só fazem discretas contribuições quando já estão acometidos de doenças
incapacitantes, por certo o benefício previdenciário não é devido à luz da Lei n.º 8.213/1991 e da
própria lógica constitucional da Previdência.
9. O julgado rescindendo analisou e valorou a conjunto probatório e, segundo seu livre
convencimento, de forma motivada e razoável, adotou uma solução jurídica, dentre outras,
admissível, não se afastando dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época. A
excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas.
10. Verba honorária fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de
juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas
civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º,
4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que
inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios
da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
11. Em juízo rescindendo, julgada improcedente a ação rescisória, nos termos do artigo 487, I, do
CPC/2015.
Acórdao
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5013330-56.2020.4.03.0000
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
AUTOR: JOSÉ FARIA BASILIO
Advogado do(a) AUTOR: REGIANE LAVORENTI BASILIO CARNEIRO - SP276656
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5013330-56.2020.4.03.0000
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
AUTOR: JOSÉ FARIA BASILIO
Advogado do(a) AUTOR: REGIANE LAVORENTI BASILIO CARNEIRO - SP276656
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta por JOSE FARIA BASILIO em face do INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com fundamento no artigo 966, V e VIII, do CPC/2015,
objetivando rescindir acórdão proferido pela 9ª Turma deste e. Tribunal, a fim de que lha seja
concedida aposentadoria por invalidez, acrescida de 25% em razão de necessidade de
assistência permanente.
Sustentou que o julgado rescindendo incorreu em erro de fato e violou disposição literal dos
artigos 11, V, f e h, 42 e 102 da Lei n.º 8.213/91, pois, no seu entender, é segurado obrigatório do
RGPS, na qualidade de sócio gerente de empresa, sendo irrelevante para fins de concessão do
benefício a inexistência de recolhimentos previdenciário, já que a "norma não diz que tem que ter
recolhimento no período, diz que tem que existir atividade remunerada", bem como, que "não é
necessário que os requisitos à concessão do benefício previdenciário sejam preenchidos
simultaneamente".
Os autos foram redistribuídos (ID 132954203) em razão do ajuizamento anterior da Ação
Rescisória autuada sob n.º 5029091-98.2018.4.03.0000, em que proferida decisão monocrática
terminativa, transitada em julgado, que extinguiu o processo, sem resolução de mérito, nos
termos dos artigos 267, IV, do CPC/1973 e 485, IV, do CPC/2015, ante a inexistência de coisa
julgada material, dado o ajuizamento anterior à conclusão do julgamento do recurso extraordinário
interposto na ação subjacente.
Consta decisão ID 133047414 que reconheceu a observância do prazo decadencial para
ajuizamento da ação rescisória; deferiu ao autor os benefícios da assistência judiciária gratuita,
dispensando-o do depósito prévio, e de tramitação prioritária do feito a teor dos artigos 1.048, I,
do CPC e 71 da Lei n.º 10.741/03; e, indeferiu a tutela provisória de urgência.
Citado, o réu apresentou contestação (ID 135077716), alegando a inexistência de violação à lei
ou erro de fato.
O autor ofereceu réplica (ID 137422045).
O Ministério Público Federal opinou pela improcedência da ação rescisória (ID 137585526).
É o relatório.
AÇÃO RESCISÓRIA (47) Nº5013330-56.2020.4.03.0000
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
AUTOR: JOSÉ FARIA BASILIO
Advogado do(a) AUTOR: REGIANE LAVORENTI BASILIO CARNEIRO - SP276656
REU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
O autor fundamenta a ação rescisória no artigo 966, V, VIII, do CPC/2015, sob a alegação de que
o julgado rescindendo incorreu em erro de fato e violou disposição literal dos artigos 11, V, f e h,
42 e 102 da Lei n.º 8.213/91, pois, no seu entender, é segurado obrigatório do RGPS, na
qualidade de sócio gerente de empresa, sendo irrelevante para fins de concessão do benefício a
inexistência de recolhimentos previdenciário, já que a "norma não diz que tem que ter
recolhimento no período, diz que tem que existir atividade remunerada", bem como, que "não é
necessário que os requisitos à concessão do benefício previdenciário sejam preenchidos
simultaneamente".
Nascido em 27.03.1944 (ID 132879426), o autor postulou na ação subjacente, ajuizada em
13.10.2009 (ID 132879517, p. 4-17), a concessão de aposentadoria por invalidez, acrescida de
25% em razão de necessidade de assistência permanente, ou, sucessivamente, de auxílio-
doença. Juntou tão somente documentação médica.
Realizada perícia médica, em 18.08.2011 (ID 132879519, p. 3-6), apurou-se que o autor é
portador de doença oftalmológica grave, denominada deslocamento de retina, apresentando
“comprometimento visual severo bilateral, mais intenso à direita, com grande prejuizo mesmo
para a visão binocular”, de sorte que caracterizada incapacidade total e permanente, cujo termo
inicial foi fixado por volta de 2006.
Manifestando-se quanto ao laudo pericial, a autarquia pugnou pela reconhecimento da perda da
qualidade de segurado (p. 12-13), juntando extrato do CNIS no qual se verifica a existência do
último vínculo empregatício no ano de 1986 e, posteriormente, apenas recolhimentos na
qualidade de contribuinte individual entre julho e outubro de 2008.
Em 1ª Instância, o pedido foi julgado procedente (ID p. 22-28), sentença reformada em 2º grau de
jurisdição, dando-se provimento à remessa necessária e à apelação autárquica para julgar
improcedente a demanda (p.62-66), conforme decisão monocrática proferida pelo Juiz Federal
convocado Rodrigo Zacharias, da qual destaco:
"[...] No que respeita a incapacidade, laudo médico pericial, realizado em 18.08.2011 (fls.
124/127), atestou que o autor é portador "de doença oftalmológica grave, denominada
descolamento de retina, inicialmente com acometimento do olho esquerdo, em 2000 e
posteriormente do olho direito, a partir de 2006, este evoluindo com complicação infecciosa e
maior comprometimento da acuidade visual". Concluiu pela incapacidade total e permanente há
"aproximadamente cinco anos".
Logo, provada a deficiência incapacitante para o trabalho/atividade habitual. [...]
Por outro lado, como é cediço, a doença preexistente ao reingresso à filiação ao RGPS,
ressalvado o seu agravamento após a implementação da carência prevista em lei, não é
amparada pela legislação vigente.
Com efeito, nos termos do parágrafo único do art. 59 da Lei 8.213/91, "não será devido auxílio-
doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença
ou da lesão invocada como causa para o benefício, salvo quando a incapacidade sobrevier por
motivo de progressão ou agravamento dessa doença ou lesão".[...]
No caso dos autos, o autor comprovou vínculo empregatício de 01.06.1966 a 15.04.1981 e
01.03.1982 a 20.12.1986 e recolhimento de contribuição previdenciária de 07.2008 a 10.2008 (fls.
158).
De acordo com laudo médico pericial, a incapacidade ocorreu no ano de 2006. Constata-se,
portanto, que o autor já estava acometido dos males incapacitantes, quando, propositalmente,
retomou as contribuições ao Regime de Previdência, tudo com o objetivo de auferir o benefício
colimado. [...]
Portanto, em se tratando de doença preexistente à nova filiação, não faz jus ao benefício
almejado. [...]" (grifo nosso)
O autor interpôs agravo (p. 71-97), aduzindo que desde 1986 é contribuinte individual, na
qualidade de sócio de microempresa. Juntou cópia de sua inscrição como contribuinte individual
empresário, no ano de 1999, e declarações de imposto de renda pessoa física.
Foi negado provimento ao agravo interposto pelo autor, conforme acórdão unânime proferido pela
9ª Turma desta Corte (p. 117-124), sob o fundamento de que “deve o recurso demonstrar a
errônea aplicação do precedente ou a inexistência dos pressupostos de incidência do art. 557 do
CPC, de modo que a irresignação a partir de razões sobre as quais a decisão exaustivamente se
manifestou não é motivo para a sua interposição”. (p. 133-137).
Os aclaratórios foram rejeitados (p. 133-137), pois o recurso “ostenta nítido caráter infringente”.
O recurso especial não foi admitido (ID 132879522, p. 25-27) e o c. Superior Tribunal de Justiça
negou seguimento ao agravo interposto (ID 132879525, p. 3-5), ante sua Súmula n.º 7. Foi
negado provimento ao agravo interno (ID 132879526, p. 7-11). Sem interposição de outros
recursos pelas partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 28.09.2016 (p. 15).
O recurso extraordinário não foi admitido (ID 132879522, p. 28-29), porém, em razão do
julgamento do tema n.º 766, o e. Supremo Tribunal Federal determinou a devolução dos autos a
esta Corte (ID 132879526, p. 18). Em nova decisão, o Vice-Presidente desta Corte julgou
prejudicado o recurso excepcional (ID 132879513). Sem interposição de outros recursos pelas
partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 10.07.2019 (ID 132879512).
A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal e
direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta
(confira-se: STJ, S1, AR 4264, relator Ministro Humberto Martins, DJe 02.05.2016).
Ressalto que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento, objeto do
enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a literal
disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação
controvertida nos tribunais".
Para que seja possível a rescisão do julgado por violação literal de lei decorrente de valoração da
prova, esta deve ter sido de tal modo desconexa que resulte em pungente ofensa à norma
vigente ou em absoluto descompasso com os princípios do contraditório ou da ampla defesa.
De outro lado, para que seja reconhecido erro de fato, hábil à rescisão da coisa julgada na forma
dos artigos 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973 e 966, VIII, § 1º, do CPC/2015, exige-se que, sem
que tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido
um fato inexistente ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído
de forma definitiva para a conclusão do decidido.
Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser
aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a
produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo.
Nesse sentido, encontra-se sedimentada a jurisprudência dos Tribunais superiores e desta Corte:
"EMENTA PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AÇÃO RESCISÓRIA. ERRO DE
FATO. PENSÃO POR MORTE DE EX-COMBATENTE. CUMULAÇÃO COM BENEFÍCIO DE
NATUREZA PREVIDENCIÁRIA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. DECISÃO AGRAVADA
PUBLICADA EM 25.02.2016. 1. A hipótese de rescindibilidade insculpida no artigo 485, IX, do
CPC de 1973, em que fundado o pedido, resulta configurada quando "a sentença admitir um fato
inexistente, ou quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido", sendo
indispensável, em ambos os casos, "que não tenha havido controvérsia, nem pronunciamento
judicial sobre o fato" (CPC, artigo 485, §§ 1º e 2º). [...] o erro apto a ensejar a desconstituição do
julgado é aquele que, corrigido, impõe outra solução para a causa, ou seja, deve ser capaz de
influir de forma definitiva para a conclusão do julgado.[...]" (STF, 1ª Turma, AgRg/AR 1931,
relatora Ministra Rosa Weber, DJe 10.03.2017)
"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. ADMINISTRATIVO. PENSÃO ESPECIAL. EX-
COMBATENTE. ART. 485, IX, DO CPC. ERRO DE FATO. INEXISTÊNCIA. LEI 4.242/63.
CONCEITO AMPLO DE EX-COMBATENTE. IMPOSSIBILIDADE. DIVERGÊNCIA
JURISPRUDENCIAL NÃO COMPROVADA. 1. O erro que dá ensejo à ação rescisória é o que
passa despercebido pelo juiz e não aquele incidente sobre fato que foi alvo de divergência entre
as partes e pronunciamento judicial. [...]" (STJ, 2ª Turma, REsp 1349189, relatora Ministra Eliana
Calmon, DJe 19.06.2013)
"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485, V, VII e IX DO
CPC/73. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA
MATERIAL. ERRO DE FATO NÃO CONFIGURADO. REQUISITOS PARA QUALIFICAÇÃO DOS
DOCUMENTOS COMO "NOVOS" NÃO DEMONSTRADOS. EXTENSÃO DA QUALIFICAÇÃO
RURAL DO COMPANHEIRO. INVIABILIDADE. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI
NÃO DEMONSTRADA. REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUIRA CONCEDIDO.
APLICAÇÃO DA SISTEMÁTICA PROCESSUAL VIGENTE À ÉPOCA DA PROPOSITURA.
INTELIGÊNCIA DO ART. 14 DO CPC, C/C O ART. 5º, XXXVI DA C.F. AÇÃO RESCISÓRIA
IMPROCEDENTE. [...] 5 - O erro de fato apto a ensejar a configuração da hipótese de
rescindibilidade prevista no artigo 485, IX, §§ 1º e 2º do Código de Processo Civil/73 é aquele que
tenha influenciado decisivamente no julgamento da causa e sobre o qual não tenha havido
controvérsia nem tenha sido objeto de pronunciamento judicial, apurável independentemente da
produção de novas provas. [...]" (TRF3, 3ª Seção, AR 00189594320134030000, relator
Desembargador Federal Paulo Domingues, DJe 19.05.2017)
É patente a inexistência de erro de fato, seja em decorrência da controvérsia entre as partes
quanto à qualidade de segurado à época do início da incapacidade laborativa (em 2006), seja
porque houve pronunciamento judicial sobre o fato, considerada a existência de contribuições
previdenciárias apenas em período anterior a 1986 e posterior a 2008.
Tampouco há se falar em violação à lei, sob a pueril alegação de que, na qualidade de sócio
gerente, era segurado obrigatório do RGPS e, portanto, fazia jus ao benefício por incapacidade
laborativa, decorrente de moléstia isenta de carência.
Não há dúvida que o sócio gerente é considerado segurado obrigatório do RGPS, na qualidade
de contribuinte individual, conforme disposição do artigo 11, V, f, da Lei n.º 8.213/91.
Não obstante, é igualmente cediço que o segurado filiado ao RGPS na condição de contribuinte
individual é responsável pelo recolhimento das contribuições correspondentes, a fim de ter
garantida a devida cobertura previdenciária, conforme disposto no artigo 30, II, da Lei n.º
8.212/91.
Nesse sentido, cito o seguinte precedente, mutatis mutandis:
"PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. CONTRIBUIÇÕES APÓS O ÓBITO DO
INSTITUIDOR. IMPOSSIBILIDADE. PERDA DA QUALIDADE DE SEGURADO. 1. Consoante o
entendimento consolidado nesta Corte, perde a qualidade de segurado o contribuinte individual
que deixa de verter recursos por período superior ao de graça. 2. Para que haja a concessão da
pensão por morte é imprescindível que o de cujus mantenha a qualidade de segurado.
Entendimento firmado no Recurso Especial 1.110.565/SE, o qual tramitou sob o rito do recurso
repetitivo. 3. Agravo regimental a que se nega provimento." (STJ, 2ª Turma, AgRg/REsp 1347806,
relator Ministro Og Fernandes, DJe 12.11.2014) [grifo nosso]
A concessão dos benefícios previdenciários mantidos pelo Regime Geral de Previdência Social
deve observar as estritas hipóteses legais, dado o caráter contributivo do sistema e a
necessidade de preservação do seu equilíbrio financeiro e atuarial.
É necessário frisar que a Seguridade Social brasileira está construída sobre os parâmetros
jurídicos da solidariedade, de modo que o seguro social depende do cumprimento de um conjunto
de requisitos distribuídos por toda sociedade e também para o Estado, especialmente por
trabalhadores, sendo certo que as contribuições necessárias ao custeio desse conjunto de
benefícios pecuniários devem ser recolhidas quando o trabalhador não está acometido de
doenças incapacitantes.
Não havendo contribuições por parte dos trabalhadores (contribuintes obrigatórios ou facultativos)
sob a lógica solidária que mantém o sistema de seguridade, ou se esses trabalhadores só fazem
discretas contribuições quando já estão acometidos de doenças incapacitantes, por certo o
benefício previdenciário não é devido à luz da Lei n.º 8.213/1991 e da própria lógica constitucional
da Previdência.
Assim, o julgado rescindendo analisou e valorou a conjunto probatório e, segundo seu livre
convencimento, de forma motivada e razoável, adotou uma solução jurídica, dentre outras,
admissível, não se afastando dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época.
A excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas. Nesse sentido,
confira-se precedentes desta 3ª Seção:
"PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. ART. 485, V e IX DO CPC/73.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ RURAL. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL
ACERCA DO LABOR RURAL DA AUTORA. VIOLAÇÃO AO ART. 55, § 3º DA LEI DE
BENEFÍCIOS AFASTADA. ERRO DE FATO NÃO CONFIGURADO. APLICAÇÃO DA
SISTEMÁTICA PROCESSUAL VIGENTE À ÉPOCA DA PROPOSITURA. INTELIGÊNCIA DO
ART. 14 DO NOVO CPC, C/C O ART. 5º, XXXVI DA C.F. AÇÃO RESCISÓRIA
IMPROCEDENTE. [...] 2 - A viabilidade da ação rescisória fundada no artigo 485, V do Código de
Processo Civil/73 ( atual art 966, V do CPC) decorre da não aplicação de uma determinada lei ou
do seu emprego de tal modo aberrante que viole o dispositivo legal em sua literalidade,
dispensando-se o reexame dos fatos da causa originária. 3 - O julgado rescindendo reconheceu
como não comprovado o labor rural durante todo o período afirmado na ação originária, negando
aos documentos juntados pelo requerente para sua comprovação a qualidade de início de prova
material conforme previsto no art. 55, § 3º da Lei nº 8.213/91. Pleito rescisório que reside
precipuamente na rediscussão dos requisitos para o reconhecimento do tempo de serviço como
trabalhadorA rural invocado pela parte autora, com o questionamento do critério de valoração da
prova produzida na ação originária adotado pelo julgado rescindendo, fundamentado no livre
convencimento motivado, com sua revaloração segundo os critérios que o autor entende corretos.
4 - Hipótese de rescindibilidade prevista no inciso V do artigo 485 do CPC/73 não configurada,
pois das razões aduzidas na petição inicial não se pode reconhecer tenha o julgado rescindendo
incorrido em interpretação absolutamente errônea da norma regente da matéria, não
configurando a violação a literal disposição de lei a mera injustiça ou má apreciação das provas.
[...]" (TRF3, 3ª Seção, AR 00333455420084030000, relator Desembargador Federal Paulo
Domingues, DJe 03.02.2017)
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO LEGAL. AÇÃO RESCISÓRIA. JULGAMENTO
MONOCRÁTICO. APLICABILIDADE DO ART. 557 DO CPC. APOSENTADORIA POR IDADE
RURAL. PROVA ORAL INCONSISTENTE. DOCUMENTO NOVO. VIOLAÇÃO A LITERAL
DISPOSIÇÃO DE LEI AFASTADA. MERO REEXAME DA PROVA PRODUZIDA NA AÇÃO
ORIGINÁRIA. DESCABIMENTO. AÇÃO RESCISÓRIA IMPROCEDENTE. PRELIMINAR
REJEITADA. AGRAVO IMPROVIDO. [...] 2 - Mantida a decisão agravada que resolveu de
maneira fundamentada a questão, afastando a pretensão rescisória direcionada exclusivamente
ao questionamento do critério de valoração da prova produzida na ação originária e adotada Na r.
decisão rescindenda, fundamentado no livre convencimento do julgador. 3 - Prova testemunhal
inconsistente. 4 - Não se pode reconhecer tenha o julgado rescindendo incorrido na hipótese de
rescindibilidade prevista no inciso V, do artigo 485 do CPC, pois a autora não comprovou sua
atividade rural e, se assim foi, não há que se falar em violação à disposição de lei a mera injustiça
ou má apreciação das provas. [...]" (TRF3, 3ª Seção, Ag/AR 00193564420094030000, relator
Desembargador Federal Gilberto Jordan, DJe 30.03.2016)
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. CARÊNCIA DA AÇÃO.
PRELIMINAR CONFUNDE-SE COM O MÉRITO. PENSÃO POR MORTE. ALEGAÇÃO DE
DIREITO ADQUIRIDO DO FALECIDO À APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ERRO DE
FATO NÃO CARACTERIZADO. DOCUMENTOS NOVOS INSERVÍVEIS. INEXISTÊNCIA DE
VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI. IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. ÔNUS DA
SUCUMBÊNCIA. [...] 18. Entendo não terem sido violados os dispositivos apontados. Com base
no princípio do livre convencimento motivado, a prestação jurisdicional foi entregue de acordo
com uma das soluções possíveis para a situação fática apresentada, à luz da legislação de
regência. [...]" (TRF3, 3ª Seção, AR 00007730620124030000, relatora Desembargadora Federal
Daldice Santana, DJe 26.11.2014)
Ante o exposto, em iudicium rescindens, julgo improcedente a presente ação rescisória, nos
termos do artigo 487, I, do CPC/2015.
Custas na forma da lei.
Condeno o autor no pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais),
devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido no Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal para as dívidas civis, conforme
prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade ficará suspensa por 5
(cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a
concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º,
do CPC.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO LITERAL À DISPOSITIVO
DE LEI. ERRO DE FATO. PRONUNCIAMENTO JUDICIAL SOBRE O FATO. VALORAÇÃO DE
PROVA. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. RAZOABILIDADE. SOLUÇÃO JURÍDICA
ADMISSÍVEL. PARÂMETROS LEGAIS E JURISPRUDENCIAIS DE ÉPOCA. INCABÍVEL
REANÁLISE DE PROVAS. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. MOLÉSTIA
ISENTA DE CARÊNCIA. QUALIDADE DE SEGURADO. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL.
FILIAÇÃO OBRIGATÓRIA. PRINCÍPIO DA SOLIDARIEDADE. CARÁTER CONTRIBUTIVO DO
SISTEMA. PRESERVAÇÃO DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL. NECESSIDADE DE
RECOLHIMENTO DAS CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. IUDICIUM RESCINDENS.
IMPROCEDÊNCIA DA AÇÃO. VERBA HONORÁRIA. CONDENAÇÃO.
1. A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal
e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta.
Ressalte-se, ainda, que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento,
objeto do enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a
literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de
interpretação controvertida nos tribunais".
2. Para que seja possível a rescisão do julgado por violação literal de lei decorrente de valoração
da prova, esta deve ter sido de tal modo desconexa que resulte em pungente ofensa à norma
vigente ou em absoluto descompasso com os princípios do contraditório ou da ampla defesa.
3. A viabilidade da ação rescisória por erro de fato pressupõe que, sem que tenha havido
controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente
ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva
para a conclusão do decidido.
4. O erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível
pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção
de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo..
5. É patente a inexistência de erro de fato, seja em decorrência da controvérsia entre as partes
quanto à qualidade de segurado à época do início da incapacidade laborativa (em 2006), seja
porque houve pronunciamento judicial sobre o fato, considerada a existência de contribuições
previdenciárias apenas em período anterior a 1986 e posterior a 2008.
6. Não há dúvida que o sócio gerente é considerado segurado obrigatório do RGPS, na qualidade
de contribuinte individual, conforme disposição do artigo 11, V, f, da Lei n.º 8.213/91. Não
obstante, é igualmente cediço que o segurado filiado ao RGPS na condição de contribuinte
individual é responsável pelo recolhimento das contribuições correspondentes, a fim de ter
garantida a devida cobertura previdenciária, conforme disposto no artigo 30, II, da Lei n.º
8.212/91.
7. A concessão dos benefícios previdenciários mantidos pelo Regime Geral de Previdência Social
deve observar as estritas hipóteses legais, dado o caráter contributivo do sistema e a
necessidade de preservação do seu equilíbrio financeiro e atuarial.
8. É necessário frisar que a Seguridade Social brasileira está construída sobre os parâmetros
jurídicos da solidariedade, de modo que o seguro social depende do cumprimento de um conjunto
de requisitos distribuídos por toda sociedade e também para o Estado, especialmente por
trabalhadores, sendo certo que as contribuições necessárias ao custeio desse conjunto de
benefícios pecuniários devem ser recolhidas quando o trabalhador não está acometido de
doenças incapacitantes. Não havendo contribuições por parte dos trabalhadores (contribuintes
obrigatórios ou facultativos) sob a lógica solidária que mantém o sistema de seguridade, ou se
esses trabalhadores só fazem discretas contribuições quando já estão acometidos de doenças
incapacitantes, por certo o benefício previdenciário não é devido à luz da Lei n.º 8.213/1991 e da
própria lógica constitucional da Previdência.
9. O julgado rescindendo analisou e valorou a conjunto probatório e, segundo seu livre
convencimento, de forma motivada e razoável, adotou uma solução jurídica, dentre outras,
admissível, não se afastando dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época. A
excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas.
10. Verba honorária fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de
juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas
civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção), conforme prescrevem os §§ 2º,
4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que
inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios
da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
11. Em juízo rescindendo, julgada improcedente a ação rescisória, nos termos do artigo 487, I, do
CPC/2015. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Seção, por
unanimidade, decidiu, em iudicium rescindens, julgar improcedente a ação rescisória, consoante
art. 487, I, do CPC/2015, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
